quinta-feira, 17 de julho de 2008

procura o cap 50? foi postado, é o anterior a este post.



Desenho LINDO de Polly para marcar o fim da primeira fase.
Thanks, Polly *-*


rascunho | escurecido pelo photoshop | passado a limpo com caneta

- Desculpe, Polly, mas esses desenhos são tão lindos que seria um crime só expor a fase final para todos. Concorda? *-*

Parte 50 - O vazio entre o conformismo e a frieza.

Existe uma certa crueldade que nos faz manter vivos. A crueldade nos faz levantar a cada vez que levamos um tombo, a crueldade nos faz superar os obstáculos da vida e seguir em frente, a crueldade nos faz ignorar as vidas alheias carregadas de tragédia.
Conseguimos viver dia após dia, mesmo sabendo de pessoas que estão se afundando em um mundo cada vez mais triste.
Conseguimos nos levantar a cada tapete puxado, não importa por quem. O que importa é que levantamos, ficamos em pé e encaramos de frente.
Como se fossêmos contra um vento muito forte, é assim que a crueldade move a gente.

Não é cruel quando você perde algum amado, mas ainda assim persiste em viver?
Não é cruel quando você vê que existem pessoas que precisam de ajuda, mas ainda assim você as ignora e consegue ser feliz?
Não é cruel quando o céu está cinzento, mas você insiste em ser cor-de-rosa?
Não é cruel?

A crueldade move a raça humana, pessoas que conseguem sorrir mesmo quando está tudo em ruínas. É uma raça fracassada que insiste em viver todo dia, lutando contra a própria natureza, evitando a morte a qualquer custo. É uma raça fabulosa em se destruir, destruir os outros e que ainda assim consegue ser feliz.
Como as pessoas conseguem?

Felizes a todo instante, mesmo quando são compostos por tragédias pessoais e melodramas mexicanos. São pessoas tristes que mentem o tempo todo para si mesmas, são pessoas que resolveram encarar o céu azul todo dia.
O coração se aperta a cada problema, mas melhor não pensar nisso.
Somente se levantar a cada tombo.

Isso é tão cruel.
Como Siih podia estar tão serena ao ver o corpo de sua assistente ser erguido?
Como Siih podia estar tão tranquila ao ver o fogo se acender debaixo da tábua de madeira?
Como Siih podia estar tão resignada ao ver que estava completamente destruída por dentro?

O sol estava alaranjado nessa hora, e Siih teve que se servir de toda a sua crueldade capaz de mantê-la em pé para assistir à cerimônia. Ela se recusou a fazer qualquer coisa, e ignorou os olhares. Somente olhava para o vazio, e tudo era um borrão tão confuso, de pessoas borradas sem nome. E um céu que era bonito, mesmo borrado. Tão bonito, tão laranja com aquele rosa que dava o acabamento perfeito.
- Vossa Majestade?
Era mais alguém que dava os pêsames. Ela não ouvia realmente, sequer olhou para a pessoa. Somente fitava o céu, seus olhos aparentando estar tão tranquilos, mas qualquer perceberia que tudo o que Siih queria era se atirar da torre mais alta que o castelo tivesse. Mas não fazia isso, contrariando seus próprios instintos. Seus pés insistiam em ficar onde estavam, seus olhos não desviavam do céu mesmo que houvesse uma guerra.
- Irmã?
Siih foi sugada do céu para a realidade, mas continuou imersa em devaneios. Conseguiu focar um pouco no rosto do irmão, e reparou que ele parecia muito preocupado. Coitado, ela não pôde deixar de pensar.

Seu braço doeu por um instante, e o vestido lhe deu uma sensação de sufoco. Ela se virou para Lefi, os olhos muito apagados.

Eu recuei muitos passos para mentir
Mas agora eu estou aqui

Entregue a você


- Irmã? Você... está palida - Lefi completou sem nenhuma emoção, somente procurando algum vestígio de alegria nos olhos de Siih. Ela deu um leve sorriso, tão falso que completou a perfeita máscara de tranquilidade.
Siih olhou para o céu novamente, tentando encontrar aquele laranja e aquele rosa que a acalentou lentamente, que a tranquilizou por breves momentos. Mas o rosa deixava de existir vagarosamente, dando lugar ao azul. Não o azul do meio-dia, o azul que assistiu a sua maior derrota.
Mas um azul-safira tranquilo que se deixava ser bordado por estrelas, um azul que permitia a Siih um pouco de paz.

O fogo consumia o corpo de Libby devagar, junto com seus pertences. Atrás do fogo, Ophelia não sorria, muito menos Lala. Os cabelos de Lala pareciam flamejantes, devido ao laranja do céu que se apagava e ao fogo. Ophelia estava de pé e fizera questão de começar toda a cerimônia, como uma penitência. E Siih nada fez para impedir o absurdo da assassina reger o funeral da vítima despedaçada.

Como Siih podia cuidar de alguém se estava tão destruída por dentro?, era a dúvida que consumia a mente de Alicia.

Todos me falaram para eu parar
Mas eu não fiz, e agora?

O que você vai fazer?


Não importa o que falassem, o que achassem, o que vissem. Alicia sabia de como Siih se consumia diariamente naquela função que ela odiava, de como Siih tentava fazer bem-feito mesmo que simplesmente quisesse mandar todos se danarem. Como pode uma Rainha não amar seu ofício? Como pode uma Rainha ignorar os maiores segredos de sua própria família? Como pode uma Rainha se odiar por não parar com toda aquela monstruosidade?

E como Alicia podia ajudar em uma situação que ela se via sem saída?

Ela vira sua colega de trabalho, a menina com quem compartilhou a atenção da Rainha durante meses, ser estraçalhada como uma formiga. E agora essa colega era consumida pelas chamas, e sentia que era hora de fugir. Mas ninguém deixaria, e ela mesma não queria. Queria ficar longe, mas sabia que não poderia amargurar a culpa de deixar pessoas sozinhas.
Engoliu em seco.

Por que eu não morri de uma vez?
Contrariando a minha lei?

E estou submissa a você


- Siih, vamos embora - foi tudo o que Lefi disse.
Siih sentiu ser puxada por mãos fortes e masculinas, mãos decididas que a levaram para dentro do palácio e a guiaram por escadarias até o seu quarto. Sentiu essas mesmas mãos a sentarem na cama, e a abraçarem fortemente. Siih enxergou o próprio quarto e percebeu que o espelho refletia seu olhar tão vazio de sentimentos.

Ninguém se incomodou com a ausência da Majestade, pois a lei é bem conveniente a uma Rainha: ela faz o que quer na hora que quer. E todos interpretaram a ausência inesperada como um sinal muito profundo de luto.
Siih passou as mãos no cabelo e desabou na cama, olhando fixamente para o teto.

As últimas horas passaram como flashes diante de seus olhos. Saíra daquela torre e simplesmente tomou banho, escolheu a roupa e esperou ser chamada. Não falou com alguém, e se recusou a comer algo. O sol se tornara meio quente a cada hora que se passava, e o silêncio se instalava de forma cada vez mais lenta. Era simplesmente maravilhoso ficar só, confortada pelas próprias lembranças.

Precisava desse tempo, precisava de alguma esperança. Mas ela se esvaía a cada segundo, então se concentrava em ler documentos que não lera há dois anos. Papéis amarelados, contando todos os podres da família real. E as palavras ainda a confundiam enormemente.
Saldo de 40 fadas mortas.
Feitiço Ilusionista renovado, 450milhões de Glombs Encantados.
Encanto de Ilum renovado: condições completas do Encanto...

Siih olhou pela janela, vendo o azul se tornar cada vez mais escuro. O sol deixara de existir, e sentia frio em seu vestido com um tecido absurdamente fino.
- Vá embora - disse - me deixe sozinha.
- Irmã...
- Me deixe em paz.
- Mas...
- VÁ!
Lefi não insistiu mais. Somente saiu do quarto, deixando a irmã ficar olhando o negro céu.
Era tarde para descobrir os segredos e lutar agora.
Era tarde demais.

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Alicia se sentiu extremamente irritada ao ser acordada por Lala às três da manhã, o castelo em sombras, para mandar uma festa particular que envolvia a renúncia de Siih e a definitiva vitória de Ophelia. E a única assistente da ex-Vossa Majestade fez uma anotação mental para que não mandasse mais Lala para aquele lugar, mesmo que fosse totalmente inconsciente. Agora sentia medo de uma futura ira de Lala.

Ela fez os Glombs trabalharem duramente, desenrolando tapetes vermelhos, arrumarem milhares de pétalas de rosas vermelhas, passarem um vestido todo branco, roxo e dourado, iluminarem todo o castelo com bonitas e finas velas brancas que emanavam um fogo confortável, e servirem uma ceia exuberante, com muito vinho e leitões com maçãs na boca.
E foi Alicia quem acordou Siih e a fez vestir um simples vestido negro, e depois acordou Lefi, contrariando os próprios principios de não entrar em um quarto pertencente a um homem. Ela o acordou, avisou sobre Ophelia e voltou para organizar tudo.

Em questão de minutos, longos minutos que se arrastaram impacientes, tudo estava pronto e Ophelia esperava por Siih na Segunda Torre.
- Ophelia - Siih disse, e viu todo a cerimônia.

Ophelia no centro, Lala à sua esquerda e Lefi à sua direita, e Alicia na direita de Lefi. E um tapete vermelho que se estendia pelo quarto corredor.
- Entre nessas salas e pegue a coroa - Ophelia sussurrou docemente.
Siih queria xingar, bater o pé, se recusar. Mas algo lhe dizia que era melhor se submeter ou algo de mais aconteceria. E ela não suportaria outro funeral.
- Está bem - disse.

A primeira porta era a Sala de Bronze, a segunda a Sala de Prata, como descobriu.
A primeira porta dava para uma sala toda avermelhada, onde até mesmo o carpete era vermelho e no centro, uma mesa de madeira com um livro vermelho também. Era sufocante pela vermelhidão e Siih não quis ler o livro.

A segunda porta era uma esplêndida sala de estatuetas belíssimas e troféis. Tudo de cristal, com carpete prateado. Siih pensou ter sentido o olhar frio e vigilante da mãe naquela sala, e fez questão de sair daquele aposento claustrofóbico o mais depressa.

A terceira porta era a Sala de Ouro.
Circular, toda branca com uma mesa de mármore no centro, também circular. E a coroa brilhante, deslumbrante.
O ouro com diamantes, formando uma linda combinação. E em volta, estantes brancas cheias de coroas. Siih reparou que as coroas mais bonitas e trabalhadas ficavam ali, e decididamente nenhuma de suas tiaras era tão bonita como aquelas coroas. A mais bonita entre elas, tirando a principal, era, claro, a de ouro com rubi, formando arcos repetidos.

Pegou a coroa principal, de ouro e diamante, sentindo o peso da decisão.
- E se eu não quiser dar a coroa? - perguntou, quando ficou diante de Ophelia, esta maravilhada com a beleza do acessório.
Ophelia parou para pensar antes de responder.
- Será o prato principal da ceia. Você acha que tem um gosto bom?
Siih não resistiu.

Entregou a coroa e se entregou à Ophelia.
Renegou seus poderes, e o seu passado.
Sentiu a preocupação de Alicia e a decepção de Lefi.
Sentiu a frieza de Lala e a vitória de Ophelia.

A coroa deixou suas mãos para decorar os cabelos castanhas de Ophelia que rodopiou levemente, fazendo o vestido girar perfeitamente.
Era como se um fardo deixasse suas mãos e seus ombros, e era como se os fantasmas exigentes se calassem diante da renúncia. Siih se ajoelhou diante de Ophelia, e enterrando toda a sua amargura e orgulho, renunciou ao cargo.

Por escolha própria, cedeu os poderes adquiridos na condição de Rainha. Trocou a própria vida pela soberania de Ophelia, e nem se arrependeu. A promessa de se vingar de Libby ainda era maquinada na sua mente, e Siih sabia que um dia ela que ficaria de pé, com a coroa de ouro e diamante. O Conselho fora destruído, onde estariam aquelas fadas?
Era absolutismo, onde a Rainha fazia o que quisesse.

E Siih fazia o pior e o melhor.

Ophelia sorriu, se sentindo gloriosa ao sentir a humilhação de Siih nos seus pés. E dando outro sorriso, se curvou para todos, e magnificamente

sussurrou:
- Agora sou a Rainha.

Siih não chorou, seus olhos frios como pedra.
Lala não sorriu, seus olhos penetrantes como punhais.
Lefi não disse uma palavra, seus olhos fitando a irmã gelada.
Alicia não decidiu resistir, seus olhos fitando a nova soberana deslumbrada.

Pois agora Ophelia era a soberana e toda a luta fora inútil.

E agora você venceu.




N.A.: fim melodramático e curto para a primeira fase. Sinto muito pelo fato de as Campinas não aparecerem. Mas fiquei 100 minutos tocando instrumentos (pandeiro, agogô, 'tantan' - algo assim - e tamborim) e meus dedos doem absurdamente, ok? ù.u

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Parte 49 - Você perdeu, Siih.

- Isso dói!
- É para sentir o que posso fazer!
- Eu já falei que dói!
- Lala, ora essa! Ora... - a voz falhou.
As mãos largaram o corpo frágil de Lala, que desabou no chão, que se contorceu de dor. Os cabelos laranja estavam despenteados, e os olhos cor-de-mel não verteram nenhuma lágrima ou assumiram alguma expressão de arrependimento ou ódio.
- Já entendeu que eu não tenho escrúpulos? - Ophelia sibilou maldosamente.
- Como se não tivesse entendido desde o começo! - Lala gritou, se pondo de pé, gritando na cara de Ophelia.
Estavam em um dos quartos que Alicia arrumou rapidamente e medrosamente. Era grande, todo branco e cristalino. A janela dava para ver as Campinas lá embaixo, o sol se derramando sobre o verde contínuo. E não havia nada no quarto, exceto por uma estátua de marfim que retratava uma mulher com asas. Esta estátua brilhava devido ao sol, de olhos muito penetrantes. Uma estátua que estava exatamente no centro da sala, que aliás era circular. Um cenário interessante para Ophelia castigar Lala.

