sexta-feira, 27 de junho de 2008

Parte 42 - Que fique bem... e as Opções Um, Dois e Três.

As horas se arrastaram, Raveneh e Catherine torturavam hora por hora o Jorge, Crazy matava todos no prédio. E o fogo se apagava lentamente, a cidade arrasada. Pela janela do escritório que fora de Jorge, podia-se ver a praça com muros derrubados, chão repleto de corpos, sangue e destruição, e entre a fumaça e o fogo quase sumindo, podia-se ver crianças chorando, mulheres gritando por seus entes queridos. Catherine mordeu o lábio inferior, encarando Jorge:
- É, acho que está na hora.
- Maldita... - Jorge havia levado chutes a noite inteira, tendo ficado inconsciente várias vezes durante a madrugada, ao passo que Catherine permaneceu acordada, muito preocupada em pertubá-lo.
- Bom dia, Raveneh - Crazy disse, voltando para o escritório - ele ainda está vivo?
- Sim... - Catherine respondeu - eu tive umas idéias boas. Poderia me arranjar um barril? Eu não podia sair daqui, estava esperando você.
- Sim o_o
Crazy saiu, voltando rapidamente com um barril desses que guarda cerveja e coisas assim. Catherine sorriu, se ajoelhando diante de um Jorge desamparado, os lábios vermelhos e um corte na sobrancelha direita, ainda sangrando.
- Vem cá, meu irmão... - Catherine estava com uma voz tão doce, tão meiga que Jorge sentia estranho em ouvir aquelas palavras e acabar por acreditar nelas, por não ter outras palavras.
Catherine conseguiu levantar Jorge e meter ele dentro do barril, de modo que Jorge ficou só com os braços e pernas fora do barril. Estava preso.
- Venha - Catherine sorria, conduzindo o irmão dentro do barril cuidadosamente, indicando se havia um degrau a mais ou a menos, cuidando para que o irmão não tropeçasse. Crazy, curioso, a seguia.

A praça estava imunda, os rastros perturbadores. Mas o palanque permanecia inexplicavelmente, aquele palanque onde morreria estava ali, firme. Subiu as escadas, conduzindo Jorge.
- Senhoras e senhores! - gritou.
Imediatamente surgiu uma multidão não sei de que lugar, todos curiosos, intrigados. Catherine viu em volta, percebendo que não havia muita coisa a se fazer... Crazy estava atrás dela, seu olhar oscilando entre curiosidade e compreensão, além de ansiedade.
- Arranje-me um verdadeiro estojo de facas bem afiadas - sussurrou para Crazy - facas, punhais, lanças, tudo que ferir.
Crazy compreendeu o que Catherine queria fazer imediatamente, engoliu em seco. Localizou um soldado qualquer, pediu seu armamento que todo soldado tinha: um conjunto de punhais para o caso de perder a espada, já que Crazy conseguira perder seu conjunto de facas durante a batalha.
- Pronto - disse Crazy.
Catherine sorriu mais uma vez, acariciando cada punhal, tão prateado... era uma arma linda demais para ser usada em um ser tão baixo como Jorge, mas não tinha muitas condições de escolher cuidadosamente, estava agindo pelos impulsos, estava quase delirando...


- Raveneh! - gritou Johnny.
O grupo foi também curioso o bastante para ir até a praça, e conseguiu ver Raveneh em cima do palanque, acima de todos os outros, aquele sorriso maléfico, e alguém dentro de um barril.
- Oh céus! - Rafitcha exclamou surpreendida - que vingança!
Bia olhou para o céu, ficando mais azul a cada minuto que se passava, o sol ainda nem nascera direito.

Facas. Facas eram metidas a torto e a direito no barril, e Catherine só se preocupava em não colocar na cabeça para não morrer de imediato. Mas colocava facas em toda a extensão, como quem apunhala uma árvore só por apunhalar. As pessoas que presenciavam aquele momento de ódio e revolta olhavavam horrorizadas, as bocas abertas de nojo e medo, imaginavam a dor de quem estava ali dentro. Imaginavam a dor, tremiam só de pensar em ter facas afiadas a um centímetro da sua pele, se não menos. Quando finalmente Catherine terminou, percebeu que no norte, a rua era reta... mas à esquerda, a praça fazia uma ladeira descendo até a rua...
- Isso - sibilava, a voz quase doce - isso, meu irmão, é o fim. Conhece-o?
- A-Argh... - Jorge ofegava, tentando desviar de cada faca mirada para si mesmo - eu vou conseguir escapar... Eu tenho pernas e braços!
- Que bom que você me fez lembrar deles! - Catherine sussurrou - mas cortar seus braços e pernas é tão cruel, tão sangrento... Odeio sangue, sabia?
- Imagina se gostasse - retrucou Jorge sarcasticamente. Percebeu que acima dele, havia três facas apontando para a sua cabeça, a dez centímetros de roçar no couro cabeludo.
Catherine levantou um frasco minuscúlo, um líquido laranja se sacudindo dentro dele.

