quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Parte 63 - A dor experimental para o fim do inferno.

- Johnny, o que quer falar? - indagou Raveneh totalmente confusa.
- Escute-me! - disse Johnny ríspido - você precisa acabar com isso!
- Com o quê? - devolveu Raveneh confusa. Estavam sentados no quarto de Raveneh, o sol ameaçando descer.
- E-eu nem sei como dizer isso, Raveneh... - disse Johnny ansioso - mas... você tem... bem, você tem uma dupla personalidade.
- Tenho uma du-o quê? - gaguejou Raveneh intrigada.
- Dupla personalidade. - disse Johnny já com um pouco mais de coragem, embora não soubesse explicar o problema de Raveneh - tem vezes que você não é você... outra pessoa que "toma" seu corpo... Mas na verdade, ela faz parte de você, sabe? Desde criança.
- Ah. - fez Raveneh sem conseguir entender muita coisa do que Johnny falava.
- É outra menina, e ela age por você - disse Johnny - o nome dela...
- Qual o nome dela? - indagou Raveneh sem aparentar surpresa.
- Catherine.
Raveneh abriu a boca para emitir um murmúrio de espanto, mas logo calou-se. Estava sentindo alguma coisa, que não conseguia explicar...
Sua expressão se contorceu de dor.
- O que houve, Raveneh? - Johnny perguntou, preocupado.
- N-nada... - gaguejou Raveneh - nada...
Seu olhar estava maligno.

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- Faça todos aqueles que têm sangue nas mãos sintam dores - disse Siih com um sorriso.
Lefi, desesperado, gritou:
- Tola! Tola, tola, mil vezes tola! E a batalha recente em Campinas? Eles mataram muitos soldados! - hesitou ofegante - os soldados mataram pessoas! Mas eles fizeram em favor do reino, em uma guerra! Vai punir-los também? Você não é Deus!
Siih não deu atenção as palavras do irmão.

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- A-ai... - murmurou Fer.
- O que houve? - Rafitcha perguntou - o morango não caiu bem?
- Não - disse Doceh - é uma dor... mas ela é estranha. Como se fosse uma agulha que insiste em nos alfinetar, e cria uma agonia...
- É doloroso - disse Kibii - mas... mas o que é isso? Você não sente, Rafitcha?
- Não! - disse Rafitcha preocupada.
- Também não sinto nada - contou Tatiih.
- Então é somente nós... - disse Fer - o que é isso? D-dói tanto...!
E pela primeira vez desde que Fer veio para as Campinas, viram-na chorar de dor.

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- D-dói - murmurou Raveneh pasma - m-meu... Céus! - mordeu o lábio inferior.
- O que está acontecendo? - indagou Johnny confuso.
- Está doendo! - murmurou Raveneh - está doendo demais! E-eu...

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- Que faça reviver as mortes que causou. - murmurou Siih.
- Você está punindo os assassinos ou está expulsando os nortistas? - gritou Lefi.

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- Catherine... - murmurou Raveneh - meu Deus, Catherine está sangrando tanto...
Johnny ficou pasmo. Será que a outra personalidade de Raveneh estava finalmente revelando o que fizera a Raveneh?
- A-argh... - rosnou Raveneh - Johnny, saia, por favor... saia. Vou acabar fazendo... ai!, al-algum mal...
- Mas, Raveneh!...
- Saia!
- Ra...
- Saia - disse Catherine - Raveneh não está se sentindo bem. Saia, por favor.
Johnny, reconhecendo a voz de Catherine, saiu do quarto.
- Está bem.

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Rafitcha saíra da cozinha, a procura de Nath para ajudar as meninas, e logo encontrou o irmão quase chorando.
- Johnny! - exclamou - o que houve?
- Raveneh... - murmurou Johnny - sentiu dores e me mandou embora.
Não se sentia disposto a contar sobre a Catherine.
- Engraçado... - disse Rafitcha - Doceh, Fer e Kibii também sentiram dores. Estou procurando a Nath para saber o que é isso.
Johnny ergueu o rosto, surpreso.
- Tem algo em comum entre elas... - disse ele - mas o quê?

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- Siih, me ouça - pediu Lefi, que já estava exausto de tanto berrar.
Seus gritos atraíram Vê e Gika, que tiveram o cuidado de fechar a porta para que ninguém mais escutasse os gritos. Elas estavam na porta, observando, caladas e com medo, a cena entre os dois irmãos. Siih realmente parecia fora de si.
Siih levantou o rosto.
- Você realmente achou que eu iria punir os assassinos? Meu irmão, não sou cruel - sua voz estava normal, assim como o olhar. Sorriu com o sorriso meigo que sempre tivera - foi somente um teste. Uma dor... Pare.

