DOIS ANOS DEPOIS.
- Como está Raveneh, Johnny? - indagou Umrae observando Raveneh longe, treinando luta com espadas no meio da floresta.
- Ela está bem - murmurou Johnny lavando roupas juntamente com Umrae e Tatiih.
- Ela devia descansar - murmurou Tatiih - já fazem cinco meses...
- Eu sei - Johnny disse - mas ela não me ouve. Ela é muito teimosa, e disse que ia treinar alguma luta para a próxima guerra. Não adianta falar que estamos em tempos de paz...
- Você devia ouvir-la - disse Rafitcha aproximando-se com uma bacia vazia - Raveneh tem muitos dons, e um deles é "sentir" o futuro. Ela consegue saber o que vai acontecer, mas não com exatidão. É um dom bastante estranho.
- Então ela sabe o que vai acontecer? - surpreendeu-se Umrae - é... ela sempre sabe as coisas mais simples...
- Sim! Então ela podia trabalhar de cigana! - exclamou Tatiih, mas foi cortada por Johnny com uma voz fria:
- Eu nunca permitiria isso!
Todas riram, achando graça na negativa veemente de Johnny.
- Por favor...
Todos se viraram para ver quem enunciara o "por favor". Um rapaz moreno, alto e com olhos pequenos. Vestia vestes formais e escuras, e provavelmente vinha de outro reino.
- Sim, o que deseja? - perguntou Rafitcha intrigada.
- Aqui é o lugar que se chama Campinas? - perguntou o homem se empertigando.
- Sim - respondeu Rafitcha. Ela era a recepcionista daquele lugar, portanto todos os forasteiros que ali chegavam, ela se encarregava de dar todas as informações.
- Uma senhorita chamada Raveneh mora aqui? - o homem continuou a indagar, sério.
Rafitcha mordeu o lábio inferior, gesto imitado por Johnny no mesmo instante. O que aquele homem queria com Raveneh?
- Depende - intrometeu-se Johnny - quem é você?
- Isso não lhe interessa. - afirmou o homem com uma postura arrogante - por favor, a senhorita Raveneh mora aqui?
Logo chegaram Kibii, Fer, Doceh e Lych que viram a cena de longe.
- Ou você desembucha tudo, garoto - disse Kibii - ou você pode dizer o que deseja na sua lápide, agora.
O homem recuou. Logo Maria chegou.
- O que esse forasteiro deseja? - indagou.
- E-eu... - o homem tremia. Era um grupo diante dele, portando-se de forma ameaçadora, expressões sérias.
- Desembucha, homem! - Kibii disse com um sorriso frio. Fer também sorriu cinicamente, deixando mostrar a fria lâmina do seu punhal.
Quem são essas pessoas? perguntava-se o homem os amigos de Raveneh? Ela realmente achou gente para proteger-la...
- Chamem-na - disse o homem - eu me chamo J-Jorge.
- Eu chamo - disse Johnny - se ela concordar em encontrar em você... nós nos afastaremos, mas continuaremos vigiando. Qualquer mal que você faça a ela, nunca vai retornar a sua casa vivo. Entendeu?
- S-s-sim...
Johnny se afastou, atravessando um curto trecho da floresta até alcançar Raveneh, que estava alheia a tudo, lutando com a espada.
- Raveneh - começou.
Raveneh parou instantaneamente.
- Sim?
- Tem um homem chamado Jorge querendo falar com você - disse Johnny - você conhece?
PEIM
A espada caíra no chão, com estrondo.
- Deixem-o falar comigo - disse Raveneh - ele é meu irmão. Ou... mei0-irmão.
--------------------------
- Como está a situação no país? - indagou Siih a Lefi.
- Está regular - respondeu o irmão.
Estavam em uma reunião íntima, somente com as fadas.
- Heppaceneoh está sob controle - disse Gika remexendo em alguns papéis - o culpado pelos últimos assassinatos em sério já foi morto de acordo com a lei. E o programa de ajuda psicológica a vítimas do assassino está funcionando muito bem.
- Que bom. - disse Siih - Vê, e como está Arthur?
- Seu quadro psicológico está bem melhor - disse Vê de pé - ele apresenta sinais de revolta, porém afeiçoou-se ao gato de estimação que foi dado de aniversário. Ele está bem mais calmo agora.
- Ótimo - disse Siih - Clah, como foi o julgamento da Senhora Madison?
Enquanto Vê se sentava, Clah se levantou com o seu eterno sorriso:
- Tudo em ordem, Vossa Majestade - respondeu calmamente - a Senhora Madison foi considerada culpada, porém sua pena foi atenuada. Ficará na Prisão Yung durante quatro anos.
- Hmm - fez Siih - então... é só. Estão dispensadas.
Todas as fadas se retiraram do aposento, exceto Siih e Lefi. Siih fora uma boa rainha nos últimos dois anos, controland0 tudo: verbas para educação, saúde e segurança, lazer para todos, punição aos culpados, controle de outros países que foram dominados por fadas, salários, etc, etc, etc. Siih se cansava bastante a respeito disso.
Mas não tanto como se cansara há dois atrás, quando ainda tinha o poder absoluto que lhe permitia manipular pessoas. Se cansara demais daquilo.
Siih sorriu. Estava tudo normal, como tinha que ser.
--------------------------
- O que quer comigo? - indagou Raveneh.
- Eu? - o homem tremia - eu...
- Todos das Campinas estão de olho em você - disse Raveneh. Ela estava de costas para o meio-irmão, sentada em uma pedra - se você tentar algo contra mim, eles lhe matarão.
- Eles são os seus guarda-costas, Raveneh? - zombou Jorge - agora arranjou amiguinhos que matam...
- CALA A BOCA! - Raveneh não conseguia entender. Por que? Por que ele tinha que ir ali? Por que? - eles são meus amigos.
- Você se passou por vítima? - Jorge não ligava - se fez de inocente e por isso eles estão alertas com os seus familiares?
- Mais ou menos isso - murmurou Raveneh com um sorriso zombateiro - mas eu tiraria a parte do "se passar por vítima". Não é uma parte muito legal. E não é verdade.
- Você matou mamãe - resmungou Jorge.
- É mesmo - Raveneh não resolveu negar ou dizer que fora C atherine. Não tinha cara de pau para fazer isso - e isso me lembra... o que veio fazer aqui? Falar de mamãe?
- A polícia está investigando a morte de mamãe - contou Jorge - e eu estou na investigação.
- E o que isso tem a ver comigo? - indagou Raveneh sem sorrir.
- Você é a suspeita número um - Jorge disse quase não acreditando no tom de voz de Raveneh - você estava presente na morte de mamãe, e ainda vão decidir se foi acidental ou proposital.
- Ah, só isso? - Raveneh sorriu - vá embora. Vá embora e só volte quando tiver um mandato para me prender. Aí sim, eu prestarei atenção. Mas vá embora.
- Por que eu devo te ouvir? - indagou Jorge - o que pode fazer contra mim? Ou vai chamar seus amiguinhos pra te defenderem?
- Eu, sozinha, posso te matar - Raveneh disse - e pode ter certeza que vai ser mais cruel nas minhas mãos do que nas mãos dos meus "amiguinhos", como você diz.
Jorge somente suspirou impaciente.
- Preciso voltar - disse - eu vim só para dizer isso mesmo. Que estão investigando a hipótese que mamãe morreu propositalmente... Logo, virão aqui aos montes para lhe interrogar.
- Eu sei. - disse Raveneh - agora vá embora. Eu não quero você aqui.
- Eu sou o seu meio-irmão! - exclamou Jorge surpreso - como você pode dizer essas coisas para mim?
- VÁ EMBORA! - Raveneh pôs a mãe na bainha da espada, exasperada.
Jorge recuou, vendo o gesto inesperado de Raveneh. Ela vai me matar se eu não me mandar, concluiu ao ver a mão de Raveneh sobre a bainha.
- Está bem. Adeus, Raveneh - disse por fim.
Saiu correndo, ileso. Raveneh suspirou, cansada. Já estava de cinco meses de gravidez, sua mãe fora assassinada por suas próprias mãos há mais de dois anos e só agora que estavam investigando?
País do futuro, não é isso?
Desmaiou.
--------------------------
Um teto bastante familiar, um cheiro de chá.
- Fique descansando - disse Johnny - o cansaço de treinar com espadas, o estresse de discutir com aquele Jorge e o fato de você estar grávida... você acabou desmaiando...
Raveneh não se moveu. Realmente estava muito cansada, embora não sentisse medo de que os policiais do país "natal" viessem interrogar-lhe com métodos suspeitos, e muito provavelmente, declarar-la culpada. Até porque Raveneh não pretendia se dizer inocente.
- Nós escutamos o que Jorge falou - disse Johnny estendendo uma xícara cheia de um líquido fumegante que cheirava deliciosamente - nós não vamos deixar ninguém lhe levar daqui.
- Eu vou ser considerada culpada - disse Raveneh com um suspiro - e não pretendo escapar dizendo que eu tenho dupla personalidade. Ia ser humilhante demais para mim.
- O fato de você ser considerada inocente porque tem um problema psicológico? - indagou Johnny por indagar.
- Mais ou menos isso - murmurou Raveneh - eu me recuso a aparecer no tribunal como uma... uma doida varrida. Prefiro me manter sã e culpada. Não vou dizer que foi Catherine, embora tenha sido mesmo.
- Eu entendo... - Johnny disse - você é uma protegida das fadas, Raveneh. E de acordo com Rafitcha, a lei te favorece. Você está grávida, portanto não pode ser obrigada a sair do território. A não ser que queira.
- Que bom - Raveneh sorriu - eu ficaria doente caso saísse daqui.
Raveneh bebeu um pouco do chá, e colocou a xícara nas mãos de Johnny.
Se sentou calmamente.
- Me abraçe - pediu.
Johnny sorriu. Há dois anos, ela pedira uma coisa diferente com o mesmo tom de voz. Era um tom calmo e suave, quase um sussurro.
Ele abriu os braços, e ela se curvou diante dele, o envolvendo com seus braços finos. A barriga já um pouco pronunciada não permitia um abraço mais forte, mas Raveneh não sentia isso. Somente sentia que estava feliz.
Pois tudo terminaria bem. E ela tinha certeza absoluta disso, pela primeira vez na vida.
sexta-feira, 28 de dezembro de 2007
Depois de tempos, um epílogo! \o/
Este epílogo que postarei foi escrito. Sim, ele tem total brecha para uma continuação da história. E confesso, eu pensei nessa idéia.
Mas não há nada confirmado!
E uma "fã" lembrou que eu não esclareci quem era a irmã de Giovanni (aqui).
Mas eu não esclareço isso no epílogo. Ou seja duas opções para vocês: imaginem o quanto quiserem ou implorem (se arrastando de joelhos!) por uma continuação ;*
Beijos e aqui vai o epílogo esperado! /o/
Mas não há nada confirmado!
E uma "fã" lembrou que eu não esclareci quem era a irmã de Giovanni (aqui).
Mas eu não esclareço isso no epílogo. Ou seja duas opções para vocês: imaginem o quanto quiserem ou implorem (se arrastando de joelhos!) por uma continuação ;*
Beijos e aqui vai o epílogo esperado! /o/
quinta-feira, 29 de novembro de 2007
Parte 70 - FINAL - "Fique comigo para sempre."
Renegada está morta há uma semana.
Era muito difícil de acreditar.
Muito mesmo.
Todos estavam com um ar extremamente sombrio, pesado. Ninguém sequer sorria.
O velório e a cerimônia de cremação havia ocorrido há dois dias, e as Campinas estavam de luto. Ninguém estendia as roupas, e também ninguém ligava para isso. Fer não treinava mais com seus punhais, Kibii não usava uma flecha sequer.
Estava tudo muito estranho.
E a mais abalada era, claro, a Raveneh. Ela estava trancada em uma casa recém-feita, composta apenas de um cômodo. Ela não chorava, nem se lamentava.
Somente ficava parada, inerte.
Hoje faz sete dias que Renegada morreu.
Por que era tão difícil se acostumar com isso? Por que era tão difícil acordar e lembrar que uma amiga se matou?
Lembrou de Arthur. Ele estava sob aos cuidados das fadas, que tinham tato em informar que seus pais morreram. Raveneh duvidava seriamente que um dia Arthur pudesse perdoar Renegada pelo que fizera.
Quando o Rei morreu, eu quase desmaiei.
Por que? Por que o sangue lhe parecia tão familiar? Lembrava-se cenas dos pesadelos que tinha quase toda noite.
Estava se sentindo confusa demais. Bebeu um copo d'água.
- Olá, Raveneh.
Uma voz estranha e ao mesmo tempo familiar. Parecia vir de fora e de dentro.
Sentou-se na cama, seu corpo doeu. Não mexera muito o corpo desde que Renegada morrera.
A voz vinha do seu espelho.
- Quem é você? - perguntou Raveneh.
O seu reflexo no espelho não estava igual. Era alguém muito parecido com Raveneh, mas não era Raveneh.
Pois a menina sorria, enquanto Raveneh estava arrasada. E a menina tinha cabelos negros, enquanto Raveneh era loira.
- É tão triste a outra face não te reconhecer, Raveneh.
Raveneh acabou por se lembrar de onde ouvira a voz.
- Catherine?
Catherine sorriu.
- Eu realmente não esperava que você soubesse quem sou... - riu - mas antes de ficar escandalizada... eu não sou a sua irmã. Nem o espiríto dela.
Raveneh suspirou.
- O que está fazendo parada aí? - murmurou Catherine - sete dias que você está mofando nessa cama!
- Minha amiga morreu. - afirmou Raveneh. Não tinha a menor idéia de quem era Catherine e o porquê de conversar com um reflexo no espelho. Mas continuava conversando.
- E daí? - disse Catherine - eu sei que a sua querida amiga, Mycil Regallian, matou o ex-amante dela e depois se jogou da janela. Mas ela não gostaria que você ficasse sete dias prostrada na cama por culpa dela!
- Quê? - exclamou Raveneh - o que você sabe de Renegada?
- Muitas coisas - Catherine sorriu - tudo que eu sei, você sabe. E vice-versa.
- Quem é você?
Raveneh apertou a colcha da cama.
- Nada que te interesse. Simplesmente estou cansada de ficar te protegendo. Saia daí, vá fazer qualquer coisa. Sei lá, treinar luta de espada, colher morangos, lavar roupas. Ficar mofando na cama não ajuda em nada!
- Você não manda na minha vida!
Catherine riu amargamente.
- Mando mais do que você imagina! Agora troque de roupa e vá fazer algo. Estou cansada disso...
- Quem é você?
- Cale a boca. Sabe de uma coisa? Você é fraca demais! Tem que depender de mim pra tudo! Não aguentou nem ver o Rei sendo morto...
- QUEM É VOCÊ?!
- Duh, Raveneh durona - Catherine revirou os olhos - ok, eu me rendo. Digamos que eu sou você.
- Isso não é uma resposta - afirmou Raveneh. Estou ficando louca, pensou, provavelmente é tudo alucinação, coisa da minha cabeça.
- Mas eu sou você. Ou você é eu. Ou... estou ficando confusa com essa história - disse Catherine - ok, com certeza você não deve lembrar de muitas coisas, não é? Tipo, na sua infância.
- Eu realmente me lembro de poucas coisas - murmurou Raveneh cabisbaixa - me lembro de muitas poucas coisas.
- Eu que estava lá - sussurrou Catherine. Ela não ria mais, nem o sorriso continuava em seu rosto - eu estava lá. Muitas vezes você não agiu como tal, Raveneh. Quem agia no seu lugar era eu. E eu, definitivamente, me cansei de ficar te protegendo. Não quero mais.
- Ficar me protegendo? - Raveneh estava surpresa - eu não entendi.
- Idiota. Você tem dupla personalidade - Catherine explicou - eu sou a outra face sua. Entendeu agora?
Raveneh assentiu.
Era realmente confuso esse problema. Mas explicava muito dos seus lapsos de memória que ocorriam desde a sua infância...
- M-maldita... - exclamou a mãe.
Raveneh deu um passo para trás.
- O que eu fiz? - perguntou tremendo, deixando cair o copo de vidro no chão.
- Me envenenou... Maldita...
Raveneh sufocou um grito escandalizada. Como podia envenenar a própria mãe? Era um ato vergonhoso!
E como podia levar a culpa pelo que não fizera? Correu.
- Cale a boca - suspirou.
O sorriso de Catherine se desfez.
- Realmente estou cansada de ficar aturando suas manias - murmurou - eu não aguento mais ficar te protegendo a todo instante.
- Eu nunca pedi isso - Raveneh protestou.
- Tem certeza? - Catherine contradisse - o que mais aguentei foram seus lamentos...
Raveneh estava perdida em suas próprias memórias.
- Aargh... P-por favor... R-Raveneh...
E o sangue pingava do lençol, sujando todo o chão...
- C-Catherine... - Raveneh não sabia o que fazer.
- Você está entendendo agora? - Catherine murmurou - as suas lembranças estão comigo. Você só tem os fragmentos que me faltam... Eu tenho várias opções pra você, Raveneh, e você vai decidir...
Raveneh não respondeu. Levantou-se, e foi para a porta. Saiu, deixando uma Catherine surpresa no espelho.
Lá fora, chovia. A chuva caía fina, quase que sutil, tocando no chão com gotas fragéis.
O céu escurecia, apesar de serem só quatro horas da tarde, e as Campinas estavam vazias: todos estavam recolhidos nas próprias cabanas.
Logo as roupas que Raveneh usava molharam, e ela começou a se sentir frio. Porém não queria entrar em casa onde um pesadelo lhe aguardava. Precisa assimilar a terrível descoberta:
Você matou sua mãe e deixou a sua irmã morrer.
Mesmo que estivesse agindo sob outra outra personalidade, ainda assim, sentia que tinha culpa pela segunda personalidade que absorvera todos os golpes que sofrera na infância. Simplesmente estou cansada de ficar te protegendo, Catherine dissera. Será que Catherine era simplesmente a face que agia por ela? Enquanto Raveneh era doce e aguentava tudo sem reclamar, Catherine era doce e feroz, além de se recusar a levar desaforo para casa.
E muito provavelmente, pensou Raveneh tremendo de frio e medo, ela possui grandes poderes que eu nunca tive... Assim que consegui fugir dos nortistas... Ela matou todos, e eu não sabia...
Eu estava sendo protegida...
Por que era tão difícil se acostumar com isso? Por que isso doía tanto? Por que...?
A chuva começou a engrossar, e Raveneh, tonta como estava, desabou no chão aos prantos.
- Raveneh? - uma voz chamou.
Levantou o rosto, e deu um fraco sorriso.
- J-Johnny...
Johnny vestia um manto azul, e ergueu os braços em um gesto acolhedor.
Raveneh conseguiu se levantar, mesmo com a forte chuva e a confusão mental em que se encontrava, e abraçou o Johnny.
- Você está ensopada, Raveneh - disse Johnny com um leve sorriso - vamos para a sua casa, para se secar.
Raveneh se afastou de Johnny, com o rosto retorcido de fúria e pavor:
- Não! - a voz tremia - ela... ela...
- Ela? Ela quem? - Johnny indagou surpreso.
- C-Catheri... - soluçou Raveneh.
Neste instante, Johnny compreendeu. Finalmente Raveneh descobrira por si própria a outra face e estava verdadeiramente transtornada...
Compreendeu que levar Raveneh de volta para a sua própria casa estava fora de questão.
Abraçou Raveneh o mais forte que podia, e sob a chuva, podia sentir as lágrimas quentes se derramando sob o manto.
- Calma... calma... calma... - sussurrava em um tom calmo para Raveneh.
Ele a guiou até a sua casa, e durante o caminho, ela chorava sem parar. Johnny se perguntou o que ele fizera para merecer isso: amar uma menina totalmente desequilibrada.
Johnny morava em uma cabana de madeira, frágil, e tinha somente um cômodo assim como a cabana de Raveneh. Uma enorme cama de casal, dada pelos pais de Johnny, uma mesa onde uma vela jazia apagada, e um guarda-roupa.
Onde ela vai dormir? pensou Johnny percebendo que só tinha a cama como repouso. E definitivamente não faria Raveneh dormir no chão, como cavalheiro que era.
Raveneh olhou em volta, e respirou profundamente.
Em seguida desabou na cama, mergulhada em um sono profundo. Johnny a ajeitou na cama, com um leve prazer.
Johnny estava bastante cansado, e também desabou na cama ao lado de Raveneh. Dormiria no chão, mas o cansaço não lhe permitiu pensar duas vezes.
Parecia um casal. Ainda não era totalmente noite, e os dois já dormiam na cama dele. Quando deu meia-noite, Raveneh acordou. Assustou-se até se lembrar de que Johnny a trouxera para a casa dele, confusa que estava.
Ele me ajudou... Sorriu.
Levantou-se. Voltaria para a própria casa, mesmo que o espelho a encarasse e Catherine aparecesse. Se no dia anterior todos soubessem que ela passou a noite na casa de Johnny, poderiam criar boatos mentirosos e ela poderia ficar mal-falada. Não queria isso para si.
Percebeu que as roupas ainda estavam molhadas, e percebeu também que Johnny não tirara seu manto azul. Sorriu, e calmamente se curvou sobre o Johnny e conseguiu pegar o manto sem que Johnny acordasse.
Mal abriu a porta, Johnny disse:
- Aonde vai, Raveneh? - indagou surpreso.
- Está acordado? - murmurou Raveneh - eu...
- Sim, acordei quando você tirou o manto - Johnny respondeu com um sorriso - vai voltar para a sua casa? Pensei que não conseguisse suportar Catherine.
- Não consigo - admitiu Raveneh - mas... eu preciso encarar-la de qualquer forma.
- Você tem razão... - Johnny disse - mas você está pronta?
- Não sei - Raveneh não chorou como fizera há algumas horas. Na verdade estava séria, seus olhos azuis refletindo serenidade e os cabelos loiros ainda molhados lhe davam um ar de inocência, como sempre fizera.
Johnny sorriu. A cabana estava escura, e a chuva ainda caía, porém bem mais fraca, quase como uma garoa.
- Você... - hesitou antes de continuar - você está indo para a sua casa, pois teme ficar mal-falada?
Raveneh não teve como negar, tamanha a surpresa, ao que Johnny murmurou com um sorriso:
- Ninguém falaria mal de você, Raveneh. Nós moramos no meio de amigos, e nenhum deles ousaria dizer algo de obsceno contra você.
- Eu sei, mas... - Raveneh não conseguia achar algo para rebater - eu...
- Fique aqui. - pediu Johnny.
Raveneh levantou o rosto, este ficando vermelho:
- Não sei se devo...
- Eu não sou nenhum pervertido, Raveneh - riu Johnny - não farei nada de mal, prometo.
Raveneh sorriu. Como poderia retrucar?
Fechou a porta atrás de si.
- Está bem... - Raveneh disse - mas com uma condição.
- Qual?
Raveneh respirou fundo, e tomou coragem:
- Que fique comigo para sempre.
Johnny sorriu.
- Claro que sim, Raveneh.
A partir daí, Raveneh soube que poderia aguentar de tudo: Catherine-irmã, Catherine-personalidade, a mãe, os assassinatos que cometeu e não lembrava, os pesadelos que continuavam a aterrorizar durante a noite, a tortura que passou nas mãos dos nortistas, o suicídio de uma amiga íntima, tudo.
Ela podia aguentar de tudo.
Mas com Johnny ao seu lado.
Era muito difícil de acreditar.
Muito mesmo.
Todos estavam com um ar extremamente sombrio, pesado. Ninguém sequer sorria.
O velório e a cerimônia de cremação havia ocorrido há dois dias, e as Campinas estavam de luto. Ninguém estendia as roupas, e também ninguém ligava para isso. Fer não treinava mais com seus punhais, Kibii não usava uma flecha sequer.
Estava tudo muito estranho.
E a mais abalada era, claro, a Raveneh. Ela estava trancada em uma casa recém-feita, composta apenas de um cômodo. Ela não chorava, nem se lamentava.
Somente ficava parada, inerte.
Hoje faz sete dias que Renegada morreu.
Por que era tão difícil se acostumar com isso? Por que era tão difícil acordar e lembrar que uma amiga se matou?
Lembrou de Arthur. Ele estava sob aos cuidados das fadas, que tinham tato em informar que seus pais morreram. Raveneh duvidava seriamente que um dia Arthur pudesse perdoar Renegada pelo que fizera.
Quando o Rei morreu, eu quase desmaiei.
Por que? Por que o sangue lhe parecia tão familiar? Lembrava-se cenas dos pesadelos que tinha quase toda noite.
Estava se sentindo confusa demais. Bebeu um copo d'água.
- Olá, Raveneh.
Uma voz estranha e ao mesmo tempo familiar. Parecia vir de fora e de dentro.
Sentou-se na cama, seu corpo doeu. Não mexera muito o corpo desde que Renegada morrera.
A voz vinha do seu espelho.
- Quem é você? - perguntou Raveneh.
O seu reflexo no espelho não estava igual. Era alguém muito parecido com Raveneh, mas não era Raveneh.
Pois a menina sorria, enquanto Raveneh estava arrasada. E a menina tinha cabelos negros, enquanto Raveneh era loira.
- É tão triste a outra face não te reconhecer, Raveneh.
Raveneh acabou por se lembrar de onde ouvira a voz.
- Catherine?
Catherine sorriu.
- Eu realmente não esperava que você soubesse quem sou... - riu - mas antes de ficar escandalizada... eu não sou a sua irmã. Nem o espiríto dela.
Raveneh suspirou.
- O que está fazendo parada aí? - murmurou Catherine - sete dias que você está mofando nessa cama!
- Minha amiga morreu. - afirmou Raveneh. Não tinha a menor idéia de quem era Catherine e o porquê de conversar com um reflexo no espelho. Mas continuava conversando.
- E daí? - disse Catherine - eu sei que a sua querida amiga, Mycil Regallian, matou o ex-amante dela e depois se jogou da janela. Mas ela não gostaria que você ficasse sete dias prostrada na cama por culpa dela!
- Quê? - exclamou Raveneh - o que você sabe de Renegada?
- Muitas coisas - Catherine sorriu - tudo que eu sei, você sabe. E vice-versa.
- Quem é você?
Raveneh apertou a colcha da cama.