Ophelia não pareceu, mas se sentiu irada ao se ver diante do "poupe a Majestade". Mesmo que Lala estivesse completamente submissa naquela hora, ainda assim Ophelia odiou se ver diante de um pedido tão... ridículo. E era por esse motivo que castigava Lala, desferindo alguns golpes na costa, como se fossem chicotadas. E Lala não havia chorado, pedido perdão ou nem mesmo desafiara Ophelia. Simplesmente aguentara os golpes (ela sentiu um arrepio e evitou ver qual a arma que foi usada) com disciplina espartana. Lala somente se irritara.
- Me desculpe, Lala - Ophelia deu um olhar bondoso e Lala realmente teve muito medo de perdoar Ophelia, guiada pela aparente bondade e ternura naqueles dois olhos castanhos.
Lala tocou as próprias costas, tendo que contorcer seu braço. Sentiu apenas um machucado, e percebeu que não sangrava. Mas ardia ao simples toque.
- Você vai me arranja roupas decentes - Lala somente disse - chame Alicia e mande-a trazer roupas para mim.
- Ora - Ophelia comprimiu um riso - eu não me curvo a você! Quem é a escrava aqui?
- Mas, mestre - Lala disse em um tom perigosamente baixo - você vai recusar um pedido da sua querida... amiga?
Ophelia a fitou com os olhos castanhos, admirando a serenidade e o orgulho contido nas feições definidas da escrava. Vacilou, e resolveu aceitar o pedido da "escrava".
- Alicia! - abriu a porta, meteu a cabeça para fora e gritou - Alicia!
Silêncio.
- Alicia! Não tem ninguém aqui que trabalhe?
- Você matou a outra assistente - Lala alfinetou - agora quer que Alicia dê conta do dobro que tem que fazer?
- Cala a boca, Lala - Ophelia disse com rispidez - ei, você! - disse para um Glomb qualquer que passava - você. Pegue roupas! Anda!
- Sinto muito - o Glomb disse - nós somos enfeitiçados para obedecer somente à Rainha. E Siih ainda é a Rainha, e não podemos obedecer a qualquer pessoa que Siih seja inimiga!
- Ah entendo - Ophelia mordeu o lábio inferior. Com certeza aqueles malditos feitiços para controlar um povo inteiro - então, por favor, chame Alicia?
O Glomb engoliu em seco, avistou a garota de cabelos laranja que por acaso estava de costas. E conseguiu ver os cortes feios, que não sangravam, mas pareciam bastante doloridos. E achou uma excelente idéia chamar Alicia.
- Claro, senhora!
E sumiu.

- Você é uma idiota, Ophelia - Lala disse, a voz muito casual. Ophelia se virou, parecendo bastante irritada:
- Tem noção do que está dizendo, Lala? Se alguém escutar você dizendo assim...
- ... perdem todo o "respeito" que tem por você - Lala completou sem um mínimo de temor - já chorei demais, já me humilhei demais.
- É fácil ser destemida quando se está ganhando, né? - Ophelia alfinetou, fechando a porta rapidamente - você sequer ajudou quando foi sete contra um. E só chorou pedindo que eu poupasse a Majestade. Por que chora tanto em momentos cruciais e é uma idiota tola destemida a sós?
- Por que é mais fácil mentir, Ophelia - Lala deu um sorriso de canto - minha amiga, não quero que você morra. Mas se você morrer, não quero ser perseguida em todos as colônias de fadas como traidora, entende?
- Você é uma safada mentirosa - Ophelia deu um sorriso cínico.
- Absolutamente - Lala sorriu.
- Quando foi que perdeu o medo por mim? - Ophelia quis saber, curiosa.
- Quando você extinguiu uma vila inteira - Lala respondeu friamente - não quis sentir o medo que todos sentiam. Sabe, dá para ver as Campinas aqui. O que fará com elas?
Ophelia ergueu o olhar, tentando achar uma resposta. Nem sabia. Mas que diferença fazia? Era tudo a mesma coisa, pessoas que tremiam só de ver uma Musinha sequer. Hmpf, gente tola e insignificante.

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Grillindor era um reino fantástico, como uma pérola em meio a lama. E com a derrota de Istypid e o orgulho restaurado, estava ainda mais lindo. O verde da grama era vivo, as flores fabulosas, o céu de um azul tão puro! E o palácio que se erguia acima de todas as casas, vitorioso, com a bandeira tremulando no alto.
- Ouvi falar da sua atuação - disse o rei, um homem muito baixo e de olhos pequenos - foi simplesmente esplêndido, Crazy.
- Obrigado, Majestade - Crazy disse, a voz fria.
- Então eu o nomeio General - o rei deu um sutil sorriso - e você receberá todas as honras devidas.
Crazy havia se levantado e fitado o rei nos olhos:
- O que significa - disse - receber mais folgas e poder manter Zidaly longe de mim?
- Posso garantir a respeito de mais folgas - o rei deu um sorriso mais aberto - mas não a respeito de Zidaly. Por que quer tanto que ela fique longe? Ela te adora, General.
- Porque ela é uma vagabunda - Crazy respondeu sem rodeios e se afastou, logo atravessando a linha que separava a sala do trono do sol brilhante. Era apenas mais um dia. Conhecia a história de Ophelia, e imaginava o que estava acontecendo lá longe. Mas isso não importava mais, pois Grillindor era completamente independente. Estreitou os olhos, evitando olhar diretamente para o sol.

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- Eu... a odiava.
Alicia estava sentada, bastante pálida e trêmula, olhando para o vazio. Não estava na cozinha ou na enfermaria onde Siih repousava, nada disso. Estava no quarto onde Libby dormia, admirando cada móvel.
A cama com o lençol branco e desarrumado.
As cortinas da cor de marfim que se mexiam de acordo com a mais leve brisa.
As paredes cristalinas e frias.
O armário feito de mármore, pesado. E as roupas que eram enfileiradas de acordo com o tipo. A maioria era branco e de tons pastéis, Alicia reparou.
A escrivaninha de mármore, com papéis, canetas. A cadeira reta, de madeira clara.
- Eu a odiava.
A voz saia rasgante, quase cortante. E as lágrimas rompiam as bochechas da garota, fazendo-a se sentir desesperada. Não queria recordar do corpo ensanguentado da colega, não queria lembrar as risadas cínicas de Ophelia. O quarto era praticamente idêntico ao seu, com somente a diferença da cor da cortina e obviamente, das roupas e itens pessoais que costumam ficar guardados nas gavetas da escrivaninha.
- Libby, você se lembra do nosso primeiro dia? - Alicia sussurrava para o vazio, não se incomodando pelo céu lindo que aparecia pela janela - a gente se odiava.
Abriu as gavetas, procurando algum parente vivo a quem avisar. Não que tivesse esperanças, pois se lembrava com perfeita clareza que toda a família morrera por causa dos demônios, por causa de Ophelia. Maldita Ophelia, como você conseguiu destruir uma família inteira?
Fotos, fotos e mais fotos. Fotos de Libby criança, de Libby adolescente e outras na escola, com colegas. Algumas com mãe, pai, irmã, prima. Vasculhou mais, não se preocupando em bagunçar o quarto de Libby. Suas mãos trêmulas acharam rapidamente envelopes. Cartas.
Querida Libby dizia uma delas. A letra era perfeitamente redonda e pequena, sem um mínimo tremor Aqui está tudo bem. Que bom que está contente aí! indica que todo o pouco dinheiro que eu investi em você foi bem investido! Que orgulho, servindo à própria Rainha!
Alicia largou a carta. Será que Ophelia tinha noção do que significava cada pessoa morta por Ophelia? Mesmo que odiasse Libby, nunca desejaria a sua morte. Será que... odiava? Céus, não era somente uma briguinha infantil? Rixa entre duas colegas? Uma disputa mesquinha para ver quem seria a favorita?
Kallipta engravidou pela quarta vez, e ela jura que será a última. Claro, eu farei questão de que seja a última, vou castrar aquele maldito Alicia respirou fundo e voltou a ler a carta Sua irmã não toma jeito, Libby, vive aí vadiando e sempre tendo um filho daquele homem, e já falei que ele não presta, mas quem me ouve? Ah, Libby, que bom que você existe!
Alicia verificou a data. A data fora enviada um mês antes, provavelmente a última ou penúltima carta enviada. Então Libby tinha uma irmã que estava grávida, uma mãe que se preocupava... seria uma mãe? Sim, era, podia ler o "De sua querida mãe" no final da carta. Remexeu os envelopes, a procura de outro endereço. Mas decididamente todos os endereços escritos eram sempre de uma única cidade: a vila destruída por Ophelia.
Tentou juntar os envelopes e controlar seu tremor. O medo crescia e envenenava seu coração, sufocava seus pulmões e comprimia a sua garganta, emprestando torpor a Alicia que já não sabia mais o que estava fazendo.
- Alicia! - era um Glomb.
Pequeno, meio esverdeado. Sua expressão estava quase chorosa, embora isso seja muito difícil de dizer devido a estranha junção dos olhos miúdos e maldosos.
- Alicia - o Glomb repetiu.
- O que foi? - Alicia perguntou, secando as lágrimas rapidamente, tentando parecer furiosa por ser indignada. O Glomb respirou fundo e sussurrou, com a voz falhando várias vezes:
- Ophelia quer falar com você.
Alicia gelou.
- Como é?
- Perdoe-me, eu não pude evitar, perdoe-me! Eu não pude seguir as ordens dela, mas ela me mandou chamar você e é o que estou fazendo e...
- Cala a boca! - Alicia exasperou-se, tentando respirar direito.
- ... E ela torturou a criada dela, de cabelos laranja e eu...
- Ela o quê?
Alicia se levantou, ignorando todas as fotos e cartas que largara no chão. Não se incomodou em praticamente atropelar o Glomb que quase chorava de tanto pavor, só tentava lembrar onde era o quarto que Ophelia estava. E agora? Libby morrera simplesmente por tentar avisar Siih sobre o perigo de uma arma. Alicia não gostava de passar por covarde, mas não tinha a mínima vontade de morrer. Se ficar viva significasse servir a Ophelia, se pondo fora da linha de fogo, então era o que ia fazer. Dane-se. Ideais de lealdade são lindos e maravilhosos, mas quando isso implica a vida de outras pessoas, não a própria. Como diz um ditado mentiroso e vulgar: não existem ateus quando o avião está para cair. Talvez isso se aplique a situação: não existem valentes quando se vê com um punhal na garganta. Algumas raras pessoas cedem suas vidas de forma honrada.
E Alicia não era esse tipo de pessoa.
- Ah, chegou, Alicia - Ophelia sussurrou - é esse o seu nome, né? Ouvi algo assim.
- Sim - Alicia respondeu, fria. Apesar de ter optado em salvar a própria vida, isso não queria dizer que ela amaria Ophelia e seguiria todas as suas ordens amavelmente.
- Preciso que arranje roupas decentes para Lala - Ophelia disse simplesmente - e quero que avise Siih para se preparar para a cerimônia fúnebre de sua amiga, a Libby.
- Ela não era minha amiga - corrigiu Alicia secamente.
- Já foi?
Alicia não respondeu, somente andando pelos corredores mandando uns dois Glombs levarem roupas para Lala e procurando a enfermaria. A encontrou no final de um corredor, onde a porta branca era decorada com uma margarida.
- Majestade - Alicia sussurrou.
- Oh, Alicia - Siih a viu entrar na sala - entre, por favor.

- Ela torturou Lala? - se surpreendeu Siih.
- Sim - Alicia estava muito abalada, e evitava olhar nos olhos de Siih - acho que foi porque Lala pediu que te poupasse - supôs Alicia.
- Então corro tanto risco como... - Siih não conseguiu dizer o nome da assistente - ela vai ser queimada hoje.
- Eu sei - Alicia ergueu os olhos para Siih - Ophelia pediu para que você se arrumasse.
- Pediu? - Siih deu um sorriso de canto, de uma forma muito cínica.
- Ok, mandou - Alicia disse sem se incomodar pelo tom zombateiro de Siih - o que importa é que ela tem a minha vida nas mãos.
- Com medo, Alicia? - Siih sorriu levemente.
Alicia a fitou friamente. Siih reparou pela primeira vez na cor dos olhos de Alicia: um cinza apagado, como um céu nublado. Eram bonitos e profundos, e cintilaram quando Alicia respondeu muito secamente:
- Querias!
Claro, era uma resposta mentirosa, mas Alicia não queria admitir o medo crescente dentro de si. Achava que caso negasse o tempo todo o medo que sentia, conseguiria derrubá-lo.
Ah, como ela estava errada!
- Bem, Ophelia ainda não é a Rainha - Lefi disse - torturou Lala, e quer a coroa. Sabe onde fica a coroa. E... bem, tudo indica que estamos completamente ferrados!
- Cale a boca, Lefi - Siih disse, ao que Lefi retrucou:
- Eu não estou mentindo. E acho que você deve abrir mão do seu orgulho e pedir ajuda às Campinas.
- Não vou pedir ajuda à ninguém - Siih retorquiu - você pediu as Musas e veja no que deu.
- Mas... - Lefi tentou se justificar, ao que Alicia interrompeu:
- Você não precisa se arrumar para a cerimônia?
Siih olhou feio, mas não falou mais nada. Somente se levantou, resmungando algo contra o braço quebrado que fora posto em uma tipóia de pano.
- Onde está a enfermeira? - rosnou Siih quando viu o braço frágil e doendo.
- Eu que cuidei do seu braço - Alicia respondeu prontamente - não sei se você sabe, mas os criados estão se pelando de medo, sabe. E a equipe médica foi toda dispensada para cuidar dos queridos órfãos de Ophelia.
- Você... - Siih ficou pasma. Nunca imaginara que Alicia tinha dons médicos - obrigada.
- Não tem de quê - Alicia deu um sorriso torto e frio - agora vá se arrumar. Também me retirarei. Não vou parecer uma mendiga na frente de Ophelia, sabe. E a sua serviçal, Lala.
- Lala é uma escrava - defendeu Siih, ao que Alicia disse:
- Duvido que Lala realmente odeie Ophelia.
Siih não se incomodou nem um pouco pela interrupção de Alicia. Afinal se as coisas tomassem o rumo provável, em breve Siih seria reduzida as mesmas condições de Alicia. Seriam colegas somente.
- Bem, preciso me vestir. Que horas são? - Siih perguntou, e Lefi respondeu distraidamente:
- Três e quarenta.
- Ao pôr-do-sol, foi o que ela disse, não? - Siih olhou pela janela, pensativa e tristonha - Libby...
- Você não vai poder vingar Libby se ficar assim - lembrou Lefi.
- Cala a boca - Siih retorquiu, e sem dar uma única palavra, saiu da enfermaria deixando um irmão cabisbaixo e uma assistente completamente perdida. Todos estavam perdidos. A quem deviam a lealdade? E Siih, como ficaria?

