terça-feira, 20 de maio de 2008

Parte 30 - Algumas decisões.

- Estou com medo - admitiu Raveneh.
Johnny a abraçou, um sorriso forçado no rosto.
Kitsune trancava as portas, cuidadosamente, deixando lá dentro somente as coisas que poderia deixar pra trás: sentia medo de não poder voltar mais a esta casa onde vivera durante os últimos anos.
- Vai dar tudo certo - Rafitcha disse - vai dar tudo certo.
- Você tem esperanças de ganhar o julgamento? - Kitsune perguntou, a voz soando quase incrédula.
Rafitcha hesitou antes de dizer a verdade:
- Não. Jorge é sujo demais.

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Umrae estava preocupada demais contando os venenos de dano, soníferos, paralisantes, cimitarras, katanas, bestas, arcos, flechas, espadas comuns, lanças e outras coisas de guerra.
- Bom dia, Umrae - cumprimentara Ly - como vai?
- Bem - respondeu Umrae secamente.
- Heh - Ly murmurou - muito difícil o trabalho aí?
- Sim - Umrae respondeu - você não devia estar treinando a pequena tropa?
- Vão perder de qualquer forma - Ly disse friamente - aquele exército de nada vai adiantar contra demônios. Eu me sinto culpado por treinar pessoas de forma tão inútil.
- Pelo menos as armas são de prata - Umrae tentou consolar.
Ly mordeu o lábio inferior de apreensão.
- Sim... pelo menos.
Maria estava por perto, toda apressada, envolta em um manto em vários tons de azul.
- Umrae - sussurrou - sem enrolação, venho lhe dizer que pensei muito e você foi promovida a Capitã.
CRAS.
Umrae deixou cair um frasco de sonífero no chão, o líquido se derramando no chão.
- A o quê?
- Capitã - respondeu Umrae - agora você irá dividir suas responsabilidades com Ly. E vice-versa.
- Maria... - murmurou Ly - então não serei mais sozinho nas minhas obrigações?
- Exato - Maria continuou - vocês dois tem a carta branca para fazerem o que quiserem.
- Como assim? - disseram Ly e Umrae em uníssono.
- O que quiser - Maria repetiu - a estratégia militar, medidas de evacuamento, táticas de ataque, tudo vai ser determinado por vocês dois.
- Oh My God - murmurou Umrae pasma - então sou livre para fazer o que quiser a respeito de Ophelia.
- Exatamente - respondeu Maria - agora vou indo, tenho reunião com as fadas. Tchau.
- Tchau... - Ly se espantara também.
Maria dera as costas, Umrae pegara um pano para limpar o sonífero no chão.
- Então... Capitã Umrae, qual será a sua primeira medida? - perguntou Ly.
Umrae mordeu o lábio inferior: não conseguia definir o que sentia... se era apreensão, medo ou simplesmente a mais pura euforia.
- Ly... - começou - ainda tem aquele abrigo construído há anos e anos?
- O abrigo subterrâneo? - disse Ly intrigado - sim, embora seja inutilizado...
- Pois comece uma campanha de evacuação agora - Umrae disse - todo mundo deve ser mandado para lá. Depois separamos os que vão lutar e os que não vão...
- Aquele abrigo é enorme - Ly disse ainda mais curioso - você acha que a situação vai ser como a lenda?
- Aquele abrigo foi construído na primeira guerra provocada por Ophelia - vociferou Umrae - os poucos sobreviventes que restaram aqui nas Campinas só sobreviveram porque estavam no abrigo. Não vai ser diferente agora.
- Sim, Capitã - Ly sorriu - então é um plano para mudarmos tudo pra lá. Comece você também.
- Sim - Umrae disse.
Em cinco minutos, as caixas já estavam abertas para guardar os frascos que iriam ser guardados no abrigo. Em cinco minutos, todos nas Campinas guardavam suas roupas, armas, utensílios. E os que tinham poucas coisas se preocuparam com as coisas das pessoas que viajaram como Johnny, Rafitcha ou Raveneh, então arrumaram também as coisas que estes deixaram para trás.
Era um plano de emergência, em que todos se preparavam para partir.

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- Tem certeza que está bem, Majestade? - Dahes perguntou.
- Sim - respondeu Siih.
O vestido era belo, com aqueles detalhes em azul que a faziam parecer uma rainha da neve. As mangas justas que chegavam até o punho, o corpete ricamente bordado, repleto de pedrarias, as milhares de camadas de seda na saia do vestido, o cabelo quase negro trançado cuidadosamente, a tiara de prata dando o seu brilho.
- Vai ser uma reunião chata - argumentou Dahes preocupado com a rainha que aprendera a gostar - não precisa ir.
- Eu vou - disse Siih categoricamente - não se preocupe comigo, querido.
Dificilmente se encontraria uma rainha tão bela quando ela. Seus olhos eram sorridentes, a sua pele brilhando de tanta emoção. Mas ainda assim seu espírito parecia preocupado. Percorreu os corredores sendo acompanhado de Dahes que a toda hora fazia uma reverência para toda pessoa que passava, até chegar em uma enorme porta de madeira. Empurrou a porta com força.
O salão era fascinante: todo amplo, uma mesa de madeira formando um semicírculo. O chão espelhado, o lustre dourado no teto, as janelas revelando os jardins fantásticos, os vitrais no alto. E atrás da enorme mesa, várias pessoas: todas elas seres mágicos, vestidos pomposamente e ares arrogantes. No centro, Lefi cercado de nove cadeiras: quatro cadeiras no lado direito, cinco no lado esquerdo.
- Irmã! - cumprimentou Lefi com alegria - venha! - apontou a cadeira ao lado direito - venha!
- Oh não seja tão informal, irmão - disse Siih corando - estamos em uma reunião importante!
- Quem se importa com isso? - Lefi riu.
Siih deu a mão para Dahes que a acompanhou: em seguida ela subiu o pé direito, como se fosse subir uma escada. E seguiu com o pé esquerdo, sempre subindo uma escada. Mas não havia escada nenhuma, só se ela fosse invisível. Assim Siih caminhou no meio do ar, como se houvesse um tapete invisível sob seus pés, levando Dahes. Sentou-se ao lado de Lefi, deixando Dahes atrás de si.

Mal Siih se sentou, a porta se abriu com rompantes revelando três garotas: uma de cabelos negros e um olhar maldoso, a outra com seu ar sempre étero e os cabelos que chegavam a causar profunda inveja de tão sedosos e a terceira garota usava tranças no cabelo, a roupa negra e marrom.
- Miih, Loveh e Elyon - sussurrou Lefi - Trevas, Ventos e Submundo.
- Sejam bem-vindas - Siih disse em voz alta, sua voz ecoando em todo o canto do salão.
- Oh-Oh - Miih estava diante da mesa, tendo que erguer os olhos para enxergar os rostos atrás da mesa - então você é a Rainha das Fadas? Jovem demais.
- Eu sou Rainha há mais de dois anos - murmurou Siih secamente.
- Pior ainda! - zombou Miih - era ainda mais jovem quando assumiu o cargo.
Siih engoliu em seco.
- Por favor, sente-se - pediu Lefi apartando o sarcasmo - Loveh aí, Miih ao seu lado. Elyon, pode sentar aí.
Ao contrário de Siih que simplesmente levitou até o lugar, elas preferiram subir na mesa com grande leveza.
- Cadê as outras? - perguntou Lefi.
- Não sei - respondeu Elyon secamente.
Logo depois chegou Maria que ao contrário de todo mundo, resolveu usar uma das entradas da mesa para chegar ao seu lugar.

Eu poderia passar horas discorrendo sobre o modo de como cada Musa chegou, mas seria muito saco pra vocês e creio que vocês estão ansiosos para saber como é que vai ser o fim dessa história que parece não ter fim.
- Bem - começou Siih - está aberta a sessão. 5ª Reunião Extraordinária. Eu sou a Rainha das Fadas e todos vocês, excluindo as Musas e Maria Jhujhu, obedecem às minhas ordens. Estamos diante de um caso difícil em que há duzentos anos atrás, provocou a mesma preocupação, apreensão e a 3ª Reunião Extraordinária: e este problema tem um nome, e este nome é Ophelia.
- Ophelia é uma das Musas - continuou séria - nasceu há duzento e dez anos, e tinha um poder absurdamente enorme² logo na infância que fez todos se assustarem. Mas era só uma criança, e foi abusada pela mãe, esta uma mulher inescrupulosa que queria o poder absoluto. A família de Ophelia constava de oito irmãos, três primos, uma tia viúva, a mãe e o pai. Quando a mãe iniciou seus planos de ser a Rainha do Novo Mundo se aproveitando dos poderes da quarta filha, de dez anos na época, a guerra se iniciou. As, na época, oito musas revidaram. A guerra durou um ano inteiro e suas consequências foram trágicas: a família de Ophelia se reduziu a mãe e a irmã mais velha, desaparecida. Só na capital, havia cerca de dois milhões de habitantes. Depois da guerra, o número se reduziu a apenas quinhentos habitantes. Nas Campinas, a maioria se refugiu no abrigo subterrâneo, de modo que a maioria sobreviveu. Aproximadamente duzentas pessoas ficaram na superfície para lutarem. Dessas duzentas, sobreviveram em "perfeito" estado quarenta e duas pessoas. Esses são somente alguns números. Esses são somente alguns números, é claro. Não está contabilizado o número de mortos, feridos e sobreviventes em todo o Império e reinos próximos. E não devemos esquecer que uma das Musas, Olga, perdeu a vida.
Todos ficaram calados. Estavam apreensivos, relembrando as músicas tristes, os cemitérios. E isso acontecera há duzento anos... Para nós, pode parecer muita coisa. Mas uma fada vive em média cento e cinquenta anos, e os humanos que vivem entre as fadas também. Então era como se tivesse acontecido há apenas dez anos. Todos os reinos conseguiram se reconstruir, mas todos estavam medrosos de que a dose se repetisse... ainda hoje havia famílias dilaceradas pela guerra, crianças órfãs criaram seus filhos em meio ao sofrimento e outros tantos efeitos colaterais terríveis que uma guerra pode trazer.

Siih ainda se lembrava... a mãe não vira a guerra, mas a avó vira. Lembrava-se das histórias que a avó que contava: o medo que as pessoas tinham de dormir, a qualquer cor diferente no céu achavam que era mais uma luta, os cadáveres empilhados, as construções que ruíam dia a dia. A própria família de Siih quase fora destruída: além da avó, havia os irmãos e primos e netos. Depois da guerra, só havia a avó e seu filho para restaurarem o reino. Cinquenta anos depois da guerra, o filho morreu louco, e então a avó desposou um rapaz (sim, um rapaz): tiveram quatro filhos, e uma delas era a mãe de Siih. Os outros três se espalharam pelo mundo. Enfim...

- Deixe a luta com Ophelia com a gente - disse Loveh - só se preocupem em proteger seus cidadãos.
- Usem os abrigos - disse Siih - faça uma evacuação em massa. Peguem os melhores soldados para lutar com os demônios, e o resto... abriguem o resto.
- As armas tem que ser de prata - lembrou Elyon - ferro não faz efeito com demônios.
Ao redor, todos iam anotando as sugestões que na verdade eram ordens.
- Posso chama-la de Siih? - perguntou Sunny simpaticamente, com seus olhos azuis sonhadores - por favor.
- Sim - respondeu Siih analisando os inúmeros relatórios.
- Bem... - continuou Sunny - nós não somos suficientes para conter Ophelia.
- Eu sei.
- Então quer que a gente aceite ajudar vocês assim... arriscando as nossas vidas de um jeito tão fútil? - indignou Sunny.
- Nós também vamos arriscar as nossas vidas - disse Siih - os cidadãos de Campinas sabem que vão morrer, por exemplo, mas ainda assim eles querem lutar em vez de fugir! E o que está pretendendo com essa pergunta?
- Eu quero saber qual é o apoio que vamos receber - Sunny disse entredentes - nós resolvemos ajudar vocês, mesmo não tendo obrigação. Pouco nos importa os seus soldados, cidadãos, mulheres, crianças. E não estou nem um pouco a fim de lutar com uma Ophelia forte. Como vocês vão ajudar a gente?
Siih engoliu em seco.
- Eu concordo com ela - disse Alice - nós sete, sozinhas, não bastam para Ophelia ser derrotada. Seus soldados poderão dar conta dos demônios, mas nós que ficamos com o peixe grande.
Maria mordeu o lábio inferior: quem poderia auxiliar as Musas em uma missão tão difícil? Como poderia derrotar a Ophelia? Aparentemente todos tinham as mesmas dúvidas, e a resposta estava difícil de ser encontrada.
- Bem... - começou Siih insegura - a gente poderia enfraquecer Ophelia antes de vocês lutarem com ela...
- Como? - cortou Loveh.
Siih não sabia o que dizer, e não queria inventar qualquer coisa de última hora. Embora precisasse... milhares de vidas seriam perdidas caso Ophelia desse o primeiro passo.
- Não sei - admitiu Siih quase aos prantos - não sei. Não sabemos as fraquezas de Ophelia, não sabemos o que funcionará, não sabemos de nada...
- Hmpf - fez Loveh - só conseguiríamos enfraquecer Ophelia...
- E nós também estaríamos fracas - lembrou Catherine desanimada - vamos precisar de sangue novo no final da luta para dar o golpe final. Mas quem tem poder suficiente para se esconder e só agir em último caso?
Sunny se agitou.
- Tem alguém assim - disse sorridente.
- Quem? - começou Miih, mas logo compreendeu - sim, ela é perfeita...
As Musas sorriram como se soubessem de algum segredo muito, muito importante: os olhares secretos, os sorrisos tímidos, os risinhos disfarçados.
- Eu concordo! - disse Elyon em voz alta.
- Eu também! - apoiou Loveh.
Obviamente ninguém estava entendendo alguma coisa.
- Do que estão falando? - perguntou Siih - posso, por favor, saber?
- Simples... - Elyon cochichou - alguém com poder suficiente para dar o golpe final... não precisa ser necessariamente uma Musa, certo?
- Aonde estão querendo chegar com isso? - Siih não entendia nada.
- Seu poder é estranhamente gradativo, Majestade - murmurou Loveh sorridente - por mais que você tente se livrar dele, parece impossível que seu poder se perca...
- É perfeito - comentou Sunny.
- O que querem? - indagou Lefi surpreso - que Siih seja o elemento surpresa?
- Exatamente - Louise disse, sendo apoiada pelas companheiras.