- Mas é um dos venenos de Umrae! - exclamou Tatiih surpresa - ela conseguiu surrupiar de mim! O.O'
- Achei que tinha dado a ela... - comentou Johnny pasmo. A situação chegara a tal ponto que Raveneh simplesmente roubou venenos sob a responsabilidade de Tatiih?
- Não...

- Esse veneno foi feito por uma amiga muito estimada, querida minha - Catherine contava despreocupadamente, mergulhando um dardo que achara no chão no veneno. Mergulhar dardos em veneno é somente uma maneira muito rústica e simples de se fazer dardos envenenados, e obviamente especialistas como Umrae e Kibii sabem fazer melhor que isso. Mas nem Raveneh ou Catherine sabiam a melhor maneira de se envenenar dardos, de modo que ela usou a saída mais comum - o nome dela é Umrae... esse veneno vai ser sua tortura... e sua cura, tá? Espero que fique bem, meu irmão... eu realmente espero isso...
Jorge sentiu uma das mãos ser furada por algo afiado, uma agulha? Sentiu algo sair dessa coisa pontiaguda, algum líquido se estranhando nas suas veias, se misturando ao seu sangue. Gelou, tremendo... aquilo era gelado...

Um chute fez cair o barril, ele já não podia se mover devido ao frio e todo o esforço em evitar as facas foi inútil: as afiadas facas fizeram o seu trabalho de perfurar cada parte do corpo de Jorge, estraçalhando seu corpo por completo. Espero que fique bem, meu irmão... foi tudo o que pôde ouvir antes de ficar tonto com o veneno, pois depois só pôde sentir. As palavras foram ditas pela irmã que odiava, pela irmã que renegava, pela irmã que humilhou. Mas a voz, o tom, o jeito... tudo lembrava Catherine. Podia sentir seus cabelos negros esvoaçando lentamente, podia ver seu sorriso luminoso, podia lembrar das noites que compartilhavam segredos e falavam da vida dos outros. Eram cruéis, maldosos. Que fique bem... era um desejo de Catherine, a irmã que morrera jovem devido a um aborto mal-feito, não de Raveneh que só desejava a sua dor.

Fechou os olhos, tentando suportar a dor sem gritar, o que não conseguiu. Quando chegou no final da ladeira e o barril trombou numa pedra, ele se abriu revelando um homem morto e completamente estraçalhado.
- Oh céus... - Raveneh viu aquele barril descer. Para ela, aquele barril era como se tudo de ruim estivesse se esvaindo... foi ela que viu, não a Catherine - oh céus...
- Raveneh! - gritou alguém. Sim, Johnny conseguiu atravessar a multidão curiosa e apavorada para subir ao palanque quase desesperado - Raveneh!
- Johnny... - Raveneh quase vomitou, mas controlou as ânsias de vômito.
Se agarrou a Johnny como uma criança desamparada. Era mulher, casada, mãe! Mas se sentia tão frágil, era tão arrasador realizar uma vingança, machucar os outros lhe custava tanto...
- Você está bem? - perguntava Johnny exasperado - fizeram algo de ruim com você? Raveneh!
- Estou bem... - mas Raveneh não tinha convicção do que dizia - argh!
O barril havia chegado ao fim da ladeira e aberto, mostrando Jorge morto. De fato, era uma visão para embrulhar o estômago de qualquer um - e eu, a narradora, não descreverei porque se imaginar a cena, não comerei mais durante hoje e isso é muito ruim, certo?
- Me tire daqui - Raveneh falava com mais firmeza, estava mais determinada - me tire daqui, me leve de volta pra casa, Johnny, quero ir embora, cadê May?
- Está com Rafitcha, ela está bem embora chorando feito doida - Johnny tentava acalmá-la, mas sem muito sucesso.
Ela ofegava. Tentava não olhar para atrás de si, não queria ver o corpo do seu meio-irmão, não queria ver que tinha mais um assassinato nas mãos.

Ela desceu, deixando toda uma população surpresa, admirada e indignada - indignada com a morte, indignada com a indiferença, quem sabia realmente da história?
- Por favor, tirem isso da minha frente - ordenou Crazy - eu não quero vomitar toda vez que passar por aqui.
Ele olhou para o povo que passara a olha-lo, observa-lo, analisa-lo. Se sentiu incomodado.
- Chispem daqui! - gritou - vão embora!
Ele deu as costas, tentando arranjar as últimas coisas para considerar o reino oficialmente tomado por Grillindor.

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- Majestade! - ofegou Lefi exasperado, sendo seguido por uma Libby frenética e uma Alicia ofegante - irmã... desculpe, estamos tão atrasados... mas...
- Desembucha, Lefi! O que houve? - Siih gritou, energética.
- Umacidadefoidestruídapelosdemônios! - Lefi deu a notícia de forma desenfreada - saldocentoeummortos!
- Fale devagar! - embora Siih tivesse entendido perfeitamente, ela queria ouvir pela segunda vez. Só para garantir que não havia se enganado...
- Demônios - Lefi tentou mais devagar, de forma bem pausada - demônios... cento e uma pessoas morreram... só vinte sobreviveram...
- Mas é o cenário de quatrocentos anos atrás! - Siih exclamou alterada - demônios foram destruídos completamente...
- Essa era a "verdade" que diziam para todos, não era? - lembrou Lefi, o que fez Siih andar de um lado para outro.
Libby tentava não chorar, seu nariz ficando muito vermelho com o esforço.
- Alicia, mande recolher os sobreviventes! - Siih agiu - Libby, mande uma tropa de vinte e quatro caçadoras de demônios à região! Diga que pagamos o dobro do oferecido normalmente! Há vagas para todas!
- S-Sim, senhora - Libby tremia.
- Por que treme tanto, criatura? - perguntou Siih quase pulando de tanto ódio, nervosismo - e não gagueja!
- M-Minha família morava nessa cidade! - Libby desabafou - foram todos mortos...
- Os sobreviventes já foram contabilizados? - perguntou Siih se virando para Lefi - já sabem quem são?
- Informações retiradas agorinha! - Lefi prontificou mostrando um papel repleto de rabiscos - infelizmente, nenhum é da família de Libby.
Libby controlava as lágrimas, mas não tinha muito jeito.
- Libby, vá trabalhar - Siih odiava dar ordens assim, mas não podia fazer muita coisa - sinto muito pela sua família, mas por favor, então me ajude... me ajude a vingar os que mataram a sua família!
- Sim, Majestade! - Libby conseguiu se controlar, engolindo todas as lágrimas de uma vez.
- Alicia, aproveite e mande evacuar TODA a região, entendeu? - Siih continuou tentando raciocinar de forma clara - agora vão!
- E eu? - perguntou Lefi intrigado.
- Você... - Siih andava de um lado para outro, procurando uma saída - isso é coisa de Ophelia, tenho certeza que é... Lefi, meu irmão... procure as Musas! Mande-as virem para cá, imediatamente! Para ajudar, a Sunny deve estar na cozinha experimentando aqueles bolos que ela tanto gosta...
- Sim, irmã! - Lefi disse e saiu do quarto.

O quarto era lindo, todo branco de detalhes dourados. Siih estava linda como convém a uma rainha naquele dia e em todos os outros, usando um delicado vestido azul-turquesa. Mas não estava preocupada com detalhes como a beleza do tecido que envolvia seu corpo nem na quantidade de diamantes que adornava a sua pequena tiara (na realeza das fadas, a coroa oficial não precisa ser usada o tempo todo). Só se preocupava com Ophelia. Se fechasse os olhos, podia se lembrar das lendas a respeito de Ophelia que sua mãe ou seu pai lhe contavam... Podia se lembrar das músicas que seu pai lhe ensinara, podia se lembrar da voz adocicada atribuida a voz de Ophelia.
Nas lendas, Ophelia era uma garota malvada, perversa, uma criança que nascera para fazer o mal. Agora que crescera, achara que Ophelia tinha se arrependido e todas as maldades eram simplesmente manipulações da mãe, então Ophelia não seria a grande culpada. Mas agora... mas agora tinha ordenado uma invasão à uma vila, acabado com famílias inteiras. Em busca do quê? Da coroa? Do seu cargo? Dos seus poderes? Se era a coroa, cargo, poderes... ela não se incomodava, ela cedia de boa vontade. Às vezes odiava ser Rainha.
Fez o que nenhuma Rainha deve fazer em momentos de crise: chorou.

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- Lala... - começou Ophelia calmamente, se sentando em uma pedra atrás da amiga - Lala.
- O que é? - os cabelos laranja ricocheteavam com o vento, batiam desenfreados no rosto, mas Lala não se incomodava. Só fitava as ruínas da vila, os demônios saciados, dormindo, preguiçosos.
- Eu... - Ophelia nem sabia o que dizer. Falar que era tudo uma ação a favor do Novo Mundo? Falar que o governo já fez pior? Só pioraria tudo - me perdoe.
- Pelo?
A pergunta de Lala soou irônica aos ouvidos de Ophelia, mesmo que isso não fosse intenção de Lala. Ambas as amigas olharam a vila lá embaixo, refletindo sobre a fumaça subindo aos céus e sobre os corpos mutilados estirados no chão.
- É isso que você faz, Ophelia? - perguntou Lala - destruição? Você disse que o Novo Mundo seria melhor para as pessoas... eu acreditei em você. Não sabia que envolvia isso, mas na verdade...
- Lala?
- Na verdade, como fui burra! Eu fui idiota, devia ter percebido! - gritou Lala - eu estava sendo escrava de quem? Não de uma fada qualquer, maníaca! Mas da Musa das Musas, a Musa que dormiu durante duzentos anos por causa de encantos! A Musa que derrota mil hirikis sem esforço algum! A Musa que apavora todo o reino, a Musa que conseguiu causar a maior guerra que já assolou o mundo mágico! A Musa que quer ser Rainha! É claro que ela pode, os mais fortes dominam, não é mesmo?
Ophelia não se defendeu. Só fitava a vila, só admirava cada barraco queimado, só observava cada demônio que dormia. Ouvia o que Lala falava, mas não lhe interessava se defender. "Musa". "A mais poderosa". "A mais temida". "A que mata mil hirikis em um golpe". "Musa".
- Olha como o mundo é grande, Ophelia... olha, as casas, colinas, o céu... tudo isso pode ser seu, só seu!
A empolgação era contagiante, Ophelia sorriu apontando para um balão cor-de-rosa que subia aos céus:
- Isso também pode ser meu, mamãe?
- Claro... tudo pode ser seu... tudo É seu... basta você ser a maior Rainha de todas as pessoas... basta você ser a mais poderosa...

O mundo era grande demais. Havia gente poderosa demais. E na verdade, tudo o que queria era o balão cor-de-rosa, mas confrontada com o poder de ter um mundo para si mesma... o que você escolheria? Um balão cor-de-rosa que cobiçou somente por alguns instantes ou o mundo inteiro? A escolha parece tão óbvia...
- Venha, Lala - Ophelia disse, se levantando de repente. Mas Lala permaneceu parada.
- Não vem? - perguntou Ophelia intrigada.
- Não - Lala respondeu - eu não vou mais com você.
Ophelia bufou, revirou os olhos. Ok, já tivera a sua cota de depressão e reflexão sobre a infância durante o dia. Odiava quando ficava pensando nas vidas perdidas em uma guerra tão tola.
- Ora essa, a firombeta está nervosa - ironizou, a voz ficando bem baixa e sibilante - deixe-me lembrar, minha querida: você pode ser a minha amiga, mas pelo que me lembro, você não ganhou alforria, ok?
Lala se virou, surpresa. Ah, é... engoliu em seco.
- Portanto - Ophelia baixou ainda mais a voz - você ainda é a minha escrava e eu sou a sua dona, entendeu? Trate de levantar daí e me acompanhar.
Lala respirou fundo, refletindo sobre as opções possíveis. Opção Um: aceitar e ir logo com Ophelia (chance de ficar viva: 98%). Opção Dois: bater pé e dizer que vai ficar (chance de ficar viva: 40% a 60% variando de acordo com o nível de estresse de Ophelia). Opção Três: se matar (chance de ficar viva: 0%, por razões óbvias). E se ameaçasse se matar? Não, chantagem nunca funcionava com Ophelia.
- E se eu quiser ficar mesmo assim? - perguntou timidamente, ao que Ophelia sorriu de lado e ergueu somente a sobrancelha direita:
- Sabe, tem uma região onde morei por algum tempo em que escravos foragidos e capturados em seguida recebem o seguinte castigo: ficam acorrentados no pescoço com uma pesada corrente de ferro durante seis meses e durante todos os dias, comem somente uma refeição por dia e esta é basicamente uma mistura feita de água, farinha e restos do almoço do patrão. Que tal ser acorrentada no pescoço feito um cachorrinho e comer farinha com maçã todo dia?
Lala engoliu em seco. A Opção Dois definitivamente estava descartada, e a Opção Três parecia muito atraente.
- Vou com você - suspirou, decidindo pela Opção Um, afinal das contas.
- Boa menina - foi tudo o que Ophelia disse. Mas ela não estava sorrindo.

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- Vocês voltarão como? - perguntou Crazy, olhando para uma Raveneh febril, mas sorridente amamentando um bebê.
- Não sei - respondeu Johnny - mas voltaremos logo... esse país é tão triste para Raveneh.
- Sim - concordou Rafitcha. Ela estava sentada em uma cadeira, ao lado de Raveneh e parecia muito cansada.
Todos suspiraram. Raveneh se aconchegou junto ao Johnny, o sorriso meio tonto, a pele queimando. Johnny tentava pensar no que poderia fazer para fazer Raveneh melhorar, preocupado. Só pensava em voltar pra casa, em voltar para aquela casa que os dois dividiam, em arrumar decentemente o quarto do bebê, em festejar que todos voltaram vivos e ilesos. Ou quase, porque Raveneh sofrera feridas demais que não se cicatrizariam tão rápido. Fora a maior prova de fogo que Raveneh passara: desafiara toda a questão de dupla personalidade e conseguira sentir coisas que nunca sentira nada, combateu todo o passado, fez por enterrar toda a história que a perturbava com terríveis pesadelos durante a noite.

Johnny acordara várias vezes com os gemidos apavorados de Raveneh, e pusera a sua cabeça no colo, acariciando seus fios dourados, cantarolando baixinho. Várias vezes ele a acordou, com um chá calmante ao lado especialmente para ela. Várias vezes ela acordou gritando, o suor frio e ele a tranquilizou, beijando sua testa carinhosamente. Eram tantas noites angustiantes, tantas noites que Johnny quis a morte para quem machucou tanto a esposa. Sabia que seus pesadelos tinham relação com a morte do pai e da irmã. Ambos lembravam sangue. Ambos lembravam alguma coisa que se perdera na infância, que nem Johnny nem Raveneh conseguiam definir.
- Maytsuri vai ser uma linda menininha - Raveneh disse, com tranquilidade.
Mesmo estando terrivelmente febril, Raveneh aparentava estar serena. Estava bastante calma, na verdade, nem um pouco estressada. Sua respiração era pausada, seus traços concentrados em alimentar May.
- Precisamos voltar - Bia escovava seus cabelos diante de um espelho quebrado - mas como chamaremos Raven?
- Podem pegar alguns cavalos nossos - ofereceu Crazy encostado na porta - ou posso pedir para que os soldados do Mundo das Fadas voltem com vocês.
- Essa segunda opção é boa! - exclamou Tatiih - o que acham?
- Excelente - concordou Rafitcha - se formos com um exercito, teremos proteção elevado a não-sei-quantos e iremos bem rápido, já que tem pressa de chegar ao destino...
- Eles vieram em cavalos alados - acrescentou Crazy - quem sabe?
- Perfeito! - exclamou Johnny - Bia? Raveneh?
- Por mim, tudo bem - Bia respondeu, sem interromper o que fazia.
- E você, Raveneh? - foi a pergunta quase tímida de Rafitcha, observando o olhar distraído de Raveneh. Esta ergueu os olhos, piscou-os levemente e murmurou:
- Está bem... por mim, tudo bem - foi a resposta dita de forma vaga, vazia, desinteressada. Raveneh queria muito voltar para Campinas, mas estava tão tonta que não tinha condições de avaliar o melhor transporte para voltar.
E então Crazy deu um sorriso acolhedor, e se retirou para fazer seus afazeres, incluindo arranjar uma carona sete pessoas mais um bebê.

3 comentários:

PollyQueiroz disse...

Jorge: o bife...

sabe quando a gente faz bife e tem que amaciar a carne, batendo com a ponta da faca ou passando aquele rolinho com laminas???

foi o que lembrei quando li esse capítulo, na parte que Jorge morre... também me lembrou o rolador de queijo...

Hoje a noite não como bife, juro!

bjus Luna, ótima história...

rende mais que Harry Potter!

Umrae disse...

Se ela tá com febre, provavelmente alguma infecção, não é perigoso ela amamentar? Não pode passar para a May?

Umrae disse...

"sabe quando a gente faz bife e tem que amaciar a carne, batendo com a ponta da faca ou passando aquele rolinho com laminas???"

Nesse caso, com o veneno necromante, o bife já vem refrigerado, né?