- Nada que te interesse. Simplesmente estou cansada de ficar te protegendo. Saia daí, vá fazer qualquer coisa. Sei lá, treinar luta de espada, colher morangos, lavar roupas. Ficar mofando na cama não ajuda em nada!
- Você não manda na minha vida!
Catherine riu amargamente.
- Mando mais do que você imagina! Agora troque de roupa e vá fazer algo. Estou cansada disso...
- Quem é você?
- Cale a boca. Sabe de uma coisa? Você é fraca demais! Tem que depender de mim pra tudo! Não aguentou nem ver o Rei sendo morto...
- QUEM É VOCÊ?!
- Duh, Raveneh durona - Catherine revirou os olhos - ok, eu me rendo. Digamos que eu sou você.
- Isso não é uma resposta - afirmou Raveneh. Estou ficando louca, pensou, provavelmente é tudo alucinação, coisa da minha cabeça.
- Mas eu sou você. Ou você é eu. Ou... estou ficando confusa com essa história - disse Catherine - ok, com certeza você não deve lembrar de muitas coisas, não é? Tipo, na sua infância.
- Eu realmente me lembro de poucas coisas - murmurou Raveneh cabisbaixa - me lembro de muitas poucas coisas.
- Eu que estava lá - sussurrou Catherine. Ela não ria mais, nem o sorriso continuava em seu rosto - eu estava lá. Muitas vezes você não agiu como tal, Raveneh. Quem agia no seu lugar era eu. E eu, definitivamente, me cansei de ficar te protegendo. Não quero mais.
- Ficar me protegendo? - Raveneh estava surpresa - eu não entendi.
- Idiota. Você tem dupla personalidade - Catherine explicou - eu sou a outra face sua. Entendeu agora?
Raveneh assentiu.
Era realmente confuso esse problema. Mas explicava muito dos seus lapsos de memória que ocorriam desde a sua infância...
- M-maldita... - exclamou a mãe.
Raveneh deu um passo para trás.
- O que eu fiz? - perguntou tremendo, deixando cair o copo de vidro no chão.
- Me envenenou... Maldita...
Raveneh sufocou um grito escandalizada. Como podia envenenar a própria mãe? Era um ato vergonhoso!
E como podia levar a culpa pelo que não fizera? Correu.
- Cale a boca - suspirou.
O sorriso de Catherine se desfez.
- Realmente estou cansada de ficar aturando suas manias - murmurou - eu não aguento mais ficar te protegendo a todo instante.
- Eu nunca pedi isso - Raveneh protestou.
- Tem certeza? - Catherine contradisse - o que mais aguentei foram seus lamentos...
Raveneh estava perdida em suas próprias memórias.
- Aargh... P-por favor... R-Raveneh...
E o sangue pingava do lençol, sujando todo o chão...
- C-Catherine... - Raveneh não sabia o que fazer.
- Você está entendendo agora? - Catherine murmurou - as suas lembranças estão comigo. Você só tem os fragmentos que me faltam... Eu tenho várias opções pra você, Raveneh, e você vai decidir...
Raveneh não respondeu. Levantou-se, e foi para a porta. Saiu, deixando uma Catherine surpresa no espelho.
Lá fora, chovia. A chuva caía fina, quase que sutil, tocando no chão com gotas fragéis.
O céu escurecia, apesar de serem só quatro horas da tarde, e as Campinas estavam vazias: todos estavam recolhidos nas próprias cabanas.
Logo as roupas que Raveneh usava molharam, e ela começou a se sentir frio. Porém não queria entrar em casa onde um pesadelo lhe aguardava. Precisa assimilar a terrível descoberta:
Você matou sua mãe e deixou a sua irmã morrer.
Mesmo que estivesse agindo sob outra outra personalidade, ainda assim, sentia que tinha culpa pela segunda personalidade que absorvera todos os golpes que sofrera na infância. Simplesmente estou cansada de ficar te protegendo, Catherine dissera. Será que Catherine era simplesmente a face que agia por ela? Enquanto Raveneh era doce e aguentava tudo sem reclamar, Catherine era doce e feroz, além de se recusar a levar desaforo para casa.
E muito provavelmente, pensou Raveneh tremendo de frio e medo, ela possui grandes poderes que eu nunca tive... Assim que consegui fugir dos nortistas... Ela matou todos, e eu não sabia...
Eu estava sendo protegida...
Por que era tão difícil se acostumar com isso? Por que isso doía tanto? Por que...?
A chuva começou a engrossar, e Raveneh, tonta como estava, desabou no chão aos prantos.
- Raveneh? - uma voz chamou.
Levantou o rosto, e deu um fraco sorriso.
- J-Johnny...
Johnny vestia um manto azul, e ergueu os braços em um gesto acolhedor.
Raveneh conseguiu se levantar, mesmo com a forte chuva e a confusão mental em que se encontrava, e abraçou o Johnny.
- Você está ensopada, Raveneh - disse Johnny com um leve sorriso - vamos para a sua casa, para se secar.
Raveneh se afastou de Johnny, com o rosto retorcido de fúria e pavor:
- Não! - a voz tremia - ela... ela...
- Ela? Ela quem? - Johnny indagou surpreso.
- C-Catheri... - soluçou Raveneh.
Neste instante, Johnny compreendeu. Finalmente Raveneh descobrira por si própria a outra face e estava verdadeiramente transtornada...
Compreendeu que levar Raveneh de volta para a sua própria casa estava fora de questão.
Abraçou Raveneh o mais forte que podia, e sob a chuva, podia sentir as lágrimas quentes se derramando sob o manto.
- Calma... calma... calma... - sussurrava em um tom calmo para Raveneh.
Ele a guiou até a sua casa, e durante o caminho, ela chorava sem parar. Johnny se perguntou o que ele fizera para merecer isso: amar uma menina totalmente desequilibrada.
Johnny morava em uma cabana de madeira, frágil, e tinha somente um cômodo assim como a cabana de Raveneh. Uma enorme cama de casal, dada pelos pais de Johnny, uma mesa onde uma vela jazia apagada, e um guarda-roupa.
Onde ela vai dormir? pensou Johnny percebendo que só tinha a cama como repouso. E definitivamente não faria Raveneh dormir no chão, como cavalheiro que era.
Raveneh olhou em volta, e respirou profundamente.
Em seguida desabou na cama, mergulhada em um sono profundo. Johnny a ajeitou na cama, com um leve prazer.
Johnny estava bastante cansado, e também desabou na cama ao lado de Raveneh. Dormiria no chão, mas o cansaço não lhe permitiu pensar duas vezes.
Parecia um casal. Ainda não era totalmente noite, e os dois já dormiam na cama dele. Quando deu meia-noite, Raveneh acordou. Assustou-se até se lembrar de que Johnny a trouxera para a casa dele, confusa que estava.
Ele me ajudou... Sorriu.
Levantou-se. Voltaria para a própria casa, mesmo que o espelho a encarasse e Catherine aparecesse. Se no dia anterior todos soubessem que ela passou a noite na casa de Johnny, poderiam criar boatos mentirosos e ela poderia ficar mal-falada. Não queria isso para si.
Percebeu que as roupas ainda estavam molhadas, e percebeu também que Johnny não tirara seu manto azul. Sorriu, e calmamente se curvou sobre o Johnny e conseguiu pegar o manto sem que Johnny acordasse.
Mal abriu a porta, Johnny disse:
- Aonde vai, Raveneh? - indagou surpreso.
- Está acordado? - murmurou Raveneh - eu...
- Sim, acordei quando você tirou o manto - Johnny respondeu com um sorriso - vai voltar para a sua casa? Pensei que não conseguisse suportar Catherine.
- Não consigo - admitiu Raveneh - mas... eu preciso encarar-la de qualquer forma.
- Você tem razão... - Johnny disse - mas você está pronta?
- Não sei - Raveneh não chorou como fizera há algumas horas. Na verdade estava séria, seus olhos azuis refletindo serenidade e os cabelos loiros ainda molhados lhe davam um ar de inocência, como sempre fizera.
Johnny sorriu. A cabana estava escura, e a chuva ainda caía, porém bem mais fraca, quase como uma garoa.
- Você... - hesitou antes de continuar - você está indo para a sua casa, pois teme ficar mal-falada?
Raveneh não teve como negar, tamanha a surpresa, ao que Johnny murmurou com um sorriso:
- Ninguém falaria mal de você, Raveneh. Nós moramos no meio de amigos, e nenhum deles ousaria dizer algo de obsceno contra você.
- Eu sei, mas... - Raveneh não conseguia achar algo para rebater - eu...
- Fique aqui. - pediu Johnny.
Raveneh levantou o rosto, este ficando vermelho:
- Não sei se devo...
- Eu não sou nenhum pervertido, Raveneh - riu Johnny - não farei nada de mal, prometo.
Raveneh sorriu. Como poderia retrucar?
Fechou a porta atrás de si.
- Está bem... - Raveneh disse - mas com uma condição.
- Qual?
Raveneh respirou fundo, e tomou coragem:
- Que fique comigo para sempre.
Johnny sorriu.
- Claro que sim, Raveneh.
A partir daí, Raveneh soube que poderia aguentar de tudo: Catherine-irmã, Catherine-personalidade, a mãe, os assassinatos que cometeu e não lembrava, os pesadelos que continuavam a aterrorizar durante a noite, a tortura que passou nas mãos dos nortistas, o suicídio de uma amiga íntima, tudo.
Ela podia aguentar de tudo.
Mas com Johnny ao seu lado.
segunda-feira, 26 de novembro de 2007
Parte 69 - Já é tarde demais pra voltar atrás...
- Tragam o prisioneiro!
Todos estavam dispostos em fileiras bem assentadas, diante de uma juíza com cabelos lisos e loiros, e olhos redondos, amigáveis e cor-de-mel.
Quatro fadas com os braços desnudos e olhares sérios vieram, com o Rei de cabeça erguida entre elas. Raveneh percebeu que ele estava acorrentado em correntes de ferro, que todas as quatro seguravam.
- P-papai... - murmurou Arthur.
Era a primeira vez que Raveneh e o pessoal das Campinas o viram tão cabisbaixo. Mas, realmente, a não ser que você odeie profundamente seu pai, é um soco no estômago ver seu pai preso, julgado e muito provavelmente condenado.
- Vai sair tudo bem... - tranquilizou Raveneh, embora ela soubesse que o resultado do julgamento ia ser a morte.
- Tragam a prisioneira!
Outras quatro fadas de olhos sérios vieram, dessa vez com a Renegada acorrentada no meio do quarteto.
- R-Renegada... - murmurou Raveneh.
Lembrou-se do dia em que conheceu Renegada. No dia ela era baixinha como ela, mas no decorrer do tempo, ela se equiparou a uma mulher normal em altura. Provavelmente era encanto, porque pesquisara uma vez e descobrira que fadas das trevas não costumam ser baixinhas.
Ela era um doce de menina, e cantara com ela...
Nunca suspeitara que ela tivesse algum envolvimento com o Rei...
- Olha lá a Lala! - exclamou Kibii que estava sentada ao lado de Raveneh - ela está tão preocupada!...
- Deve ter descoberto coisas chocantes! - palpitou Fer - e vai ter que contar tudo hoje...
- O Rei parece tranquilo - murmurou Kibii - Renegada também. Ah, mas ela vai sair inocente!
Lynda estava sentada uma fileira atrás de Raveneh, e ainda tinha uma excelente audição que lhe permitia escutar todos os comentários no tribunal. Ruronna está aqui. dizia para si. Ruronna veio, e isso quer dizer que não importa o que Mycil faça, já era...
Conseguiu engolir seus soluços.
Aguardou.
- Eu me chamo Clah Alfacce - disse a juíza com um leve sorriso pelo rosto. Parecia uma dessas pessoas que sempre estão contentes com a vida, mesmo que aconteça uma guerra, mesmo que criancinhas estejam sendo assassinadas na sua frente, mesmo que um inocente seja condenado. A juíza parecia estar sempre feliz, com um sorriso no rosto - e serei a juíza neste presente e duplo julgamento. O Rei Calvin Mo, que reina sobre Heppaceneoh, foi detido por crimes como tentativa de sequestro contra a Senhorita Raveneh, que implica em quebra de Tratado. Também cometeu o crime de ameaçar o céu das Campinas, e tentar invadir as Campinas, mesmo isso implicando que o Tratado Campinas-Heppaceneoh, feito há dez anos atrás, seja quebrado. Já a Mycil Regallian está detida sobre o crime de ser cúmplice do Rei Calvin Mo.
- Mycil Regallian? - Fer indagou, surpresa.
- Você não achava que ela se chamava Renegada mesmo, achava? - riu Umrae.
Tatiih concordou, e completou com o seu conhecimento de história:
- "Renegada" é um título que muitas pessoas costumam usar, quando são banidas de seus lares e coisas assim. E são obrigadas a se apresentar assim, geralmente. Porém creio que a Renegada resolveu utilizar esse título em vez do seu nome, porque ela não estava na terra dela...
- Ah. - Fer mordeu o lábio inferior.
- Ela já foi lá pra casa brigar com papai... - resmungou Arthur - ela é uma chata de primeira! Papai disse que ela é má.
- Não! - escandalizou-se Raveneh - Renegada não é a vilã aqui! Ela é muito boa e gosta muito de você! O seu pai a odeia, por isso tenta fazer com que você a odeie também!
- Hmpf. - fez Arthur.
A juíza pigarreou.
- Rei Calvin Mo de Heppaceneoh, se diz inocente ou culpado? - perguntou.
- Inocente, claro. - disse o Rei - embora eu tenha cometido os crimes e...
- Mycil Regallian, conhecida como Renegada, se diz inocente ou culpada? - interrompeu a juíza.
- Inocente! - exclamou Renegada.
Siih estava sentada ao lado da juíza, em uma cadeira especial. Vestia um longo vestido azul-marinho, muito escuro. Estava bastante interessada no julgamento.
Lefi estava sentado ao lado da irmã, e com uma maleta de socorros, afinal Siih viera ao julgamento mesmo ainda não estando recuperada totalmente...
- Pois bem... - disse a juíza - por favor, senhorita Lallyn...
- Sim! - exclamou Lala sorridente, com seus cabelos laranja.
- O nome de Lala é Lallyn? - exclamou Kibii pasma - ahah, que nome de princesa!
- É bonito. - disse Arthur - ela é bem bonita!
- AH! - riu Fer - você é um pirralho, e já acha que a senhorita Lallyn se interessará em você?!
- Eu não disse isso! - resmungou Arthur ficando muito vermelho de repente.
- Ah, que bonitinho, ele ficou vermelho! - cochichou Raveneh entre risos.
Todos riram, deixando Arthur muito sem graça.
- Pois bem, senhorita Lallyn Sakamoto - disse a juíza - por favor, apresente os depoimentos que acusam o Rei Mo.
- Sim! - concordou Lala e pôs um monte de papéis em cima da mesa.
- Sakamoto? - murmurou Tatiih - Sakamoto é uma antiga família que sempre...
- Aquela que gerava só filho que ia pra guerra? - completou Fer - sim, Lala é a última herdeira dessa família! Lallyn Sakamoto! Que chique, ela tem ascendência nobre *o*
Todos riram, inclusive Arthur.
O julgamento prosseguia, entediante.
Lala dizia o que ia contra e a favor do Rei, e repetia o mesmo a Renegada.
Quando chegaram a parte de dez anos atrás, Raveneh e seus amigos das Campinas se arrependeram profundamente de terem arrastado Arthur de lá. Antes não tivessem trago Arthur!
- Então você teve um filho com o Rei Calvin Mo? - indagou a juíza Clah.
Raveneh estava estarrecida, Fer, Kibii, Tatiih, Umrae, todos estavam profundamente chocados.
Mas Arthur era quem mais mostrava sinais de choque.
Eu sou o filho de Renegada... repetia a si mesmo, confuso eu sou filho de verdade do papai. Eu não sou adotivo, eu realmente...
- Tire-o daqui! - disse Maria com rispidez - Arthur não deve ouvir tudo! Eu mesma não sei a história, mas Lala acabou de me pedir para que tirasse Arthur daqui!
- E-e-está bem! - murmurou Raveneh chocada - Arthur, vamos...
- Não.
- Vamos! Veja, precisamos beber água e...
As vozes eram sussurradas para não atrapalhar o julgamento.
- A-Arthur, não precisamos mais ficar aqui... - Fer tentou persuadir.
- Renegada me abandonou... - murmurou Arthur.
- Isso não é verdade! - exclamou Maria entre cochichos - saia daqui!
- Eu quero escutar tudo. - afirmou Arthur.
- Você só tem dez anos! - exclamou Tatiih - vamos sair daqui, você querendo ou não!
- Não!
A última fala não foi mais cochichada, foi um grito que fez todos se calarem.
A juíza levantou a cabeça, com um olhar agudamente penetrante:
- Quem está gritando?
Gika e Vê que estavam no julgamento, perto de Siih, cochicharam:
- Devem ser o pessoal das Campinas...
Lynda estava escondida sob o capuz, e se levantou.
- Acho melhor você sair... - disse para Arthur.
- Quem é você? - perguntou Arthur.
- Você não precisa saber... - murmurou Lynda erguendo só um pouco do seu capuz, deixando Arthur visualizar o brilho maldoso dos seus olhos e sentir um frio na espinha - só precisa sair. Sabe, crianças não devem vir a julgamentos.
- E-eu...
- Vá embora. - disse Lynda.
Arthur calou a boca e consentiu, e foi embora com Tatiih e Umrae. Raveneh queria ir junto, não queria mais escutar tudo aquilo, porém foi obrigada a ficar, pois era a vítima da tentativa de sequestro, portanto testemunha dos crimes do Rei.
Lynda se sentou novamente e olhou para a irmã, que sorriu. Obrigada, irmã... Não posso deixar que meu filho veja o acontecerá a seguir...
- Deseja falar algo, senhorita Mycil Regallian? - indagou a juíza, vendo que a Renegada levantara a mão direita.
- Sim. - respondeu Renegada.
- Agora? - murmurou Ruronna - adiantou em uma semana... esperta, você!
- Cale a boca - cochichou Renegada.
- Permito que fale, senhorita - disse a juíza com o seu sorriso leve e eterno.
Renegada se levantou. Agradeceu por terem tirado seu filho dali, pois não queria que ele ficasse traumatizado para o resto da sua vida. Estava com tanto medo de que as coisas dessem errado...
Eu não consegui ficar em paz
Eu estava sempre me perturbando
Remoendo meus pecados
- Eu... - murmurou Renegada sem olhar para ninguém - eu não sei o que falar... Mas primeiro... o-obrigada... por tirarem meu filho daqui... Eu não suportaria ver-lo...
- Estúpida - murmurou Lynda para si - ela sempre foi tão sentimental...
O sol começava a se esconder atrás das nuvens, como se estivesse prevendo um triste fim.
Eu não consegui ficar em paz
Eu precisava de você
Mas você...
Você me traiu...
- Para mim, o resultado do julgamento pouco importa - continuou Renegada, enquanto todos permaneciam em silêncio - o resultado não mudará o meu destino. Geralmente, fadas como eu são orgulhosas. E o meu destino não era nem um pouco agradável... Eu consegui ver.
- Fadas das trevas podem prever o futuro? - perguntou Fer.
- A-acho que sim... - gaguejou Raveneh pasma. O que Renegada estava querendo dizer?
- Calvin... - disse Renegada contendo a fúria na sua voz - foi realmente uma estupidez ter tirado de mim a única razão para eu viver. Uma estupidez que você julgou inteligente. Presumiu que eu era sentimental, que eu não tentaria nada. Mas não sabe nada do ódio que pode existir no coração de uma mulher.
Eu não conseguia ficar em paz
Pois eu precisava de você
Mas você foi embora, me traiu
Agora já consegui levantar sozinha
Não preciso mais da sua ajuda!
- O que está dizendo? - indagou o Rei. Não conseguia entender muito, mas sentia um frio na espinha.
- Você achou que eu estava presa porque o amava. - disse Renegada com um frio sorriso - mas eu estava presa porque eu sabia que você não hesitaria em machucar Arthur, se necessário. É o pior tipo de gente para amar...
- Eu preciso voltar para o julgamento... - exclamava Arthur.
- Não! - disse Tatiih - você não precisa e não deve!
- Sim! - concordou Umrae - agora beba a água!
Ninguém escutava nada através da porta, o que era um alívio.
- Ruronna veio. - disse Renegada.
- R-Ruronna... s-sua muijiid...? - o Rei sempre temera esse momento.
- Sim. - disse Renegada - se não estou enganada... você sempre teve medo disso, não é? Por que aí eu perderia o medo e faria o que tinha vontade há muito tempo... você me subestimou, Calvin...
- Mas... - disse Calvin - só porque Ruronna veio, não quer dizer que...
- Uma semana não é nada para mim - riu Renegada friamente - acho melhor adiantar o serviço... Dói menos.
A juíza não conseguia interromper a discussão.
Ninguém conseguia.
Estavam todos paralisados, até mesmo o sol se escondera e o tempo se nublou, ameaçando chuva.
Corra, pode correr
Agora não preciso mais de você
Mas eu já quero experimentar
O sabor da vitória
Deixe-me experimentar
O sabor da vingança
- Céus... - dizia Lynda. - Mycil vai fazer o que estou pensando?
Raveneh escutara o que a Lynda dissera.
- Do que está falando? - perguntou.
- Veja... - disse Lynda.
Renegada simplesmente saltou sobre a mesa. E as correntes...
Bem, ela arrastara as correntes consigo.
- Calvin - ela disse em cima da mesa - não me interessa. É uma vergonha morrer estupidamente nas mãos de um homem tolo, as vésperas da morte! Você acha que não sei? Uma semana... um dia antes de me executar... Como se eu não conseguisse ler a sua aura!
- Espere... - murmurou Raveneh - o Rei de Heppaceneoh...
- ... estava planejando um modo de matar a Renegada... - continuou Fer.
- ... e ela descobriu tudo? - Kibii completou - ah, mas... como?
- Mycil não é uma estúpida - Lynda riu sarcasticamente - sempre foi boa em saber o que os outros pretendiam.
- Quem é você? - indagou Kibii vendo a estranha encapuzada.
- Digamos que eu conheço Mycil desde muito pequena... - disse Lynda.
- Wow... - murmurou Raveneh - então Renegada conseguiu descobrir que o Rei pretendia matar-la. E aí?
- E aí não sei...
O céu se nublara completamente, e o aposento tornou-se escuro.
Vá e fuja
Corra o quanto puder
Saiba que eu vou te alcançar
Pois a raiva se tornou as minhas asas...
- Não vou perder tempo fazendo um discurso - disse Renegada - mas só lhe direi... você me subestimou.
Ela tinha um olhar frio.
Ele tinha um olhar desesperado, gelado de medo.
Todos estavam apreensivos, sem entender o que se passava ali. O que a Renegada pretendia?, era a pergunta que passava pela mente de qualquer um ali. Lynda mordeu o lábio inferior. Idiota! Nunca conseguiu fazer isso... pensava.
Renegada olhou para Raveneh com ternura, e disse:
- Não se esqueça de distribuir meus pertences para Arthur. Por favor.
- Mas você vai sair inocente... - murmurou Raveneh.
- Sim, vou... - disse Renegada com um sorriso - mas meu destino já foi escrito e só poderei adiar.
Não! gritou Lynda mentalmente. Mycil, não!
- Vossa Majestade de Heppaceneoh... - murmurou Renegada - o que deseja escrito em sua lápide?
Todos emitiram um murmúrio.
- L-lápide? - gaguejou o Rei - e-eu...
- Sim, e diga logo! - Renegada estava outra vez fria como sempre - eu não tenho o dia inteiro!
- E-eu... - o Rei não conseguia acreditar no que ouvia. Mas tinha que admitir que esse dia chegaria, de um modo ou outro.
- Eu te odeio! - gritou Renegada.
- Kycci, querida... - riu o Rei - vai ficar aqui até a morte! Vai morrer presa a mim!
- Quando Ruronna chegar...
Agora estavam ali, dias, meses, anos depois. Renegada havia prometido.
- Quando Ruronna chegar...
- E-eu...
- Quando Ruronna chegar...
- Já que é assim... - disse Renegada - arranjem qualquer coisa para a lápide de Calvin. Pois o seu tempo acabou.
- Não... - sussurrou o Rei sentindo seu coração batendo cada vez mais devagar, como se as forças estivessem lhe abandonando lentamente.
- Quando Ruronna chegar...
- Não... - o Rei tinha que admitir que Renegada vencera a guerra que existia desde que os dois se conheceram.
Suas pernas deixaram de se mover, e ele não conseguia mais respirar.
Era como se tivesse alguém apertando a sua garganta, tentando matar-lo com um estrangulamento.
O Rei olhou para a ex-amante, e a viu como nunca vira antes.
Uma verdadeira fada das trevas.
Tinha que admitir que fora estúpido. O fato de Renegada ser o tipo de fada das trevas sentimental não queria dizer que ela não fosse capaz de matar alguém, se necessário.
Eu vou te alcançar
E sua cabeça será o meu troféu
Oh sim
Sua traição foi longe demais
Ameaçou aqueles que eu amo...
- Quando Ruronna chegar...
- Já é tarde demais... - disse Renegada - seu coração não está aguentando mais, seu pescoço está sendo comprimido, e nem suas pernas ou suas mãos conseguem se mover. É tarde demais.
- V-vadia...
- Quando Ruronna chegar...
eu lhe matarei!
O Rei fechou os olhos, jogando a cabeça pra trás.
- Ainda não está bom... - murmurou Renegada - ainda não consigo me sentir satisfeita...
O Rei deu um frio sorriso, e descansou a cabeça na mesa. Aparentemente, ainda respirava. Renegada balançava a cabeça, como se não tivesse ficado bem com aquilo. Seu olhar era gélido, o que impediu Raveneh de gritar. O que impediu qualquer um de gritar.
Renegada saltou sobre a mesa, e ficou de pé diante do Rei.
- Para uma boa morte... - disse - tem que haver sangue!
Vá! Corra!
Mas vou chegar a ti
Se esconda, não adianta
Pois eu vou te encontrar...
Ninguém lembrou do que ocorrera em seguida. Ou melhor, ninguém quis lembrar.
Alguns fecharam os olhos, outros ficaram vidrados e conseguiram esquecer pouco a pouco.
