sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Parte 31 - Arthur, O Príncipe Escondido

Quando Raveneh se curvou em agradecimento, admirou-se ao ver o salão vazio. Todo um espetáculo somente para o Rei? Não...
Raveneh se levantou, com um leve sorriso. Viu ao lado do Rei, um garoto moreno. Tinha um sorriso muito bonito, e estava vestido de forma muito simples, simplesmente com uma camisa branca e calças azul-marinho, tudo de algodão puro. E o garoto estava descalço, com seus olhos negros. Uma expressão que Raveneh, não sabia porque, lhe parecia muito familiar.
- Agora confio em ti, Catherine - disse o Rei com uma voz grave - quero que conheças o Arthur.
Raveneh ficou muito surpresa. Nunca ouvira falar desse menino chamado Arthur!
- Pode descer, Catherine - convidou o Rei com um leve sorriso - venhas jantar conosco.
- Obrigada, Vossa Majestade - agradeceu Raveneh descendo do palco, e sentando-se à mesa. Arthur a fitava com um olhar muito estranho, como se suspeitasse de algo, fazendo Raveneh sentir um calafrio correndo pela espinha.
- Arthur é o meu filho adotivo, Catherine - contou o Rei - ele tem nove anos. Quase dez.
"O mesmo tempo desde a Primeira Guerra" lembrou Raveneh para si mesma.
- Como você veio ser empregada? - perguntou Arthur.
Por que aquele menino parecia tão familiar? Aquela expressão, aquela voz, aquele jeito de comer...!
- Eu era uma baderneira e fui levada pra cá para ser banida - respondeu Raveneh observando o prato sendo enchido de carne, legumes, massa pelos empregados - disse que sabia dançar e a Vossa Majestade achou interessante me contratar.
- Você confia nela, pai? - indaga o menino solenemente.
Raveneh quis fugir ao ouvir a pergunta. Porque o menino parecia que sabia do segredo dela?
- Sim, Arthur - respondeu o Rei. Se ele se sentiu acuado pela pergunta, não demonstrou.
- Quem é a sua mãe, Arthur? - indagou Raveneh engolindo em seco.
- Me abandonou - respondeu Arthur fitando o prato cheio de tomate, arroz e carne.
O jantar seguiu sem mais delongas e perguntas, com Raveneh sentindo-se muito incomodada com o olhar vigilante do garoto. Parecia-lhe que o garoto tinha alguma coisa de mágico...
Ao subir para o seu quarto, escutou o Rei de novo conversando com alguém. Com o menino.
- Essa menina não me cheira bem - comentou Arthur.
- Porque? - perguntou o Rei com um tom muito curioso.
- Não sei. - Arthur respondeu - Eu não sei. Pai, sei lá, parece que eu consigo... sei lá, adivinhar o que as pessoas pensam...
- Ler as mentes de outras pessoas? - indagou o Rei horrorizado.
E claro, Raveneh deixou cair a cesta de roupas sujas que levava, muito surpresa. Só faltava essa!
- Não exatamente - corrigiu o menino - é... farejar sentimentos, sei lá! Só sei que Catherine não me parece confiável... Ela guarda um segredo!
- Bobagem! - retrucou o Rei - fez os exercícios do Dom Bonaparte?
- Sim, eu fiz - Arthur disse com uma voz mais conformada - pai... porque mamãe me abandonou?
- Bem... - o Rei emudeceu. Como iria explicar para um menino de dez anos as verdadeiras razões de a mãe não cuidar dele como deveria cuidar?
Raveneh sentiu que era uma intrusa. Sim, era uma espiã, e tinha como dever espiar tudo o que o Rei falava. Mas esse assunto parecia-lhe tão particular, tão íntimo que Raveneh saiu de perto. O Rei não era aquela monstruosidade que era contada nas Campinas. Tinha um filho a quem criava, talvez tivera uma mulher que deixara lembranças belas e também algumas ruins... O Rei era, na verdade, uma criatura solitária que tinha como única alegria o Arthur. Como podia enfrentar um homem desses?
Sentou-se na sua pequena e fina cama pensando em como deveria agir. As Campinas levaram a melhor na primeira batalha. Fora fácil demais. E tinha algo muito suspeito nisso... O Rei, pelo que sabia, não costumava subestimar as habilidades das Campinas. Aliás, de acordo com algumas histórias contadas por Tia Rê, uma sábia mulher, o Rei até viveu durante umas semanas nas Campinas e viu de perto toda o encanto que o povo das Campinas tinha. E isso foi há muito tempo.
"Johnny" começou a escrever.
"Sinto saudades das Campinas. E o castelo me parece ainda mais assustador... Me pergunto sempre porque o Rei está atacando as Campinas... Quais são os motivos? Porque tanto ódio? Eu preciso de razões decentes para... Céus, se me descobrirem, não sei o que poderão fazer comigo...!"
Raveneh respirou fundo. Continuou a carta.
"Eu conheci o pequeno Arthur, Johnny. Ele é o filho adotivo do Rei... Contei somente isso na carta para ser lida para todos. Parece-me que está sendo bem cuidado, mas sofre por não ter uma mãe. E ele é esperto, Johnny. Ele não confia em mim, eu pude pressentir. Não sei porque, mas tenho a impressão que este menino tem poderes, mas não sabe deles. Ou sabe e finge que desconhece seus poderes. Johnny, não conte este detalhe de Arthur desconfiar de mim para Maria ou qualquer uma das pessoas que vivem com você, nas Campinas. É um detalhe que não quero revelar no momento, e preciso ter certeza quanto aos motivos dele para isso."
Escutou passos. Tinha que finalizar a carta rapidamente!
"Tenho que me despedir aqui, o dever me espera!
Carinhosamente...
... da R."
Dobrou a carta rapidamente, escreveu um "Pessoal - Para Johnny" muito rápido e escondeu a carta sob as vestes.
A porta se abriu. Era o pequeno Arthur.

Nenhum comentário: