segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Parte 67 - Laços de sangue.

É verdade que virou tragédia
É verdade que não deu certo
Mas...
... se não for você, quem mais vai no seu lugar?


Raveneh estava de pé, pensativa, com pensamentos voando longe.
Estava diante da porta do quarto onde Arthur vivia, e não saía dali pra nada.
- Arthur! - gritou.
- O que é? - uma voz de criança gritou de volta, agressivo.
- Vamos ao julgamento - disse Raveneh em um tom mais baixo - seu pai está lá. Vamos agora.
- Eu não quero ir! - Arthur disse esganiçado.
- Não é questão de querer - retrucou Raveneh - é questão de ir. Você tem três segundos para abrir a porta.
- Eu não vou!
- Um.
- Não vou, não vou, não vou e não vou!
- Dois.
- É surda? EU NÃO VOU!
- Três.
- Eu não vou!
- Você vai sim. Sinto muito pela porta.
BLAM.
Tudo o que se viu em seguida foi Raveneh arrastando um garoto de quase dez anos que esperneava e gritava e uma porta totalmente destruída graças ao poderoso chute de Raveneh.
- Que paciência tem a Raveneh, não é? - riu Umrae.
- Eu não tenho isso - murmurou Fer risonha - eu mataria se fosse comigo! Mas Raveneh é um anjo de pessoa xD
- Sim, ela é! - concordou Kibii entusiasmada.
Todos iriam para o julgamento.

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- Eu gostaria de ver Mycil Regallian - ela disse.
A mulher que atendia os visitantes levantou o olhar, curiosa. Nunca vira uma mulher daquelas.
Ela era alta, e tinha um porte imponente. Seu olhar era penetrante e azul, seus cabelos castanho-claros estavam perfeitamente penteados e usava vestes demasiadas estranhas para aquele local. E seu sotaque era um bocado diferente.
- Devo anunciar-la - disse a mulher - poderia me dizer o nome?
- Mycil sabe quem sou - ela disse - e eu não vim do Norte para ser barrada. Sabe, são alguns dias de viagem.
- Sinto muito, são regras - desculpou-se a mulher. A voz da outra era bastante imperativa, e dava a entender que faria qualquer maldade caso ela recusasse sua entrada.
- Está bem, então - disse a forasteira - pode me anunciar como... Forasteira Noturna.
- F-Forasteira Noturna? - gaguejou a funcionária - e-está bem!
E correu para dentro.
Todos que estavam na sala admiraram o vulto da forasteira, que usava um longo vestido justo no tronco e que se soltava suave a partir da cintura. Usava também um manto muito bonito por cima, como se fosse um véu, e calçava botas. Tudo de preto. Não tinha uma peça sequer que fosse de outra cor.
Mas o que mais chamava atenção não era o fato de todas as peças serem pretas. Era simplesmente a bainha negra, que guardava uma afiada espada. Qualquer um saberia que só pelo jeito da forasteira, a espada servia como uma luva nas mãos dela. E só pelo seu olhar, também se podia saber que ela não era do tipo que sentia piedade.
A funcionária voltou.
- Ela disse que reconhecia - disse a funcionária - pode entrar.
A forasteira sorriu, debaixo do véu.
- Uuuff! - suspirou a funcionária - a-achei que fosse morrer...

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- Olá. - disse Renegada.
Ela estava em uma sala toda branca, atrás do vidro. Era a Sala de Espera para Aprisionados, onde se podia conversar com familiares ou amigos antes de um julgamento ou condenação. Renegada sentara-se pacientemente, esperando que alguém quisesse ver-la antes do julgamento.
A forasteira sentou-se diante de Renegada, e abaixou o véu.
- Você acha que assistirá meu julgamento sem ninguém saber, Lynda? - perguntou Renegada.