Mas o que se lembram de algo como Lynda ou a juíza disseram que Renegada conseguira ferir o Rei sem precisar das mãos. Ela fizera vários cortes pelo corpo, e o sangue pingou no chão.
Raveneh conseguiu gritar. O sangue lhe parecia demasiado familiar.
- Me ajude, Raveneh... - suplicara a irmã.
- O que tentou fazer? Se matar? Não queria morrer? Então morra sozinha...
- N-não... p-por favor, Raveneh, eu não queria morrer...
- Matar é o mesmo que desejar a morte. Descanse em paz, Catherine...
- P-por favor...
Raveneh não conseguiu olhar por muito tempo. Renegada matou o pai do seu filho... uma voz ecoava na sua cabeça Renegada matou alguém... Mas que diálogo era esse que passava em sua mente? Parecia perder a consciência pouco a pouco, e logo retomava. Catherine? Por que lembrou-se de sangue. De pés sujos de sangue.
De um sorriso frio, de um lamento perdido no passado...
Se arrependimento matasse...
- Adeus.
- Peguem-na! Cometeu um assassinato! - gritou a juíza.
As fadas não conseguiram alcançar-la. Renegada deu um salto, e chegou rapidamente a janela. Lynda sufocou o choro, e gritou desesperadamente:
- Mycil!
Renegada escutou, porém não deu atenção. Tinha que fazer-lo logo. Quando seu muijiid vem... tudo o que lhe resta é esperar ou adiar o destino...
- R-renegada - gaguejou Fer - você vai fugir?
- Pior... - Kibii murmurou pasma - ela vai se matar!
- Não...
- Pare...
- Peguem-na!
- Parem...
- Peguem-na!
- Pare, por favor, pare, Renegada... fuja, mas não se mate...
- Se pular dessa janela, morrerá, senhorita Mycil Regallian - disse a juíza suplicante - existe um encantamento que impede as pessoas de voar...
- Eu sei... - disse Renegada - eu sei disso. - chorou.
E pulou.
Eu vou te alcançar
E com a minha morte, pagarei o seu castigo...
Nem que tenha que morrer...
Vou vingar a sua traição...
Não demorou muito, se escutou o baque.
Renegada estava morta.
Todos estavam dispostos em fileiras bem assentadas, diante de uma juíza com cabelos lisos e loiros, e olhos redondos, amigáveis e cor-de-mel.
Quatro fadas com os braços desnudos e olhares sérios vieram, com o Rei de cabeça erguida entre elas. Raveneh percebeu que ele estava acorrentado em correntes de ferro, que todas as quatro seguravam.
- P-papai... - murmurou Arthur.
Era a primeira vez que Raveneh e o pessoal das Campinas o viram tão cabisbaixo. Mas, realmente, a não ser que você odeie profundamente seu pai, é um soco no estômago ver seu pai preso, julgado e muito provavelmente condenado.
- Vai sair tudo bem... - tranquilizou Raveneh, embora ela soubesse que o resultado do julgamento ia ser a morte.
- Tragam a prisioneira!
Outras quatro fadas de olhos sérios vieram, dessa vez com a Renegada acorrentada no meio do quarteto.
- R-Renegada... - murmurou Raveneh.
Lembrou-se do dia em que conheceu Renegada. No dia ela era baixinha como ela, mas no decorrer do tempo, ela se equiparou a uma mulher normal em altura. Provavelmente era encanto, porque pesquisara uma vez e descobrira que fadas das trevas não costumam ser baixinhas.
Ela era um doce de menina, e cantara com ela...
Nunca suspeitara que ela tivesse algum envolvimento com o Rei...
- Olha lá a Lala! - exclamou Kibii que estava sentada ao lado de Raveneh - ela está tão preocupada!...
- Deve ter descoberto coisas chocantes! - palpitou Fer - e vai ter que contar tudo hoje...
- O Rei parece tranquilo - murmurou Kibii - Renegada também. Ah, mas ela vai sair inocente!
Lynda estava sentada uma fileira atrás de Raveneh, e ainda tinha uma excelente audição que lhe permitia escutar todos os comentários no tribunal. Ruronna está aqui. dizia para si. Ruronna veio, e isso quer dizer que não importa o que Mycil faça, já era...
Conseguiu engolir seus soluços.
Aguardou.
- Eu me chamo Clah Alfacce - disse a juíza com um leve sorriso pelo rosto. Parecia uma dessas pessoas que sempre estão contentes com a vida, mesmo que aconteça uma guerra, mesmo que criancinhas estejam sendo assassinadas na sua frente, mesmo que um inocente seja condenado. A juíza parecia estar sempre feliz, com um sorriso no rosto - e serei a juíza neste presente e duplo julgamento. O Rei Calvin Mo, que reina sobre Heppaceneoh, foi detido por crimes como tentativa de sequestro contra a Senhorita Raveneh, que implica em quebra de Tratado. Também cometeu o crime de ameaçar o céu das Campinas, e tentar invadir as Campinas, mesmo isso implicando que o Tratado Campinas-Heppaceneoh, feito há dez anos atrás, seja quebrado. Já a Mycil Regallian está detida sobre o crime de ser cúmplice do Rei Calvin Mo.
- Mycil Regallian? - Fer indagou, surpresa.
- Você não achava que ela se chamava Renegada mesmo, achava? - riu Umrae.
Tatiih concordou, e completou com o seu conhecimento de história:
- "Renegada" é um título que muitas pessoas costumam usar, quando são banidas de seus lares e coisas assim. E são obrigadas a se apresentar assim, geralmente. Porém creio que a Renegada resolveu utilizar esse título em vez do seu nome, porque ela não estava na terra dela...
- Ah. - Fer mordeu o lábio inferior.
- Ela já foi lá pra casa brigar com papai... - resmungou Arthur - ela é uma chata de primeira! Papai disse que ela é má.
- Não! - escandalizou-se Raveneh - Renegada não é a vilã aqui! Ela é muito boa e gosta muito de você! O seu pai a odeia, por isso tenta fazer com que você a odeie também!
- Hmpf. - fez Arthur.
A juíza pigarreou.
- Rei Calvin Mo de Heppaceneoh, se diz inocente ou culpado? - perguntou.
- Inocente, claro. - disse o Rei - embora eu tenha cometido os crimes e...
- Mycil Regallian, conhecida como Renegada, se diz inocente ou culpada? - interrompeu a juíza.
- Inocente! - exclamou Renegada.
Siih estava sentada ao lado da juíza, em uma cadeira especial. Vestia um longo vestido azul-marinho, muito escuro. Estava bastante interessada no julgamento.
Lefi estava sentado ao lado da irmã, e com uma maleta de socorros, afinal Siih viera ao julgamento mesmo ainda não estando recuperada totalmente...
- Pois bem... - disse a juíza - por favor, senhorita Lallyn...
- Sim! - exclamou Lala sorridente, com seus cabelos laranja.
- O nome de Lala é Lallyn? - exclamou Kibii pasma - ahah, que nome de princesa!
- É bonito. - disse Arthur - ela é bem bonita!
- AH! - riu Fer - você é um pirralho, e já acha que a senhorita Lallyn se interessará em você?!
- Eu não disse isso! - resmungou Arthur ficando muito vermelho de repente.
- Ah, que bonitinho, ele ficou vermelho! - cochichou Raveneh entre risos.
Todos riram, deixando Arthur muito sem graça.
- Pois bem, senhorita Lallyn Sakamoto - disse a juíza - por favor, apresente os depoimentos que acusam o Rei Mo.
- Sim! - concordou Lala e pôs um monte de papéis em cima da mesa.
- Sakamoto? - murmurou Tatiih - Sakamoto é uma antiga família que sempre...
- Aquela que gerava só filho que ia pra guerra? - completou Fer - sim, Lala é a última herdeira dessa família! Lallyn Sakamoto! Que chique, ela tem ascendência nobre *o*
Todos riram, inclusive Arthur.
O julgamento prosseguia, entediante.
Lala dizia o que ia contra e a favor do Rei, e repetia o mesmo a Renegada.
Quando chegaram a parte de dez anos atrás, Raveneh e seus amigos das Campinas se arrependeram profundamente de terem arrastado Arthur de lá. Antes não tivessem trago Arthur!
- Então você teve um filho com o Rei Calvin Mo? - indagou a juíza Clah.
Raveneh estava estarrecida, Fer, Kibii, Tatiih, Umrae, todos estavam profundamente chocados.
Mas Arthur era quem mais mostrava sinais de choque.
Eu sou o filho de Renegada... repetia a si mesmo, confuso eu sou filho de verdade do papai. Eu não sou adotivo, eu realmente...
- Tire-o daqui! - disse Maria com rispidez - Arthur não deve ouvir tudo! Eu mesma não sei a história, mas Lala acabou de me pedir para que tirasse Arthur daqui!
- E-e-está bem! - murmurou Raveneh chocada - Arthur, vamos...
- Não.
- Vamos! Veja, precisamos beber água e...
As vozes eram sussurradas para não atrapalhar o julgamento.
- A-Arthur, não precisamos mais ficar aqui... - Fer tentou persuadir.
- Renegada me abandonou... - murmurou Arthur.
- Isso não é verdade! - exclamou Maria entre cochichos - saia daqui!
- Eu quero escutar tudo. - afirmou Arthur.
- Você só tem dez anos! - exclamou Tatiih - vamos sair daqui, você querendo ou não!
- Não!
A última fala não foi mais cochichada, foi um grito que fez todos se calarem.
A juíza levantou a cabeça, com um olhar agudamente penetrante:
- Quem está gritando?
Gika e Vê que estavam no julgamento, perto de Siih, cochicharam:
- Devem ser o pessoal das Campinas...
Lynda estava escondida sob o capuz, e se levantou.
- Acho melhor você sair... - disse para Arthur.
- Quem é você? - perguntou Arthur.
- Você não precisa saber... - murmurou Lynda erguendo só um pouco do seu capuz, deixando Arthur visualizar o brilho maldoso dos seus olhos e sentir um frio na espinha - só precisa sair. Sabe, crianças não devem vir a julgamentos.
- E-eu...
- Vá embora. - disse Lynda.
Arthur calou a boca e consentiu, e foi embora com Tatiih e Umrae. Raveneh queria ir junto, não queria mais escutar tudo aquilo, porém foi obrigada a ficar, pois era a vítima da tentativa de sequestro, portanto testemunha dos crimes do Rei.
Lynda se sentou novamente e olhou para a irmã, que sorriu. Obrigada, irmã... Não posso deixar que meu filho veja o acontecerá a seguir...
- Deseja falar algo, senhorita Mycil Regallian? - indagou a juíza, vendo que a Renegada levantara a mão direita.
- Sim. - respondeu Renegada.
- Agora? - murmurou Ruronna - adiantou em uma semana... esperta, você!
- Cale a boca - cochichou Renegada.
- Permito que fale, senhorita - disse a juíza com o seu sorriso leve e eterno.
Renegada se levantou. Agradeceu por terem tirado seu filho dali, pois não queria que ele ficasse traumatizado para o resto da sua vida. Estava com tanto medo de que as coisas dessem errado...
Eu não consegui ficar em paz
Eu estava sempre me perturbando
Remoendo meus pecados
- Eu... - murmurou Renegada sem olhar para ninguém - eu não sei o que falar... Mas primeiro... o-obrigada... por tirarem meu filho daqui... Eu não suportaria ver-lo...
- Estúpida - murmurou Lynda para si - ela sempre foi tão sentimental...
O sol começava a se esconder atrás das nuvens, como se estivesse prevendo um triste fim.
Eu não consegui ficar em paz
Eu precisava de você
Mas você...
Você me traiu...
- Para mim, o resultado do julgamento pouco importa - continuou Renegada, enquanto todos permaneciam em silêncio - o resultado não mudará o meu destino. Geralmente, fadas como eu são orgulhosas. E o meu destino não era nem um pouco agradável... Eu consegui ver.
- Fadas das trevas podem prever o futuro? - perguntou Fer.
- A-acho que sim... - gaguejou Raveneh pasma. O que Renegada estava querendo dizer?
- Calvin... - disse Renegada contendo a fúria na sua voz - foi realmente uma estupidez ter tirado de mim a única razão para eu viver. Uma estupidez que você julgou inteligente. Presumiu que eu era sentimental, que eu não tentaria nada. Mas não sabe nada do ódio que pode existir no coração de uma mulher.
Eu não conseguia ficar em paz
Pois eu precisava de você
Mas você foi embora, me traiu
Agora já consegui levantar sozinha
Não preciso mais da sua ajuda!
- O que está dizendo? - indagou o Rei. Não conseguia entender muito, mas sentia um frio na espinha.
- Você achou que eu estava presa porque o amava. - disse Renegada com um frio sorriso - mas eu estava presa porque eu sabia que você não hesitaria em machucar Arthur, se necessário. É o pior tipo de gente para amar...
- Eu preciso voltar para o julgamento... - exclamava Arthur.
- Não! - disse Tatiih - você não precisa e não deve!
- Sim! - concordou Umrae - agora beba a água!
Ninguém escutava nada através da porta, o que era um alívio.
- Ruronna veio. - disse Renegada.
- R-Ruronna... s-sua muijiid...? - o Rei sempre temera esse momento.
- Sim. - disse Renegada - se não estou enganada... você sempre teve medo disso, não é? Por que aí eu perderia o medo e faria o que tinha vontade há muito tempo... você me subestimou, Calvin...
- Mas... - disse Calvin - só porque Ruronna veio, não quer dizer que...
- Uma semana não é nada para mim - riu Renegada friamente - acho melhor adiantar o serviço... Dói menos.
A juíza não conseguia interromper a discussão.
Ninguém conseguia.
Estavam todos paralisados, até mesmo o sol se escondera e o tempo se nublou, ameaçando chuva.
Corra, pode correr
Agora não preciso mais de você
Mas eu já quero experimentar
O sabor da vitória
Deixe-me experimentar
O sabor da vingança
- Céus... - dizia Lynda. - Mycil vai fazer o que estou pensando?
Raveneh escutara o que a Lynda dissera.
- Do que está falando? - perguntou.
- Veja... - disse Lynda.
Renegada simplesmente saltou sobre a mesa. E as correntes...
Bem, ela arrastara as correntes consigo.
- Calvin - ela disse em cima da mesa - não me interessa. É uma vergonha morrer estupidamente nas mãos de um homem tolo, as vésperas da morte! Você acha que não sei? Uma semana... um dia antes de me executar... Como se eu não conseguisse ler a sua aura!
- Espere... - murmurou Raveneh - o Rei de Heppaceneoh...
- ... estava planejando um modo de matar a Renegada... - continuou Fer.
- ... e ela descobriu tudo? - Kibii completou - ah, mas... como?
- Mycil não é uma estúpida - Lynda riu sarcasticamente - sempre foi boa em saber o que os outros pretendiam.
- Quem é você? - indagou Kibii vendo a estranha encapuzada.
- Digamos que eu conheço Mycil desde muito pequena... - disse Lynda.
- Wow... - murmurou Raveneh - então Renegada conseguiu descobrir que o Rei pretendia matar-la. E aí?
- E aí não sei...
O céu se nublara completamente, e o aposento tornou-se escuro.
Vá e fuja
Corra o quanto puder
Saiba que eu vou te alcançar
Pois a raiva se tornou as minhas asas...
- Não vou perder tempo fazendo um discurso - disse Renegada - mas só lhe direi... você me subestimou.
Ela tinha um olhar frio.
Ele tinha um olhar desesperado, gelado de medo.
Todos estavam apreensivos, sem entender o que se passava ali. O que a Renegada pretendia?, era a pergunta que passava pela mente de qualquer um ali. Lynda mordeu o lábio inferior. Idiota! Nunca conseguiu fazer isso... pensava.
Renegada olhou para Raveneh com ternura, e disse:
- Não se esqueça de distribuir meus pertences para Arthur. Por favor.
- Mas você vai sair inocente... - murmurou Raveneh.
- Sim, vou... - disse Renegada com um sorriso - mas meu destino já foi escrito e só poderei adiar.
Não! gritou Lynda mentalmente. Mycil, não!
- Vossa Majestade de Heppaceneoh... - murmurou Renegada - o que deseja escrito em sua lápide?
Todos emitiram um murmúrio.
- L-lápide? - gaguejou o Rei - e-eu...
- Sim, e diga logo! - Renegada estava outra vez fria como sempre - eu não tenho o dia inteiro!
- E-eu... - o Rei não conseguia acreditar no que ouvia. Mas tinha que admitir que esse dia chegaria, de um modo ou outro.
- Eu te odeio! - gritou Renegada.
- Kycci, querida... - riu o Rei - vai ficar aqui até a morte! Vai morrer presa a mim!
- Quando Ruronna chegar...
Agora estavam ali, dias, meses, anos depois. Renegada havia prometido.
- Quando Ruronna chegar...
- E-eu...
- Quando Ruronna chegar...
- Já que é assim... - disse Renegada - arranjem qualquer coisa para a lápide de Calvin. Pois o seu tempo acabou.
- Não... - sussurrou o Rei sentindo seu coração batendo cada vez mais devagar, como se as forças estivessem lhe abandonando lentamente.
- Quando Ruronna chegar...
- Não... - o Rei tinha que admitir que Renegada vencera a guerra que existia desde que os dois se conheceram.
Suas pernas deixaram de se mover, e ele não conseguia mais respirar.
Era como se tivesse alguém apertando a sua garganta, tentando matar-lo com um estrangulamento.
O Rei olhou para a ex-amante, e a viu como nunca vira antes.
Uma verdadeira fada das trevas.
Tinha que admitir que fora estúpido. O fato de Renegada ser o tipo de fada das trevas sentimental não queria dizer que ela não fosse capaz de matar alguém, se necessário.
Eu vou te alcançar
E sua cabeça será o meu troféu
Oh sim
Sua traição foi longe demais
Ameaçou aqueles que eu amo...
- Quando Ruronna chegar...
- Já é tarde demais... - disse Renegada - seu coração não está aguentando mais, seu pescoço está sendo comprimido, e nem suas pernas ou suas mãos conseguem se mover. É tarde demais.
- V-vadia...
- Quando Ruronna chegar...
eu lhe matarei!
O Rei fechou os olhos, jogando a cabeça pra trás.
- Ainda não está bom... - murmurou Renegada - ainda não consigo me sentir satisfeita...
O Rei deu um frio sorriso, e descansou a cabeça na mesa. Aparentemente, ainda respirava. Renegada balançava a cabeça, como se não tivesse ficado bem com aquilo. Seu olhar era gélido, o que impediu Raveneh de gritar. O que impediu qualquer um de gritar.
Renegada saltou sobre a mesa, e ficou de pé diante do Rei.
- Para uma boa morte... - disse - tem que haver sangue!
Vá! Corra!
Mas vou chegar a ti
Se esconda, não adianta
Pois eu vou te encontrar...
Ninguém lembrou do que ocorrera em seguida. Ou melhor, ninguém quis lembrar.
Alguns fecharam os olhos, outros ficaram vidrados e conseguiram esquecer pouco a pouco.
Mas o que se lembram de algo como Lynda ou a juíza disseram que Renegada conseguira ferir o Rei sem precisar das mãos. Ela fizera vários cortes pelo corpo, e o sangue pingou no chão.
Raveneh conseguiu gritar. O sangue lhe parecia demasiado familiar.
- Me ajude, Raveneh... - suplicara a irmã.
- O que tentou fazer? Se matar? Não queria morrer? Então morra sozinha...
- N-não... p-por favor, Raveneh, eu não queria morrer...
- Matar é o mesmo que desejar a morte. Descanse em paz, Catherine...
- P-por favor...
Raveneh não conseguiu olhar por muito tempo. Renegada matou o pai do seu filho... uma voz ecoava na sua cabeça Renegada matou alguém... Mas que diálogo era esse que passava em sua mente? Parecia perder a consciência pouco a pouco, e logo retomava. Catherine? Por que lembrou-se de sangue. De pés sujos de sangue.
De um sorriso frio, de um lamento perdido no passado...
Se arrependimento matasse...
- Adeus.
- Peguem-na! Cometeu um assassinato! - gritou a juíza.
As fadas não conseguiram alcançar-la. Renegada deu um salto, e chegou rapidamente a janela. Lynda sufocou o choro, e gritou desesperadamente:
- Mycil!
Renegada escutou, porém não deu atenção. Tinha que fazer-lo logo. Quando seu muijiid vem... tudo o que lhe resta é esperar ou adiar o destino...
- R-renegada - gaguejou Fer - você vai fugir?
- Pior... - Kibii murmurou pasma - ela vai se matar!
- Não...
- Pare...
- Peguem-na!
- Parem...
- Peguem-na!
- Pare, por favor, pare, Renegada... fuja, mas não se mate...
- Se pular dessa janela, morrerá, senhorita Mycil Regallian - disse a juíza suplicante - existe um encantamento que impede as pessoas de voar...
- Eu sei... - disse Renegada - eu sei disso. - chorou.
E pulou.
Eu vou te alcançar
E com a minha morte, pagarei o seu castigo...
Nem que tenha que morrer...
Vou vingar a sua traição...
Não demorou muito, se escutou o baque.
Renegada estava morta.
Parte 68 - Promessa.
- Você gostaria de falar com a Renegada, Raveneh? - indagou Maria com um leve sorriso no rosto.
- Posso? - exclamou Raveneh alegre - desde que voltei do castelo não falei mais com ela!
- Sim! - Maria sorriu, apontando uma porta - vá por ali e fale com a recepcionista.
- Obrigada... - murmurou Raveneh - isso tudo está sendo tão estranho pra mim. Eu ainda nem entendi direito porque Renegada foi presa.
- Ela poderá lhe explicar. - disse Maria.
Raveneh sorriu.
--------------------------
- Odeio a Raveneh! - Arthur embirrava - ela é uma vaca velha!
- Schiiii! - repreendeu Kibii - não se fala alto deste jeito, menino! Não tá em casa não!
- E eu com isso? - Arthur deu a língua - ela é uma cadela feia, isso sim! Eu sempre desconfiei daquela chata. Mentirosa, isso que ela é.
- Cale. A. Boca! - Fer disse com rispidez.
- Hmpppppppppppppppf!!!! - resmungou o menino mais uma vez.
Todos suspiraram. A sala de espera para o julgamento era abafada, e as paredes eram pintadas em um tom bastante monotóno de verde. As fadas tinham fama por suas belas construções, mas definitivamente aquela sala de espera não estava incluída nas mais "belas construções feitas pelas fadas".
--------------------------
- Raveneh! - exclamou Renegada, surpresa.
- Wow-wow - murmurou Raveneh com um sorriso - primeira vez que te vejo desde que saí daquele castelo, não é?
- Acho que sim... - respondeu Renegada - mal você voltou, eu fui embora...
- Bem, não é hora pra dramas! - disse Raveneh - sabe que te apoiarei mesmo que você seja culpada... Mas... de que crime te acusam?
Renegada mordeu o lábio inferior, receosa. Mas preferiu dizer a verdade:
- Fui enviada do Rei para espionar as Campinas.
- Então quer dizer que o nosso encontro foi fajuto? - indagou Raveneh piscando os olhos, surpresa.
- Mais ou menos isso... Mas...
- Wow... eu gostei do Rei, então... - riu Raveneh - me fez conhecer você!
Renegada sorriu. Tinha se esquecido de como Raveneh era inocente, mesmo com a sua aura perturbada...
- Tenho certeza que sairá inocente, certo? - disse Raveneh - e...
Calou-se ao olhar nos olhos de Renegada que estavam frios.
- Raveneh.
Renegada controlou o choro, e disse, respirando fundo:
- Você está com as minhas coisas. Tem muitas coisas valiosas lá. Eu tenho um medalhão... Tem um "R"... Eu quero que o dê para Arthur.
- Arthur? - Raveneh ficou surpresa. Ninguém sabia da relação entre o Rei e Renegada, somente Lala que por ética profissional, não contara pra ninguém.
- Você entenderá mais tarde... - Renegada não tinha coragem para contar sobre o Arthur... mas se sentia uma falsa completa não contando pra Raveneh - você vai entender... e... por favor, dê?
- Sim, darei o medalhão pra aquele pirralho... - murmurou Raveneh pasma - m-mas... ele está lá fora...
- Não falarei com ele... - disse Renegada.
Sentia que se visse Arthur, seu coração iria amolecer e ia tornar tudo mais difícil.
- E-está bem... - Raveneh disse - mas enfim... você vai inocente, tenho certeza.
- Eu também - Renegada sorriu - Raveneh, aconteça o que acontecer... por favor, nunca me ache falsa.
- Te achar falsa? - Raveneh riu - por quê? Por causa da história de espionar Campinas? Bem, eu acho que é mentira!
- Exatamente... - disse Renegada. - não é totalmente mentira... mas me prometa isso? Só isso?
- Sim... Renegada...
- Seu tempo acabou. - disse uma voz extremamente aguda que ecoou pelo quarto. Raveneh contorceu o rosto em uma careta, e foi embora.
Ruronna sorria.
- Vai ser agora? - perguntou entre risinhos abafados.
- Sim - Renegada respondeu.
Uma lágrima desceu pelo seu rosto.
- Posso? - exclamou Raveneh alegre - desde que voltei do castelo não falei mais com ela!
- Sim! - Maria sorriu, apontando uma porta - vá por ali e fale com a recepcionista.
- Obrigada... - murmurou Raveneh - isso tudo está sendo tão estranho pra mim. Eu ainda nem entendi direito porque Renegada foi presa.
- Ela poderá lhe explicar. - disse Maria.
Raveneh sorriu.
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- Odeio a Raveneh! - Arthur embirrava - ela é uma vaca velha!
- Schiiii! - repreendeu Kibii - não se fala alto deste jeito, menino! Não tá em casa não!
- E eu com isso? - Arthur deu a língua - ela é uma cadela feia, isso sim! Eu sempre desconfiei daquela chata. Mentirosa, isso que ela é.
- Cale. A. Boca! - Fer disse com rispidez.
- Hmpppppppppppppppf!!!! - resmungou o menino mais uma vez.
Todos suspiraram. A sala de espera para o julgamento era abafada, e as paredes eram pintadas em um tom bastante monotóno de verde. As fadas tinham fama por suas belas construções, mas definitivamente aquela sala de espera não estava incluída nas mais "belas construções feitas pelas fadas".
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- Raveneh! - exclamou Renegada, surpresa.
- Wow-wow - murmurou Raveneh com um sorriso - primeira vez que te vejo desde que saí daquele castelo, não é?
- Acho que sim... - respondeu Renegada - mal você voltou, eu fui embora...
- Bem, não é hora pra dramas! - disse Raveneh - sabe que te apoiarei mesmo que você seja culpada... Mas... de que crime te acusam?
Renegada mordeu o lábio inferior, receosa. Mas preferiu dizer a verdade:
- Fui enviada do Rei para espionar as Campinas.
- Então quer dizer que o nosso encontro foi fajuto? - indagou Raveneh piscando os olhos, surpresa.
- Mais ou menos isso... Mas...
- Wow... eu gostei do Rei, então... - riu Raveneh - me fez conhecer você!
Renegada sorriu. Tinha se esquecido de como Raveneh era inocente, mesmo com a sua aura perturbada...
- Tenho certeza que sairá inocente, certo? - disse Raveneh - e...
Calou-se ao olhar nos olhos de Renegada que estavam frios.
- Raveneh.
Renegada controlou o choro, e disse, respirando fundo:
- Você está com as minhas coisas. Tem muitas coisas valiosas lá. Eu tenho um medalhão... Tem um "R"... Eu quero que o dê para Arthur.
- Arthur? - Raveneh ficou surpresa. Ninguém sabia da relação entre o Rei e Renegada, somente Lala que por ética profissional, não contara pra ninguém.
- Você entenderá mais tarde... - Renegada não tinha coragem para contar sobre o Arthur... mas se sentia uma falsa completa não contando pra Raveneh - você vai entender... e... por favor, dê?
- Sim, darei o medalhão pra aquele pirralho... - murmurou Raveneh pasma - m-mas... ele está lá fora...
- Não falarei com ele... - disse Renegada.
Sentia que se visse Arthur, seu coração iria amolecer e ia tornar tudo mais difícil.
- E-está bem... - Raveneh disse - mas enfim... você vai inocente, tenho certeza.
- Eu também - Renegada sorriu - Raveneh, aconteça o que acontecer... por favor, nunca me ache falsa.
- Te achar falsa? - Raveneh riu - por quê? Por causa da história de espionar Campinas? Bem, eu acho que é mentira!
- Exatamente... - disse Renegada. - não é totalmente mentira... mas me prometa isso? Só isso?
- Sim... Renegada...
- Seu tempo acabou. - disse uma voz extremamente aguda que ecoou pelo quarto. Raveneh contorceu o rosto em uma careta, e foi embora.
Ruronna sorria.
- Vai ser agora? - perguntou entre risinhos abafados.
- Sim - Renegada respondeu.
Uma lágrima desceu pelo seu rosto.
Parte 67 - Laços de sangue.
É verdade que virou tragédia
É verdade que não deu certo
Mas...
... se não for você, quem mais vai no seu lugar?
Raveneh estava de pé, pensativa, com pensamentos voando longe.
Estava diante da porta do quarto onde Arthur vivia, e não saía dali pra nada.
- Arthur! - gritou.
- O que é? - uma voz de criança gritou de volta, agressivo.
- Vamos ao julgamento - disse Raveneh em um tom mais baixo - seu pai está lá. Vamos agora.
- Eu não quero ir! - Arthur disse esganiçado.
- Não é questão de querer - retrucou Raveneh - é questão de ir. Você tem três segundos para abrir a porta.
- Eu não vou!
- Um.
- Não vou, não vou, não vou e não vou!
- Dois.
- É surda? EU NÃO VOU!
- Três.
- Eu não vou!
- Você vai sim. Sinto muito pela porta.
BLAM.
Tudo o que se viu em seguida foi Raveneh arrastando um garoto de quase dez anos que esperneava e gritava e uma porta totalmente destruída graças ao poderoso chute de Raveneh.
- Que paciência tem a Raveneh, não é? - riu Umrae.
- Eu não tenho isso - murmurou Fer risonha - eu mataria se fosse comigo! Mas Raveneh é um anjo de pessoa xD
- Sim, ela é! - concordou Kibii entusiasmada.
Todos iriam para o julgamento.
--------------------------
- Eu gostaria de ver Mycil Regallian - ela disse.
A mulher que atendia os visitantes levantou o olhar, curiosa. Nunca vira uma mulher daquelas.
Ela era alta, e tinha um porte imponente. Seu olhar era penetrante e azul, seus cabelos castanho-claros estavam perfeitamente penteados e usava vestes demasiadas estranhas para aquele local. E seu sotaque era um bocado diferente.
- Devo anunciar-la - disse a mulher - poderia me dizer o nome?
- Mycil sabe quem sou - ela disse - e eu não vim do Norte para ser barrada. Sabe, são alguns dias de viagem.
- Sinto muito, são regras - desculpou-se a mulher. A voz da outra era bastante imperativa, e dava a entender que faria qualquer maldade caso ela recusasse sua entrada.
- Está bem, então - disse a forasteira - pode me anunciar como... Forasteira Noturna.
- F-Forasteira Noturna? - gaguejou a funcionária - e-está bem!
E correu para dentro.
Todos que estavam na sala admiraram o vulto da forasteira, que usava um longo vestido justo no tronco e que se soltava suave a partir da cintura. Usava também um manto muito bonito por cima, como se fosse um véu, e calçava botas. Tudo de preto. Não tinha uma peça sequer que fosse de outra cor.
Mas o que mais chamava atenção não era o fato de todas as peças serem pretas. Era simplesmente a bainha negra, que guardava uma afiada espada. Qualquer um saberia que só pelo jeito da forasteira, a espada servia como uma luva nas mãos dela. E só pelo seu olhar, também se podia saber que ela não era do tipo que sentia piedade.
A funcionária voltou.
- Ela disse que reconhecia - disse a funcionária - pode entrar.
A forasteira sorriu, debaixo do véu.
- Uuuff! - suspirou a funcionária - a-achei que fosse morrer...
--------------------------
- Olá. - disse Renegada.
Ela estava em uma sala toda branca, atrás do vidro. Era a Sala de Espera para Aprisionados, onde se podia conversar com familiares ou amigos antes de um julgamento ou condenação. Renegada sentara-se pacientemente, esperando que alguém quisesse ver-la antes do julgamento.
A forasteira sentou-se diante de Renegada, e abaixou o véu.
- Você acha que assistirá meu julgamento sem ninguém saber, Lynda? - perguntou Renegada.
Já faz muito tempo
Desde que eu te vi pela última vez
Agora os anos nos transformaram
E eu vejo tua face de mulher
- Não seja tola, Mycil - disse Lynda - posso saber porque você preferiu usar o codinome "Renegada" aqui?
- Não. - respondeu Mycil.
As duas se fitaram, ambas com algum sentimento estranho.
Não sabiam se sentiam saudades, não sabiam se era amor ou ódio. Estavam há muitos anos sem se verem...
Eu odeio te amar
Eu odeio saber que eu te conheci
Você me protegeu das minhas amarguras
Mas eu não quero mais proteção
- Você não devia ter partido histericamente - disse Lynda com um certo rancor na voz.
- Eu fui porque quis - afirmou Mycil.
- Tola! Você não sabe como magoou mamãe! - cuspiu Lynda.
- Mamãe? Eu não a reconheço como a minha mãe.
Deixa, deixa, eu não quero mais sofrer
Deixa, deixa, deixe-me sozinha
Vá embora, que eu não preciso de você
Para me proteger
- Você é totalmente cega - disse Lynda - você se apaixonou por Calvin e ficou cega.
Mycil engoliu em seco. O pior era que a irmã tinha razão: apaixonar-se por Calvin fora o ato mais estúpido que tivera em toda a sua vida... gerou uma criança que sabia que não podia criar e um julgamento. E claro, a vinda de Ruronna.
- Está bem - Lynda disse - eu sei que a mãe não foi exatamente uma maravilha com você. Sei que você não era exatamente um modelo para herdar alguma de Regallian. Mas ela ainda tem algum sentimento materno por você!
Não, não vou acreditar em suas mentiras
Não, deixe-me sozinha
Sei que você me protegeu, mas eu preciso viver
Em algum lugar longe de suas mentiras
- Aham - riu Mycil sarcasticamente - belo exemplo de mãe: Mycil, você é uma idiota! Mycil, você não sabe matar ninguém! Mycil, você mais parece humana normalzinha! Aham.
Lynda entristeceu. Apesar de tudo, tinha que reconhecer que a mãe não fora boa com a irmã, muito pelo contrário: fora cruel. Mycil podia ser um sério problema mental, se não tivesse a irmã sempre a proteger de todas as maldades da mãe e da Kharën.
- Bem - disse Lynda - eu vim assistir ao seu julgamento. Já sabe o que fará depois do julgamento?
- Sim - respondeu a irmã.
Mal Lynda ia formular uma frase, Mycil a interrompeu:
- Ruronna veio.
Deixe-me viver sozinha
Partindo sem destino
Deixe-me afundar sozinha
Afundar-me em um lago de podridão...
- Que triste - disse Lynda - bem, estou indo. Amanhã irei assistir ao seu julgamento - colocou o capuz sobre os cabelos castanho-claros.
- Eu odeio essa sua ironia - disse Mycil admirando o teto - dá a impressão que nada no mundo importa.
- Você me faz rir - disse Lynda - bem, minha querida irmã, amanhã conhecerei seu filho. Ele deve ser uma pessoa fantástica, um amor de menino.
- Criado por Calvin? - riu Mycil - eu amo-o, mas sinceramente Calvin o criou muito mal, mimando-o. Agora Arthur dá pena, mimado do jeito que é. Nem eu gostaria de pegar aquele menino pra viver comigo.
- Quanta maldade, Mycil - disse Lynda com um sorriso de escárnio - isso é coisa que se diga do próprio filho? Você é a mãe dele, mesmo que não tenha criado...
- Calvin o tirou de mim! - explodiu Mycil - eu não sou mais a mãe dele. Eu não o criei. Eu não vivi com ele... Eu não sou a mãe dele.
- Se você vê a situação dessa forma... - disse Lynda seriamente - nada posso fazer pra mudar. Mas creio que com a chegada de Ruronna, não dê pra fazer muitas coisas, não é mesmo?
- É... - murmurou Mycil triste - eu tinha planos para ter Arthur como meu filho. Mas Ruronna mudou isso. Bem, entrego-me ao destino.
Deixe-me mergulhar na minha depressão...
É verdade que não deu certo
Mas...
... se não for você, quem mais vai no seu lugar?
Raveneh estava de pé, pensativa, com pensamentos voando longe.
Estava diante da porta do quarto onde Arthur vivia, e não saía dali pra nada.
- Arthur! - gritou.
- O que é? - uma voz de criança gritou de volta, agressivo.
- Vamos ao julgamento - disse Raveneh em um tom mais baixo - seu pai está lá. Vamos agora.
- Eu não quero ir! - Arthur disse esganiçado.
- Não é questão de querer - retrucou Raveneh - é questão de ir. Você tem três segundos para abrir a porta.
- Eu não vou!
- Um.
- Não vou, não vou, não vou e não vou!
- Dois.
- É surda? EU NÃO VOU!
- Três.
- Eu não vou!
- Você vai sim. Sinto muito pela porta.
BLAM.
Tudo o que se viu em seguida foi Raveneh arrastando um garoto de quase dez anos que esperneava e gritava e uma porta totalmente destruída graças ao poderoso chute de Raveneh.
- Que paciência tem a Raveneh, não é? - riu Umrae.
- Eu não tenho isso - murmurou Fer risonha - eu mataria se fosse comigo! Mas Raveneh é um anjo de pessoa xD
- Sim, ela é! - concordou Kibii entusiasmada.
Todos iriam para o julgamento.
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- Eu gostaria de ver Mycil Regallian - ela disse.
A mulher que atendia os visitantes levantou o olhar, curiosa. Nunca vira uma mulher daquelas.
Ela era alta, e tinha um porte imponente. Seu olhar era penetrante e azul, seus cabelos castanho-claros estavam perfeitamente penteados e usava vestes demasiadas estranhas para aquele local. E seu sotaque era um bocado diferente.
- Devo anunciar-la - disse a mulher - poderia me dizer o nome?
- Mycil sabe quem sou - ela disse - e eu não vim do Norte para ser barrada. Sabe, são alguns dias de viagem.
- Sinto muito, são regras - desculpou-se a mulher. A voz da outra era bastante imperativa, e dava a entender que faria qualquer maldade caso ela recusasse sua entrada.
- Está bem, então - disse a forasteira - pode me anunciar como... Forasteira Noturna.
- F-Forasteira Noturna? - gaguejou a funcionária - e-está bem!
E correu para dentro.
Todos que estavam na sala admiraram o vulto da forasteira, que usava um longo vestido justo no tronco e que se soltava suave a partir da cintura. Usava também um manto muito bonito por cima, como se fosse um véu, e calçava botas. Tudo de preto. Não tinha uma peça sequer que fosse de outra cor.
Mas o que mais chamava atenção não era o fato de todas as peças serem pretas. Era simplesmente a bainha negra, que guardava uma afiada espada. Qualquer um saberia que só pelo jeito da forasteira, a espada servia como uma luva nas mãos dela. E só pelo seu olhar, também se podia saber que ela não era do tipo que sentia piedade.
A funcionária voltou.
- Ela disse que reconhecia - disse a funcionária - pode entrar.
A forasteira sorriu, debaixo do véu.
- Uuuff! - suspirou a funcionária - a-achei que fosse morrer...
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- Olá. - disse Renegada.
Ela estava em uma sala toda branca, atrás do vidro. Era a Sala de Espera para Aprisionados, onde se podia conversar com familiares ou amigos antes de um julgamento ou condenação. Renegada sentara-se pacientemente, esperando que alguém quisesse ver-la antes do julgamento.
A forasteira sentou-se diante de Renegada, e abaixou o véu.
- Você acha que assistirá meu julgamento sem ninguém saber, Lynda? - perguntou Renegada.
Já faz muito tempo
Desde que eu te vi pela última vez
Agora os anos nos transformaram
E eu vejo tua face de mulher
- Não seja tola, Mycil - disse Lynda - posso saber porque você preferiu usar o codinome "Renegada" aqui?
- Não. - respondeu Mycil.
As duas se fitaram, ambas com algum sentimento estranho.
Não sabiam se sentiam saudades, não sabiam se era amor ou ódio. Estavam há muitos anos sem se verem...
Eu odeio te amar
Eu odeio saber que eu te conheci
Você me protegeu das minhas amarguras
Mas eu não quero mais proteção
- Você não devia ter partido histericamente - disse Lynda com um certo rancor na voz.
- Eu fui porque quis - afirmou Mycil.
- Tola! Você não sabe como magoou mamãe! - cuspiu Lynda.
- Mamãe? Eu não a reconheço como a minha mãe.
Deixa, deixa, eu não quero mais sofrer
Deixa, deixa, deixe-me sozinha
Vá embora, que eu não preciso de você
Para me proteger
- Você é totalmente cega - disse Lynda - você se apaixonou por Calvin e ficou cega.
Mycil engoliu em seco. O pior era que a irmã tinha razão: apaixonar-se por Calvin fora o ato mais estúpido que tivera em toda a sua vida... gerou uma criança que sabia que não podia criar e um julgamento. E claro, a vinda de Ruronna.
- Está bem - Lynda disse - eu sei que a mãe não foi exatamente uma maravilha com você. Sei que você não era exatamente um modelo para herdar alguma de Regallian. Mas ela ainda tem algum sentimento materno por você!
Não, não vou acreditar em suas mentiras
Não, deixe-me sozinha
Sei que você me protegeu, mas eu preciso viver
Em algum lugar longe de suas mentiras
- Aham - riu Mycil sarcasticamente - belo exemplo de mãe: Mycil, você é uma idiota! Mycil, você não sabe matar ninguém! Mycil, você mais parece humana normalzinha! Aham.
Lynda entristeceu. Apesar de tudo, tinha que reconhecer que a mãe não fora boa com a irmã, muito pelo contrário: fora cruel. Mycil podia ser um sério problema mental, se não tivesse a irmã sempre a proteger de todas as maldades da mãe e da Kharën.
- Bem - disse Lynda - eu vim assistir ao seu julgamento. Já sabe o que fará depois do julgamento?
- Sim - respondeu a irmã.
Mal Lynda ia formular uma frase, Mycil a interrompeu:
- Ruronna veio.
Deixe-me viver sozinha
Partindo sem destino
Deixe-me afundar sozinha
Afundar-me em um lago de podridão...
- Que triste - disse Lynda - bem, estou indo. Amanhã irei assistir ao seu julgamento - colocou o capuz sobre os cabelos castanho-claros.
- Eu odeio essa sua ironia - disse Mycil admirando o teto - dá a impressão que nada no mundo importa.
- Você me faz rir - disse Lynda - bem, minha querida irmã, amanhã conhecerei seu filho. Ele deve ser uma pessoa fantástica, um amor de menino.
- Criado por Calvin? - riu Mycil - eu amo-o, mas sinceramente Calvin o criou muito mal, mimando-o. Agora Arthur dá pena, mimado do jeito que é. Nem eu gostaria de pegar aquele menino pra viver comigo.
- Quanta maldade, Mycil - disse Lynda com um sorriso de escárnio - isso é coisa que se diga do próprio filho? Você é a mãe dele, mesmo que não tenha criado...
- Calvin o tirou de mim! - explodiu Mycil - eu não sou mais a mãe dele. Eu não o criei. Eu não vivi com ele... Eu não sou a mãe dele.
- Se você vê a situação dessa forma... - disse Lynda seriamente - nada posso fazer pra mudar. Mas creio que com a chegada de Ruronna, não dê pra fazer muitas coisas, não é mesmo?
- É... - murmurou Mycil triste - eu tinha planos para ter Arthur como meu filho. Mas Ruronna mudou isso. Bem, entrego-me ao destino.
Deixe-me mergulhar na minha depressão...
Parte 66 - Trauma.
Os dias se passaram lentamente. De domingo até terça-feira, de noite.
Todas as noites, Raveneh sofria com os pesadelos. E durante todas as noites, Raveneh acordava inesperadamente e abraçava ao Johnny, revivendo memórias de sua triste infância.
Todas as noites, Renegada riscava a parede silenciosa. Não conversava com Ruronna, tinha muita pouca vontade. Só fazia reviver suas lembranças.
E durante todas as noites, Siih sorria festejando a saída dos nortistas. Acabara-se um inferno em sua vida. Agora só faltava o julgamento do Rei e de Renegada, e anexar Heppaceneoh como território das fadas.
Chegou a véspera.
Terça-feira. O sol descia lentamente, o céu se tingindo de laranja e rosa.
Raveneh estava parada na janela, pensativa.
- Raveneh. - chamou Johnny.
- Johnny! - exclamou Raveneh.
- Por que está tão pensativa? - indagou Johnny também admirando o crespúculo ao lado de Raveneh.
- O julgamento de Renegada - disse Raveneh - estou preocupada com ela.
Johnny sorriu.
- Sim. Você é uma das melhores amigas dela. Mas ela sairá inocente, tenho certeza.
- E poderá tomar Arthur para criar - sorriu Raveneh - já imaginou? Aquele menino tão mimado, não sai do quarto pra nada!
Os dois riram, mas logo ficaram sérios novamente. Raveneh respirou fundo.
- Johnny... o que estava dizendo a respeito de duplas personalidades? - perguntou - eu não entendi muito bem.
O estômago de Johnny deu cambalhotas desconfortáveis, para logo depois afundar triste.
- É o que você tem - disse - Gika que diagnosticou. Você, de vez em quando, fica totalmente estranha. Age diferente, fala diferente. Não é você mesma. Gika disse que era outra personalidade e esta personalidade guarda a maior parte das suas lembranças. Raveneh, você se lembra de algo na infância?
- Estúpida! Tola! Idiota! Não vê que sua irmã vai comer?
- Muito pouco - respondeu Raveneh.
- Você se lembra de fatos felizes? - Johnny perguntou.
- Eu sou melhor que você! Eu sou mais bonita, sou mais simpática, tenho mais gente que gosta de mim do que de você! Otária, pensa que é gente...
- Eu sou boa! Sim, eu sou boa menina! - gritou Raveneh chorando.
- Idiota. - deu um tapa sonoro na bochecha esquerda da irmã - idiota... sua bastarda, você pensa que é quem? Saia do meu caminho.
- Não muito. - disse a menina com tristeza. Olhando para o céu que ficava mais escuro a medida que os minutos se arrastavam, disse: - eu sou bastarda. Por isso nunca fui tratada com consideração naquela casa.
- B-bastarda? - gaguejou Johnny.
- Anos atrás, meus pais já eram casados e já tinham os oito filhos. - suspirou - eram humanos absolutamente normais. Minha mãe sempre foi o tipo de pessoa dominadora, fanática, possessiva. Ela era louca. Já meu pai não, mas ele se irritava facilmente. De modo que era briga direto. Um dia, meu pai cansou daquilo tudo e foi embora. Conheceu uma fada, e a namorou. Ela engravidou. Porém, ela era meio frágil e morreu durante o parto. Ela que é a minha mãe biológica. Meu pai, perdido, acabou me levando de volta pra casa. Minha mãe só faltou matar.
- Quer dizer que você não é filha de sangue da sua "mãe"? - indagou Johnny pasmo.
- Sim. - disse Raveneh com tristeza - eu tenho esse sangue de fada por causa da minha mãe biológica. Meu pai dizia que ela era muito bonita, e que amava muito a mim. Fazia vários planos quando estava grávida, e disse que eu era extremamente parecida com ela. Acho que mamãe tem ódio de mim por causa disso. Ela acha que sou muito parecida com a filha de verdade dela, a Catherine.
- E por que você a chama de "mamãe"? - Johnny estava surpreso. Nunca imaginaria que Raveneh era adotada.
Raveneh mordeu o lábio inferior.
- Eu sou a sua mãe. Está me ouvindo? Eu sou a sua mãe, não aquela fada vagabunda com quem seu pai foi pra cama na primeira noite!
- Mas mães são boas! Você é boa com Catherine! A senhora Monty é boa com Selene! Você é má! Você não é minha mãe!
- Ouça-me. Eu SOU a sua mãe. E se você não me chamar disso durante toda a vida, eu volto e bato em você, está me entendendo? Bato mesmo, e vou te deixar toda machucada!
Raveneh chorou. Ela só tinha seis anos na época.
- Não consigo chamar-la de outra forma - disse Raveneh - e-eu não consigo.
Johnny observou os olhos de Raveneh se molharem suavemente.
Ele queria que as pessoas cruéis nunca tivessem filhos. Como seria se Raveneh não tivesse uma mãe e uma irmã a atormentarem? Tantos traumas que poderiam ser evitados, se simplesmente tivessem ensinado o que era o amor.
Não se admira que Raveneh tivesse que criar um escudo, nem que fosse uma personalidade cópia da irmã. Raveneh odiava a irmã, mas queria a todo custo ser amada pela mãe... Não é pra tanto que criou Catherine...
Raveneh chorou.
--------------------------
- Amanhã! - murmurou Siih - e já estou de pé!
Lefi sorriu.
- Como ver os nortistas longe de Heppaceneoh me faz bem! - riu Siih.
- E como fez para ajudar os habitantes de lá? - indagou Lefi.
- Mandei voluntários para ajudar-los... - disse Siih - eles estão se estruturando novamente.
- Que bom.
A noite estava confortável.
Todas as noites, Raveneh sofria com os pesadelos. E durante todas as noites, Raveneh acordava inesperadamente e abraçava ao Johnny, revivendo memórias de sua triste infância.
Todas as noites, Renegada riscava a parede silenciosa. Não conversava com Ruronna, tinha muita pouca vontade. Só fazia reviver suas lembranças.
E durante todas as noites, Siih sorria festejando a saída dos nortistas. Acabara-se um inferno em sua vida. Agora só faltava o julgamento do Rei e de Renegada, e anexar Heppaceneoh como território das fadas.
Chegou a véspera.
Terça-feira. O sol descia lentamente, o céu se tingindo de laranja e rosa.
Raveneh estava parada na janela, pensativa.
- Raveneh. - chamou Johnny.
- Johnny! - exclamou Raveneh.
- Por que está tão pensativa? - indagou Johnny também admirando o crespúculo ao lado de Raveneh.
- O julgamento de Renegada - disse Raveneh - estou preocupada com ela.
Johnny sorriu.
- Sim. Você é uma das melhores amigas dela. Mas ela sairá inocente, tenho certeza.
- E poderá tomar Arthur para criar - sorriu Raveneh - já imaginou? Aquele menino tão mimado, não sai do quarto pra nada!
Os dois riram, mas logo ficaram sérios novamente. Raveneh respirou fundo.
- Johnny... o que estava dizendo a respeito de duplas personalidades? - perguntou - eu não entendi muito bem.
O estômago de Johnny deu cambalhotas desconfortáveis, para logo depois afundar triste.
- É o que você tem - disse - Gika que diagnosticou. Você, de vez em quando, fica totalmente estranha. Age diferente, fala diferente. Não é você mesma. Gika disse que era outra personalidade e esta personalidade guarda a maior parte das suas lembranças. Raveneh, você se lembra de algo na infância?
- Estúpida! Tola! Idiota! Não vê que sua irmã vai comer?
- Muito pouco - respondeu Raveneh.
- Você se lembra de fatos felizes? - Johnny perguntou.
- Eu sou melhor que você! Eu sou mais bonita, sou mais simpática, tenho mais gente que gosta de mim do que de você! Otária, pensa que é gente...
- Eu sou boa! Sim, eu sou boa menina! - gritou Raveneh chorando.
- Idiota. - deu um tapa sonoro na bochecha esquerda da irmã - idiota... sua bastarda, você pensa que é quem? Saia do meu caminho.
- Não muito. - disse a menina com tristeza. Olhando para o céu que ficava mais escuro a medida que os minutos se arrastavam, disse: - eu sou bastarda. Por isso nunca fui tratada com consideração naquela casa.
- B-bastarda? - gaguejou Johnny.
- Anos atrás, meus pais já eram casados e já tinham os oito filhos. - suspirou - eram humanos absolutamente normais. Minha mãe sempre foi o tipo de pessoa dominadora, fanática, possessiva. Ela era louca. Já meu pai não, mas ele se irritava facilmente. De modo que era briga direto. Um dia, meu pai cansou daquilo tudo e foi embora. Conheceu uma fada, e a namorou. Ela engravidou. Porém, ela era meio frágil e morreu durante o parto. Ela que é a minha mãe biológica. Meu pai, perdido, acabou me levando de volta pra casa. Minha mãe só faltou matar.
- Quer dizer que você não é filha de sangue da sua "mãe"? - indagou Johnny pasmo.
- Sim. - disse Raveneh com tristeza - eu tenho esse sangue de fada por causa da minha mãe biológica. Meu pai dizia que ela era muito bonita, e que amava muito a mim. Fazia vários planos quando estava grávida, e disse que eu era extremamente parecida com ela. Acho que mamãe tem ódio de mim por causa disso. Ela acha que sou muito parecida com a filha de verdade dela, a Catherine.
- E por que você a chama de "mamãe"? - Johnny estava surpreso. Nunca imaginaria que Raveneh era adotada.
Raveneh mordeu o lábio inferior.
- Eu sou a sua mãe. Está me ouvindo? Eu sou a sua mãe, não aquela fada vagabunda com quem seu pai foi pra cama na primeira noite!
- Mas mães são boas! Você é boa com Catherine! A senhora Monty é boa com Selene! Você é má! Você não é minha mãe!
- Ouça-me. Eu SOU a sua mãe. E se você não me chamar disso durante toda a vida, eu volto e bato em você, está me entendendo? Bato mesmo, e vou te deixar toda machucada!
Raveneh chorou. Ela só tinha seis anos na época.
- Não consigo chamar-la de outra forma - disse Raveneh - e-eu não consigo.
Johnny observou os olhos de Raveneh se molharem suavemente.
Ele queria que as pessoas cruéis nunca tivessem filhos. Como seria se Raveneh não tivesse uma mãe e uma irmã a atormentarem? Tantos traumas que poderiam ser evitados, se simplesmente tivessem ensinado o que era o amor.
Não se admira que Raveneh tivesse que criar um escudo, nem que fosse uma personalidade cópia da irmã. Raveneh odiava a irmã, mas queria a todo custo ser amada pela mãe... Não é pra tanto que criou Catherine...
Raveneh chorou.
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- Amanhã! - murmurou Siih - e já estou de pé!
Lefi sorriu.
- Como ver os nortistas longe de Heppaceneoh me faz bem! - riu Siih.
- E como fez para ajudar os habitantes de lá? - indagou Lefi.
- Mandei voluntários para ajudar-los... - disse Siih - eles estão se estruturando novamente.
- Que bom.
A noite estava confortável.
domingo, 18 de novembro de 2007
Parte 65 - Ruronna, a muijiid.
Noite de domingo.
- Jantar! - exclamou Raveneh - venham comer!
Era o último dia no navio, afinal já não tinha mais a ameaça de algum exército invadir as Campinas. De modo que no dia seguinte, ao raiar, todos se mudariam de volta para as Campinas.
- Você fez macarronada! - exclamou Raven - e qual é a sobremesa?
- Deixa de ser guloso, Núbo u_ú - repreendeu Maria - coma primeiro a macarronada.
- Aham. - disse Raveneh - a macarronada é uma delícia, acrescentei salsichas!
- Perfeitamente! - concordou Umrae - você cozinha muito bem!
- Obrigada, Umrae! - agradeceu Raveneh - e preparei também um suco de laranja. Alguém quer?
Todos levantaram as mãos, contentes.
- Pra Fer, Kibii, Doceh, Lych, Raven... - Raveneh ia contando - Johnny, por que está assim?
Johnny ergueu o olhar, surpreso.
- Assim como?
- Distraído - respondeu Raveneh em um sussurro - já faz um tempo que você anda no mundo da lua. Perguntei quem queria um suco, e você sequer se manifestou! Estou ficando preocupada.
- Decerto. - concordou Johnny - nada, só são coisas minhas. Eu quero o suco sim.
Raveneh pôs o suco, mas não estava convencida da desculpa de Johnny. Ela sabia que tinha algo a ver com ela, e Raveneh já imaginava sobre a segunda personalidade.
Mas ela não tinha realmente idéia do que a segunda personalidade fizera.
--------------------------
- Então já chegou a minha hora. - concluiu Renegada pensativa. A noite veio arrasadora, e um pouco menos entediante que o normal.
- Sim, Mycil.
Renegada não estava só. Nas suas costas, havia um ser maior que a Renegada, de seis braços brancos e pernas sedutoras, também brancas. Vestia um longo vestido negro, repleto de detalhes sutis. O seu rosto era oval, com uma boca pequena e vermelha, além de um par de olhos negros, quase felinos. E seus cabelos negros, lisos e longos que chegavam ao chão, mesmo que este ser ficasse flutuando graças as suas pequenas asas parecidas com asas de morcegos, eram sedosos.
Era uma muijiid (N/A: pronuncia-se muírridê), seres que acompanham fadas das trevas desde que nascem. Toda fada das trevas era acompanhada por uma muijiid, e podia ou não dispensar a companhia desta.
- Bem - disse Renegada - já sei o que fazer. - sorriu - eu não vou poder realizar meus planos... Infelizmente... mas é a vida.
- Sim, Mycil - concordou sua muijiid - é a vida.
Renegada mordeu o lábio inferior. Com a chegada de Ruronna, sua muijiid, todos seus planos estavam acabados. Tudo se acabou. Agora era só esperar e esperar, até chegar o momento final.
Tola!
Fadas das trevas não choram, Mycil.
As palavras de sua mãe ecoavam na sua mente.
- Deixe ela sozinha, mãe. Deixe ela chorar.
- Ela é uma vergonha para a nossa família.
- Ela não sabe nem matar humanos.
- Ela sempre foi assim! Deixe-a em paz!
- Por que você sempre defendeu a sua irmãzinha querida? O que será que acontece se eu matar-la?
- Você morre, simples assim.
- Ah! - um riso que rasga o céu de insegurança - veremos!
- Sim, veremos.
Renegada chorou.
- Bem, Ruronna - disse - enfrentemos nossos destinos.
- Sim, Mycil - disse Ruronna admirando o teto.
Quando não se vive feliz.
Quando não se nasce feliz.
De que diabos adianta viver
Se já não começou bem?
- Jantar! - exclamou Raveneh - venham comer!
Era o último dia no navio, afinal já não tinha mais a ameaça de algum exército invadir as Campinas. De modo que no dia seguinte, ao raiar, todos se mudariam de volta para as Campinas.
- Você fez macarronada! - exclamou Raven - e qual é a sobremesa?
- Deixa de ser guloso, Núbo u_ú - repreendeu Maria - coma primeiro a macarronada.
- Aham. - disse Raveneh - a macarronada é uma delícia, acrescentei salsichas!
- Perfeitamente! - concordou Umrae - você cozinha muito bem!
- Obrigada, Umrae! - agradeceu Raveneh - e preparei também um suco de laranja. Alguém quer?
Todos levantaram as mãos, contentes.
- Pra Fer, Kibii, Doceh, Lych, Raven... - Raveneh ia contando - Johnny, por que está assim?
Johnny ergueu o olhar, surpreso.
- Assim como?
- Distraído - respondeu Raveneh em um sussurro - já faz um tempo que você anda no mundo da lua. Perguntei quem queria um suco, e você sequer se manifestou! Estou ficando preocupada.
- Decerto. - concordou Johnny - nada, só são coisas minhas. Eu quero o suco sim.
Raveneh pôs o suco, mas não estava convencida da desculpa de Johnny. Ela sabia que tinha algo a ver com ela, e Raveneh já imaginava sobre a segunda personalidade.
Mas ela não tinha realmente idéia do que a segunda personalidade fizera.
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- Então já chegou a minha hora. - concluiu Renegada pensativa. A noite veio arrasadora, e um pouco menos entediante que o normal.
- Sim, Mycil.
Renegada não estava só. Nas suas costas, havia um ser maior que a Renegada, de seis braços brancos e pernas sedutoras, também brancas. Vestia um longo vestido negro, repleto de detalhes sutis. O seu rosto era oval, com uma boca pequena e vermelha, além de um par de olhos negros, quase felinos. E seus cabelos negros, lisos e longos que chegavam ao chão, mesmo que este ser ficasse flutuando graças as suas pequenas asas parecidas com asas de morcegos, eram sedosos.
Era uma muijiid (N/A: pronuncia-se muírridê), seres que acompanham fadas das trevas desde que nascem. Toda fada das trevas era acompanhada por uma muijiid, e podia ou não dispensar a companhia desta.
- Bem - disse Renegada - já sei o que fazer. - sorriu - eu não vou poder realizar meus planos... Infelizmente... mas é a vida.
- Sim, Mycil - concordou sua muijiid - é a vida.
Renegada mordeu o lábio inferior. Com a chegada de Ruronna, sua muijiid, todos seus planos estavam acabados. Tudo se acabou. Agora era só esperar e esperar, até chegar o momento final.
Tola!
Fadas das trevas não choram, Mycil.
As palavras de sua mãe ecoavam na sua mente.
- Deixe ela sozinha, mãe. Deixe ela chorar.
- Ela é uma vergonha para a nossa família.
- Ela não sabe nem matar humanos.
- Ela sempre foi assim! Deixe-a em paz!
- Por que você sempre defendeu a sua irmãzinha querida? O que será que acontece se eu matar-la?
- Você morre, simples assim.
- Ah! - um riso que rasga o céu de insegurança - veremos!
- Sim, veremos.
Renegada chorou.
- Bem, Ruronna - disse - enfrentemos nossos destinos.
- Sim, Mycil - disse Ruronna admirando o teto.
Quando não se vive feliz.
Quando não se nasce feliz.
De que diabos adianta viver
Se já não começou bem?
sexta-feira, 16 de novembro de 2007
Parte 64 - A forasteira e a sua espada.
Renegada riscava as paredes, resmungando. Era madrugada, de sábado pra domingo, e definitivamente estava de saco cheio daquela história.
Contava os dias, e sabia que faltavam três dias inteiros até a manhã do seu julgamento. Será que Raveneh viria? Será que alguém das Campinas viria? Maria, com certeza, viria, afinal ela era representante. Mas pensava se não havia decepcionado algum deles com a sua prisão como espiã do Rei.
Eu estava sob chantagem. pensou Renegada furiosamente mas ainda assim vou ser julgada. Afinal fui eu quem aproximei o Rei das Campinas e permiti que Raveneh quase fosse sequestrada..
Rosnou.
Queria que o julgamento viesse logo, e tinha quase certeza que sairia inocente.
Pensou em Arthur. Como ele estaria? Será que poderia tomar-lo para criar depois do julgamento? Talvez não... Fora privada de poder criar seu filho desde que o Rei tomara. Maldito Calvin.
Estava escuro.
- Olá, Mycil.
Renegada sem se virar, reconheceu a voz.
- Finalmente você veio - disse ela, sem olhar para trás.
--------------------------
- Siih! - exclamou Lefi - está bem?
- Oh sim! - murmurou Siih - eu me sinto bem mais leve! Somente... somente uma dor de cabeça!
Lefi sorriu.
- O médico veio mais uma vez? - perguntou Siih - nossa, já são quatro da manhã! Já estamos em domingo...
- Siih, você já não está mais com febre - disse Lefi contente - creio que poderá comparecer no julgamento do Rei Calvin Mo de Heppaceneoh!
- Você é o melhor irmão do mundo, Lefi! - exclamou Siih - estou me sentindo bem, só um pouco cansada! Poderia pedir a Vê para preparar aquele chá dela? E a Gika para ficar aqui, comigo? Ela sabe cantarolar umas músicas muito boas, que me fazem relaxar.
- Sim! - assentiu Lefi.
Saiu do quarto, a fim de chamar Gika e Vê.
Siih sorria. O céu lhe parecia feliz, se sentia bem mais leve agora que tinha abdicado dos seus poderes.
Siih estava feliz.
--------------------------
- Senhorita, vai pagar agora ou depois? - perguntou a recepcionista da Pousada Meiji.
- Agora - ela respondeu, entregando um saco de moedas de ouro. Devo ficar até a quinta, creio.
- Sim, senhorita! - assentiu a recepcionista deslumbrada com as moedas.
Ela subiu as escadas pausadamente, sem olhar pra trás.
Chegou ao seu quarto, porém não se deitou na cama nem pediu água. Seu corpo não pedia isso. Pedia somente minutos de paz, sem humanos normais para perturbar.
Lembrou-se da última pessoa que tentara barrar seu caminho. Hmpf. pensou com zombaria Gente como eu proibida de atravessar certas estradas. Bem, tiveram o que mereceram.
Treinou mais uns golpes com a sua afiada espada.
Era um domingo claro, com um sol feliz.
Olhou pela janela, vislumbrando o castelo. Onde eu estarei quarta-feira.
Não sabia como entraria no julgamento, mas sabia que ia estar lá e aguentar o que desse. Precisava estar lá. Por sua família, se fosse. Mas não podia permitir que Mycil enfrentasse aquele julgamento sozinha.
E precisava conhecer o filho de Mycil.
Um.
A espada cortou a colcha da cama.
Dois.
A espada cortou a cortina.
Três.
A espada cortou a pintura retratando o Tratado entre a Rainha e o Rei.
- Se for inocentado, Vossa Majestade de Heppaceneoh - ela disse - sinto dizer que cairá nas minhas mãos.
Contava os dias, e sabia que faltavam três dias inteiros até a manhã do seu julgamento. Será que Raveneh viria? Será que alguém das Campinas viria? Maria, com certeza, viria, afinal ela era representante. Mas pensava se não havia decepcionado algum deles com a sua prisão como espiã do Rei.
Eu estava sob chantagem. pensou Renegada furiosamente mas ainda assim vou ser julgada. Afinal fui eu quem aproximei o Rei das Campinas e permiti que Raveneh quase fosse sequestrada..
Rosnou.
Queria que o julgamento viesse logo, e tinha quase certeza que sairia inocente.
Pensou em Arthur. Como ele estaria? Será que poderia tomar-lo para criar depois do julgamento? Talvez não... Fora privada de poder criar seu filho desde que o Rei tomara. Maldito Calvin.
Estava escuro.
- Olá, Mycil.
Renegada sem se virar, reconheceu a voz.
- Finalmente você veio - disse ela, sem olhar para trás.
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- Siih! - exclamou Lefi - está bem?
- Oh sim! - murmurou Siih - eu me sinto bem mais leve! Somente... somente uma dor de cabeça!
Lefi sorriu.
- O médico veio mais uma vez? - perguntou Siih - nossa, já são quatro da manhã! Já estamos em domingo...
- Siih, você já não está mais com febre - disse Lefi contente - creio que poderá comparecer no julgamento do Rei Calvin Mo de Heppaceneoh!
- Você é o melhor irmão do mundo, Lefi! - exclamou Siih - estou me sentindo bem, só um pouco cansada! Poderia pedir a Vê para preparar aquele chá dela? E a Gika para ficar aqui, comigo? Ela sabe cantarolar umas músicas muito boas, que me fazem relaxar.
- Sim! - assentiu Lefi.
Saiu do quarto, a fim de chamar Gika e Vê.
Siih sorria. O céu lhe parecia feliz, se sentia bem mais leve agora que tinha abdicado dos seus poderes.
Siih estava feliz.
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- Senhorita, vai pagar agora ou depois? - perguntou a recepcionista da Pousada Meiji.
- Agora - ela respondeu, entregando um saco de moedas de ouro. Devo ficar até a quinta, creio.
- Sim, senhorita! - assentiu a recepcionista deslumbrada com as moedas.
Ela subiu as escadas pausadamente, sem olhar pra trás.
Chegou ao seu quarto, porém não se deitou na cama nem pediu água. Seu corpo não pedia isso. Pedia somente minutos de paz, sem humanos normais para perturbar.
Lembrou-se da última pessoa que tentara barrar seu caminho. Hmpf. pensou com zombaria Gente como eu proibida de atravessar certas estradas. Bem, tiveram o que mereceram.
Treinou mais uns golpes com a sua afiada espada.
Era um domingo claro, com um sol feliz.
Olhou pela janela, vislumbrando o castelo. Onde eu estarei quarta-feira.
Não sabia como entraria no julgamento, mas sabia que ia estar lá e aguentar o que desse. Precisava estar lá. Por sua família, se fosse. Mas não podia permitir que Mycil enfrentasse aquele julgamento sozinha.
E precisava conhecer o filho de Mycil.
Um.
A espada cortou a colcha da cama.
Dois.
A espada cortou a cortina.
Três.
A espada cortou a pintura retratando o Tratado entre a Rainha e o Rei.
- Se for inocentado, Vossa Majestade de Heppaceneoh - ela disse - sinto dizer que cairá nas minhas mãos.
quarta-feira, 14 de novembro de 2007
Parte 63 - A dor experimental para o fim do inferno.
- Johnny, o que quer falar? - indagou Raveneh totalmente confusa.
- Escute-me! - disse Johnny ríspido - você precisa acabar com isso!
- Com o quê? - devolveu Raveneh confusa. Estavam sentados no quarto de Raveneh, o sol ameaçando descer.
- E-eu nem sei como dizer isso, Raveneh... - disse Johnny ansioso - mas... você tem... bem, você tem uma dupla personalidade.
- Tenho uma du-o quê? - gaguejou Raveneh intrigada.
- Dupla personalidade. - disse Johnny já com um pouco mais de coragem, embora não soubesse explicar o problema de Raveneh - tem vezes que você não é você... outra pessoa que "toma" seu corpo... Mas na verdade, ela faz parte de você, sabe? Desde criança.
- Ah. - fez Raveneh sem conseguir entender muita coisa do que Johnny falava.
- É outra menina, e ela age por você - disse Johnny - o nome dela...
- Qual o nome dela? - indagou Raveneh sem aparentar surpresa.
- Catherine.
Raveneh abriu a boca para emitir um murmúrio de espanto, mas logo calou-se. Estava sentindo alguma coisa, que não conseguia explicar...
Sua expressão se contorceu de dor.
- O que houve, Raveneh? - Johnny perguntou, preocupado.
- N-nada... - gaguejou Raveneh - nada...
Seu olhar estava maligno.
--------------------------
- Faça todos aqueles que têm sangue nas mãos sintam dores - disse Siih com um sorriso.
Lefi, desesperado, gritou:
- Tola! Tola, tola, mil vezes tola! E a batalha recente em Campinas? Eles mataram muitos soldados! - hesitou ofegante - os soldados mataram pessoas! Mas eles fizeram em favor do reino, em uma guerra! Vai punir-los também? Você não é Deus!
Siih não deu atenção as palavras do irmão.
--------------------------
- A-ai... - murmurou Fer.
- O que houve? - Rafitcha perguntou - o morango não caiu bem?
- Não - disse Doceh - é uma dor... mas ela é estranha. Como se fosse uma agulha que insiste em nos alfinetar, e cria uma agonia...
- É doloroso - disse Kibii - mas... mas o que é isso? Você não sente, Rafitcha?
- Não! - disse Rafitcha preocupada.
- Também não sinto nada - contou Tatiih.
- Então é somente nós... - disse Fer - o que é isso? D-dói tanto...!
E pela primeira vez desde que Fer veio para as Campinas, viram-na chorar de dor.
--------------------------
- D-dói - murmurou Raveneh pasma - m-meu... Céus! - mordeu o lábio inferior.
- O que está acontecendo? - indagou Johnny confuso.
- Está doendo! - murmurou Raveneh - está doendo demais! E-eu...
--------------------------
- Que faça reviver as mortes que causou. - murmurou Siih.
- Você está punindo os assassinos ou está expulsando os nortistas? - gritou Lefi.
--------------------------
- Catherine... - murmurou Raveneh - meu Deus, Catherine está sangrando tanto...
Johnny ficou pasmo. Será que a outra personalidade de Raveneh estava finalmente revelando o que fizera a Raveneh?
- A-argh... - rosnou Raveneh - Johnny, saia, por favor... saia. Vou acabar fazendo... ai!, al-algum mal...
- Mas, Raveneh!...
- Saia!
- Ra...
- Saia - disse Catherine - Raveneh não está se sentindo bem. Saia, por favor.
Johnny, reconhecendo a voz de Catherine, saiu do quarto.
- Está bem.
--------------------------
Rafitcha saíra da cozinha, a procura de Nath para ajudar as meninas, e logo encontrou o irmão quase chorando.
- Johnny! - exclamou - o que houve?
- Raveneh... - murmurou Johnny - sentiu dores e me mandou embora.
Não se sentia disposto a contar sobre a Catherine.
- Engraçado... - disse Rafitcha - Doceh, Fer e Kibii também sentiram dores. Estou procurando a Nath para saber o que é isso.
Johnny ergueu o rosto, surpreso.
- Tem algo em comum entre elas... - disse ele - mas o quê?
--------------------------
- Siih, me ouça - pediu Lefi, que já estava exausto de tanto berrar.
Seus gritos atraíram Vê e Gika, que tiveram o cuidado de fechar a porta para que ninguém mais escutasse os gritos. Elas estavam na porta, observando, caladas e com medo, a cena entre os dois irmãos. Siih realmente parecia fora de si.
Siih levantou o rosto.
- Você realmente achou que eu iria punir os assassinos? Meu irmão, não sou cruel - sua voz estava normal, assim como o olhar. Sorriu com o sorriso meigo que sempre tivera - foi somente um teste. Uma dor... Pare.
--------------------------
- Não precisa mais, Rafitcha! - disse Tatiih. - parou.
- Que alívio... - murmurou Doceh - foi como um pesadelo...
- Parecia que eu ainda estava na floresta - sussurrou Kibii - mas a floresta estava sinistra... e a cada flecha que eu a-atirava - hesitou, quase chorando - era como se fosse veneno no meu corpo... doía...
Fer ficou calada. Não rememorou a guerra como Doceh e Kibii, embora tivesse matado muitos soldados nessa situação. Lembrou de alguns meses antes.
Quando lavou a sua alma em sangue.
Afiava a espada.
- Órfã tola! - grasnou uma voz rouca - não era a filha daquele carinha?
Fer não virou a cara. Sabia perfeitamente a distância, e se quisesse poderia matar-lo agora. Mas queria se divertir um pouco antes...
- Calem-se. - disse.
Os homens aproximaram-se e logo fizeram um círculo em volta de Fer. Eram os homens que conseguiram escapar durante o atentado a pensão onde morara. "Estúpidos" pensou Fer, observando o jeito que os homens brandiam suas espadas "mal sabem segurar uma espada". Sorriu.
- Quer morrer agora, menininha? - riu o maior dos homens. Os outros o acompanharam nos risos.
Risos horríveis, grasnantes, que causariam muitos pesadelos a qualquer pessoa que estaria ali. Menos Fer que não se abalava com esse tipo de coisa.
Fer levantou sua espada.
Os homens riram.
- Matem-na! - berrou o maior dos homens, visivelmente o chefe deles.
Todos os homens pularam em direção a Fer, que estava cercada. Mas tal a surpresa quando perceberam que Fer não estava mais ali.
- Aqui. - disse Fer.
Todos olharam para o alto: Fer dera um pulo magnifíco e estava prestes a descer.
- Ela é uma boa espadachim! - murmurou um deles.
Logo Fer desceu, e com um golpe, cortou a cintura de cinco deles.
- E-ela é forte... - gaguejou um deles logo antes de cair.
Mais um salto, mais um corte. Quando um deles atacava pela frente, ela sempre estava por trás, e traiçoeiramente desferia um letal golpe por trás. Quando ela estava na frente, e o oponente tentava um golpe em horizontal para cortar a cintura de Fer e separar-la em duas, ela saltava e a espada partia a cabeça sem piedade.
Em questão de poucos minutos, só restara o chefe.
Os outros ainda estavam vivos, agonizantes.
Fer utilizara-se de golpes aprendidos com o pai, que não causavam a morte imediata. Ela queria que eles sofressem o maior tempo possível, que pagassem o que fizeram com a sua vida. O céu, nublado, parecia concordar com seus ideais de justiça.
- Tola! - disse o chefe - nós matamos o seu querido paizinho? E por isso...
- Cale-se. - disse Fer - não merece dizer uma palavra sequer.
Não precisou de muito tempo para ele perceber que ela brandira a espada e a utilizara tão rápido que ele nem sentiu.
Mas ela acabara de cortar suas partes baixas.
- Creio que nunca mais poderá ser grosseiro com as meninas novamente. - murmurou Fer com um sorriso - soube que você fez isso em outras cidades.
- M-Maldita! - exclamou o chefe pasmo - e-eu vou pegar você!
- Não acho que você vá viver o suficiente - Fer sussurrou, colocando a sua capa, com repulsa na voz - do jeito que isso está sangrando, sinto muito. Mas se achar um médico, quem sabe?
O chefe conseguiu caminhar até ela, e brandir a espada.
Fer não precisou utilizar-se da sua espada: do jeito que o chefe estava sonso, era mais fácil lhe dar um murro certeiro no abdomên.
- M-Maldita - murmurou o chefe, quase fechando os olhos.
- Vou deixar você vivo. - disse Fer colocando a espada na bainha. Não precisava mais dela.
- Estúpida.
- Adeus - disse Fer - se resistir... bem, asseguro que da próxima, serei melhor em tirar uma vida. Já tenho sangue nas minhas mãos. Mais um pouco não fará diferença.
O homem só grasnou.
--------------------------
- Nortistas. - murmurou Siih - os que forem cruéis, por favor, iluminem-se.
Lefi preferiu não falar nada. Conhecia Siih: quando essa menina metia uma idéia, ninguém conseguia persuadir-la. E depois, Siih não era sinceramente cruel e tinha compaixão. Preferiu acreditar nela. Mas tinha muito medo que o poder acabasse por lhe tirar a vida...
Siih iniciou.
- Os que não têm compaixão, tenham suas espadas tomadas.
- Os reféns, que recebam essas espadas tomadas dos nortistas.
- Os reféns, com suas espadas, brandam-nas contra os nortistas que lhe fizeram mal.
- Os nortistas, fujam para seus lugares natais.
Lefi mordeu o lábio inferior.
- As estradas... - o olhar de Siih se iluminou novamente de forma sinistra - estas serão amaldiçoadas. A cada nortista que atravessar uma estrada para Heppaceneoh, seja entrando ou saindo, sofra vinte e quatro horas de loucura. Serão privados de tudo. Comida, água, mulheres. Que a cada água que encontrem, não bebam. Que a cada pão ou fruta que encontrem, não consigam comer. Sintam fome ou sede, mas suas gargantas não aguentam mais. E que a cada mulher que vejam, sintam vontade, mas não conseguirão ter-la. - mordeu o lábio inferior, escondendo seu riso.
- O que acha que ela está fazendo? - indagou Gika a Vê.
- Amaldiçoando Heppaceneoh, acho... - murmurou Vê - expulsando os nortistas...
- Os nortistas... enfraquecerão... - Siih já aparentava sinais de cansaço. Manipular milhares de pessoas a uma longa distância estava lhe custando sua vida, e Lefi percebeu isso.
- Pare! - gritou Lefi - foi o suficiente! Os nortistas conseguirão sair... mas, pare... ou vai morrer!
- Que seja! - Siih debruçou-se sobre o lago e bebeu um pouco da sua água.
As pedras que ficavam em volta do lago, antes opacas, brilharam vivamente. Siih conseguiu sorrir e continuar.
- Lefi... - pediu Siih - acione a Tropa da Lua.
- T-Tropa da Lua? Mas... - disse Lefi pasmo. Porquê justamente esta tropa?
- Vá, por favor? - Siih estava extremamente doce.
Lefi foi.
- O que é a Tropa da Lua? - indagou Vê.
- Uma tropa especial, feita para as fadas - disse Gika - são extremamente treinadas.
- Ah...
--------------------------
- BWAAAAAAAAAAAAAHHH!!!!!!!!!!!!!!! - um urro penetrou em Heppaceneoh.
De um dia para outro, tudo mudara. Os nortistas estavam a beira da loucura, e os reféns estavam quase se libertando. E claro, chegou a tropa de fadas.
Cem fadas, todas com expressões felinas e cabelos negros, cavalgavam em cavalos brancos e alados. Estavam furiosas, e também um tanto confusas, porque nunca, em toda a história, atacaram um reino que não estivesse sob o domínio das fadas.
Mas obedeceram, e com fúria.
As fadas da Tropa da Luz são exímias na arte de batalhar, principalmente com espadas. Eram absolutamente perfeitas, e tinham a essência da crueldade, tão necessária para derrotar os nortistas.
Mesmo os nortistas enfraquecidos pela magia de Siih, não podiam se privar do seu instinto cruel, coisa que Siih sabia muito bem.
- Quem são elas? - indagou um nortista.
- T-Tropa da Lua... - gaguejou outro.
Uma hora se passou, muito sangue jorrou.
Outra hora se passou, mais sangue se derramou.
Mas o sangue não era das fadas.
Siih, quando armara seu plano, pensara em tudo. As fadas da Tropa da Lua poderiam derrotar os nortistas, mas eles teriam que estar enfraquecidos para não revidarem com força e machucarem as fadas.
No final de duas horas, Heppaceneoh estava afundada em sangue. Nunca, nunca na vida as pessoas que moravam por lá poderiam dizer que já haviam visto tanto sangue na vida.
As fadas olharam para tudo com desprezo. Obedecendo as ordens que Lefi dera, voltaram.
Um.
As pessoas olharam em volta, percebendo que os nortistas estavam mortos.
Dois.
O sino tocou, de algum lugar, festejando.
Três.
As pessoas dentro do castelo saíram todas.
Quatro.
O castelo sucumbiu. E o que antes era um imponente castelo, agora era só um punhado de pedras e pó.
Os nortistas estão mortos. todos diziam para si Não temos mais nortistas por aqui.
Mas era difícil de acreditar.
Muito, muito difícil.
- Escute-me! - disse Johnny ríspido - você precisa acabar com isso!
- Com o quê? - devolveu Raveneh confusa. Estavam sentados no quarto de Raveneh, o sol ameaçando descer.
- E-eu nem sei como dizer isso, Raveneh... - disse Johnny ansioso - mas... você tem... bem, você tem uma dupla personalidade.
- Tenho uma du-o quê? - gaguejou Raveneh intrigada.
- Dupla personalidade. - disse Johnny já com um pouco mais de coragem, embora não soubesse explicar o problema de Raveneh - tem vezes que você não é você... outra pessoa que "toma" seu corpo... Mas na verdade, ela faz parte de você, sabe? Desde criança.
- Ah. - fez Raveneh sem conseguir entender muita coisa do que Johnny falava.
- É outra menina, e ela age por você - disse Johnny - o nome dela...
- Qual o nome dela? - indagou Raveneh sem aparentar surpresa.
- Catherine.
Raveneh abriu a boca para emitir um murmúrio de espanto, mas logo calou-se. Estava sentindo alguma coisa, que não conseguia explicar...
Sua expressão se contorceu de dor.
- O que houve, Raveneh? - Johnny perguntou, preocupado.
- N-nada... - gaguejou Raveneh - nada...
Seu olhar estava maligno.
--------------------------
- Faça todos aqueles que têm sangue nas mãos sintam dores - disse Siih com um sorriso.
Lefi, desesperado, gritou:
- Tola! Tola, tola, mil vezes tola! E a batalha recente em Campinas? Eles mataram muitos soldados! - hesitou ofegante - os soldados mataram pessoas! Mas eles fizeram em favor do reino, em uma guerra! Vai punir-los também? Você não é Deus!
Siih não deu atenção as palavras do irmão.
--------------------------
- A-ai... - murmurou Fer.
- O que houve? - Rafitcha perguntou - o morango não caiu bem?
- Não - disse Doceh - é uma dor... mas ela é estranha. Como se fosse uma agulha que insiste em nos alfinetar, e cria uma agonia...
- É doloroso - disse Kibii - mas... mas o que é isso? Você não sente, Rafitcha?
- Não! - disse Rafitcha preocupada.
- Também não sinto nada - contou Tatiih.
- Então é somente nós... - disse Fer - o que é isso? D-dói tanto...!
E pela primeira vez desde que Fer veio para as Campinas, viram-na chorar de dor.
--------------------------
- D-dói - murmurou Raveneh pasma - m-meu... Céus! - mordeu o lábio inferior.
- O que está acontecendo? - indagou Johnny confuso.
- Está doendo! - murmurou Raveneh - está doendo demais! E-eu...
--------------------------
- Que faça reviver as mortes que causou. - murmurou Siih.
- Você está punindo os assassinos ou está expulsando os nortistas? - gritou Lefi.
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- Catherine... - murmurou Raveneh - meu Deus, Catherine está sangrando tanto...
Johnny ficou pasmo. Será que a outra personalidade de Raveneh estava finalmente revelando o que fizera a Raveneh?
- A-argh... - rosnou Raveneh - Johnny, saia, por favor... saia. Vou acabar fazendo... ai!, al-algum mal...
- Mas, Raveneh!...
- Saia!
- Ra...
- Saia - disse Catherine - Raveneh não está se sentindo bem. Saia, por favor.
Johnny, reconhecendo a voz de Catherine, saiu do quarto.
- Está bem.
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Rafitcha saíra da cozinha, a procura de Nath para ajudar as meninas, e logo encontrou o irmão quase chorando.
- Johnny! - exclamou - o que houve?
- Raveneh... - murmurou Johnny - sentiu dores e me mandou embora.
Não se sentia disposto a contar sobre a Catherine.
- Engraçado... - disse Rafitcha - Doceh, Fer e Kibii também sentiram dores. Estou procurando a Nath para saber o que é isso.
Johnny ergueu o rosto, surpreso.
- Tem algo em comum entre elas... - disse ele - mas o quê?
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- Siih, me ouça - pediu Lefi, que já estava exausto de tanto berrar.
Seus gritos atraíram Vê e Gika, que tiveram o cuidado de fechar a porta para que ninguém mais escutasse os gritos. Elas estavam na porta, observando, caladas e com medo, a cena entre os dois irmãos. Siih realmente parecia fora de si.
Siih levantou o rosto.
- Você realmente achou que eu iria punir os assassinos? Meu irmão, não sou cruel - sua voz estava normal, assim como o olhar. Sorriu com o sorriso meigo que sempre tivera - foi somente um teste. Uma dor... Pare.
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- Não precisa mais, Rafitcha! - disse Tatiih. - parou.
- Que alívio... - murmurou Doceh - foi como um pesadelo...
- Parecia que eu ainda estava na floresta - sussurrou Kibii - mas a floresta estava sinistra... e a cada flecha que eu a-atirava - hesitou, quase chorando - era como se fosse veneno no meu corpo... doía...
Fer ficou calada. Não rememorou a guerra como Doceh e Kibii, embora tivesse matado muitos soldados nessa situação. Lembrou de alguns meses antes.
Quando lavou a sua alma em sangue.
Afiava a espada.
- Órfã tola! - grasnou uma voz rouca - não era a filha daquele carinha?
Fer não virou a cara. Sabia perfeitamente a distância, e se quisesse poderia matar-lo agora. Mas queria se divertir um pouco antes...
- Calem-se. - disse.
Os homens aproximaram-se e logo fizeram um círculo em volta de Fer. Eram os homens que conseguiram escapar durante o atentado a pensão onde morara. "Estúpidos" pensou Fer, observando o jeito que os homens brandiam suas espadas "mal sabem segurar uma espada". Sorriu.
- Quer morrer agora, menininha? - riu o maior dos homens. Os outros o acompanharam nos risos.
Risos horríveis, grasnantes, que causariam muitos pesadelos a qualquer pessoa que estaria ali. Menos Fer que não se abalava com esse tipo de coisa.
Fer levantou sua espada.
Os homens riram.
- Matem-na! - berrou o maior dos homens, visivelmente o chefe deles.
Todos os homens pularam em direção a Fer, que estava cercada. Mas tal a surpresa quando perceberam que Fer não estava mais ali.
- Aqui. - disse Fer.
Todos olharam para o alto: Fer dera um pulo magnifíco e estava prestes a descer.
- Ela é uma boa espadachim! - murmurou um deles.
Logo Fer desceu, e com um golpe, cortou a cintura de cinco deles.
- E-ela é forte... - gaguejou um deles logo antes de cair.
Mais um salto, mais um corte. Quando um deles atacava pela frente, ela sempre estava por trás, e traiçoeiramente desferia um letal golpe por trás. Quando ela estava na frente, e o oponente tentava um golpe em horizontal para cortar a cintura de Fer e separar-la em duas, ela saltava e a espada partia a cabeça sem piedade.
Em questão de poucos minutos, só restara o chefe.
Os outros ainda estavam vivos, agonizantes.
Fer utilizara-se de golpes aprendidos com o pai, que não causavam a morte imediata. Ela queria que eles sofressem o maior tempo possível, que pagassem o que fizeram com a sua vida. O céu, nublado, parecia concordar com seus ideais de justiça.
- Tola! - disse o chefe - nós matamos o seu querido paizinho? E por isso...
- Cale-se. - disse Fer - não merece dizer uma palavra sequer.
Não precisou de muito tempo para ele perceber que ela brandira a espada e a utilizara tão rápido que ele nem sentiu.
Mas ela acabara de cortar suas partes baixas.
- Creio que nunca mais poderá ser grosseiro com as meninas novamente. - murmurou Fer com um sorriso - soube que você fez isso em outras cidades.
- M-Maldita! - exclamou o chefe pasmo - e-eu vou pegar você!
- Não acho que você vá viver o suficiente - Fer sussurrou, colocando a sua capa, com repulsa na voz - do jeito que isso está sangrando, sinto muito. Mas se achar um médico, quem sabe?
O chefe conseguiu caminhar até ela, e brandir a espada.
Fer não precisou utilizar-se da sua espada: do jeito que o chefe estava sonso, era mais fácil lhe dar um murro certeiro no abdomên.
- M-Maldita - murmurou o chefe, quase fechando os olhos.
- Vou deixar você vivo. - disse Fer colocando a espada na bainha. Não precisava mais dela.
- Estúpida.
- Adeus - disse Fer - se resistir... bem, asseguro que da próxima, serei melhor em tirar uma vida. Já tenho sangue nas minhas mãos. Mais um pouco não fará diferença.
O homem só grasnou.
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- Nortistas. - murmurou Siih - os que forem cruéis, por favor, iluminem-se.
Lefi preferiu não falar nada. Conhecia Siih: quando essa menina metia uma idéia, ninguém conseguia persuadir-la. E depois, Siih não era sinceramente cruel e tinha compaixão. Preferiu acreditar nela. Mas tinha muito medo que o poder acabasse por lhe tirar a vida...
Siih iniciou.
- Os que não têm compaixão, tenham suas espadas tomadas.
- Os reféns, que recebam essas espadas tomadas dos nortistas.
- Os reféns, com suas espadas, brandam-nas contra os nortistas que lhe fizeram mal.
- Os nortistas, fujam para seus lugares natais.
Lefi mordeu o lábio inferior.
- As estradas... - o olhar de Siih se iluminou novamente de forma sinistra - estas serão amaldiçoadas. A cada nortista que atravessar uma estrada para Heppaceneoh, seja entrando ou saindo, sofra vinte e quatro horas de loucura. Serão privados de tudo. Comida, água, mulheres. Que a cada água que encontrem, não bebam. Que a cada pão ou fruta que encontrem, não consigam comer. Sintam fome ou sede, mas suas gargantas não aguentam mais. E que a cada mulher que vejam, sintam vontade, mas não conseguirão ter-la. - mordeu o lábio inferior, escondendo seu riso.
- O que acha que ela está fazendo? - indagou Gika a Vê.
- Amaldiçoando Heppaceneoh, acho... - murmurou Vê - expulsando os nortistas...
- Os nortistas... enfraquecerão... - Siih já aparentava sinais de cansaço. Manipular milhares de pessoas a uma longa distância estava lhe custando sua vida, e Lefi percebeu isso.
- Pare! - gritou Lefi - foi o suficiente! Os nortistas conseguirão sair... mas, pare... ou vai morrer!
- Que seja! - Siih debruçou-se sobre o lago e bebeu um pouco da sua água.
As pedras que ficavam em volta do lago, antes opacas, brilharam vivamente. Siih conseguiu sorrir e continuar.
- Lefi... - pediu Siih - acione a Tropa da Lua.
- T-Tropa da Lua? Mas... - disse Lefi pasmo. Porquê justamente esta tropa?
- Vá, por favor? - Siih estava extremamente doce.
Lefi foi.
- O que é a Tropa da Lua? - indagou Vê.
- Uma tropa especial, feita para as fadas - disse Gika - são extremamente treinadas.
- Ah...
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- BWAAAAAAAAAAAAAHHH!!!!!!!!!!!!!!! - um urro penetrou em Heppaceneoh.
De um dia para outro, tudo mudara. Os nortistas estavam a beira da loucura, e os reféns estavam quase se libertando. E claro, chegou a tropa de fadas.
Cem fadas, todas com expressões felinas e cabelos negros, cavalgavam em cavalos brancos e alados. Estavam furiosas, e também um tanto confusas, porque nunca, em toda a história, atacaram um reino que não estivesse sob o domínio das fadas.
Mas obedeceram, e com fúria.
As fadas da Tropa da Luz são exímias na arte de batalhar, principalmente com espadas. Eram absolutamente perfeitas, e tinham a essência da crueldade, tão necessária para derrotar os nortistas.
Mesmo os nortistas enfraquecidos pela magia de Siih, não podiam se privar do seu instinto cruel, coisa que Siih sabia muito bem.
- Quem são elas? - indagou um nortista.
- T-Tropa da Lua... - gaguejou outro.
Uma hora se passou, muito sangue jorrou.
Outra hora se passou, mais sangue se derramou.
Mas o sangue não era das fadas.
Siih, quando armara seu plano, pensara em tudo. As fadas da Tropa da Lua poderiam derrotar os nortistas, mas eles teriam que estar enfraquecidos para não revidarem com força e machucarem as fadas.
No final de duas horas, Heppaceneoh estava afundada em sangue. Nunca, nunca na vida as pessoas que moravam por lá poderiam dizer que já haviam visto tanto sangue na vida.
As fadas olharam para tudo com desprezo. Obedecendo as ordens que Lefi dera, voltaram.
Um.
As pessoas olharam em volta, percebendo que os nortistas estavam mortos.
Dois.
O sino tocou, de algum lugar, festejando.
Três.
As pessoas dentro do castelo saíram todas.
Quatro.
O castelo sucumbiu. E o que antes era um imponente castelo, agora era só um punhado de pedras e pó.
Os nortistas estão mortos. todos diziam para si Não temos mais nortistas por aqui.
Mas era difícil de acreditar.
Muito, muito difícil.
terça-feira, 13 de novembro de 2007
Parte 62 - Siih está estranha.
Siih saiu do lago, e secou-se rapidamente com as toalhas brancas e felpudas que estavam diante do lago. Sabia perfeitamente o que tinha que fazer... estava tão óbvio, tão na cara, que se julgou burra, pois a idéia lhe passou pela cabeça, mas a descartara.
Saiu da 'Sala do Repouso', e foi para o seu quarto normal, onde escolheu um bonito vestido azul-marinho. Era bastante simples, vazio de bordados. Mas tinha um tecido sedoso, e era extremamente confortável e belo.
Penteou os cabelos cuidadosamente, deixando-os soltos.
Olhou-se no espelho.
Sorriu.
Tocou o sininho, e logo veio a Vê correndo.
- Deseja algo, Vossa Majestade? - indagou.
- Eu quero uma maquete do Reino de Heppaceneoh - disse Siih - para agora!
- Uma o quê? - indagou Vê surpresa.
- Uma maquete do Reino de Heppaceneoh! - respondeu Siih calma - pegue a do Museu Leste. E eu quero agora, está me entendendo?
- Mas... - gaguejou Vê - eu não posso roubar um artigo no mu...
- Não quero saber! - sussurrou Siih - pode roubar, dou permissão para tal coisa. Mas eu exijo a maquete.
Vê tremia descontrolada.
- Está bem, Vossa Majestade - disse Vê vencida e saiu, exasperada, do quarto.
Você não precisava ser tão dura com ela, disse uma voz na cabeça de Siih, ela é só uma garota. Aliás, quase da mesma idade que a sua.
Siih suspirou impaciente, olhando para a tarde que se arrastava.
--------------------------
- Raveneh! - chamou Rafitcha - que tal morangos?
- Ahh!! - exclamou Raveneh - que bom!
Havia um grande grupo de garotas na cozinha do navio, que riam, divertidas e alegres.
- Eu preciso treinar minha mira - suspirou Fer.
- Digo o mesmo - concordou Kibii.
- Ah, tem árvores por toda a volta - observou Rafitcha - Doceh, você gostaria de morangos?
- Oh, sim, obrigada! - respondeu Doceh - eu preciso aumentar meu estoque de chocolates venenosos. Só sobram uns quatro que mal matam uma pessoa.
- Vocês são muito estranhas - comentou Raveneh, distraída.
- Ora, ora! - riu Tatiih - por que diz isso, Raveneh?
Raveneh respirou fundo e respondeu:
- Vocês falam de "matar" como se fosse algo tão... - suspirou - ...natural!
- Morte é uma coisa natural - disse Fer - e nós sempre temos uns invasores que bem merecem uma ida para o outro lado.
- Isso aí! - riu Kibii - mas fique tranquila, minha doce Raveneh! Nós não matamos cruelmente e sem necessidade.
- Sim... - suspirou Raveneh com um sorriso.
--------------------------
- Eis a maquete! - disse uma Vê completamente ofegante.
- Obrigada, Vê - agradeceu Siih - já não era tempo.
Vê saiu da sala rapidamente, enquanto Siih penetrava na Sala do Repouso com a maquete nas mãos.
Era uma maquete absolutamente perfeita, Siih reparou. O castelo, os bonequinhos, as casas enfileiradas como o Rei gostava.
A maquete era perfeita para o seu plano.
--------------------------
- Hey! - chamou Johnny - Raven, cadê Raveneh?
- Eu a vi por andando por lá junto com Rafitcha - respondeu Raven enquanto selecionava alguns peixes para o jantar.
- Obrigado, Raven! - agradeceu Johnny.
- Não tem de quê! - sorriu Ravenh.
Johnny disparou pelo corredor. As palavras de Gika ainda ecoavam na sua cabeça.
Raveneh tivera pesadelos, e agora Johnny sabia os motivos deles. Diabos, pensou, não me admira que tenha tantos pesadelos tendo uma moça maluca dentro de si que mata a mãe e deixa a irmã morrer sem ajuda!
"Diga que ela tem uma dupla personalidade e que manifestou muitas vezes." Johnny se lembrou das palavras de Gika "Mas não diga nada sobre o que a outra fez. Nada."
Escutou as vozes de Rafitcha e Raveneh.
- Achei! - exclamou.
--------------------------
Siih sorriu. Deixara a passagem aberta, em caso de perigo.
- Agora... - disse Siih para a maquete - torne-se viva!
- Sim! - disse uma voz ruidosa, que ecoou por todo o aposento.
A maquete dobrou, então, de tamanho, e imediatamente os bonequinhos ganharam vida, outros bonequinhos surgiram com a feição dos nortistas e a maquete assumiu o aspecto atual do reino: queimado, destruído, arrasado.
- Que os nortistas apareçam luminosos, sem exceção - disse Siih em um tom baixo - que sua luz seja avermelhada.
Imediatamente metade dos bonequinhos se iluminaram vermelhos.
- Que os nativos do Reino de Heppaceneoh se iluminem azulados.
A outra metade dos bonequinhos assumiram uma tonalidade azul.
- Agora... - murmurou SIih - que tudo o que eu faça com esses bonecos... aconteça na vida real, em Heppaceneoh.
E riu.
--------------------------
- Raveneh? - indagou Johnny.
- Estou aqui - respondeu Raveneh.
- Hey, quer morangos? - ofereceu Rafitcha ao mesmo tempo que Raveneh respondia.
- Err... - disse Johnny - quero uns três. Raveneh, preciso falar com você. Agora.
- Ok... - disse Raveneh intrigada.
Rafitcha pegou um pote e colocou oito morangos dentro, dando-o para Johnny.
- Obrigada, irmã. - agradeceu Johnny.
- De nada!
Johnny e Raveneh saíram da cozinha, ele um tanto apressado e ansioso, ela confusa, mas tranquila.
- O que será que ele queria com ela? - perguntou Fer.
- Não sei - disse Kibii - mas dissem que ela está fazendo terapia.
- Terapia? - surpreendeu-se Umrae - mas porquê?
- Traumas que adquiriu no castelo - disse Tatiih - é a resposta mais óbvia, não?
- É, pode ser - concordou Kibii - se eu passasse pelo que Raveneh passou, eu ia fazer terapia também!
- Concordo! - comentou Fer - mas Raveneh está tão doce, tão calma! Não dá pra pensar que ela estaria fazendo terapia!
- É... - disse Umrae - mas sempre acho que os bonzinhos demais são os mais perigosos...
- O que está insinuando, Umrae? - indagou Doceh - que Raveneh é uma, sei lá, assassina a sangue frio?
- Não... - respondeu Umrae - somente acho suspeito as ações de Raveneh. Não importa, a doçura dela não me convence de que não há algo mais.
- Hmmm... - disse Fer - mas isso é pra todos, não? Enfim, eu voto que Raveneh não faz mal a ninguém. Certo, garotas?
- Certo! - as garotas bradiram em resposta.
- Weee!! Tem mais morangos ou você deu tudo para Johnny, Rafitcha? - perguntou Tatiih sorridente.
--------------------------
Todo o castelo começou a tremer.
A água do pequeno lago de Siih começou a borbulhar, e os pertences começaram a cair dentro dos domínios reais.
No corredor, Vê caiu no primeiro tremor, ao que foi socorrida por Gika.
- Vê! - Gika exclamou - o que houve?
- Estamos tendo terremoto! - disse Vê se levantando.
- Não seja boba! - Gika disse - nós moramos nas nuvens, não existem terremotos!
- Ah tá! - zombou Vê - então é um vulcão que explodiu?
- Não...! - disse Gika - é... mágico. Não é natural!
- Legal! - ironizou Vê - realmente o chão não se racha, só treme. Mas é desconfortável!
- É... - Gika disse pensativa, e quase caiu se não tivesse se segurado em uma estante.
- Hey, vocês duas! - gritou Lefi, que vinha pelo corredor - vocês viram a Siih?
- Siih? - indagou Gika - wow..
- É o nome íntimo da Vossa Majestade - disse Vê - e-ela - segurou-se em uma estante - ela está no quarto.
- Fazendo o quê? - indagou Lefi que não se segurava em nada, e também não caía.
- E-ela estava estranha - gaguejou Vê - pediu uma maquete de Heppaceneoh, aí eu saí... E-ela estava tão estranha.
- Como assim estranha? - Gika perguntou, intrigada.
- Ah, não sei explicar! - disse Vê - o olhar dela estava estranho, não sei! Só sei dizer que a Vossa Majestade estava muito esquisita!
- Siih! - exclamou Lefi - que diabos está fazendo?
Entrou pelo quarto correndo, tão rápido que trombou em Vê e a coitada caiu no chão de novo.
Mais um tremor.
Lefi viu a pintura revirada e a porta aberta.
- A Sala do Repouso? - indagou para si - mas há tempos que Siih não a usa! Meu Deus, só pode ser algo ruim...
Mal entrou, deparou-se com uma cena, no mínimo, estranha.
Siih estava diante do lago, com a maquete viva do Reino de Heppaceneoh, e sorria de um modo bastante sinistro.
- Olá, Lefi - disse Siih - pretende assistir o começo da Era das Fadas?
- Eu... - Lefi começou a dizer, mas logo calou-se. Que diabos era aquela maquete, e que diabos Siih falava de "Era das Fadas"? - do que está falando?
- Estive pensando... - disse Siih - Arthur demorará mais uns sete anos até poder governar Heppaceneoh. Durante esses anos, quem governará aquele reino?
- Permaneceria como território das fadas - disse Lefi - mas o que quer dizer com isso, Siih? E... Veronica G. tinha razão... você está tão estranha! - concluiu aterrorizado.
Siih sorriu, debaixo dos cabelos desalinhados. Não se podia ver seu olhar, pos estava escuro, mas Lefi podia ver uma luminosidade branca e forte que vinha dos olhos, como se fossem faróis.
- Correto, meu caro irmão - disse Siih. A voz dela também estava diferente: mais rouca, mais sensual.
- Pare com isso... - disse Lefi - o que está fazendo?
Correu até o lago, e já ia mergulhar, quando foi empurrado por mãos invisíveis e jogado no outro extremo da sala, longe de Siih.
- Veja. Não interfira - disse Siih pondo as mãos sobre a maquete, que iluminava.
- O que vai fazer? - indagou Lefi, machucado com o empurrão - você que me afastou, S-Siih...?
- Não posso deixar que me atrapalhem, meu querido irmão - disse Siih indiferente - sinto muito... Mas não permitirei que ninguém se aproxime até terminar o que devo fazer. Não se preocupe... não matarei inocentes.
- M-Meu Deus!... - gaguejou Lefi - o poder subiu a cabeça... PARE! - e tentou correr ao encontro da irmã mais uma vez, mas logo se deparou com uma barreira invisível, que não lhe permitia ir adiante.
Siih olhou para Lefi, e disse, com um sincero sorriso:
- Vejamos... os que carregam mortes nas costas... iluminem desde Heppaceneoh até as Campinas!
Saiu da 'Sala do Repouso', e foi para o seu quarto normal, onde escolheu um bonito vestido azul-marinho. Era bastante simples, vazio de bordados. Mas tinha um tecido sedoso, e era extremamente confortável e belo.
Penteou os cabelos cuidadosamente, deixando-os soltos.
Olhou-se no espelho.
Sorriu.
Tocou o sininho, e logo veio a Vê correndo.
- Deseja algo, Vossa Majestade? - indagou.
- Eu quero uma maquete do Reino de Heppaceneoh - disse Siih - para agora!
- Uma o quê? - indagou Vê surpresa.
- Uma maquete do Reino de Heppaceneoh! - respondeu Siih calma - pegue a do Museu Leste. E eu quero agora, está me entendendo?
- Mas... - gaguejou Vê - eu não posso roubar um artigo no mu...
- Não quero saber! - sussurrou Siih - pode roubar, dou permissão para tal coisa. Mas eu exijo a maquete.
Vê tremia descontrolada.
- Está bem, Vossa Majestade - disse Vê vencida e saiu, exasperada, do quarto.
Você não precisava ser tão dura com ela, disse uma voz na cabeça de Siih, ela é só uma garota. Aliás, quase da mesma idade que a sua.
Siih suspirou impaciente, olhando para a tarde que se arrastava.
--------------------------
- Raveneh! - chamou Rafitcha - que tal morangos?
- Ahh!! - exclamou Raveneh - que bom!
Havia um grande grupo de garotas na cozinha do navio, que riam, divertidas e alegres.
- Eu preciso treinar minha mira - suspirou Fer.
- Digo o mesmo - concordou Kibii.
- Ah, tem árvores por toda a volta - observou Rafitcha - Doceh, você gostaria de morangos?
- Oh, sim, obrigada! - respondeu Doceh - eu preciso aumentar meu estoque de chocolates venenosos. Só sobram uns quatro que mal matam uma pessoa.
- Vocês são muito estranhas - comentou Raveneh, distraída.
- Ora, ora! - riu Tatiih - por que diz isso, Raveneh?
Raveneh respirou fundo e respondeu:
- Vocês falam de "matar" como se fosse algo tão... - suspirou - ...natural!
- Morte é uma coisa natural - disse Fer - e nós sempre temos uns invasores que bem merecem uma ida para o outro lado.
- Isso aí! - riu Kibii - mas fique tranquila, minha doce Raveneh! Nós não matamos cruelmente e sem necessidade.
- Sim... - suspirou Raveneh com um sorriso.
--------------------------
- Eis a maquete! - disse uma Vê completamente ofegante.
- Obrigada, Vê - agradeceu Siih - já não era tempo.
Vê saiu da sala rapidamente, enquanto Siih penetrava na Sala do Repouso com a maquete nas mãos.
Era uma maquete absolutamente perfeita, Siih reparou. O castelo, os bonequinhos, as casas enfileiradas como o Rei gostava.
A maquete era perfeita para o seu plano.
--------------------------
- Hey! - chamou Johnny - Raven, cadê Raveneh?
- Eu a vi por andando por lá junto com Rafitcha - respondeu Raven enquanto selecionava alguns peixes para o jantar.
- Obrigado, Raven! - agradeceu Johnny.
- Não tem de quê! - sorriu Ravenh.
Johnny disparou pelo corredor. As palavras de Gika ainda ecoavam na sua cabeça.
Raveneh tivera pesadelos, e agora Johnny sabia os motivos deles. Diabos, pensou, não me admira que tenha tantos pesadelos tendo uma moça maluca dentro de si que mata a mãe e deixa a irmã morrer sem ajuda!
"Diga que ela tem uma dupla personalidade e que manifestou muitas vezes." Johnny se lembrou das palavras de Gika "Mas não diga nada sobre o que a outra fez. Nada."
Escutou as vozes de Rafitcha e Raveneh.
- Achei! - exclamou.
--------------------------
Siih sorriu. Deixara a passagem aberta, em caso de perigo.
- Agora... - disse Siih para a maquete - torne-se viva!
- Sim! - disse uma voz ruidosa, que ecoou por todo o aposento.
A maquete dobrou, então, de tamanho, e imediatamente os bonequinhos ganharam vida, outros bonequinhos surgiram com a feição dos nortistas e a maquete assumiu o aspecto atual do reino: queimado, destruído, arrasado.
- Que os nortistas apareçam luminosos, sem exceção - disse Siih em um tom baixo - que sua luz seja avermelhada.
Imediatamente metade dos bonequinhos se iluminaram vermelhos.
- Que os nativos do Reino de Heppaceneoh se iluminem azulados.
A outra metade dos bonequinhos assumiram uma tonalidade azul.
- Agora... - murmurou SIih - que tudo o que eu faça com esses bonecos... aconteça na vida real, em Heppaceneoh.
E riu.
--------------------------
- Raveneh? - indagou Johnny.
- Estou aqui - respondeu Raveneh.
- Hey, quer morangos? - ofereceu Rafitcha ao mesmo tempo que Raveneh respondia.
- Err... - disse Johnny - quero uns três. Raveneh, preciso falar com você. Agora.
- Ok... - disse Raveneh intrigada.
Rafitcha pegou um pote e colocou oito morangos dentro, dando-o para Johnny.
- Obrigada, irmã. - agradeceu Johnny.
- De nada!
Johnny e Raveneh saíram da cozinha, ele um tanto apressado e ansioso, ela confusa, mas tranquila.
- O que será que ele queria com ela? - perguntou Fer.
- Não sei - disse Kibii - mas dissem que ela está fazendo terapia.
- Terapia? - surpreendeu-se Umrae - mas porquê?
- Traumas que adquiriu no castelo - disse Tatiih - é a resposta mais óbvia, não?
- É, pode ser - concordou Kibii - se eu passasse pelo que Raveneh passou, eu ia fazer terapia também!
- Concordo! - comentou Fer - mas Raveneh está tão doce, tão calma! Não dá pra pensar que ela estaria fazendo terapia!
- É... - disse Umrae - mas sempre acho que os bonzinhos demais são os mais perigosos...
- O que está insinuando, Umrae? - indagou Doceh - que Raveneh é uma, sei lá, assassina a sangue frio?
- Não... - respondeu Umrae - somente acho suspeito as ações de Raveneh. Não importa, a doçura dela não me convence de que não há algo mais.
- Hmmm... - disse Fer - mas isso é pra todos, não? Enfim, eu voto que Raveneh não faz mal a ninguém. Certo, garotas?
- Certo! - as garotas bradiram em resposta.
- Weee!! Tem mais morangos ou você deu tudo para Johnny, Rafitcha? - perguntou Tatiih sorridente.
--------------------------
Todo o castelo começou a tremer.
A água do pequeno lago de Siih começou a borbulhar, e os pertences começaram a cair dentro dos domínios reais.
No corredor, Vê caiu no primeiro tremor, ao que foi socorrida por Gika.
- Vê! - Gika exclamou - o que houve?
- Estamos tendo terremoto! - disse Vê se levantando.
- Não seja boba! - Gika disse - nós moramos nas nuvens, não existem terremotos!
- Ah tá! - zombou Vê - então é um vulcão que explodiu?
- Não...! - disse Gika - é... mágico. Não é natural!
- Legal! - ironizou Vê - realmente o chão não se racha, só treme. Mas é desconfortável!
- É... - Gika disse pensativa, e quase caiu se não tivesse se segurado em uma estante.
- Hey, vocês duas! - gritou Lefi, que vinha pelo corredor - vocês viram a Siih?
- Siih? - indagou Gika - wow..
- É o nome íntimo da Vossa Majestade - disse Vê - e-ela - segurou-se em uma estante - ela está no quarto.
- Fazendo o quê? - indagou Lefi que não se segurava em nada, e também não caía.
- E-ela estava estranha - gaguejou Vê - pediu uma maquete de Heppaceneoh, aí eu saí... E-ela estava tão estranha.
- Como assim estranha? - Gika perguntou, intrigada.
- Ah, não sei explicar! - disse Vê - o olhar dela estava estranho, não sei! Só sei dizer que a Vossa Majestade estava muito esquisita!
- Siih! - exclamou Lefi - que diabos está fazendo?
Entrou pelo quarto correndo, tão rápido que trombou em Vê e a coitada caiu no chão de novo.
Mais um tremor.
Lefi viu a pintura revirada e a porta aberta.
- A Sala do Repouso? - indagou para si - mas há tempos que Siih não a usa! Meu Deus, só pode ser algo ruim...
Mal entrou, deparou-se com uma cena, no mínimo, estranha.
Siih estava diante do lago, com a maquete viva do Reino de Heppaceneoh, e sorria de um modo bastante sinistro.
- Olá, Lefi - disse Siih - pretende assistir o começo da Era das Fadas?
- Eu... - Lefi começou a dizer, mas logo calou-se. Que diabos era aquela maquete, e que diabos Siih falava de "Era das Fadas"? - do que está falando?
- Estive pensando... - disse Siih - Arthur demorará mais uns sete anos até poder governar Heppaceneoh. Durante esses anos, quem governará aquele reino?
- Permaneceria como território das fadas - disse Lefi - mas o que quer dizer com isso, Siih? E... Veronica G. tinha razão... você está tão estranha! - concluiu aterrorizado.
Siih sorriu, debaixo dos cabelos desalinhados. Não se podia ver seu olhar, pos estava escuro, mas Lefi podia ver uma luminosidade branca e forte que vinha dos olhos, como se fossem faróis.
- Correto, meu caro irmão - disse Siih. A voz dela também estava diferente: mais rouca, mais sensual.
- Pare com isso... - disse Lefi - o que está fazendo?
Correu até o lago, e já ia mergulhar, quando foi empurrado por mãos invisíveis e jogado no outro extremo da sala, longe de Siih.
- Veja. Não interfira - disse Siih pondo as mãos sobre a maquete, que iluminava.
- O que vai fazer? - indagou Lefi, machucado com o empurrão - você que me afastou, S-Siih...?
- Não posso deixar que me atrapalhem, meu querido irmão - disse Siih indiferente - sinto muito... Mas não permitirei que ninguém se aproxime até terminar o que devo fazer. Não se preocupe... não matarei inocentes.
- M-Meu Deus!... - gaguejou Lefi - o poder subiu a cabeça... PARE! - e tentou correr ao encontro da irmã mais uma vez, mas logo se deparou com uma barreira invisível, que não lhe permitia ir adiante.
Siih olhou para Lefi, e disse, com um sincero sorriso:
- Vejamos... os que carregam mortes nas costas... iluminem desde Heppaceneoh até as Campinas!
segunda-feira, 12 de novembro de 2007
Parte 61 - Já parou de se perturbar?
Siih olhava o reino de Heppaceneoh com um misto de ansiedade e nervosismo. Pensava no que aconteceria quando o Rei fosse punido, coisa que aconteceria, com toda a certeza. Suspirou.
Tenho que fazer algo, pensou. Senão Heppaceneoh deixará de existir, e os nortistas não iriam se contentar com um pequeno reino. As Campinas possuiam atrativos, pois tinham uma bela faixa repletas de bonitas e preciosas árvores, que nunca deixavam de dar frutos, além de todos os encantos mágicos que permitem a neve mais fofa no inverno e o sol mais generoso no verão. Houve muitas tentativas de invasão, mas não houve nenhuma bem-sucedida. O máximo foi quando alguns povos antigos invadiram até a floresta e tomaram tudo, mas logo morreram de alguma maldição misteriosa.
- Puuf! - resmungou Siih - o que posso fazer por aquele reino? E se eles tomarem as Campinas? Significa que as fadas também estão sendo ameaçadas!
Sacudiu a cabeça, tentando uma idéia tola qualquer.
- Eu poderia amaldiçoar o castelo! - disse - ah, tolice! E o que farei depois?
Andou mais alguns passos.
Droga.
Um, dois, o que posso fazer? Três, quatro, e se eu mandar as fadas para lá?
Oh sim, eu posso!
- Droga. Para que serve os poderes se não sei usar-los? - perguntou-se.
Para que o mundo rodar em volta de ti
Se você não quer assim?
- Posso amaldiçoar o castelo... - pensa Siih ansiosa - mas uma boa maldição, que dure um dia ou dois...
Siih olha para o espelho.
Sei que tudo é reflexo seu
Sei que tudo é maldição sua
Sei que tudo é seu, seu, seu...
O espelho a encara de volta, inquietante.
Refletiu seu rosto ansioso, seus cabelos desalinhados, seu longo vestido preto e simples, com bordados brancos em forma de flores que se entrelaçavam suaves. Siih mordeu o lábio inferior.
Sei que a morte não é tão bem-vinda assim...
Sei que a morte foi bem má com você...
Sei que você chora todas as noites...
Se perguntando o porquê
De tanto azar...
- Eu podia simplesmente expulsar todos eles com a força do pensamento - refletiu Siih.
Só que lembrou de algumas frases em um livro que lera antes de dormir: "quando um poder é utilizado de forma intensa, prejudica o autor do feitiço por inteiro..."
A morte veio e te assombrou
E o destino vem assombrar
De novo
A morte veio, e te perturbou
E você se perturba todo dia
- Com coisas pequenas, Siih - pensa.
Andou até a descomunal parede, onde um quadro pintado por seu pai imperava soberano. Usando um pouco de força, levantou o quadro, que revelou um círculo na branca parede.
- Furinkitte... - sussurrou.
O círculo aumentou de tamanho, compreendendo todo o corpo de Siih e desapareceu, deixando no lugar um buraco na parede.
Logo se revelou um imenso corredor, que dava para uma sala enorme, toda azul. O chão, frio, era de mármore e no meio um lago, cuja água parecia espelho. Em volta, pedras azuis e redondas decoravam serenes.
A iluminação era algo fantástico, dando um ar bastante místico para a sala. Siih a chamava de "Sala de Repouso", onde fazia suas reflexões mais importantes. Foi um presente de aniversário secreto, dado pelo pai, quando Siih tinha apenas quatro anos de idade e vivia embirrada, com ciúmes de Lefi, apenas um bebê na época. Na época, seu pai lhe dizera que apesar de a mãe dar todos os cuidados para o bebê, ainda a amavam demais e que ela seria a Rainha. E como toda grande rainha, devia ter uma sala secreta onde pudesse se refugiar dos problemas.
- Papai... - sussurrou Siih.
Tirou a roupa calmamente. A sala era repleta de espelhos, e francamente, não aguentava mais se ver de preto. Entrou na lagoa.
Oh sim, e você se perturba todo dia
Se recolhe em seu quarto e chora por dentro
E pensa e fala e grita e chora
E pensa e fala e grita e chora
Siih mergulhou no pequeno lago, cujo chão era inclinado. Portanto havia a parte rasa, onde Siih podia se sentar e a água batia na altura dos ombros, e a parte funda onde Siih ficava submersa mesmo se ficasse em pé.
Chegou na parte funda, boiando. Siih sempre soubera nadar, e conseguia ficar até quinze minutos respirando debaixo d'água direto.
Esse lugar é mágico, pensou Siih, poderia realizar minhas mágicas aqui... depois abdicarei dos meus poderes.
Subiu até a borda, observando as pedras azuis e redondas.
- É isso! - exclamou para si.
E quando chora, você não pensa.
Mas quando pensa, já não chora.
Arranjou a solução?
E ela será a minha maldição?
- Lembro perfeitamente do que papai dizia - riu Siih - a água realmente faz refrescar as idéias!
Nadou mais um pouco, sorrindo.
- As pedras possuem propriedades mágicas - disse Siih.
Como em flashes de memória, relembrou uma cena de sua infância:
- Siih - disse seu pai - são vinte e cinco pedras ao todo. Todas azuis, mas de tons diferentes. Percebe?
- Sim, papai! - disse uma Siih feliz, admirando boquiaberta todo o lago. Seu pai sorriu e continuou:
- Todas elas têm algo de mágico - disse o pai, calmo - quando você for a Rainha disto tudo, vai pecisar dessas pedras.
- Mas, papai! - exclamou Siih sacudindo os braços - eu só quero um lugar pra eu nadá!
- Eu sei, querida - riu o pai - mas no futuro, terá algo mais do que somente um lago pra se nadar. Veja, bem, minha querida... são vinte e quatro pedras. Não se esqueça do que vou falar, está bem? Sempre, sempre lembre disso, pois pode salvar você, seu reino ou as pessoas ao seu redor.
- Estou ouvindo, sim, papai! - riu Siih - e vou lembrá sempre, sim!
- Das vinte e cinco, oito são feitas para atacar - continuou o pai, já sério - oito feitas para se defender e mais oito para te ajudarem nos seus feitiços.
- Como assim? - Siih indagou, curiosa.
- Quando você precisar atacar algo, as oito pedras mais escuras, com o tom semelhante ao céu durante a noite, lhe ajudarão - respondeu o pai - elas aumentarão os seus poderes. Quando estiverem te atacando e você não souber o que fazer, utilize as oito pedras que ficam lado a lado com as pedras de ataque. Seu tom de azul é turquesa, como o céu quando anoitece. E tem as oito pedras para absorver. Elas são claras como o céu durante um belo dia, e foram feitas para te ajudarem a não se desgastar muito quando realizar algum ataque.
- São vinte e cinco pedras, papai - observou Siih inocente - esqueceu daquela grandona. Que engraçado... ela não é azul!
- Sim, ela é a Pedra Branca - disse o pai - é a pedra que você deve priorizar. Mas só saberá sua utilidade quando puder... quando estiver preparada.
- Agora estou preparada, não é, papai? - sussurrou Siih. Estava diante da Pedra Branca, que era a maior de todas. Redonda, límpida, e com várias cores. Por que é chamada de Pedra Branca?, perguntou-se, Tem todas as cores!
Siih observou a pedra atentamente.
Vai, vai, vai, que o mundo precisa de você
Vai, vai, vai, que você precisa selar a maldição
Vai, que já se perturbou o suficiente
Vai, que já pensou o bastante
Siih riu. A solução lhe parecia clara como água.
Tudo o que pensara antes e descartara, com medo de que o corpo não aguentasse, estava valendo agora. Aquelas pedras que seu pai lhe dera iriam ajudar-la demais, e realizar tudo o que sonhara ultimamente.
As pedras aguentariam o que ela mesma poderia não aguentar.
Oh sim, e quem disse que você sabe?
Oh sim, se acha melhor que todos!
Oh sim, e quem disse que você é melhor?
O mundo precisa de você
Mas você não precisa dele
São mil destinos que se entrelaçavam
Mas você não tem nada com isso, tem?
Já escolheu o que fazer
Não importa o que queremos
Já escolheu o melhor, tenho certeza
Já parou de se perturbar?
Tenho que fazer algo, pensou. Senão Heppaceneoh deixará de existir, e os nortistas não iriam se contentar com um pequeno reino. As Campinas possuiam atrativos, pois tinham uma bela faixa repletas de bonitas e preciosas árvores, que nunca deixavam de dar frutos, além de todos os encantos mágicos que permitem a neve mais fofa no inverno e o sol mais generoso no verão. Houve muitas tentativas de invasão, mas não houve nenhuma bem-sucedida. O máximo foi quando alguns povos antigos invadiram até a floresta e tomaram tudo, mas logo morreram de alguma maldição misteriosa.
- Puuf! - resmungou Siih - o que posso fazer por aquele reino? E se eles tomarem as Campinas? Significa que as fadas também estão sendo ameaçadas!
Sacudiu a cabeça, tentando uma idéia tola qualquer.
- Eu poderia amaldiçoar o castelo! - disse - ah, tolice! E o que farei depois?
Andou mais alguns passos.
Droga.
Um, dois, o que posso fazer? Três, quatro, e se eu mandar as fadas para lá?
Oh sim, eu posso!
- Droga. Para que serve os poderes se não sei usar-los? - perguntou-se.
Para que o mundo rodar em volta de ti
Se você não quer assim?
- Posso amaldiçoar o castelo... - pensa Siih ansiosa - mas uma boa maldição, que dure um dia ou dois...
Siih olha para o espelho.
Sei que tudo é reflexo seu
Sei que tudo é maldição sua
Sei que tudo é seu, seu, seu...
O espelho a encara de volta, inquietante.
Refletiu seu rosto ansioso, seus cabelos desalinhados, seu longo vestido preto e simples, com bordados brancos em forma de flores que se entrelaçavam suaves. Siih mordeu o lábio inferior.
Sei que a morte não é tão bem-vinda assim...
Sei que a morte foi bem má com você...
Sei que você chora todas as noites...
Se perguntando o porquê
De tanto azar...
- Eu podia simplesmente expulsar todos eles com a força do pensamento - refletiu Siih.
Só que lembrou de algumas frases em um livro que lera antes de dormir: "quando um poder é utilizado de forma intensa, prejudica o autor do feitiço por inteiro..."
A morte veio e te assombrou
E o destino vem assombrar
De novo
A morte veio, e te perturbou
E você se perturba todo dia
- Com coisas pequenas, Siih - pensa.
Andou até a descomunal parede, onde um quadro pintado por seu pai imperava soberano. Usando um pouco de força, levantou o quadro, que revelou um círculo na branca parede.
- Furinkitte... - sussurrou.
O círculo aumentou de tamanho, compreendendo todo o corpo de Siih e desapareceu, deixando no lugar um buraco na parede.
Logo se revelou um imenso corredor, que dava para uma sala enorme, toda azul. O chão, frio, era de mármore e no meio um lago, cuja água parecia espelho. Em volta, pedras azuis e redondas decoravam serenes.
A iluminação era algo fantástico, dando um ar bastante místico para a sala. Siih a chamava de "Sala de Repouso", onde fazia suas reflexões mais importantes. Foi um presente de aniversário secreto, dado pelo pai, quando Siih tinha apenas quatro anos de idade e vivia embirrada, com ciúmes de Lefi, apenas um bebê na época. Na época, seu pai lhe dizera que apesar de a mãe dar todos os cuidados para o bebê, ainda a amavam demais e que ela seria a Rainha. E como toda grande rainha, devia ter uma sala secreta onde pudesse se refugiar dos problemas.
- Papai... - sussurrou Siih.
Tirou a roupa calmamente. A sala era repleta de espelhos, e francamente, não aguentava mais se ver de preto. Entrou na lagoa.
Oh sim, e você se perturba todo dia
Se recolhe em seu quarto e chora por dentro
E pensa e fala e grita e chora
E pensa e fala e grita e chora
Siih mergulhou no pequeno lago, cujo chão era inclinado. Portanto havia a parte rasa, onde Siih podia se sentar e a água batia na altura dos ombros, e a parte funda onde Siih ficava submersa mesmo se ficasse em pé.
Chegou na parte funda, boiando. Siih sempre soubera nadar, e conseguia ficar até quinze minutos respirando debaixo d'água direto.
Esse lugar é mágico, pensou Siih, poderia realizar minhas mágicas aqui... depois abdicarei dos meus poderes.
Subiu até a borda, observando as pedras azuis e redondas.
- É isso! - exclamou para si.
E quando chora, você não pensa.
Mas quando pensa, já não chora.
Arranjou a solução?
E ela será a minha maldição?
- Lembro perfeitamente do que papai dizia - riu Siih - a água realmente faz refrescar as idéias!
Nadou mais um pouco, sorrindo.
- As pedras possuem propriedades mágicas - disse Siih.
Como em flashes de memória, relembrou uma cena de sua infância:
- Siih - disse seu pai - são vinte e cinco pedras ao todo. Todas azuis, mas de tons diferentes. Percebe?
- Sim, papai! - disse uma Siih feliz, admirando boquiaberta todo o lago. Seu pai sorriu e continuou:
- Todas elas têm algo de mágico - disse o pai, calmo - quando você for a Rainha disto tudo, vai pecisar dessas pedras.
- Mas, papai! - exclamou Siih sacudindo os braços - eu só quero um lugar pra eu nadá!
- Eu sei, querida - riu o pai - mas no futuro, terá algo mais do que somente um lago pra se nadar. Veja, bem, minha querida... são vinte e quatro pedras. Não se esqueça do que vou falar, está bem? Sempre, sempre lembre disso, pois pode salvar você, seu reino ou as pessoas ao seu redor.
- Estou ouvindo, sim, papai! - riu Siih - e vou lembrá sempre, sim!
- Das vinte e cinco, oito são feitas para atacar - continuou o pai, já sério - oito feitas para se defender e mais oito para te ajudarem nos seus feitiços.
- Como assim? - Siih indagou, curiosa.
- Quando você precisar atacar algo, as oito pedras mais escuras, com o tom semelhante ao céu durante a noite, lhe ajudarão - respondeu o pai - elas aumentarão os seus poderes. Quando estiverem te atacando e você não souber o que fazer, utilize as oito pedras que ficam lado a lado com as pedras de ataque. Seu tom de azul é turquesa, como o céu quando anoitece. E tem as oito pedras para absorver. Elas são claras como o céu durante um belo dia, e foram feitas para te ajudarem a não se desgastar muito quando realizar algum ataque.
- São vinte e cinco pedras, papai - observou Siih inocente - esqueceu daquela grandona. Que engraçado... ela não é azul!
- Sim, ela é a Pedra Branca - disse o pai - é a pedra que você deve priorizar. Mas só saberá sua utilidade quando puder... quando estiver preparada.