Como poderiam respeitar alguém que era tão... perversa? Como podia matar pessoas inocentes, pessoas que não tinham feito nada, pessoas que tinham vidas, famílias, histórias? Como?
E Siih não tinha as respostas. Ela bem queria as respostas, ela bem que queria saber de tudo.

Me afastei de tudo.
O vestido branco balançava com o ritmo crescente dos passos.
Me permiti ficar na ignorância.
Não ligou para a dor no braço quebrado.
E Ophelia se aproveitou da minha inocência.
O vestido branco estava sujo, completamente rasgado em ambas as mangas.
Eu podia ter conhecido alguma magia proibida, uma magia poderosa.
Os corredores pareciam todos iguais!
E eu podia ter usado como uma Rainha e vencido Ophelia!
Pronto, estava agora no corredor certo. E ele era todo cristalino.
Se eu não fosse tão burra...
As lágrimas estavam quentes.
Se eu não fosse tão idiota...
A visão estava borrada.
OPHELIA NÃO TINHA VENCIDO!

Era tão difícil admitir! Tinha que repetir calmamente duas palavras que eram muito perigosas: Ophelia venceu. Tinha que repeti-las devagar, repetidamente, não querendo admitir a verdade. Palavras confusas, palavras que eram faladas a esmo, sem serem compreendidas completamente. Um sussurro maléfico.

Tantas portas. Tantos corredores. E tantas janelas no final de cada corredor. Tanta beleza.
E tanto frio. As paredes eram geladas, constrastando terrivelmente com o azul lá fora, o calor que irradiava lentamente, o verão dando adeus.
Apertou o vestido com força, tentando identificar qual porta. Quarto corredor, não era isso? Três portas, todas do mesmo aspecto: um azul-gelo, como se fosse gelo. Nenhuma inscrição indicando que sala era qual. Sala de Ouro, Sala de Prata e Sala de Bronze.

Ela se lembrava. Tinha sete anos de idade quando se perdeu naquela torre, e resolveu abrir todas as salas, procurando uma saída. Fora punida terrivelmente depois, por simplesmente ter quebrado algumas coisas. Não se lembrava, mas as coisas ficavam em uma das salas naquele corredor. Mal encostou a mão na dourada maçaneta, desistiu.

Iria ver tudo aquilo mesmo, não se importava. Não queria mais.
Nem mesmo se lembrava do que queria, somente fora impelida pelas lembranças e mágoas para chegar naquela torre. Escorregou pela parede lentamente, e abraçou os próprios joelhos, tentando se controlar.
Estava tudo acabado.

As nuvens brancas começaram a ficar ainda mais espessas e se unir cada vez mais mais.

sábado, 12 de julho de 2008

Parte 48 - O sol que castiga.

Duas horas da tarde. O sol ainda irradiava contente, contradizendo os acontecimentos infelizes que ocorriam lá embaixo. Duas horas da tarde, e todos no abrigo estavam reunidos. Todos voltaram rapidamente depois da notícia sobre Ophelia, preocupados.
- Eu não vou ficar me preocupando com Ophelia - Maria disse - se ela vier aqui, ela vai receber!
- Acontece que não podemos com ela - Raveneh havia se levantado e recusou as ordens para ficar na cama - Ophelia é uma arma de matar.
- Bem, se a gente tivesse criaturas mais poderosas que mortais e elfos - Umrae sugeriu - criaturas aliadas como Ophelia tem seus demônios.
- O que está dizendo, Umrae? - perguntou Kibii intrigada.
- Ela está se referindo aos dragões - Amai respondeu - não é?
- Absolutamente - Umrae deu um sorriso de canto. - duvido que Ophelia possa acabar com um bando de dragões. Ora, Ophelia é uma Musa, a mais poderosa Musa. Tá, e daí? Ela não pode acabar com as criaturas mais antigas que existem por aqui!
- Ela tem razão - concordou Kitsune - dragões são seres extremamente poderosos.
- E onde podemos arranjar um exército de dragões que queiram nos ajudar? - perguntou Maria.
- Vamos até uma caverna qualquer e prometemos o 13º salário, carteira assinada e todos os direitos? - ironizou Fer.
- Cala a boca, Fer - Rafitcha riu discretamente, um riso comprimido pela atmosfera sombria.
- Grillindor tem dragões, não tem, tia? - perguntou Amai.
- Sim, o maior exército de dragões domesticados que se conhece - disse Kitsune - pretendem pedir ajuda para Grillindor?
- Grillindor... - Raveneh repetiu a palavra em um tom muito baixo que ninguém ouviu. Para ela, a palavra tinha um sentido especial que lembrava o fim do pesadelo que a perturbava.
Maria abraçava um garoto dorminhoco, preocupado com a criança. Será que Ophelia queria a submissão das Campinas? O que faria? Ansiava por respostas, uma compreensão maior.
- Bem, ela não pode invadir isso aqui de qualquer jeito - Umrae lembrou - nós estamos sob proteção mágica, esqueceu?
- Sim - Bia concordou. Ela se mantinha calada durante todo o tempo, só falando quando achava que tinha algo a acrescentar - mas os Encantos não são suficientemente fortes.
- Como assim? - Fer indagou, intrigada.
- O Encanto que colocamos aqui foi do tipo que se enfraquece perante as fadas. Protege perfeitamente contra seres inimigos das fadas como Ophelia e seus demônios. Mas deixa ela virar Rainha de verdade, e assim o Encanto é esquecido.
- Então o Encanto é uma farsa - Umrae murmurou, não como se estivesse surpresa.
- Por que as fadas Encantam isso aqui? - Raveneh perguntou, intrigada.
- Porque fizemos um pacto com as fadas para nos libertamos de Heppaceneoh - Maria respondeu prontamente - e esse vínculo dura cem anos. Não nos submetemos a elas oficialmente, mas os Encantos são prestados por ela.
- Encantos é uma forma sutil de manipulação cruel - Bia sussurrou.
- Então por isso viemos para cá - raciocinou Rafitcha - porque o abrigo é protegido por magias mais fortes, certo, que não se quebrariam meramente por Ophelia ser a Rainha. Certo?
- Na mosca - Maria respondeu - aquelas fadas sempre foram uma praga. Siih é manipulada a todo momento e nem desconfia como as coisas são feitas.
- Mas ela não é a Rainha? - perguntou Tatiih intrigada - como assim, é inocente?
- Mas ela só faz assinar - Maria respondeu mais uma vez - ela assina e pronto. Aquelas fadas do Conselho fazem todos os documentos, ajeitam tudo e mandam para ela assinar. Ela assina primeiro porque não sabe como funciona a coisa, a mãe não lhe ensinou direito e o pai sempre detestou as responsabilidades. E segundo porque ela odeia ser Rainha. É um fardo que ela não gosta de carregar.
- Bem, uma Rainha que não pôde escolher e não tem noção do cargo que ocupa - Tatiih concluiu.
- Exatamente - Maria respondeu.

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O grupo das cinco Musas estava ali, em frente ao Palácio, duas horas e meia da tarde. Pelo visto Ophelia ainda não havia pego a coroa, não tinha pressa nenhuma.
- Acha que Siih vai ficar enfurecida com a gente? - perguntou Alice olhando para as torres do palácio. Eram quatro torras, cada uma em um ponto cardeal.
- Por quê? - Miih olhou para Alice intrigada.
- Não a ajudamos com Ophelia - Alice respondeu - simplesmente assistimos o espetáculo.
- Ora, a gente a ajudou e tivemos duas de nós feridas - Miih retrucou, ao que Catherine retorquiu:
- O plano não era daquele jeito, aquilo foi puro impulso, nós sabemos.
- Bem, se quiserem ficar implorando perdão a Siih, que seja - Miih deu as costas para o palácio, os cabelos negros batendo nos olhos - mas eu vou ajudar Loveh e Sunny. Siih que se vire.
- Cruel! - gritou Catherine - como pode largar esse reino a própria sorte?
- Eu sempre deixei esse reino a própria sorte - Miih sussurrou - esse reino tão adorado por vocês nunca foi um lugar decente para mim. Por isso que moro longe e só me aproximei daqui por causa de Ophelia.
- Ah! E se Ophelia vier atrás de você? - gritou Alice, ainda não acreditando no que Miih dizia.
- Eu a mato - Miih respondeu friamente.
Somente Elyon ficou calada, concordando intimamente com Miih. Assim como a Miih, não tinha a mínima vontade de ajudar e proteger o reino, ao contrário de Catherine e Alice. As histórias anteriores não permitiam esse ridículo sentimento de patriotismo, e Miih desprezava as fadas e tudo o que elas significavam.
- E você? Vai ficar? - Catherine se virou para Elyon preocupada - essas pessoas...
- Só estou aqui porque quero vingar Olga - respondeu friamente - mas precisamos ajudar Sunny e Loveh.
Catherine e Alice engoliram em seco, e resolveram voltar também. Precisavam se unir mais fortemente, para depois lutarem com Ophelia.

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- Sala de Ouro, quarto corredor, Segunda Torre - Ophelia murmurava.
Passara as últimas horas tomando um longo banho e descansando profundamente, relaxando. Os criados não tiveram a menor dúvida em ajudá-la em tudo, todos ainda temendo o destino de Libby. Aliás, o corpo de Libby foi levado por uns Glombs enojados até um salão. Lala, que também recebera um quarto e estava tomando banho, pedira a Ophelia que desse um destino digno ao corpo e foi atendida. O corpo de Libby seria queimado ao pôr-do-sol em uma cerimônia fúnebre, e as cinzas seriam jogadas no lugar escolhido por Siih. E por falar em Siih, essa estava sendo atendida por um bando de enfermeiros ansiosos, o braço sendo engessado e o corte curado.
Eu falhei, mãe.
Doía tanto admitir isso para si mesma! Era como se um punhal fosse enviado em seu coração com toda a força, e a derrota parecia inadmissível. Lefi olhava para a janela, sentado ao seu lado. Seus olhos azuis demonstravam tristeza, e parecia imerso nos próprios pensamentos.
- Lefi.
Lefi piscou os olhos e logo olhou Siih. Ao ver o sutil sorriso que se estranhava na face da irmã, sorriu também.
- Tive tanto medo de te perder... - Siih sussurrou - tanto medo que ela te matasse...
- Tola - Lefi disse - Libby vai ser queimada no pôr-de-sol.
- Queimada? Com toda a cerimônia? - Siih mordeu o lábio inferior - Ophelia não vai simplesmente jogar Libby para os malditos demônios dela?
- Não. Foi um pedido de Lala - Lefi respondeu - ela veio me contar pessoalmente, a Lala.
- Lala... - Siih olhou para baixo, os lençóis azul-claros - eu não a via fazia dois anos, desde o julgamento de Renegada...
- Eu sei - Lefi respondeu - aparentemente ela estava viajando por aí, tipo uma andarilha. E por acaso ela encontrou Ophelia...
- Parece que Lala é escrava de Ophelia - Siih sussurrou - provavelmente lutaram e Lala perdeu.
- Impossível, Lala teria sido morta - Lefi lembrou, ao que Siih disse:
- Ophelia estava sozinha e precisava de companhia. Mesmo que não fosse alguém muito poderoso, só precisava de alguém a quem se afeiçoar... Ophelia sempre foi do tipo dependente, todo mundo sabe disso. É daquelas pessoas que odeiam viver sozinhas.
Lefi suspirou.
- Bem, você está viva - disse - o braço está quebrado e o orgulho ferido, mas veja bem, está viva!
- Não seja idiota, Lefi - Siih rosnou - ela quebrou o meu braço, mas ela vai ter muito mais, posso assegurar.
- O que vai fazer? - Lefi perguntou, com medo na voz.
- Não posso falar - Siih olhou em volta desconfiada - ela deve ter espiões.
- Como se ela fosse organizada para isso - retorquiu Lefi friamente. O braço quebrado doeu, e Siih se forçou a ficar deitada na cama.
Lefi deu um longo suspiro, lamentando pelo braço quebrado da irmã, mas pelo menos estava aliviado por ela estar viva. Se Siih estivesse morta, ele não ia saber o que fazer.
Eu falhei, mãe.
Por que você nunca me disse que isso era tão difícil?

- Você acha que ela tem espiões? - perguntou Siih preocupada - ela é tão desorganizada! Está tomando esse país a torto e a direito, não calcula estratégias e tudo o mais...
- Você não calculou muito bem na hora de enviar as sete Musas - Lefi lembrou - o que estava pensando?
- O plano era para atacar Ophelia dormindo, um golpe traiçoeiro... - Siih mordeu o lábio inferior remoendo os furos no plano. Por que não previra que as Musas iam esquentar a cabeça e atacar a esmo? - mas...
- Elas não aceitaram se submeter a você, irmã - Lefi disse - Alicia me contou que escutou uma das Musas no banho, sabe. Ela ficou apavorada... Alice, assim como as outras, tem tanto desejo de matar Ophelia como você. Mas elas nunca vão se curvar a uma fada!
- Então é esse o problema? - Siih sibilava, com a voz cortante e fria - pois bem, eu não tenho culpa de nascer fada. Não tenho culpa se tive que herdar essa coroa idiota. Que me importa? Estava muito melhor no Oriente.
- Siih... - Lefi começou com severidade, ao que Siih interrompeu:
- Estou falando sério! O problema é obedecer a mim. Há dois anos que assumi esse trono e tudo o que as pessoas fazem é menosprezar o

meu trabalho! Eu mal sei dos segredos de Estado.
- Todos acham que você sabe - Lefi disse, a voz mais branda.
- Eu não tive coragem de tocar naqueles documentos - Siih virou a cara para o outro lado, escondendo o rosto choroso - eu só soube sobre Mividell e não tive coragem de ler o resto... não, não quero ler aquilo.
- Mamãe confiou em você - Lefi lembrou, passando as mãos pelos longos cabelos da irmã.
- Confiou errado, então - Siih continuou, a garganta dando um nó - ela nunca contou para mim, nunca, nunca. Por que ela me deixou sozinha? Ela me deixou sem nada quando morreu! Simplesmente despreparada, como se informações confidenciais não fossem importantes!
- Calma, Siih! - Lefi exclamou - você vai vencer Ophelia!
- Como? Me diz, como? - Siih sustentou o olhar de Lefi - Como? Ela mutilou Libby como se fosse uma... - chorou, as lágrimas se derramando, salgadas, pelas bochechas - ela machucou Loveh e Sunny, caramba!
- Mas não matou as outras Musas - Lefi lembrou, ainda sustentando o olhar furioso de Siih.
- Porque elas se acorvadaram - Siih rosnou - eu pude sentir, eu pude! Elas evitaram lutar mais, eu pude sentir! Não posso culpá-las... não posso. Eu também evitaria qualquer luta com Ophelia se algum colega meu se machucasse antes... Sunny...
- Ela está bem - ponderou Lefi - e Loveh também. Você pode sentir a energia delas, não pode?
Siih abanou a cabeça, quebrando o contato visual.
- Longe demais, eu sou fraca demais - sussurrou a garota visivelmente contrariada.
Lefi suspirou. Siih estava abalada ainda, e eram somente três horas da tarde.

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Loveh nunca sentira tanta dor.
Obrigara seus ferimentos a se fecharem, e quando as células se multiplicaram em um ritmo furioso, isso doía. E Loveh não conseguia compreender como Ophelia havia sarado a ferida tão rapidamente, tão naturalmente. Olhou para o lado, onde Sunny repousava inconsciente devido a força que fora preciso para se recuperar dos machucados. Reparou que estavam sozinhas, e não conseguia identificar ninguém a raios de vários quilômetros. Provavelmente as cinco garotas foram atrás de Ophelia e Lala, era esse o nome da garota de cabelos laranja? Sim, era. Será que elas se mantiveram longe da luta? Era o mais sensato, se manter longe da garota. Prometeram que ia atacar Ophelia e atacaram. Perderam a luta, e agora a promessa havia sido feita. Loveh não tinha nenhuma promessa em relação a Ophelia, e só acumulava o ódio necessário para uma furiosa luta. Mas persistir agora...

Era inútil.

Loveh se apoiou em uma árvore, se recuperando lentamente. Duvidava sinceramente que Ophelia não sentisse dor, ainda mais quando foi atacada tão brutalmente. Mas ela se recuperara facilmente, foi capaz de correr carregando uma garota. Como podia não sentir pavor diante de Ophelia?

Talvez Ophelia não demonstrasse que sentia dor, isso com certeza era bastante humilhante para ela. Ophelia sempre tinha aquela expressão de serenidade, como se nunca se importasse. E só a vira uma vez para ter essa certeza... primeira vez que vira Ophelia com corpo de mulher, madura...

Lembrou-se dos tempos passados, quando Ophelia era só uma criança. A mãe que era o monstro.
Ela tinha cabelos mal-penteados e castanhos. E os seus olhos eram de um tom feio de verde, um verde muito apagado, muito distante e muito triste.
Ela tinha um sorriso medonho, e tinha um corpo magro, castigo dos tempos da fome, talvez.
E ela tinha ambições perigosas, ambições que guiaram uma criança ao sofrimento.

Se fechasse os olhos agora, podia-se lembrar perfeitamente do cenário destruido, de uma garota que chorava sem parar, sem poder fazer algo a respeito da mãe. A mãe estava nas mãos de Elyon, a mãe se debatia furiosamente e Miih estava na frente da mãe, praticamente tapando toda a visão de uma mulher ossuda se contorcendo para sair.
Mas Ophelia podia ouvir a voz, a voz que rasgava o senso de justiça como quem rasga um papel.
- Mate-as! Não se preocupe comigo, mate-as!
Olga era bondosa demais, talvez. Sabia segredos das estrelas, Musa que podia ouvir os sussurros da noite. E Loveh odiava se lembrar de Ophelia, uma criança somente, se descontrolando completamente, estraçalhando Olga e logo cair adormecida, perdida em pesadelos. O sol estava serenamente dando adeus nessa hora, e as primeiras estrelas se derramavam no céu.
- Olga! - Elyon soltou a mãe, chocada.
- Solte a minha mãe - Ophelia sabia que a irmã já estava perdida.
Olga não se incomodou, somente um pouco mais...
- OPHELIA! - foi nesse instante que a mãe morreu e a filha se descontrolou.
Foi Elyon que matou a mãe, com somente um golpe despercebido de espada, foi um instinto. Elyon ficou tremendo incontrolavelmente, ao ver um cadáver desabar em cima dos pés, sujando de vermelho-sangue os seus sapatos. E Miih se virou para observar o cadáver, e Ophelia pôde ver. Olga havia a perfurado toda, mas nenhum sangue se derramava. Era como se um veneno fosse injetado no seu corpo vagarosamente.
O céu estava ficando cada vez mais azul nessa hora.


Loveh abriu os olhos, assustada. Odiava se lembrar desse episódio trágico, odiava lembrar do nó na garganta quando Olga caiu morta, odiava lembrar dos tons de azul que tingiam o céu naquele momento, e detestava se recordar até mesmo do alívio que sentiu quando perceberam que Ophelia já não mais acordaria.
O sol estava ficando mais fraco, mas não era sequer quatro horas. Era um calor agradável, quase não havia nuvens ou frio. Deu um leve sorriso, esperando descansar o bastante para voltar ao seu castelo de cristal, onde morava, longe e perto dos domínios das fadas. Não se incomodava mais quem seria a Rainha, pois ela mesma não queria ser a Rainha e não se submetia a nenhuma lei. Fazia o que bem entendesse, e as fadas entendiam isso. Até hoje.
Agora que a Rainha tinha poder suficiente, será que Loveh ainda podia ter a sua autonomia garantida? Será que ela não seria perseguida, vista como ameaça igual a Ophelia? Agora já tinham comprado a briga... sentiu a energia de alguém voltando, provavelmente Miih.
Miih podia voltar. Todas elas podiam recuar agora, mas Loveh sentia, no seu íntimo, que isso já não adiantava mais. Havia comprado a briga, havia atacado Ophelia, havia se unido a Siih. Não importa que perderam, Ophelia ainda sentia as cicatrizes da estranha aliança.

Como deveriam agir, então?

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Parte 47 - A Dor

Lala tentava falar, mas não conseguia. Somente via a tudo em volta, lembrando das praças, ruas, bifurcações, o céu. Ela estava nervosa, com medo, embora Ophelia estivesse absolutamente tranquila.
- Eu gostaria de falar com Vossa Majestade - foi tudo o que Ophelia falou diante do palácio, para um garoto assustado, calças enormes e desajeitadas, o rosto pontudo e assombrado.
Ophelia não parecia ninguém poderoso. A blusa estava suja de sangue, os cabelos castanhos em desalinho e mãos sujas de terra. Mas ela não se incomodava com essas coisas, afinal estava prestes a tomar o poder. Não sorria, e Lala sabia que Ophelia estava simplesmente se concentrando em medir as energias possíveis em toda a região. As pessoas não estranharam nada, embora todos achassem estranho uma guria chegar lá e pedindo uma visita, mas ninguém a reconheceu. Ninguém sabia que Ophelia não tinha mais forma de criança, somente as Musas. Talvez a Siih soubesse disso, não tinha certeza. Mas as pessoas comuns? Sem chance.

- Siih! - alguém gritou arfante - tem-alguem-lá-fora!
Siih não entendeu o porquê do drama, mas resolveu descer as escadas muiiiito calmamente e verificar a surpresa. Seria as Musas vitoriosas? Ao chegar na porta, percebeu que estava errada. E que dar meia volta e fingir que morreu é uma ótima saída. Mas Ophelia já a tinha visto, já tinha sorrido cinicamente e algumas pessoas se amontoavam para ver as duas estranhas garotas, uma que tinha uma roupa suja de sangue e a outra contendo o choro de medo. E não demorou muito, a Miih foi a primeira a chegar. Seus cabelos negros refletiam o sol, os olhos demonstravam impaciência, raiva, talvez até um pouco de zombaria, mas nem um tiquinho de medo existia naquele olhar.
- Bom dia, Vossa Majestade! - Ophelia cumprimentou, a voz carregada de ironia, a expressão alegre.
- B-bom dia - Siih não pôde conter o cumprimento, só olhava para Ophelia, apavorada.
- Majestade? O que houve? - Alicia e Libby conseguiram alcançá-la e agora perdiam a voz diante da visão de uma garota de cabelos castanhos e a blusa suja.
- Nada de mais - Siih rosnou. Iria matar Ophelia nem que tivesse que pagar com a própria vida. Ajeitou as mangas do comprido vestido, que era extremamente trabalhado e belissímo, mas nada útil em uma luta, por ser demasiado pesado e limitava os movimentos. Mas Siih não se importou. Estava movida pela fúria, ódio que se estranhava na sua face, no seu sangue.

Mas raiva não ia fazer vencer Ophelia, e tanto ela quanto Ophelia sabiam disso.
- Está na hora de entregar o seu trono para mim, não acha? - Ophelia era uma garota que não gostava de rodeios nem de enrolação - não acho que tenha muito sucesso. Suas amigas não tiveram.
- Mentira - sabia que era uma atitude estúpida, mas ainda Siih ficou na frente de Ophelia, a fuzilando com os olhos - Mentira.
- Isso não é mentira - Ophelia deu um sorriso sutil, os olhos brilhando de excitação.
Siih tentou procurar apoio. Olhou para trás, Alicia tremia e Libby chorava, Lefi gritava para ela voltar. Mas ela não ouviu. O sol de meio-dia irradiava, e as pessoas se juntavam para ver a estranha cena. Tirem essas pessoas daqui... era só o que conseguia pensar.

Mas Ophelia não lhe permitiu pensar, erguendo as mãos. Não iria a usar a maneira mais comum, mas ainda assim usaria suas mãos.
- O que vai fazer? - Siih não estava acostumada com lutas, afinal nunca precisou pegar em uma espada. Não sabia como agir em um duelo.
Ophelia só riu. Era realmente patética a tentativa que Siih tentava de enrolar a Musa, e chegava a dar pena. Conseguiu obter um pouco de frio: o oxigênio é um elemento muito fácil de manipular. Era muito fácil, com uma certa dose de poder mágico, concentrar todo o oxigênio em uma simples e fria bola. E era ainda mais fácil jogar essa "bola", mirando-a cuidadosamente em uma Siih desatenta, de preferência, no seu estômago. Não lhe custava nada, era somente um passatempo. Siih recebeu a "bola" com bastante frieza, sendo jogada contra o castelo.
- SIIH! - gritou Lefi ao ver a irmã caindo de costas, mas sem se abalar uma única vez.
Siih se levantou com rapidez, ignorando as intensas dores que sentiu. Fora jogada contra uma parede de cristal, e isso doía. Pelo menos o cristal não quebrou: era enfeitiçado para ataques brutais como esses.
- É só isso que pode fazer? - perguntou Siih massageando os quadris.
Ophelia deu um sorriso de canto. Siih não era tão fraca assim, então precisava de algo mais forte. Mas não pôde fazer nada, pois se viu golpeada, como se alguém lhe desse um tapa. Siih estava realmente enfurecida e ela foi capaz de conjurar algo parecendo um chicote: um fio branco, cortante, que ela manipulava como quem manipula um chicote. Sim, de fato ela conjurou um chicote de quatro metros mais ou menos que alcançava a face de Ophelia e provocara um corte acima da sobrancelha esquerda. Ah, mas agora estava começando a ficar interessante! Muito interessante, pois Siih não ficava só falando e falando besteiras, sem se mexer. Caída no chão, se esforçou em conjurar algo também. Talvez uma espada, uma espada afiada. Qual foi a sua decepção ao lembrar que não tinha esse poder! Sim, o poder de conjurar coisas era como a telepatia: uma habilidade que não se pode adquirir, somente desenvolver. Habilidades raras e antigas, Ophelia nunca precisou conjurar coisas. Mas não era agora que ia precisar... Ophelia pode aumentar o braço direito e transformá-lo em uma lâmina cortante, uma lâmina maleável que manipulava de forma rápida e desesperadora, tentando cortar o chicote de Siih.

Siih recuou, o chicote branco subiu aos céus e estalou no chão ao lado de Ophelia, fazendo-a sentir a poeira que subiu e o choque que sentiu. Ophelia continuou mexendo o braço-lâmina sem parar, agora mirando os quadris de Siih. Cortaria-os, faria Siih cair e sangrar, morrer dividida ao meio.
- Siih! - Libby gritou, percebendo o que Siih não havia reparado: a lâmina indo em frente, ignorando o chicote, tão rápido que mal se podia ver - Siih!
E Siih percebeu. Mas Ophelia havia percebido a reação de Libby antes e desviou o rumo da lâmina: apontou para a porta do castelo onde os criados se amontoavam perigosamente.
- Libby!
A lâmina alcançou o estômago de Libby, rasgando seu vestido e rompendo a carne.
- Libby! - exclamou Alicia apavorada, vendo a colega ao seu lado, com algo a perfurando. Libby já não sentia mais nada, somente aquela dor que insistia em atravessar seu espiríto, somente a sua alma sendo dilacerada em pedaços. Ofegou, segurando a lâmina que a ergueu no ar, arrancando gritos desesperados de todas as pessoas que presenciavam aquilo, e Libby pôde ver o rosto borrado de Siih aterrorizada, recuando.
- É isso - Ophelia sussurrou exibindo uma Libby ferida na frente de Siih - que eu farei com você caso não saia do meu caminho.
Siih tombou de joelhos, murmurando desculpas a Libby que só conseguiu dar um sorriso machucado. Ela não resistiu quando foi largada no chão, um rasgo fatal no abdomên. Tentou respirar, buscar ar desesperadamente, mas se recusou a se sentar e procurar ajuda. Estava diante de Ophelia, podia ver seu rosto maldoso, e conseguia ver a garota de cabelos laranja que chorava desenfreadamente. Mas tudo se tornou borrado, ninguém conseguiu chegar perto de Ophelia tamanho o medo e Libby perdeu as forças e desistiu de respirar.

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Umrae ajeitou tudo o que comprara, e arrumara tudo com ajuda de Thá que insistia em receber uma aula sobre tudo: luvas de metal, de combate, a melhor armadura para todos os usos possíveis, venenos, antídotos, etc, etc, etc. Umrae não se incomodava muito em dar as aulas, afinal eram assuntos que ela conhecia bem e Thá era uma aluna agradável e paciente.
- O que faremos se Ophelia tomar o reino? - perguntou Thá calmamente, no meio da conversa.
- Não faremos nada - Umrae respondeu - faremos algo é se os demônios idiotas dela resolverem invadir as Campinas. sim é que faremos algo.
Thá ergueu as sobrancelhas, indicando que entendeu. Realmente todos agiam como se não dessem a mínima para Ophelia, Siih e cia. Siih cuidava das fadas, as Campinas cuidavam de si próprias. As pessoas se preparavam não porque tinham que lutar pelo Mundo das Fadas, mas sim por elas próprias, e viviam com medo de que fossem obrigadas a se submeter à Ophelia.
- Pronto - Umrae disse - está tudo pronto.
Umrae deu um leve sorriso, indicando que estava satisfeita. Se sentou em uma poltrona qualquer na sala principal do abrigo, onde podia descansar um pouco lendo algum livro ou jogando xadrez com Thá. Mas as pessoas haviam preferido sair do abrigo para trabalhar ali perto. No campo on de ficavam as plantações, ou na floresta treinando algum tipo de luta.
- Olá, Umrae! - Rafitcha saiu da sala - bem, comecei a fazer o almoço com Tatiih. Tenho que hmm... - pensava olhando para a porta principal do abrigo - um ensopado com vegetais, deixe-me ver... e quem sabe, arroz? Sim, um arroz! Que tal, Umrae?
- Serve para variar um pouco o cardápio - Umrae respondeu, sem nenhuma empolgação na voz - há quanto tempo que não comemos arroz?
- Sim, sim - Rafitcha concordou - bem, Tatiih já começou o ensopado e eu começarei o arroz. Cadê Thá? Ela ficou responsável pela sobremesa de hoje?
- Ela estava etiquetando os últimos frascos de veneno - Umrae respondeu.
O almoço no abrigo foi decidido por uma série de rodízio que foi bagunçado com a chegada de Raveneh e os amigos. Cada dia, um grupo de quatro pessoas é responsável por alimentar umas dezenas de pessoa. Naquele dia seria Tatiih, Rafitcha, Thá e Raveneh. Mas como sabemos, Raveneh ficou doente de repente e portanto só tinha três pessoas.
- Umrae... - começou Rafitcha com aquela expressão de "sabe como é..." que Umrae logo se adiantou:
- Ok, eu sei que Raveneh está de cama. Sim, eu ajudo vocês. Mas ela vai me pagar amanhã - Umrae avisou, o que fez Rafitcha dar um largo sorriso.
O "pagar" não é com dinheiro, mas simplesmente com trabalho. Como se fosse uma troca de tarefas.

Estavam compenetradas em trabalhar, fatiando legumes e verificando se o arroz estava pronto, cuidando de tudo para que todos pudessem comer, quando a porta do abrigo se abriu de repente, e Alex estava exasperado:
- Ophelia chegou!
Alex era o jornalista que resolvera mudar para as Campinas, mas continuava indo para o Mundo das Fadas todo dia já que tinha que continuar trabalhando no jornal. Passava os dias visitando eventos beneficentes, achando tudo aquilo uma tremenda chatice. Mas nem ligou para o jornal quando por acaso presenciou a luta de Ophelia, e se usando de algumas magias que aprendera na faculdade de jornalismo ("Como viajar de Mundo das Fadas até o Oriente em dez minutos"), deu uma passada nas Campinas só para dar a notícia. Não que alguém entendesse porque Alex não era exatamente o cara preocupado em servir à terra onde vivia. Mas ele avisou do mesmo jeito:
- Está lutando com Siih! - continuou noticiando exasperadamente, fazendo as quatro mulheres pararem e só ficarem olhando com uma expressão de espanto com incredulidade - e matou a Libby!
- Quem é Libby? - perguntou Thá depois que Alex foi embora, se utilizando dos mesmos poderes para voltar à cena do crime.
- Uma empregada da Rainha - Rafitcha respondeu - tipo... você sabe, aquelas duas assistentes que ficam trabalhando para a rainha durante uns... seis meses?
- Sete meses - corrigiu Umrae - sete meses de escravidão.
- Ah - Thá levantou as sobrancelhas, enquanto Tatiih voltava a atividade de jogar os legumes vagamente - aconteceu.
- Será que Ophelia quer invadir as Campinas? - Tatiih perguntou em um murmúrio, como se não quisesse saber a resposta.
- Com certeza - Umrae respondeu friamente - temos magia, comida e a melhor seda da região. As Fadas quiseram dominar essa região por anos, só tivemos uma trégua durante os últimos cinquenta anos que ficamos independente de Heppaceneoh. E Siih, bem, a Siih é inocente demais. A mãe dela era um diabo, mas a filha é inocente demais, mal tem noção do que a raça dela já fez.
- Eu tenho pena da Siih - declarou Rafitcha - ela estudou no mesmo colégio que eu.
- Você foi colega dela? - se surpreendeu Tatiih.
- Não, porque ela é um ano mais nova que eu - Rafitcha respondeu - e eu estava sendo educada para a área jurídica desde criança, e ela estudava administração.
- Ah - Tatiih voltou a atenção para as cebolas, pensativa.
Ninguém se preocupou em avisar o restante do pessoal, pois Alex já deve ter feito o suficiente. E logo não pensavam mais em Ophelia, somente em amenidades.

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- Libby...
Siih não conseguia sequer se mover. Somente estava ajoelhada, diante do palácio de cristal, as fontes com água sendo jorrada ao redor, um grupo de pessoas na porta como Lefi e Alicia, e os curiosos se ajuntando de forma confortável e segura para presenciar a luta. Ophelia se aproximou de Libby que estava deitada diante dela, os olhos ainda abertos.
- Sim - Ophelia deu um olhar triste - ela morreu, Majestade.
Siih não chorou. As lágrimas até queriam sair, mas ela se recusava a chorar, se lamentar, admitir a derrota. Porém podia escutar os passos de Ophelia que se aproximava mais e mais, sentir que Ophelia se preparava para mais um golpe. O braço-lâmina continuava inteiro, funcionando a pleno vapor.
- Majestade - Ophelia sussurrou - não fique assim. Não vou te matar.
- Quem garante? - Siih conseguiu perguntar, desafiadora.
Ophelia deu um leve sorriso.
- Onde fica a coroa? - perguntou como quem pergunta se quer bolo de banana. Siih ergueu os olhos, estarrecida.
- Eu não vou lhe dizer!
- Ah, não vai? - Siih baixou os olhos, percebendo que a lâmina se envolvera em torno de si, apertando mais o círculo e ameaçando dividir seu corpo ao meio. E seu medo era tamanho que ela não conseguia sequer conjurar um chicote como havia feito.
- Então - Ophelia continuou, a voz soando muito doce - eu terei que--
- Ophelia! - Lala havia conseguido se levantar depois de todo o pânico, se ajoelhando diante de Ophelia - por favor, poupe a Majestade...
- O que isso quer dizer, Lala? - Ophelia estreitou os olhos, afrouxando o círculo de lâmina em torno de Siih - você quer salvar essa dama?
- Sim.
O sol estava quente, de meio-dia e o palácio refletia lindamente os raios de sol. Mas o espetáculo que se desenrolava diante do palácio, com um corpo de uma mulher que outrora servira a Rainha e a própria Rainha tão apavorada que teve que depender de uma reles fada para sobreviver a aniquilação completa, chegava a ser grotesco. As pessoas não conseguiam sequer imaginar os motivos. Sabiam da lenda de Ophelia, sabiam dos feitos horríveis, mas aquilo era muito além do que elas imaginavam.
- Onde está a coroa? - Ophelia perguntou sem dar atenção a Lala que estava completamente fria.
Sim, pois Lala resolvera se controlar e parar de ficar se lamentando. Não podia ficar impedindo Ophelia de prosseguir com os planos, que pelo menos fosse habilidosa para conseguir as coisas que queria. E não queria que Siih fosse morta, tinha boas lembranças do primeiro e único caso no qual trabalharam juntas.
- Por favor, Siih, responde - suplicou Lala, a voz carregada de preocupação - responde com a verdade. Ophelia não vai lhe poupar...
- Eu prefiro morrer a deixar você assumir o império! - gritou Siih furiosamente, conseguindo se levantar.
A lâmina se agitou novamente, a ponta mirando perigosamente na garganta da Rainha, mas essa deu um riso de zombaria:
- Não vai conseguir me assustar com isso de novo! Você vai pagar pela Libby!
- Ah, o nome dela era Libby? - Ophelia deu um riso cínico - oh, pobre Libby, foi rasgada por mim! Uma vida muito desinteressante, aliás.
- Cala a boca - Siih rosnou, tentando juntar suas forças em conjurar algo. Não importasse o "algo". Até se fosse uma espada ridícula, serviria. Algo para não ficar totalmente vulnerável. Com o canto dos olhos, percebeu que Miih havia chegado. Só havia quatro garotas atrás: Louise, Elyon, Alice e Catherine. Onde estariam Loveh e Sunny? Será que foram mortas? Percebeu que o grupo observava a luta sem saber como ajudar, visto que Ophelia poderia acabar com elas facilmente.
- Ninguém me manda calar a boca! - Ophelia conseguiu empurrar Siih sem erguer um dedo sequer. Siih foi jogada de novo contra o palácio, e assim todos os esforços para conjurar algo foram perdidos. Siih desistiu de tentar conjurar algo.
- Siih, caso você lute, você não pode se apegar a somente uma coisa. E caso você não possa fazer essa coisa? E aí? - seu pai lhe disse, lhe proibindo os esforços para conjurar. E logo Siih se viu sem poder conjurar qualquer coisa.
Siih se levantou, reparando que ao bater a cabeça contra o cristal que aguentava bravamente todo golpe, um corte se abrira acima da sobrancelha direita. Maldição.
- Ainda está de pé, criatura? - Ophelia rosnava.
Logo se calou, percebendo que Siih não era simplesmente uma Rainha só porque tinha o poder de conjurar e tinha o sangue real. Era também resistente, podendo aguentar ser açoitada a todo instante e se levantar logo em seguida. Era uma caracteristíca muita boa e útil, e Siih tinha de dobra. Percebeu que com a força que empurrara a garota, era para ela se manter inconsciente durante uma boa meia hora. Mas ela já estava de pé logo que foi jogada.
Lala reparou que Lefi estava na porta do palácio, e logo saiu correndo para ver se trazia a Siih para dentro do palácio. Uma boa tentativa, mas Ophelia não podia reparar nos esforços de Lefi para salvar a irmã.
- Ophelia! - gritou Lala - deixe Siih viva, por favor!
- Que justificativa você tem para tal absurdo? - Ophelia sibilou - eu só poderei ser a Rainha caso ela morra...!
- ...ou se ela renunciar - Lala completou, os olhos completamente secos e os cabelos laranja desarrumados - não precisamos derramar mais sangue. Já foi demais, Ophelia. Quem vai ousar ir contra seu reinado depois dessa pequena demonstração de poderes? Que foi ridícula, convenhamos?
Ophelia olhou para Siih. Reparou que havia mais um rapaz de cabelos negros e olhos azuis que ajudava a irmã, tentando pará-la de ir em frente.
- Pare, Siih! Ela vai te matar! - gritava ele com bom senso na voz - não quero uma irmã morta, muito obrigado.
- Lefi, me deixe ou vou ter que... - Siih tentava se desvencilhar de Lefi - vou ter que...
- Você não tem coragem para isso - Lefi sibilou quase carinhosamente.
- Eu acho amor fraternal tão lindo! - Ophelia sorriu, deixando Lefi apavorado - querida, onde está a coroa?
- Não direi - insistiu Siih, a mão direita tentando controlar o sangramento no corte que se abrira acima da sobrancelha.
- Ah, é?
Ophelia não precisou usar o braço-lâmina, pois ele voltara ao normal. Os dois braços normais fizeram o trabalho de forma absolutamente eficiente: as mãos se moveram até o braço direito e desprotegido de Siih e com somente um golpe, o braço de Siih ficou completamente quebrado, em um ângulo estranho.
- AARGH! - Siih ofegou, a dor crescendo no braço a cada instante, ao mesmo tempo que Lala gritava apavorada:
- Ophelia!
- Conte ou posso mandar o seu querido irmão pro inferno - Ophelia rosnou, a voz alcançando os ouvidos atordoados de Siih.
- Argh - Siih tentou respirar, e enfraquecida, murmurou: - Sala de Ouro, quarto corredor na Segunda Torre.
- Obrigada, querida - Ophelia sussurrou - obrigada.

terça-feira, 8 de julho de 2008

Parte 46 - Feridas.

O que Ophelia tinha feito era absurdo. Era completamente impossível que ela detivesse as três espadas com as duas mãos sem se ferir. Porém ela se ferira, visto que as espadas haviam feitos cortes nas suas mãos. Mas as espadas não cortaram as mãos dela fora, e Ophelia dera um sorriso zombeteiro. Nessa hora que Ophelia pensava em como se concentrar em machucar as três Musas que deram o primeiro passo, sentiu outras quatro dando um passo e movendo a arma na sua direção.
- Tem outras, não? - Ophelia se virou para Miih, que caíra perto de uma árvore.
- Ah - Miih disse comprimindo um riso - descobriu que tem cinco dedos em cada mão também?
Não deu tempo de Ophelia responder, pois se vira atacada pela afiada lança de Sunny, pela espada de Catherine, pelos punhais de Loveh e pelos ramos que Alice usava, ramos que se enroscavam nos pés, ramos de árvores que tremiam e se erguiam, querendo golpear...
- Ophelia! - Lala choramingando tentando se livrar dos ramos que prendiam seus pés.
- AhAh... - Loveh ofegou. Percebeu que nenhum dos seus punhais haviam atingido Ophelia... era impressão sua ou Ophelia rebatera todos com os braços?
Ophelia havia caído no chão, tonta em se defender de tantos ao mesmo tempo. Havia se ferido sim: um corte se abrira no braço por causa da espada de Catherine, embora a espada agora jazia no chão junto com Catherine, e outro corte que sangrava bastante abaixo do seio esquerdo, causado pela lança de Sunny. E os pés estavam sendo atados pelos ramos que Alice enfeitiçava.
Foi tão rápido...
Sunny conseguiu causar um corte, mas ao chegar em algum órgão vital, a lança simplesmente parou como se chegasse em uma parede de ferro. Isso era simplesmente impossível. Mas a existência da própria Ophelia contradizia todas as crenças do que fosse possível, até mesmo para os padrões das Musas. Loveh se levantou, ofegante. Percebeu a existência da garota que choramingava, lutando com os ramos.
- Alice - Ophelia resmungou, se desfazendo dos ramos rapidamente - ah, sua idiota - disse para Lala - não conseguiu se livrar deles?
Se ajoelhou diante de Lala que caíra, os olhos conflituosos, e cuidadosamente retirou cada ramo. E eles pararam de se mexer.
- Alice - Ophelia repetiu, erguendo o olhar para a única Musa que não caíra. Alice estava com a sua expressão sempre angelical e Lala pensou ter visto um leve sorriso nos lábios de Alice.
- Nós vamos te matar - rosnava Elyon - nós vamos te matar...
- Que estupidez repetir isso - Ophelia resmungou como se estivesse discutindo o tempo - dá pra calar a boca?
Todas ficaram caladas, Lala se levantou. Olhando para cada uma das Musas, cada uma das inimigas de Ophelia, percebeu o quanto elas eram poderosas, e inclusive elas podiam causar sérios danos a Ophelia. Então porque essa pose toda como se estivessem perdido a batalha? Alguma armad...
- OPHELIA!
Foi em um instante que Ophelia se virou para a esquerda, tendo uma Loveh a lhe atravessar a espada que Catherine deixara no chão. Sim, a lâmina perfurou o corpo de Ophelia e Loveh, tendo um raro momento de crueldade, girou a espada para causar um estrago maior. Um corte profundo, rompendo a carne, dilacerando-a. Lala tombou de joelhos, pasma. Nunca vira Ophelia ser tão ferida assim.
E pela expressão de surpresa de Ophelia, nem mesmo ela se lembrava de ter sido tão machucada assim alguma vez...

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Desde que Heppaceneoh virou domínio das fadas, as Campinas se isolaram ainda mais e Maria junto com sua equipe de administração composta por pessoas como Umrae e Ly, se viu sufocada pelos preços absurdos que as fadas impunham. Antes só compravam na Capital do Mundo das Fadas de vez em quando, como comprar coisas feitas pelas fadas. Em Heppaceneoh que vinha todos os itens realmente necessários. Por mais que odiassem o Rei, tinham que admitir, pelo menos a administração era decente. Mas depois de uma boa busca feita por Umrae, logo ela localizou um bairro minúsculo perto do Mercado, cujos moradores eram parentes de viajantes que traziam sempre coisas interessantes como luvas feitas de couro de mantícora ou malhas curiosas que pareciam ter sido enfeitiçadas. E tudo a um preço perfeitamente razoável!
Obviamente o comércio era nas escuras, longe dos olhos das fadas - se elas suspeitassem sobre as luvas de couro de mantícoras, iriam pegar tudo para elas na mesma hora - mas Umrae não se importava para quebrar essa lei. As Campinas faziam de tudo para não se submeterem às fadas.
- Bom dia, Umrae! - cumprimentou uma senhorita de rosto oval e olhos redondos e castanhos - como vai?
- Hola, Isadora - respondeu Umrae - o que tem hoje?
- Ora, ora! Você vai adorar! - Isadora era uma garota entusiasmada, as orelhas pontudas sendo completamente cobertas pelos cabelos negros e lisos - que tal? Luvas de couro de mantícora! E como está havendo uma estranha facilidade em pegar esses bichos, o preço desceu... e aí?
- Parece interessante - admitiu Umrae analisando as luvas - como anda Faerün?
Isadora ergueu os olhos. Sua pele era amorenada, bastante sedosa e tinha uma expressão bondosa no rosto.
- Se você está falando daquela região, bem, meu irmão não tem notícias boas - respondeu - você sabe como aquilo está desolado.
- Sei sim - Umrae levantou uma malha de metal, bem trabalhada - por quanto você venderia essas luvas de metal? - Umrae mostrou umas luvas que eram usadas por soldados, e tinha alguns tipos feitos de prata.
- Bem... - Isadora deu um fraco sorriso. Realmente ela era muito alegrinha para a raça que pertencia, mas Umrae não se incomodava. Contanto que saísse dali com itens decentes a preços razoáveis, então estava tudo bem.

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- Fadas estúpidas - gemeu Ophelia, e Miih protestou:
- Não somos fadas!
- Isso não importa mais, certo? - Loveh disse, pressionando mais a espada - quero dizer, você está ferida.
Ophelia deu um riso seco, torto.
- Isso é o que você pensa, tolazinha - disse em uma voz baixa demais, quase em um sussurro - as fadas idiotas pensam que podem comigo e enviam vocês para me derrubarem, mas vocês são como as fadas, né? Também lambem os pés da Vossa Majestade de não sei o quê?
Loveh não deu atenção, somente fitou Ophelia nos olhos gelidamente.
- Agora - Loveh sibilou, sem interromper o contato visual com Ophelia. Sunny entendeu, e esta se levantou, a lança na mão e se preparou para perfurar a cabeça de Ophelia. O horror de Lala foi tamanho que ela mal pôde alertar a "mestra" do que estava acontecendo.
Mas ela não precisou.

Ophelia, mesmo ferida, jogou o braço esquerdo para trás enquanto segurava a espada que a perfurava com a mão direita. E para horror de Sunny, Lala e todas as outras, o braço esquerdo aumentou de tamanho, as unhas se transformaram em garras, a carne maleável, carne que parou Sunny de onde ela estava, e feriu todo o seu abdomên, uma das garras atravessando o corpo, logo acima do quadril direito. Sunny recuou, sentindo aquelas garras se remexendo lá dentro, cortando suas veias sem um mínimo de piedade, o sangue encharcando a roupa.
- Boa menina - sussurrou Ophelia - boa menina.
E aí Loveh sentiu muito medo de continuar com a espada. Sentiu que era melhor se afastar, para o seu próprio bem, mas não teve tempo de fugir: Ophelia tirou o braço esquerdo de Sunny e a mirou cuidadosamente em Loveh, ferindo estrategicamente várias partes do corpo: ombros, abdomên, virilha, pernas, pulsos. Eram cortes profundos, feitos com esmero pelas garras, e Loveh tentava não gritar de dor, mesmo que isso fosse quase impossível, só fazia doer mais. Loveh grunhia, tentando se afastar, mas aquelas garras a impedia de dar um passo sequer, garras horrorosas que lhe fatiavam a carne como se fatia um boi ou peixe no almoço.
- Presumo - Ophelia começou, o sorriso se estranhando na face - que você seja tão incompetente para se regenerar feito Lala?
- De modo algum - Loveh rosnou, furiosa.
Sua mão, mesmo que machucada, dilacerada, forçou a espada mais ainda o que provocou um pouco de dor. E assim Ophelia parou de mexer as garras por um segundo, segundo imediatamente aproveitado por Loveh que se afastou, quase como um gato, para perto de Miih.
Ophelia fez um ruído de irritação, e se levantou. Ao tirar a espada do abdomên, todos verificaram que o ferimento era realmente profundo, um buraco praticamente. Mas era ridículo para Ophelia que pressionando as mãos em cima do abdomên, praticamente forçou que suas veias se unissem novamente, os tecidos da pele se regenerando lentamente. Lala estava trêmula, sem poder falar um "a" de tanto pavor. Não chorava, mas estava paralisada.
- Loveh... - Miih colocou Loveh para trás de si mesma, enquanto Elyon fazia o mesmo com Sunny - maldita...
- Faltam quantas? - Ophelia contou com o dedo indicador da mão direita e depois encostou o dedo nos lábios - um, dois, três, quatro, cinco. Louise, Alice, Miih, Elyon e Cathy!
- Catherine - corrigiu Catherine com os dentes cerrados.
- Ah claro, Cathie - Ophelia não estava nem um pouco interessada nos nomes, embora seu sorriso fosse bastante iluminado, para não dizer maligno - e nos encontramos outra vez! Mas acho que não quero machucar vocês cinco também, sabe, preciso tomar banho primeiro - indicou as roupas sujas com o sangue - de modo que tenho uma idéia.
Ophelia deu uns passos para trás, pegando Lala pela mão, o sorriso jovial. Lala tremia, horrorizada.
- Pare de tremer, Lala! - sibilou Ophelia em um tom confortável e Lala pensou ter ouvido alegria na sua voz - vamos viajar até a capital do Reino das Fadas, que tal? Eu sei, lá é muito chato. Mas de qualquer modo, quero ser dona desse pequeno império. Que tal? Hein, Lala?
- E-Eu...? - Lala tremia tanto que parecia impossível que aquela fosse a guerreira que tanto fez temer antigamente. Mas Ophelia botaria qualquer um pra correr, até mesmo Bia Premy.
- Não, minha avó - retorquiu Ophelia - venham, não vou deixar você aqui!
Ophelia pegou a mão de Lala quase carinhosamente, e dando um último sorriso, correu entre as árvores. A pobre Lala era levada assim como foi levada durante as viagens que a dupla fizera para recrutar os demônios. As Musas foram deixadas, e Sunny e Loveh recuaram, tentando curar as feridas. Mas por algum motivo, os poderes pareciam ter diminuído. Ainda era manhã, talvez umas onze horas...
- Vá logo - rosnou Loveh para Miih - eu sei o quanto você odeia proteger, mas se você não fizer... nós seremos os próximos...
- Mas você está f... - Miih começou, preocupada, ao que Loveh interrompeu:
- VÁ! Eu me viro!
Sunny concordou com Loveh e preferiu ficar, e assim somente cinco Musas foram para a Capital. Correram tão velozmente, os corpos virando borrões difusos. Quantos minutos passaram? Nenhuma delas soube contar, nenhuma delas contava quantos minutos demoravam daquela região até a capital, mesmo que a distância fosse muito grande. Naturalmente elas podiam correr praticamente voando, e provavelmente elas inspiraram o Flash.
- Ela já chegou - Miih sussurrou ao chegar na Capital, atravessando uma floresta e chegando a uma estrada com um monte de casas pequenas de madeira pintada de cores pastéis - ela já chegou.
- E daí? - Elyon ofegava. Ela odiava "correr", atravessar longas distâncias em tão pouco tempo era horrível e raramente faziam isso - e daí. Ela anda mais depressa que a gente...
- Bem... vai começar...

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O céu estava perfeitamente azul.

“Au clair de la lune,
Mon ami Pierrot,
Prête-moi ta plume
Pour écrire un mot.
Ma chandelle est morte,
Je n’ai plus de feu,
Ouvre-moi ta porte,
Pour l’amour de Dieu.” (1)


Raveneh cantarolava para o seu bebê devagar, pausando em cada palavra, a voz adocicada. Enquanto isso Johnny trabalhava (oh que machista, homem lá fora, mulher lá dentro) colhendo os últimos vegetais do verão, Rafitcha se vendo como arranjar o estoque para inverno, Kibii arrumava as flechas recém-feitas enquanto Fer afiava mais punhais e espadas, Ly discutia acaloradamente com Doceh sobre os melhores venenos para se pôr em um bolo de laranja (e Ly perdia feio na discussão).
- Você não estava com febre, Raveneh? - perguntou Rafitcha desconfiada, quando viu a amiga andar pra lá e pra cá - pode mesmo amamentar Maytsuri?
- Me deixe - Raveneh preferiu não responder - estou em paz pela primeira vez...
Rafitcha largou o que estava fazendo e pegou Maytsuri do colo de Raveneh, esta ficando aflita - dava para ver pelos olhos.
- Está com febre, Raveneh - Rafitcha murmurou, encostando a mão na testa de Raveneh - deixamos amamentar a filha ontem por piedade e falta de atenção. Mas continua com febre, e Maytsuri é só um bebê, por mais que tenha sangue mágico. Durma, preparo algo para você. Quem sabe conseguiremos baixar a sua febre e poderá amamentá-la hoje.
Raveneh não discordou das ordens de Rafitcha, pois sabia que ela tinha razão. Aceitou se deitar na cama, deu um último olhar para a filha que se aninhava no colo de Rafitcha. Mas não estava contente pela proibição sutil que a amiga fizera de amamentar o bebê, porém como podia contradizer as ordens de Rafitcha e todas as outras pessoas amigas?
- Vou deixar o bebê no berço e voltarei logo - Rafitcha disse pacientemente.
Raveneh consentiu. Somente cantarolava devagar, mais para si mesma do que para a filha. Algumas músicas infantis, de brincadeira até.

Se esta rua, se esta rua fosse minha
Eu mandava, eu mandava ladrilhar...


- Voltei - foi a voz clara e doce de Rafitcha.
Quantos minutos haviam se passado? Só fechara os olhos por alguns poucos segundos! Raveneh se empertigou, vendo a xícara com um líquido meio esverdeado, a fumaça quente se emanando devagar.
- Que tal? - Rafitcha sorriu - daqui a pouco, eu e Tatiih faremos um delicioso bolo de chocolate, que tal?
- Sim, é uma ótima idéia - concordou Raveneh sorridente - obrigada, Rafitcha. Será uma ótima tia para May.
- Tia? - Rafitcha mordeu o canto direito do lábio - não me agrada muito. Tias me lembram pessoas velhas, não?
- Ah - Raveneh riu, mas logo se controlou para beber o chá devagar.
Obviamente estava bem quente, mas Raveneh pôde sentir algo de doce no chá, um leve sabor de açúcar. E se não se enganava, sentia alguns traços de canela. Mas o gosto não era de todo ruim, mesmo que fosse quente demais.
- Desculpe por ser quente demais - Rafitcha disse com a voz morna - mas me entende, esse chá é feita com aquela erva comum aqui perto, a jupicareira, e você conhece bem as propriedades dessa erva.
- Que a erva só tem efeito sob alta temperatura? - Raveneh completou - sim, sei bem. Obrigada... não quero te atrapalhar nos seus afazeres, já fez demais.
- Não me atrapalha - Rafitcha cortou, a voz mais simpática - é isso que as pessoas aqui fazem: elas se ajudam.
Raveneh deu um riso pela metade:
- Eu devia ter imaginado.
E bebeu o resto do chá, enquanto Maytsuri dormia e Rafitcha saia para retomar seus afazeres.

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- Ótimo, terminei tudo - Umrae disse para Isadora, ajeitando as compras no lombo do cavalo com quem viera. Sim, um cavalo enorme, bem-alimentado, de pêlo negro e reluzente - vou indo.
- Bye bye - Isadora se despediu, fazendo uma breve reverência - boa sorte no caminho!
- Claro - Umrae deu um leve sorriso e subiu no cavalo, começando a montar.
O cavalo era um espécime calmo e jovem, todo forte. Umrae guiou o cavalo para as Campinas, o sol estava brilhando confortável.
Em poucos minutos chegou às Campinas, lugar agora vazio e desértico, já que todos se transferiram para o abrigo. Mas a relva continua brilhando, verde e saudável, as flores continuam tão vivas como Umrae se lembrava.
Quando Umrae chegou e descarregou as compras até o abrigo, Ophelia ainda estava no caminho. Portanto não houve tempo para alguém sentir coisa alguma, e nem mesmo Umrae ficou sabendo da chegada de Ophelia.


(1) Tradução do Poeminha:

“À claridade da lua,
Meu amigo Pierrot,
Empresta-me a tua pluma
Para escrever uma palavra.
A minha vela morreu,
Não tenho mais fogo,
Abre-me a tua porta,
Pelo amor de Deus”

Um poema que achei bonitinho e melancólico que roubei de uma fanfic descaradamente :B

sábado, 5 de julho de 2008

Parte 45 - O Primeiro Ataque.

- Vamos - Ophelia teve que dizer para fazer Lala se levantar - temos uma viagem longa pela frente.
Lala engoliu o orgulho e acabou por perguntar:
- Aonde vamos?
- Já ouviu falar de Mividell? - perguntou Ophelia com aquele sorriso torto, tão caracteristico - é pra lá que vamos.
- Mas... - Lala ergueu as sobrancelhas, cética - Mividell não existe. É só uma lenda que foi...
- Que as fadas disseram que era mentira? - Ophelia cortou, olhando para o céu ficando cada vez mais claro - mentirosas.
- Mas Mividell? Não existe! Nunca foi comprovado que existia! As pessoas só vêem os escombros! - gritava Lala sem parar, correndo atrás de Ophelia que andava depressa demais - como você vai conseguir atacar um lugar que não existe?
- Só funciona se a pessoa quer ver - Ophelia sussurrou - o que acontece com gente do meu tipo...
- O-Ophelia?
- Vamos! - aparentemente Ophelia já conseguira identificar para que direção Mividell ficava, e pegou a mão de Lala, para logo em seguida, correr tão depressa que voava. Em meia hora, chegaram. Sim, era muito, mas muito longe. Mas Ophelia era estranha, conseguia vencer longas distâncias em um tempo tão curto. Ninguém estava brincando quando alguém dizia que Ophelia era um verdadeiro monstro e Lala tinha sérias dúvidas se Ophelia realmente era fada. Nenhuma fada era tão poderosa assim.
- Não vê? - Ophelia perguntou.
- Nada - Lala respondeu. Realmente, estavam no alto de uma montanha (sim, o império das fadas é composto de muitas e muitas montanhas) e lá embaixo, só via escombros de uma cidade muito antiga e destruída. Ruínas decadentes, é o que diria a respeito daquele lugar.
- Pois eu vejo um castelo muito bonito e negro - murmurou Ophelia - ali. E na frente, várias colinas de ferros, com várias cabanas de madeira enfileiradas. Vejo Glombs e humanos trabalhando, lá. Tem uma mina lá, um Glomb acabou de perder o pé.
Lala ficou boquiaberta. Não conseguia enxergar nada! E a um gesto de Ophelia: desta vez Lala pôde ver a amiga erguendo um dedo, um dedo só. E demônios saíram de seus esconderijos, atacando as "ruínas". Agora sim, Lala podia ver. Na primeira vez que um demônio encostou em uma pedra qualquer, Lala conseguiu ver casas se erguendo, gente correndo. Cinquenta, cem demônios de todos os tipos que você imaginar estavam ali. Estranhos, de anatomias complexas e confusas, com fome e sede. Havia alguns com tentáculos, outros que abusavam de poderes mágicos, outros de línguas parecidas com cobras, aqueles que lambiam o beiço a cada vez que viam um Glomb correndo para lá e para cá.
- Meu Deus... - Lala sussurrava, pasma - eu... eu nunca causaria esse caos todo.
Ophelia a ouviu, e dando um leve sorriso, disse:
- Já está causando. Você vai ganhar por estar comigo, certo?
Lala se perguntou que tarefas a aguardariam no final da jornada.

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- É isso - Siih estava toda animada, achando que finalmente faria algo certo - veja bem... é isso.
Sunny deu uma olhada nas anotações, erguendo as sobrancelhas e tendo uma leve expressão de ceticismo.
- É o melhor que podemos fazer, certo? - Sunny sussurrou, mas Siih ouviu e ficou bem ofendida, embora guardasse o aborrecimento para si mesma.
- Sim - retorquiu - aceitam?
- É o jeito - Miih murmurou - pelo menos não sou eu que tem ficar fazendo o papel de palhaça, francamente conversar com a Ophelia!
- SIIH! - Alicia irrompeu pela sala, os cabelos loiros desarrumados e soltos - oh desculpe, M-Majestade...
- O que houve? - perguntou Siih exasperada. Ah não!
Alicia engoliu em seco:
- Ataque de demônios novamente... M-Mivi...
- Oh meu Deus! - Siih olhou para as Musas novamente, antes de sair - agora! Entenderam? Por favor!
Miih reprimiu um riso de zombaria, Siih realmente achava que podia mandar nelas? RÁ! Nem sonhando! Siih saiu, exasperada, ela mesma mandando todos os caçadores de demônios nas redondezas irem até o local. Era suicídio, claro. Mas que tipo de Rainha pensa nisso quando se vê prestes a perder 40% dos rendimentos anuais? Mas sabia que não tinha muitas esperanças, aquele dinheiro e todas aquelas vidas se perderam...
Teve que se controlar para não cair no choro, seria demais!
- Siih? - Lefi chegou, tentando acalmar a irmã, mas estava complicado: Siih estava histérica.
- Estou a ponto de desistir de tudo - admitiu - odeio Ophelia, odeio essa coisa dela de tentar atacar! Esse reino, esse império não foi construído por mim. Por que EU que tenho que ser a herdeira disso? Eu odeio ser Rainha! Não, não, e não tem nenhum herdeiro além de mim... tirando você, é claro...
- Cala a boca - Lefi murmurou - você não sabe o que está dizendo!
Siih mordeu o lábio inferior, ficando mais branca que o normal.

- E aí? Vamos? - sussurrou Loveh - eu não presenciar uma rainha histérica e queria acabar com essa história logo, vocês sabem.
- É o jeito, certo? - Louise concordou - céus, proteger essas fadinhas...
- Vamos logo - Sunny disse - eu não desejo ficar aqui acalmando Siih. Ela está em um estado de histeria completa.
As Musas suspiraram, impacientes. É, é o jeito. As sete logo saíram, tentando identificar Ophelia. Estava complicado, pois ela estava longe demais e suprimia a energia. Mas baseada pela informação de Alicia, não fora tão difícil deduzir: todas as sete conheciam o chamado reino Mividell.

- Por aqui... - Alice sussurrava, muito baixo - céus...
As sete Musas reprimiam a energia para não serem notadas por Ophelia, mas a não ser que Ophelia fosse capaz de identificar uma energia a mais naquele bando de demônios, não havia muito perigo.
- Você acha que Ophelia está deste lado ou do outro? - perguntou Catherine admirando o verdadeiro estrago que os demônios faziam.
- Por aqui - Miih respondeu de forma hesitante, indicando que não havia certeza no que dizia. Mas Loveh logo sanou a dúvida:
- Se caminharmos para ali - indicou - a acharemos. Vamos andar, arriscamos-nos demais ao voar. Mas estamos apenas a uns... dez minutos caso andemos.
- Ok - fez Sunny.
As sete andaram devagar, tomando cuidado para não quebrar cada ramo, pelo menos não de forma "forte". Elyon, Miih e Louise subiram nas árvores, se escondendo perfeitamente nas copas da árvore. Conseguiam enxergar Ophelia sentada, admirando a destruição. Ao lado, uma garota de longos cabelos laranja...
Quem é ela? perguntava Elyon meio surpresa.
Uma aliada ou escrava respondeu Miih sabiamente, se ajeitando em uma árvore logo acima de Ophelia. Qualquer passo que desse em falso, poderia cair em cima de Ophelia. E ela cairia e quebraria o pescoço. Talvez não fosse má idéia.
Estão a postos? perguntou Alice apreensiva. Ela estava atrás de Loveh, e esta podia visualizar Ophelia através de uma frestra entre árvores. Realmente era uma sorte que as árvores fossem tão coladas e não era de se admirar que a garota de cabelos laranja estivesse cheia de arranhões: provavelmente fora um suplício atravessar essas árvores tão próximas uma da outra.
Alice controlava o tremor, se sentia sufocada pelas sensações da floresta: toda floresta que Ophelia passava parecia apavorada. E uma floresta apavorada não é legal.
- Sim... - foi um sussurro baixo, meio trêmulo. Mas Alice não se importava, suas ações seriam mais corajosas que o tom na sua voz.

- É fantástico - Ophelia murmurou.
- S-Sim...
Lala tremia. Não conseguia sentir beleza por tudo aquilo como Ophelia conseguia ver. Só conseguia pensar nos prejuízos incontavéis que aquela destruição causaria... Siih era uma boa pessoa e provavelmente estava se sentindo apavorada e sufocada por Ophelia...
Ophelia se virou bruscamente, olhando cada árvore com um olhar muito atento e penetrante.
- O que foi? - perguntou Lala apavorada.
- Alguém... - Ophelia relaxou a expressão - deve ter sido impressão minha.
- Com certeza - Lala concordou. Ela não sentira nada e se Ophelia achava que era impressão, então era só impressão. Nunca encontrara alguém com tanta capacidade de identificar uma energiazinha sequer.
- Bem, deixe pra lá.

Ela viu a gente! gemeu Loveh preocupada, ao que Sunny tentou tranquilizá-la:
Não, ela não viu! Só sentiu um pouco! E calem a boca, todas vocês...
Elyon estava a direita de Miih, enquanto Louise estava mais distante, à esquerda de Miih.
Preparadas? perguntou Catherine que estava atrás de uma árvore, se aproveitando de um espaço minúsculo entre duas árvores. Ela não conseguia enxergar a garota de cabelos laranja, mas podia ver Ophelia perfeitamente. Em suas mãos, uma espada se materializou, espada essa feita de muitos materiais estranhos que vinham do oceano, o punho adornado de rubis e esmeraldas e safiras, a lâmina gelada e prateada.
Todas as outras Musas também usavam armas, espadas na preferência. A espada de Louise era quase como uma cimitarra, porém com a pequena diferença de que a lâmina era feita de labaredas de chamas, chamas quentes e cruéis. Loveh e Sunny, por terem temperamentos pacíficos, não portavam espadas. Mas elas não eram incompetentes na luta, muito pelo contrário: Loveh, resignada, usava punhais de prata (e duvidar que ela seja capaz de usar os punhais não é uma atitude boa) e Sunny era excelente no manejo de arco e flechas e melhor ainda em usar lanças para atravessar qualquer material, seja vivo ou morto. Naquele momento Sunny usava uma lança leve, feita de prata e estava a postos, conseguindo visualizar os ombros de Ophelia. Se o ataque de Miih/Elyon/Louise falhasse, ela teria que entrar mirando naquela área. Não tinha como Ophelia escapar...

AGORA!

Foi em segundo: Miih foi a primeira a descer, a espada pousando exatamente sobre a cabeça de Ophelia. Elyon e Louise estavam lado a lado, desceram um décimo depois de Miih, a espada na horizontal. Não tinha como falhar o ataque. Ophelia somente ergueu os olhos para cima, surpresa.
- OPHELIA! - gritou a garota de cabelos laranja.
- Ora, ora - Ophelia murmurando, vendo três espadas próximas, a um centímetro dos olhos.
- Que di... - Miih começou, mas a sentença não foi terminada: Ophelia levantara os braços, segurando as três espadas com as mãos, e o sangue começou a escorrer.
- Tolas.
E riu.
O plano dera errado.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Parte 44 - Completos e confusos devaneios.

Eram o quê? Três horas da manhã? Ele acordou, o chão frio, mas não se incomodou. Estava bem escuro e felizmente tinham privacidade ali... mas precisava seguir pelo corredor até a grande sala, onde havia uma jarra de água. Sim, estava com sede, sua língua seca. Johnny olhou para Maytsuri que dormia tranquilamente, depois para Raveneh. Ou para o seu contorno, devido à escuridão. Podia ver o brilho dos seus cabelos, conseguia visualizar a expressão serena. Os pesadelos não começaram foi tudo o que pôde pensar, e o pensamento fez o coração se apertar. Seguiu pelo corredor, bebeu um pouco de água, umedecendo a boca e matando a sede. Respirou fundo, e logo retornou à cama. Reparou que Raveneh se mexera, e assim a coberta estava na altura da cintura, de modo que Raveneh sentia um pouco frio devido ao fato de que estava com os braços nus. Johnny ajeitou a coberta carinhosamente, e se deitou ao seu lado. Conhecia Raveneh bem demais para saber que acordaria dali a uma hora com os pesadelos da esposa. Não estava errado.

Passada uma hora, Raveneh ofegava e suava frio. Johnny fez então o que fazia todas as noites: se ajoelhou ao seu lado, colocando a cabeça de Raveneh no seu colo, a abraçando. Aprendera que não precisava acordá-la, só precisava abraçar a esposa, sussurrando palavras calmas. E aos poucos, os gemidos medrosos que Raveneh soltava diminuíam, e ela só abria os olhos por um curto espaço. Percebia onde estava, envolvia Johnny com seus braços e se deixava dormir novamente, dessa vez de forma tranquila.
Ele sorriu, admirando a face de Raveneh. Provavelmente os pesadelos aumentariam devido a vingança que Raveneh acabou por executar... disse para si mesmo que daria um jeito de proibir a Raveneh de lutar na guerra contra Ophelia. Mesmo que Raveneh fosse boa com espadas, ele temia se isso causaria mais algum pesadelo e aflição. Definitivamente, era difícil conviver com uma pessoa tão problemática, tão contraditória. Mas ele não se arrependia de nada: sabia que podia passar a vida toda sentindo o cheiro daqueles sedosos cabelos loiros, que nunca enjoaria daqueles olhos azuis que pareciam saber de tudo e ainda assim serem tão doces. Adorava cada centímetro de Raveneh, e até Catherine ele aprendera a amar. Precisou abrir mão de várias coisas como uma boa noite de sono já que acordava por causa dos pesadelos. O casamento com Raveneh era uma prisão, mas uma prisão de que ele nunca desejara sair. Não podia mais viver a vida de farras, abrira mão de toda a independência, de não precisar dar satisfações para alguém, nem mesmo para Rafitcha. Mas quem se importava? Ele abriria mão de qualquer coisa se fosse por Raveneh.

Olhou para o teto: não havia sol. Mesmo que logo, logo começasse a amanhecer lá fora, eles não ia sentir: estavam trancados em um abrigo, com medo de Ophelia. E pela expressão apreensiva que Maria tinha, ao dormir ao lado do filho, as notícias não eram nada boas. Não permitiria que Ophelia e seus demônios levasse Raveneh ou Maytsuri. Raveneh se remexeu, aconchegando-se mais ao colo de Johnny. Quatro da manhã? Talvez, lá fora estava escuro ainda e aqui... bem, estavam dentro de um abrigo subterrâneo. Suspirou profundamente, pensando em várias coisas ao mesmo tempo. Acabou adormecendo.