Já faz muito tempo
Desde que eu te vi pela última vez
Agora os anos nos transformaram
E eu vejo tua face de mulher


- Não seja tola, Mycil - disse Lynda - posso saber porque você preferiu usar o codinome "Renegada" aqui?
- Não. - respondeu Mycil.
As duas se fitaram, ambas com algum sentimento estranho.
Não sabiam se sentiam saudades, não sabiam se era amor ou ódio. Estavam há muitos anos sem se verem...

Eu odeio te amar
Eu odeio saber que eu te conheci
Você me protegeu das minhas amarguras
Mas eu não quero mais proteção


- Você não devia ter partido histericamente - disse Lynda com um certo rancor na voz.
- Eu fui porque quis - afirmou Mycil.
- Tola! Você não sabe como magoou mamãe! - cuspiu Lynda.
- Mamãe? Eu não a reconheço como a minha mãe.

Deixa, deixa, eu não quero mais sofrer
Deixa, deixa, deixe-me sozinha
Vá embora, que eu não preciso de você
Para me proteger


- Você é totalmente cega - disse Lynda - você se apaixonou por Calvin e ficou cega.
Mycil engoliu em seco. O pior era que a irmã tinha razão: apaixonar-se por Calvin fora o ato mais estúpido que tivera em toda a sua vida... gerou uma criança que sabia que não podia criar e um julgamento. E claro, a vinda de Ruronna.
- Está bem - Lynda disse - eu sei que a mãe não foi exatamente uma maravilha com você. Sei que você não era exatamente um modelo para herdar alguma de Regallian. Mas ela ainda tem algum sentimento materno por você!

Não, não vou acreditar em suas mentiras
Não, deixe-me sozinha
Sei que você me protegeu, mas eu preciso viver
Em algum lugar longe de suas mentiras


- Aham - riu Mycil sarcasticamente - belo exemplo de mãe: Mycil, você é uma idiota! Mycil, você não sabe matar ninguém! Mycil, você mais parece humana normalzinha! Aham.
Lynda entristeceu. Apesar de tudo, tinha que reconhecer que a mãe não fora boa com a irmã, muito pelo contrário: fora cruel. Mycil podia ser um sério problema mental, se não tivesse a irmã sempre a proteger de todas as maldades da mãe e da Kharën.
- Bem - disse Lynda - eu vim assistir ao seu julgamento. Já sabe o que fará depois do julgamento?
- Sim - respondeu a irmã.
Mal Lynda ia formular uma frase, Mycil a interrompeu:
- Ruronna veio.

Deixe-me viver sozinha
Partindo sem destino
Deixe-me afundar sozinha
Afundar-me em um lago de podridão...


- Que triste - disse Lynda - bem, estou indo. Amanhã irei assistir ao seu julgamento - colocou o capuz sobre os cabelos castanho-claros.
- Eu odeio essa sua ironia - disse Mycil admirando o teto - dá a impressão que nada no mundo importa.
- Você me faz rir - disse Lynda - bem, minha querida irmã, amanhã conhecerei seu filho. Ele deve ser uma pessoa fantástica, um amor de menino.
- Criado por Calvin? - riu Mycil - eu amo-o, mas sinceramente Calvin o criou muito mal, mimando-o. Agora Arthur dá pena, mimado do jeito que é. Nem eu gostaria de pegar aquele menino pra viver comigo.
- Quanta maldade, Mycil - disse Lynda com um sorriso de escárnio - isso é coisa que se diga do próprio filho? Você é a mãe dele, mesmo que não tenha criado...
- Calvin o tirou de mim! - explodiu Mycil - eu não sou mais a mãe dele. Eu não o criei. Eu não vivi com ele... Eu não sou a mãe dele.
- Se você vê a situação dessa forma... - disse Lynda seriamente - nada posso fazer pra mudar. Mas creio que com a chegada de Ruronna, não dê pra fazer muitas coisas, não é mesmo?
- É... - murmurou Mycil triste - eu tinha planos para ter Arthur como meu filho. Mas Ruronna mudou isso. Bem, entrego-me ao destino.

Deixe-me mergulhar na minha depressão...

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