- Agora estou preparada, não é, papai? - sussurrou Siih. Estava diante da Pedra Branca, que era a maior de todas. Redonda, límpida, e com várias cores. Por que é chamada de Pedra Branca?, perguntou-se, Tem todas as cores!
Siih observou a pedra atentamente.
Vai, vai, vai, que o mundo precisa de você
Vai, vai, vai, que você precisa selar a maldição
Vai, que já se perturbou o suficiente
Vai, que já pensou o bastante
Siih riu. A solução lhe parecia clara como água.
Tudo o que pensara antes e descartara, com medo de que o corpo não aguentasse, estava valendo agora. Aquelas pedras que seu pai lhe dera iriam ajudar-la demais, e realizar tudo o que sonhara ultimamente.
As pedras aguentariam o que ela mesma poderia não aguentar.
Oh sim, e quem disse que você sabe?
Oh sim, se acha melhor que todos!
Oh sim, e quem disse que você é melhor?
O mundo precisa de você
Mas você não precisa dele
São mil destinos que se entrelaçavam
Mas você não tem nada com isso, tem?
Já escolheu o que fazer
Não importa o que queremos
Já escolheu o melhor, tenho certeza
Já parou de se perturbar?
domingo, 21 de outubro de 2007
Parte 60 - "Fadas Altas"
Terminada a Assembléia, Siih se retirou para o seu quarto.
- Vê, por favor, faça aquele chá seu para mim? - pediu.
- Sim, Vossa Majestade! - respondeu Vê sorrindo.
- Gika, por favor, a acompanhe :) - disse Siih - eu pretendo ficar sozinha.
- Sim, Vossa Majestade - concordou Gika curvando-se diante de Siih.
- Vamos, Gika - disse Vê.
Gika sorriu, e as duas saíram do aposento, enquanto Siih se recolhia pensativa.
De novo a sensação de fracasso, a sensação de algo estava em cima dela... a sensação infalível: "você é uma fracassada cheia de poder. Como pode uma coisa dessas?"
- Olá. Você está bastante pensativa, irmã - disse Lefi.
- Lefi! Eu dei ordens para não entrar ninguém - disse Siih - como conseguiu barrar as fadas?
- Eu tenho meus truques para burlar suas regras, Siih - riu Lefi - ou você acha que é a única que consegue atravessar as fadas sem elas perceberem?
- Tolo! - riu Siih.
- Bem, já pensou em como vai expulsar os nortistas? - indagou Lefi - eles já estão quase nos portões das Campinas... e como você diz, os nortistas são cruéis demais para o povo das Campinas.
- Sim... - disse Siih tristemente - eu não sei o que fazer. Os nortistas são cruéis demais. Eu podia manipular as mentes deles, não?
- Pode... - concordou Lefi - mas não deve. Eu estive estudando esses dias, e bastante a respeito das magias.
- E...?
- É bem longo. - disse Lefi - eu estudei bastante, sabe. E descobri bastante coisas inteiras.
- Como...?
Lefi começou a sussurrar, quase em um cântico:
- Há muitos anos atrás, quando as primeiras fadas começaram a criar uma vida... - seu tom era baixo, misterioso - uma vida em sociedade... Sempre tinha aquela mais poderosa...
Há muitos anos, quando o tempo era remoto
As fadas se uniram para viver juntas
Mas sempre uma mais poderosa se sobressaía
E esta passava sempre a governar
Foi assim por muitos anos
E é assim até hoje
De vez em quando, nasce alguém
Cujo poder é incontestável
Cujo poder esmaga
Cujo poder é perigoso
E de tal virtude surprema...
Houve um silêncio.
- Uau. Então eu sou uma dessas fadas com um poder que esmaga? - perguntou Siih.
- Mais ou menos - disse Lefi - você é o que pode se chamar de "fada alta" - ao olhar intrigado de Siih, respondeu - fadas altas é um termo utilizado entre magos, quando nasce uma fada com grandes poderes como os seus. Normalmente nascem de famílias que são conhecidas pela magia, e os poderes se manifestam desde os dois, três anos. É um caso bastante raro, e o Mago Compy estudou sobre as "fadas altas". Foi o maior estudo sobre esse tipo de fada já conhecido. Ele calcula que em dez anos, somente três "fadas altas" aparecem, em média. Elas vivem manifestando seus poderes, e é bastante provável que só se dêem conta dos seus poderes quando está na adolescência. Antes de morrer no ano passado, ele diz que nessa década não existe nenhuma "fada alta" que ele conheça.
- Mas e eu? - disse Siih.
- Ele não sabia que você era uma das "fadas altas" - observou Lefi - diz ele que as 'fadas altas' tem grandes poderes de manipulação, conseguem lançar maldições ou proteções em larga escala, envolvendo um país inteiro, por exemplo. Também são capazes de forçar os espirítos naturais a obedecer-la.
Siih emitiu um murmúrio de assombro.
- E por que não tem ninguém que ele conheça? - indagou Siih.
- Ele diz também que as fadas altas tem baixa expectativa de vida - diz Lefi - Mago Compy disse que os poderes são tão devastadores que um corpo frágil de menina pode não conseguir aguentar. E para realizar as magias, utiliza-se muito esforço físico, e se desgasta demais. Diz ele que das 'fadas altas' já conhecidas, a que viveu mais tempo morreu aos 28 anos de idade.
- Quê? Hey, eu não quero morrer jovem! - exclamou Siih pasma - prefiro... prefiro ser uma fada 'baixa' ou...
- Você pode abdicar dos seus poderes - disse Lefi - os poderes, originalmente, pertencem aos espirítos da natureza. De vez em quando, eles cedem os poderes deles para uma fada... Mas se a fada preferir assim, os espirítos aceitarão os poderes de volta. Você podia fazer isso, Siih.
- Primeiro vou expulsar os nortistas - disse Siih convicta - depois abdicarei dos meus poderes. Prefiro ser uma Rainha velha e sem poderes do que uma morta, jovem e com poderes u_u"
- Compreende-se - Lefi sorriu - já sabe o que fará contra os nortistas?
- Sei... - disse Siih - por favor, dá para me informar de tudo que as 'fadas altas' poderiam fazer?
Lefi sorriu.
--------------------------
Johnny estava no Reino das Fadas, mais especificamente na Rua Fuji onde se compra deliciosos morangos com chocolates.
- Eu gostaria de uma cesta com esses, por favor - pediu Johnny para o vendedor.
- Sim! - disse o vendedor - aguarde um momento, por favor.
- Está bem.
Johnny olhou para o céu, pensativo. O que a Gika queria com ele, a aquela hora? Era pôr-d0-sol, a Rainha devia estar descansando naturalmente... devia ser hora de folga da Gika. Será algo relativo a consulta de Raveneh? Uma informação?
- Seu pacote, senhor - disse o vendedor.
- Obrigado! - exclamou Johnny. Deu algumas moedas de ouro e disse - o pagamento.
Saiu pela rua imerso em pensamentos, e não demorou muito até chegar ao Sobrado do Sol, onde morava a Gika. Ficava ao lado do Palácio, com apenas uma rua separando as duas casas. Tocou a campainha.
- Johnny...? - Vê atendeu a porta - Gika disse que você viria no nosso momento de folga!
- O-obrigado... - Johnny deu um riso constrangido.
- Vê! - Gika exclamou - obrigada por atender-lo!
- Sim! - disse Vê - tenho que arrumar o quarto, poderão ficar bem na sala.
- Obrigada! - disse Gika.
Vê subiu as escadas, enquanto Johnny e Gika se dirigiam a sala. Johnny reparou que Gika não estava trajada habitualment, com toda a formalidade que seu trabalho exigia. Gika amarrara seus cabelos em um charmoso coque, e usava um bonito vestido branco com detalhes em azul. E estava descalça.
- Sente-se - pediu Gika - gostaria de um chá?
- Oh, sim - respondeu Johnny - bem, o que queria falar?
- É sobre Raveneh.
Bem que pensei!, disse Johnny para si.
- Sim, foi o que você pensou - disse Gika séria.
Ela pode ler os pensamentos alheios??, chocou-se Johnny.
- Nem sempre, Johnny - disse Gika - leite ou açúcar?
Nem sempre, é? Ok, então, prefiro leite u_u, disse mentalmente.
- Eu odeio ler pensamentos alheios, Johnny - disse Gika - mas já que prefere leite...
Gika acrescentou leite ao chá, e serviu a xícara juntamente com um prato repleto de biscoitos aparentemente deliciosos.
- É sobre a consulta de ontem - disse Gika por fim - quem apareceu foi a Catherine. E ela me contou muitas coisas.
- Sobre...? - indagou Johnny bebendo o chá.
- A morte da irmã, do pai e da mãe. Foram três mortes traumáticas, decisivos episódios para a vida de Raveneh - contou Gika - curiosamente Raveneh não lembra direito de nenhuma delas... somente em pesadelos.
- Mas... como foram essas mortes? - indagou Johnny, temendo a resposta.
- A irmã morreu quando tentava realizar um aborto, e Raveneh a viu morrer e não ajudou - contou Gika - o pai foi morto pela Dark Milk, a guarda militar do regime. E a mãe morreu, pois Raveneh extrapolou na dose do remédio que tinha que dar...
Johnny ficava cada vez mais surpreso, e seu cérebro começava a dar nós. Raveneh é uma assassina?, pensava, deixou a irmã morrer, aumentou a dose do remédio da mãe... ela matou a própria mãe?
- R-Raveneh viu a irmã morrer? Um aborto? - gaguejava Johnny.
- Sim - disse Gika em um tom triste - mas quem fez isso foi a Catherine. Por isso Raveneh não se lembra nem de como Catherine, a irmã, morreu nem como a mãe morreu. Mas se lembra um pouco do pai, pois não ela quem causou... E... eu tenho medo. A Catherine tem valores morais deturpados, Johnny. Tenho medo que ela faça mal aos outros...
- Mas... - Johnny não conseguia formular uma frase decente.
- Catherine me disse - Gika interrompeu - que só quer o bem de Raveneh. Por isso ninguém que faça bem a Raveneh será prejudicado... a irmã maltratou a Raveneh, Catherine assumiu a defesa e quando percebeu que a irmã estava prestes a morrer, somente a observou. Quando a mãe estava fraca e doente, Catherine tomou posse e vingou todas as humilhações que a Raveneh tivera por causa da mãe. Quando os nortistas machucaram Raveneh, pela primeira vez em muito tempo, Catherine surgiu e conseguiu sair dali. Ela é o escudo de Raveneh - Gika hesitou antes de continuar - e sabe, eu... Catherine não é uma pessoa má, mesmo com seus valores morais deturpados. Ela sabe o que é certo e o que é correto, mas por ela não ser uma pessoa de verdade, ser somente metade de uma menina, ela pensa que as leis não se aplicam a ela. Sabe que as pessoas iriam se chocar caso soubessem que ela provocou a morte da própria mãe... mas ela não se preocupa com os outros. Preocupa-se somente com Raveneh. Se Raveneh estiver bem, Catherine não vai agir.
- É o que você diz... - disse Johnny pensativo - não tem uma forma de destruir Catherine?
- Catherine não é uma personalidade que prejudica a Raveneh - Gika disse - Catherine é a personalidade cópia da irmã, uma forma de Raveneh se sobressair perante as humilhações da mãe. Era como se Raveneh, quando se sentisse triste ou com raiva, se olhasse no espelho e visse Catherine, a irmã. E a segunda personalidade é também um poderoso escudo... Raveneh aprendeu sobre as coisas básicas: não matar, não roubar, não prejudicar os outros... Mas quando a mãe ou a irmã lhe humilhavam, esta se questionava: 'os valores eram realmente certos?'. Mas quem tinha na cabeça que os valores estavam errados, talvez, era a Catherine. O assassinato da mãe foi uma resposta contra os 16 anos de humilhação. Dá pra entender, Johnny?
Johnny não conseguia falar nada. Estava olhando sua xícara com metade do chá, já frio. Estava chocado. Absurdamente chocado.
- E-e-eu... eu não sei o que pensar - disse Johnny - Catherine, Raveneh, tudo está sendo meio demais para mim... E-eu... - mordeu o lábio inferior - Gika, me diga... não tem uma forma de Catherine não aparecer mais? Sei lá, destruindo, unindo as duas...
- Catherine pode ser destruída, mas eu não acho bom - disse Gika roendo as unhas.
- Por que?
- Porque Raveneh pode continuar com os pesadelos e com a impressão de que faltam pedaços de sua vida - respondeu Gika - podemos unir as duas, mas não sabemos quem prevalecerá: Raveneh ou Catherine. Só existe uma opção...
- Qual? - indagou Johnny ansioso para pôr um ponto final naquela história.
- Raveneh saber que existe a Catherine - disse Gika - e conversar com ela.
- Tipo... ela conversar com ela mesma? - Johnny pensa um pouco - e assim Raveneh e Catherine podem chegar a um consenso. Mas... como iríamos forçar isso?
- Conte para Raveneh - disse Gika - diga que ela tem uma dupla personalidade e que manifestou muitas vezes. Mas não diga nada sobre o que a outra fez. Nada. Somente diga que ela tem outra, diga que se chama Catherine e que as duas precisam chegar em um acordo. Raveneh tem poderes mágicos, e pode forçar um encontro consigo mesma.
- Está bem - disse Johnny - está tarde, preciso ir. Tentarei isso.
- Obrigada, Johnny - Gika disse.
- Hey! - exclamou Johnny - quanto vai ser o julgamento de Renegada?
- Na próxima quarta-feira - respondeu Gika - por quê?
- Acho que Raveneh deseja estar lá - respondeu Johnny com um sorriso triste - ela gosta demais de Renegada, foi sua primeira amiga depois que partiu da antiga casa dela.
- Compreendo. Bem, já está anoitecendo - comentou Gika - e preciso ir para o castelo. Vossa Majestade se utiliza dos meus serviços durante este período.
- Adeus, Gika - despediu-se Johnny.
- Adeus, Johnny.
- Vê, por favor, faça aquele chá seu para mim? - pediu.
- Sim, Vossa Majestade! - respondeu Vê sorrindo.
- Gika, por favor, a acompanhe :) - disse Siih - eu pretendo ficar sozinha.
- Sim, Vossa Majestade - concordou Gika curvando-se diante de Siih.
- Vamos, Gika - disse Vê.
Gika sorriu, e as duas saíram do aposento, enquanto Siih se recolhia pensativa.
De novo a sensação de fracasso, a sensação de algo estava em cima dela... a sensação infalível: "você é uma fracassada cheia de poder. Como pode uma coisa dessas?"
- Olá. Você está bastante pensativa, irmã - disse Lefi.
- Lefi! Eu dei ordens para não entrar ninguém - disse Siih - como conseguiu barrar as fadas?
- Eu tenho meus truques para burlar suas regras, Siih - riu Lefi - ou você acha que é a única que consegue atravessar as fadas sem elas perceberem?
- Tolo! - riu Siih.
- Bem, já pensou em como vai expulsar os nortistas? - indagou Lefi - eles já estão quase nos portões das Campinas... e como você diz, os nortistas são cruéis demais para o povo das Campinas.
- Sim... - disse Siih tristemente - eu não sei o que fazer. Os nortistas são cruéis demais. Eu podia manipular as mentes deles, não?
- Pode... - concordou Lefi - mas não deve. Eu estive estudando esses dias, e bastante a respeito das magias.
- E...?
- É bem longo. - disse Lefi - eu estudei bastante, sabe. E descobri bastante coisas inteiras.
- Como...?
Lefi começou a sussurrar, quase em um cântico:
- Há muitos anos atrás, quando as primeiras fadas começaram a criar uma vida... - seu tom era baixo, misterioso - uma vida em sociedade... Sempre tinha aquela mais poderosa...
Há muitos anos, quando o tempo era remoto
As fadas se uniram para viver juntas
Mas sempre uma mais poderosa se sobressaía
E esta passava sempre a governar
Foi assim por muitos anos
E é assim até hoje
De vez em quando, nasce alguém
Cujo poder é incontestável
Cujo poder esmaga
Cujo poder é perigoso
E de tal virtude surprema...
Houve um silêncio.
- Uau. Então eu sou uma dessas fadas com um poder que esmaga? - perguntou Siih.
- Mais ou menos - disse Lefi - você é o que pode se chamar de "fada alta" - ao olhar intrigado de Siih, respondeu - fadas altas é um termo utilizado entre magos, quando nasce uma fada com grandes poderes como os seus. Normalmente nascem de famílias que são conhecidas pela magia, e os poderes se manifestam desde os dois, três anos. É um caso bastante raro, e o Mago Compy estudou sobre as "fadas altas". Foi o maior estudo sobre esse tipo de fada já conhecido. Ele calcula que em dez anos, somente três "fadas altas" aparecem, em média. Elas vivem manifestando seus poderes, e é bastante provável que só se dêem conta dos seus poderes quando está na adolescência. Antes de morrer no ano passado, ele diz que nessa década não existe nenhuma "fada alta" que ele conheça.
- Mas e eu? - disse Siih.
- Ele não sabia que você era uma das "fadas altas" - observou Lefi - diz ele que as 'fadas altas' tem grandes poderes de manipulação, conseguem lançar maldições ou proteções em larga escala, envolvendo um país inteiro, por exemplo. Também são capazes de forçar os espirítos naturais a obedecer-la.
Siih emitiu um murmúrio de assombro.
- E por que não tem ninguém que ele conheça? - indagou Siih.
- Ele diz também que as fadas altas tem baixa expectativa de vida - diz Lefi - Mago Compy disse que os poderes são tão devastadores que um corpo frágil de menina pode não conseguir aguentar. E para realizar as magias, utiliza-se muito esforço físico, e se desgasta demais. Diz ele que das 'fadas altas' já conhecidas, a que viveu mais tempo morreu aos 28 anos de idade.
- Quê? Hey, eu não quero morrer jovem! - exclamou Siih pasma - prefiro... prefiro ser uma fada 'baixa' ou...
- Você pode abdicar dos seus poderes - disse Lefi - os poderes, originalmente, pertencem aos espirítos da natureza. De vez em quando, eles cedem os poderes deles para uma fada... Mas se a fada preferir assim, os espirítos aceitarão os poderes de volta. Você podia fazer isso, Siih.
- Primeiro vou expulsar os nortistas - disse Siih convicta - depois abdicarei dos meus poderes. Prefiro ser uma Rainha velha e sem poderes do que uma morta, jovem e com poderes u_u"
- Compreende-se - Lefi sorriu - já sabe o que fará contra os nortistas?
- Sei... - disse Siih - por favor, dá para me informar de tudo que as 'fadas altas' poderiam fazer?
Lefi sorriu.
--------------------------
Johnny estava no Reino das Fadas, mais especificamente na Rua Fuji onde se compra deliciosos morangos com chocolates.
- Eu gostaria de uma cesta com esses, por favor - pediu Johnny para o vendedor.
- Sim! - disse o vendedor - aguarde um momento, por favor.
- Está bem.
Johnny olhou para o céu, pensativo. O que a Gika queria com ele, a aquela hora? Era pôr-d0-sol, a Rainha devia estar descansando naturalmente... devia ser hora de folga da Gika. Será algo relativo a consulta de Raveneh? Uma informação?
- Seu pacote, senhor - disse o vendedor.
- Obrigado! - exclamou Johnny. Deu algumas moedas de ouro e disse - o pagamento.
Saiu pela rua imerso em pensamentos, e não demorou muito até chegar ao Sobrado do Sol, onde morava a Gika. Ficava ao lado do Palácio, com apenas uma rua separando as duas casas. Tocou a campainha.
- Johnny...? - Vê atendeu a porta - Gika disse que você viria no nosso momento de folga!
- O-obrigado... - Johnny deu um riso constrangido.
- Vê! - Gika exclamou - obrigada por atender-lo!
- Sim! - disse Vê - tenho que arrumar o quarto, poderão ficar bem na sala.
- Obrigada! - disse Gika.
Vê subiu as escadas, enquanto Johnny e Gika se dirigiam a sala. Johnny reparou que Gika não estava trajada habitualment, com toda a formalidade que seu trabalho exigia. Gika amarrara seus cabelos em um charmoso coque, e usava um bonito vestido branco com detalhes em azul. E estava descalça.
- Sente-se - pediu Gika - gostaria de um chá?
- Oh, sim - respondeu Johnny - bem, o que queria falar?
- É sobre Raveneh.
Bem que pensei!, disse Johnny para si.
- Sim, foi o que você pensou - disse Gika séria.
Ela pode ler os pensamentos alheios??, chocou-se Johnny.
- Nem sempre, Johnny - disse Gika - leite ou açúcar?
Nem sempre, é? Ok, então, prefiro leite u_u, disse mentalmente.
- Eu odeio ler pensamentos alheios, Johnny - disse Gika - mas já que prefere leite...
Gika acrescentou leite ao chá, e serviu a xícara juntamente com um prato repleto de biscoitos aparentemente deliciosos.
- É sobre a consulta de ontem - disse Gika por fim - quem apareceu foi a Catherine. E ela me contou muitas coisas.
- Sobre...? - indagou Johnny bebendo o chá.
- A morte da irmã, do pai e da mãe. Foram três mortes traumáticas, decisivos episódios para a vida de Raveneh - contou Gika - curiosamente Raveneh não lembra direito de nenhuma delas... somente em pesadelos.
- Mas... como foram essas mortes? - indagou Johnny, temendo a resposta.
- A irmã morreu quando tentava realizar um aborto, e Raveneh a viu morrer e não ajudou - contou Gika - o pai foi morto pela Dark Milk, a guarda militar do regime. E a mãe morreu, pois Raveneh extrapolou na dose do remédio que tinha que dar...
Johnny ficava cada vez mais surpreso, e seu cérebro começava a dar nós. Raveneh é uma assassina?, pensava, deixou a irmã morrer, aumentou a dose do remédio da mãe... ela matou a própria mãe?
- R-Raveneh viu a irmã morrer? Um aborto? - gaguejava Johnny.
- Sim - disse Gika em um tom triste - mas quem fez isso foi a Catherine. Por isso Raveneh não se lembra nem de como Catherine, a irmã, morreu nem como a mãe morreu. Mas se lembra um pouco do pai, pois não ela quem causou... E... eu tenho medo. A Catherine tem valores morais deturpados, Johnny. Tenho medo que ela faça mal aos outros...
- Mas... - Johnny não conseguia formular uma frase decente.
- Catherine me disse - Gika interrompeu - que só quer o bem de Raveneh. Por isso ninguém que faça bem a Raveneh será prejudicado... a irmã maltratou a Raveneh, Catherine assumiu a defesa e quando percebeu que a irmã estava prestes a morrer, somente a observou. Quando a mãe estava fraca e doente, Catherine tomou posse e vingou todas as humilhações que a Raveneh tivera por causa da mãe. Quando os nortistas machucaram Raveneh, pela primeira vez em muito tempo, Catherine surgiu e conseguiu sair dali. Ela é o escudo de Raveneh - Gika hesitou antes de continuar - e sabe, eu... Catherine não é uma pessoa má, mesmo com seus valores morais deturpados. Ela sabe o que é certo e o que é correto, mas por ela não ser uma pessoa de verdade, ser somente metade de uma menina, ela pensa que as leis não se aplicam a ela. Sabe que as pessoas iriam se chocar caso soubessem que ela provocou a morte da própria mãe... mas ela não se preocupa com os outros. Preocupa-se somente com Raveneh. Se Raveneh estiver bem, Catherine não vai agir.
- É o que você diz... - disse Johnny pensativo - não tem uma forma de destruir Catherine?
- Catherine não é uma personalidade que prejudica a Raveneh - Gika disse - Catherine é a personalidade cópia da irmã, uma forma de Raveneh se sobressair perante as humilhações da mãe. Era como se Raveneh, quando se sentisse triste ou com raiva, se olhasse no espelho e visse Catherine, a irmã. E a segunda personalidade é também um poderoso escudo... Raveneh aprendeu sobre as coisas básicas: não matar, não roubar, não prejudicar os outros... Mas quando a mãe ou a irmã lhe humilhavam, esta se questionava: 'os valores eram realmente certos?'. Mas quem tinha na cabeça que os valores estavam errados, talvez, era a Catherine. O assassinato da mãe foi uma resposta contra os 16 anos de humilhação. Dá pra entender, Johnny?
Johnny não conseguia falar nada. Estava olhando sua xícara com metade do chá, já frio. Estava chocado. Absurdamente chocado.
- E-e-eu... eu não sei o que pensar - disse Johnny - Catherine, Raveneh, tudo está sendo meio demais para mim... E-eu... - mordeu o lábio inferior - Gika, me diga... não tem uma forma de Catherine não aparecer mais? Sei lá, destruindo, unindo as duas...
- Catherine pode ser destruída, mas eu não acho bom - disse Gika roendo as unhas.
- Por que?
- Porque Raveneh pode continuar com os pesadelos e com a impressão de que faltam pedaços de sua vida - respondeu Gika - podemos unir as duas, mas não sabemos quem prevalecerá: Raveneh ou Catherine. Só existe uma opção...
- Qual? - indagou Johnny ansioso para pôr um ponto final naquela história.
- Raveneh saber que existe a Catherine - disse Gika - e conversar com ela.
- Tipo... ela conversar com ela mesma? - Johnny pensa um pouco - e assim Raveneh e Catherine podem chegar a um consenso. Mas... como iríamos forçar isso?
- Conte para Raveneh - disse Gika - diga que ela tem uma dupla personalidade e que manifestou muitas vezes. Mas não diga nada sobre o que a outra fez. Nada. Somente diga que ela tem outra, diga que se chama Catherine e que as duas precisam chegar em um acordo. Raveneh tem poderes mágicos, e pode forçar um encontro consigo mesma.
- Está bem - disse Johnny - está tarde, preciso ir. Tentarei isso.
- Obrigada, Johnny - Gika disse.
- Hey! - exclamou Johnny - quanto vai ser o julgamento de Renegada?
- Na próxima quarta-feira - respondeu Gika - por quê?
- Acho que Raveneh deseja estar lá - respondeu Johnny com um sorriso triste - ela gosta demais de Renegada, foi sua primeira amiga depois que partiu da antiga casa dela.
- Compreendo. Bem, já está anoitecendo - comentou Gika - e preciso ir para o castelo. Vossa Majestade se utiliza dos meus serviços durante este período.
- Adeus, Gika - despediu-se Johnny.
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