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Siih não dormira a madrugada inteira, só pensando e delineando um plano mais perfeito. Claro, o básico já fora feito: detalhes como quem faria o quê, coisas como ponderar o quanto de poder será importante. Mas agora ajustava, aperfeiçoava. A noite estava linda, toda estrelada. Não estava mais quente, já que faltava apenas alguns poucos dias para ser outono. As folhas já começavam a se amarelar, Siih percebia. Dahes cochilava na cadeira, inconformado por ser mandado a cuidar da Majestade embora ela estivesse perfeitamente bem. Lefi dormia, assim como as Musas e as assistentes. Só ela estava acordada, admirando cada estrela que brilhava lá no alto. Queria ser uma delas, sempre alheia aos dramas terrestres. Não queria essa responsabilidade, estava com medo. Sim, era duro admitir, mas estava com medo de Ophelia. Olhava para a prancheta diante dela, onde anotações eram feitas. Escrevia melancolicamente, não conseguindo deixar de pensar nas consequências de cada alteração no plano. Tinha que se controlar para não chorar, parecer forte, impenetrável. Não podia deixar Ophelia descobrir suas fraquezas, e não queria deixar que qualquer um descobrisse como o seu interior estava confuso. Lembrou-se da sua mãe. As feições sempre duras, a frieza na voz, a postura tão imponente... obviamente uma verdadeira Rainha que não se lamentava pelos erros que cometera, uma Rainha que nunca estava indecisa. Mas sua mãe morreu. E você está viva. De que adiantava se comparar a alguém morto? Era tão vergonhoso admitir que não podia ser igual à mãe. Não lembrava de uma noite que a mãe lhe lera histórias, não lembrava de carinhos da mãe. Quem realmente ficava ao seu lado, quem sorria a cada vez que ela fazia alguma brincadeira era o seu pai. Sua mãe precisa trabalhar, querida dizia seu pai. O vidro da janela refletiu seus olhos castanhos. Eram olhos idênticos aos da mãe, aqueles olhos penetrantes. Era idêntica à mãe, reparou: além dos olhos, havia o cabelo. Longo, liso, castanho. As madeixas de um tom bonito de castanho, algo lembrando chocolate amargo, talvez, devido ao tom escuro, comumente confundido com negro. Diferente do seu pai que tinha olhos dourados e madeixas quase brancas, a pele absurdamente pálida. Sim, saíra completamente diferente do pai: a pele morena, os cabelos escuros, os olhos penetrantes que não sabiam exibir doçura por mais que tentasse. Só pessoas como Lefi podiam ver a bondade escondida naqueles olhos, pessoas que conviviam com a Siih todos os dias. Lefi. Os cabelos realmente negros, mais escuros que os da Siih, eram bonitos. Não eram encaracolados, mas também não eram completamente lisos. Um meio-termo que Siih não conseguia definir... e aqueles olhos azuis de Lefi, sempre reveladores. Voltou a atenção para Ophelia. Se distraíra demais, perdida em devaneios.

- Majestade? - Dahes acordou, tonto - acordada?
Ele piscou lentamente, se recompondo imediatamente.
- Fique aí, Dahes - murmurou Siih - estou sem sono, não se preocupe.
- Eu... - Dahes engoliu a saliva - Vossa Majestade precisa de algo?
- Não, obrigada - Siih continuou pensativa - pode voltar a dormir.
- Os empregados estão acordando agora - Dahes disse - para arrumarem tudo antes da Vossa Majestade acordar. Portanto, eu acordei no horário normal.
- Ah - Siih somente fez, mordendo os lábios o tempo todo. Não estava mais a beira de um ataque de nervos, agora que conseguira se controlar. Tinha que aprender a ter alguma frieza, só assim sua mãe conseguiu governar por tanto tempo. Deu um curto suspiro, voltando às anotações. Tente ser prática - ser prática - prática - prática murmurava para si mesma.
Não demorou muitos minutos, o plano realmente começava a parecer um plano perfeito, sem falhas. Sorriu ao imaginar tudo... detalhes, lugares, falas, reações, sentimentos.

Siih achava que estava contando com tudo.

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Ophelia e Lala não estavam se falando, nem mesmo para as coisas básicas. Lala seguia Ophelia com a cara amarrada, engolindo a saliva a todo instante, tentando se controlar para não gritar impropérios. Ophelia que caçou dessa vez, conseguindo um pássaro realmente grande, de pelugem macia e amarronzada que ambas comeram: Lala seria idiota em recusar uma comida que era assada e que não era maçã. Ophelia não tentou falar com Lala, nem mesmo um "trouxe comida". Era orgulhosa demais para pedir desculpas e depois não sabia direito qual era o problema de Lala. Tentou transmitir desde o começo quem era. Ophelia nunca disse que seria o tipo de pessoa justa na hora de guerrear, somente criara laços de afeição com Lala a ponto de protegê-la se necessário. Mas, francamente, o que Lala queria? Que ela simplesmente fosse no castelo, conversasse com Siih algo do tipo "você pode me dar todo o seu império para eu ser a Rainha aqui?". AH! Nem em sonho.

Tinha que ter um plano mais engenhoso. O primeiro passo já fora dado, atacando uma vila. Não precisou mover um dedo, nem piscar os olhos. Os demônios simplesmente souberam que aquele era o momento ideal. Fora um ataque perfeito e inesperado. Mas agora precisava dar outros ataques tão perfeitos e tão inesperados como o primeiro foi, e sabia que isso seria mais difícil. Mas conseguiria ainda assim. Derrubaria todo o reino... mas agora precisava de uma cidade mais importante para o prejuízo, além de ser vidas, também se mostraria através do dinheiro... talvez a cidade de Heppaceneoh seria muito interessante, sendo tão próxima ao Reino das Fadas... sim, oh sim, seria interessante. As Campinas provavelmente estavam protegidas, droga. Tinha que ser um lugar distante, uma cidade nem tão importante assim...
Mividell.
Sim, aquele reino estranho que rendia ao Reino das Fadas cerca de 40% dos rendimentos anuais. Era um reino pouco conhecido, repleto de Glombs que faziam um pesado trabalho escravo, em minas. Cidadãos comuns não conheciam o reino, pois este era escondido pelas Fadas de alto escalão. Era um segredo de estado, um reino enfeitiçado para parecer somente escombros. Mas os Glombs sabiam a verdade, a verdade que destruiria a reputação do governo caso fosse revelada. Glombs não eram as criaturas mais adoradas, era verdade. Mas nenhum cidadão pensaria nisso, pois não havia somente Glombs ali. Ophelia, por acaso, sabia que quando uma criança era órfã, era enviada ao orfanato até completar 18 anos. Depois disso, não eram simplesmente liberados, mas sim mandados a este reino de estranho nome, onde trabalhavam forçadamente. Era um cenário cruel, que qualquer jornalista daria um braço para noticiar, um cenário escondido. Como Ophelia sabia mesmo? Talvez... provavelmente a mãe descobrira graças a um Glombs foragido.. isso não importava agora. Eram informações importantes e confidenciais, e um ataque nessa cidade ia chocar todos. A magia que protegia o reino era frágil, um inesperado ataque romperia esse véu tão delicado e todos descobririam a existência... um perfeito artifício que mantinha em segredo durante tanto tempo. E com certeza, Siih não contava com isso. Mas a Siih era tão inocente, não contava com nada!

Sorriu maleficamente, e Lala reparou nesse sorriso. Ela reparou nisso, assim como reparou no brilho anormal nos dois olhos de Ophelia. Percebeu que a amiga estava muito tranquila, muito mais cínica. E receosa, percebeu que mais um passo seria dado. E ela não poderia fazer mais nada pra impedir. Embora a tentação de ser a Princesa fosse absurda, ela sabia que não era certo. Queria o poder assim como Ophelia queria e brigara por uma causa perdida. Sim, era estupidez acreditar que Siih tivesse alguma chance contra Ophelia. Ela havia visto, ela havia presenciado: Ophelia era um monstro. Como poderia competir? Fora idiota em acreditar que podia sair dali, mas na verdade estava presa. Era escrava de Ophelia e por mais que Ophelia gostasse dela, essa situação nunca iria mudar. Era orgulhosa demais para pedir desculpas, mas realmente não queria brigar com a amiga e agora se sentia mais inclinada a ir "pro lado de Ophelia". Que situação. Era só pedir desculpas e ficava tudo por isso mesmo. Grande merda.

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Kibii acordou, impaciente. Havia tido mais um daqueles sonhos irritantes em que estava em um castelo, sozinha. Podia se lembrar de cada detalhe do castelo: a tapeçaria com toda uma árvore genealógica, mas não conseguia se lembrar dos nomes e rostos, os tapetes caros e vermelhos, os móveis de madeira escura, as portas de madeira com batentes dourados, os corredores e escadarias sem fim, e um cheiro, um cheiro de algo que a perturbava imensamente. Nunca conseguia lembrar que cheiro era, o que significava. Só lembrava perfeitamente que era estranho, familiar, atordoante. E no final, sempre no final do sonho, alguém lhe empurrava um anel. De prata e rubi, lindo. E quando conseguia enxergar o anel direito, acordava. Esse sonho sempre recorrente a irritava, tirava sua paciência e lhe causava umas boas três horas de mau humor. Era simplesmente frustrante não conseguir se lembrar do que os sonhos lhe lembrava.

Lembrava-se do seu passado muito vagamente. Lembrava que tinha uma mãe, talvez até uma irmã. Lembrava das horas ao ar livre que passava, treinando arco-e-flecha. Eram dias felizes que recebia presentes, agrados, cortesias. Mas se lembrava também que um dia tudo isso mudou. Mas não conseguia lembrar o nome de ninguém que convivia com ela, e não conseguia lembrar de onde viera. Era angustiante perceber que trazia uma série de heranças além do anel de prata e rubi: o arco de madeira rara, as jóias que ainda mantinha consigo, alguns vestidos de fino tecido, toda uma série de flechas que nunca usava com medo de perdê-las: flechas de ouro, prateadas, decoradas com pedras preciosas e outras mais simples, de simples madeira, porém eficientes. Mas agora o que isso importava? Lembrava seu nome completo e podia dizer que pertencia à raça dos elfos com a maior tranquilidade. E agora tinha um lar, e esses sonhos não chegavam a ser pesadelos. Cinco e quatro da manhã. Precisava tomar um banho, assim dizia a sua rotina diária. Mesmo que fizesse frio, ela não se incomodava. Todos começavam a acordar também, reparou. Levantou-se, pegando uma toalha e as roupas que usaria durante o dia, se dirigindo ao banheiro.

- Bom dia, Kibi - cumprimentou Umrae que já estava na banheira. Sim, como um abrigo não pode ser enorme com um banheiro com uns mil chuveiros, então foram feitas várias banheiras onde cabiam tranquilamente umas quinze pessoas e com grande espaço entre elas. Talvez essas banheiras de água quente onde as pessoas tomavam banho juntas inspiraram aqueles famosos banhos japoneses que as pessoas chamam de "fontes de águas termais". Dizem que relaxam. Kibii enrolou a toalha em si própria, descendo à banheira respondendo ao cumprimento.
- Acordou cedo - murmurou Kibii. Normalmente era a primeira a acordar cedo, sendo que Umrae vinha logo depois.
- Sim - Umrae concordou - bem, eu irei a Heppaceneoh hoje, comprar algumas coisas. Quer algo?
- Hmmm - fez Kibii apreciando a água azul e quente - eu preciso comprar luvas, botas e roupas novas.
- Bem - Umra ergueu as sobrancelhas - você não vai experimentar antes de comprar?
Kibii contorceu o rosto em uma careta, indicando que não gostara da idéia:
- Não. Eu te dou meu tamanho, você escolhe a mais simples roupa que tiver e pronto - hesitou antes de falar - experimentar roupas é chato.
Umrae deu um riso seco.
- Bom dia - Fer havia chegado, colocara suas roupas em um canto, e enrolada na toalha assim como Umrae e Kibii, mergulhou na banheira.
- Bom dia - cumprimentaram Kibii e Umrae em uníssono.
As três tomaram o banho caladas, o silêncio sendo interrompido apenas com comentários sobre o tempo ou sobre demônios (que se tornaram um tema recorrente de conversa ultimamente). A primeira a sair foi Umrae, depois Fer e por fim a Kibii. Nenhuma delas foi original na hora de escolher roupas, pois estavam preocupadas demais com a guerra que viria para isso: Umrae optou por um figurino prático envolvendo botas, uma capa marrom e blusa branca (tinha uma estranha predileção por blusas brancas mesmo que elas fossem as primeiras a se sujarem), Kibii preferiu roupas completamente negras (iria treinar em uma área completamente escura da floresta e o negro se mesclava perfeitamente) e Fer deu preferência a uma blusa de frio, calça e botas com tonalidades variando desde verde-musgo até o negro.

- Bom dia - murmurou Tatiih. Ela tomara banho em outra banheira, e usava um vestido azul-marinho - café da manhã!
A sala era circular e os tapetes estendidos onde as pessoas ficavam sentadas, comendo tranquilamente. Sim, cinco e meia da manhã, todos estavam acordados. Ou você acha que antigamente havia a moleza de hoje em dia? De modo algum! Raveneh ninava Maytsuri que acordara dando um berreiro fenomenal, que conseguiu acordar uma Rafitcha que só queria saber de dormir (pois a pobre coitada não conseguira realmente dormir durante a viagem). Amai e Kitsune tinham feito amizade com as pessoas, especialmente Amai que passara a conversar com Raven e Kitsune ficou bem amiga de Maria, ambas discutindo sobre como é difícil criar uma criança. Malygna e Thá e Vinicius tomaram o café quase em um círculo fechado, Bia apreciava o café sozinha, encostada em um canto.
- Bia! - chamou Raveneh - venha!
- Oi? - Bia levantou o olhar para ver quem chamou. Ao ver que era Raveneh, deu um leve sorriso somente.
- Venha! - disse Johnny - você fica aí toda sozinha, solitária! Até parece que não tem amigos.
Ah. Amigos. Bia Premy tinha amigos? Uau, isso era um feito bom considerando a vida de Bia, mesmo considerando que ela tinha o quê? Dezesseis anos?
- Ok - Bia acabou concordando. Como poderia recusar?
Levantou-se e se sentou ao lado de Raveneh e Johnny, com Rafitcha do outro lado.
- Está tudo bem agora - Raveneh sorriu - não é, nenê?
Bia deu um fraco sorriso, sabendo a mesma coisa que todos: estavam tremendamente errados. Não estava tudo bem, muito pelo contrário. Mas como admitir sem um ataque?