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- Esse reino é tão triste - murmurou Rafitcha - porque esse preconceito todo aos seres mágicos?
Estavam na carruagem, em direção ao tribunal e ao julgamento.
Amai olhou para fora antes de começar:
- Houve uma guerra por aqui há muitos anos. E há muitos anos haviam seres mágicos, junto com humanos. E havia alguns seres humanos que desprezavam os seres mágicos, sabe-se lá porquê. O fato é que esse grupo, formado por três principais famílias, começou a disseminar seus pensamentos anti-mágicos por todo o país. E pouco a pouco, os humanos foram acreditando que os mágicos eram impuros e que não deviam estar ali. Contavam lorotas de que foram abusados por mágicos durante séculos, ameaçavam aqueles que tinham amizade com mágicos, etc. Até a Noite das Chamas em que expulsaram todos os seres mágicos que haviam: queimaram todas as florestas que haviam por perto, raptavam os filhotes mágicos indefesos e os largavam em uma zona onde não se pode usar magia, o que fazia as fêmeas correrem atrás. Enfim, se utilizaram de várias técnicas sujas que acabaram por fazer com que os seres mágicos decidissem não ficar aqui. Então eles foram embora, e desde então é isso. Esses seres são odiados e desprezados.
- Então... - Rafitcha olhou para fora - nenhum reino vizinho criou rivalidade?
- Somente um - respondeu Kitsune - a maioria dos reinos vizinhos são humanos e eles resolveram adotar a mesma estratégia. Por isso essa área é chamada de Terra Seca, sem encantos, sem mágica. E há um reino mágico, governado por magos. Chama-se Grillindor, é bem bonito, eu já fui lá. Os seres mágicos se refugiaram lá, e seus descendentes guardam rancor deste reino...
- Bem, uma história bem triste - sussurrou Raveneh - sempre detestei esse país... esse país que nunca consegui chamar de lar...
Todos ficaram calados.

Rafitcha mordeu o lábio inferior, se vendo totalmente perdida: como poderia sair viva? Sabia que não ganharia, era impossível: além das complicações envolvendo o caso de Raveneh (N.A.: de acordo com uma amiga minha, nenhum advogado brasileiro poderia salvar Raveneh se ela fosse julgada nos dias atuais O.O"), ainda estava lidando com um promotor que queria sangue. Que queria ver Raveneh morta, custe o que custar.
E pelo que escutara de Raveneh durante a viagem, Jorge era um fanático que menosprezava mágicos, ou seja, não bastava Raveneh ser condenada à morte. Seus amigos também tinham que ir...
... mas Raveneh estava grávida! Mas desde quando Jorge ligaria pra isso? Não esperaria Raveneh ter o bebê, ou pior ainda, forçaria um parto e pegaria o bebê para si, sabe-se lá para quê.
Rafitcha precisava ganhar, custe o que custar. Não tinha esperanças, mas iria tentar. E na sua mente, um plano B se formava...

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- Pelas barbas de Merlim! - vociferou Crazy - eu tenho compromisso, que quê é?
- O plano foi adiado - disse o homem - vai ser daqui a dois dias.
- Quer dizer, depois e depois de amanhã? PQP! (N.A.: pra não usar o palavrão todo! ù.ú)
Crazy mordeu o lábio inferior, quase arrancando sangue de tanta fúria. Respirou fundo, e disse friamente:
- Então o plano vai ser daqui a dois dias - respirou fundo mais uma vez - então que seja.
- É...
- Então tchau - disse Crazy - tenho um julgamento pra ir, entendeu?
O homem engoliu em seco.
- Está bem, comandante.
Está bem... está bem... Bem, o jeito é esse. Pelo menos tem mais prazo pra Raveneh e seus amigos escaparem da morte...

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