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- Não precisa mais, Rafitcha! - disse Tatiih. - parou.
- Que alívio... - murmurou Doceh - foi como um pesadelo...
- Parecia que eu ainda estava na floresta - sussurrou Kibii - mas a floresta estava sinistra... e a cada flecha que eu a-atirava - hesitou, quase chorando - era como se fosse veneno no meu corpo... doía...
Fer ficou calada. Não rememorou a guerra como Doceh e Kibii, embora tivesse matado muitos soldados nessa situação. Lembrou de alguns meses antes.
Quando lavou a sua alma em sangue.

Afiava a espada.
- Órfã tola! - grasnou uma voz rouca - não era a filha daquele carinha?
Fer não virou a cara. Sabia perfeitamente a distância, e se quisesse poderia matar-lo agora. Mas queria se divertir um pouco antes...
- Calem-se. - disse.
Os homens aproximaram-se e logo fizeram um círculo em volta de Fer. Eram os homens que conseguiram escapar durante o atentado a pensão onde morara. "Estúpidos" pensou Fer, observando o jeito que os homens brandiam suas espadas "mal sabem segurar uma espada". Sorriu.
- Quer morrer agora, menininha? - riu o maior dos homens. Os outros o acompanharam nos risos.
Risos horríveis, grasnantes, que causariam muitos pesadelos a qualquer pessoa que estaria ali. Menos Fer que não se abalava com esse tipo de coisa.
Fer levantou sua espada.
Os homens riram.
- Matem-na! - berrou o maior dos homens, visivelmente o chefe deles.
Todos os homens pularam em direção a Fer, que estava cercada. Mas tal a surpresa quando perceberam que Fer não estava mais ali.
- Aqui. - disse Fer.
Todos olharam para o alto: Fer dera um pulo magnifíco e estava prestes a descer.
- Ela é uma boa espadachim! - murmurou um deles.
Logo Fer desceu, e com um golpe, cortou a cintura de cinco deles.
- E-ela é forte... - gaguejou um deles logo antes de cair.
Mais um salto, mais um corte. Quando um deles atacava pela frente, ela sempre estava por trás, e traiçoeiramente desferia um letal golpe por trás. Quando ela estava na frente, e o oponente tentava um golpe em horizontal para cortar a cintura de Fer e separar-la em duas, ela saltava e a espada partia a cabeça sem piedade.
Em questão de poucos minutos, só restara o chefe.
Os outros ainda estavam vivos, agonizantes.
Fer utilizara-se de golpes aprendidos com o pai, que não causavam a morte imediata. Ela queria que eles sofressem o maior tempo possível, que pagassem o que fizeram com a sua vida. O céu, nublado, parecia concordar com seus ideais de justiça.
- Tola! - disse o chefe - nós matamos o seu querido paizinho? E por isso...
- Cale-se. - disse Fer - não merece dizer uma palavra sequer.
Não precisou de muito tempo para ele perceber que ela brandira a espada e a utilizara tão rápido que ele nem sentiu.
Mas ela acabara de cortar suas partes baixas.
- Creio que nunca mais poderá ser grosseiro com as meninas novamente. - murmurou Fer com um sorriso - soube que você fez isso em outras cidades.
- M-Maldita! - exclamou o chefe pasmo - e-eu vou pegar você!
- Não acho que você vá viver o suficiente - Fer sussurrou, colocando a sua capa, com repulsa na voz - do jeito que isso está sangrando, sinto muito. Mas se achar um médico, quem sabe?
O chefe conseguiu caminhar até ela, e brandir a espada.
Fer não precisou utilizar-se da sua espada: do jeito que o chefe estava sonso, era mais fácil lhe dar um murro certeiro no abdomên.
- M-Maldita - murmurou o chefe, quase fechando os olhos.
- Vou deixar você vivo. - disse Fer colocando a espada na bainha. Não precisava mais dela.
- Estúpida.
- Adeus - disse Fer - se resistir... bem, asseguro que da próxima, serei melhor em tirar uma vida. Já tenho sangue nas minhas mãos. Mais um pouco não fará diferença.
O homem só grasnou.


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- Nortistas. - murmurou Siih - os que forem cruéis, por favor, iluminem-se.
Lefi preferiu não falar nada. Conhecia Siih: quando essa menina metia uma idéia, ninguém conseguia persuadir-la. E depois, Siih não era sinceramente cruel e tinha compaixão. Preferiu acreditar nela. Mas tinha muito medo que o poder acabasse por lhe tirar a vida...
Siih iniciou.
- Os que não têm compaixão, tenham suas espadas tomadas.
- Os reféns, que recebam essas espadas tomadas dos nortistas.
- Os reféns, com suas espadas, brandam-nas contra os nortistas que lhe fizeram mal.
- Os nortistas, fujam para seus lugares natais.
Lefi mordeu o lábio inferior.
- As estradas... - o olhar de Siih se iluminou novamente de forma sinistra - estas serão amaldiçoadas. A cada nortista que atravessar uma estrada para Heppaceneoh, seja entrando ou saindo, sofra vinte e quatro horas de loucura. Serão privados de tudo. Comida, água, mulheres. Que a cada água que encontrem, não bebam. Que a cada pão ou fruta que encontrem, não consigam comer. Sintam fome ou sede, mas suas gargantas não aguentam mais. E que a cada mulher que vejam, sintam vontade, mas não conseguirão ter-la. - mordeu o lábio inferior, escondendo seu riso.
- O que acha que ela está fazendo? - indagou Gika a Vê.
- Amaldiçoando Heppaceneoh, acho... - murmurou Vê - expulsando os nortistas...
- Os nortistas... enfraquecerão... - Siih já aparentava sinais de cansaço. Manipular milhares de pessoas a uma longa distância estava lhe custando sua vida, e Lefi percebeu isso.
- Pare! - gritou Lefi - foi o suficiente! Os nortistas conseguirão sair... mas, pare... ou vai morrer!
- Que seja! - Siih debruçou-se sobre o lago e bebeu um pouco da sua água.
As pedras que ficavam em volta do lago, antes opacas, brilharam vivamente. Siih conseguiu sorrir e continuar.
- Lefi... - pediu Siih - acione a Tropa da Lua.
- T-Tropa da Lua? Mas... - disse Lefi pasmo. Porquê justamente esta tropa?
- Vá, por favor? - Siih estava extremamente doce.
Lefi foi.
- O que é a Tropa da Lua? - indagou Vê.
- Uma tropa especial, feita para as fadas - disse Gika - são extremamente treinadas.
- Ah...

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- BWAAAAAAAAAAAAAHHH!!!!!!!!!!!!!!! - um urro penetrou em Heppaceneoh.
De um dia para outro, tudo mudara. Os nortistas estavam a beira da loucura, e os reféns estavam quase se libertando. E claro, chegou a tropa de fadas.
Cem fadas, todas com expressões felinas e cabelos negros, cavalgavam em cavalos brancos e alados. Estavam furiosas, e também um tanto confusas, porque nunca, em toda a história, atacaram um reino que não estivesse sob o domínio das fadas.
Mas obedeceram, e com fúria.
As fadas da Tropa da Luz são exímias na arte de batalhar, principalmente com espadas. Eram absolutamente perfeitas, e tinham a essência da crueldade, tão necessária para derrotar os nortistas.
Mesmo os nortistas enfraquecidos pela magia de Siih, não podiam se privar do seu instinto cruel, coisa que Siih sabia muito bem.
- Quem são elas? - indagou um nortista.
- T-Tropa da Lua... - gaguejou outro.
Uma hora se passou, muito sangue jorrou.
Outra hora se passou, mais sangue se derramou.
Mas o sangue não era das fadas.
Siih, quando armara seu plano, pensara em tudo. As fadas da Tropa da Lua poderiam derrotar os nortistas, mas eles teriam que estar enfraquecidos para não revidarem com força e machucarem as fadas.
No final de duas horas, Heppaceneoh estava afundada em sangue. Nunca, nunca na vida as pessoas que moravam por lá poderiam dizer que já haviam visto tanto sangue na vida.
As fadas olharam para tudo com desprezo. Obedecendo as ordens que Lefi dera, voltaram.
Um.
As pessoas olharam em volta, percebendo que os nortistas estavam mortos.
Dois.
O sino tocou, de algum lugar, festejando.
Três.
As pessoas dentro do castelo saíram todas.
Quatro.
O castelo sucumbiu. E o que antes era um imponente castelo, agora era só um punhado de pedras e pó.
Os nortistas estão mortos. todos diziam para si Não temos mais nortistas por aqui.
Mas era difícil de acreditar.
Muito, muito difícil.

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