segunda-feira, 24 de março de 2008

Parte 13 - Partindo para as trevas.

- Aonde vai, Thá? - indagou uma garota, o seu rosto coberto pelo capuz.
- Lynda, você também sentiu, certo? - indagou Thá sem rodeios - Ophelia acordou... Ouvi dizer que ela provocou uma confusão durante o show de uma cantora lá, acho que o nome dela é Yahana...
- Yohana - corrigiu Lynda, fechando os olhos hesitante - imagino o que as Musas farão...
- Estão ferradas - afirmou Thá.
As duas estavam em pé, diante da feira, seus rostos cobertos por capuzes. As pessoas normais da vila de Cherllaux costumam achar isso estranho, mas já se acostumaram de tal forma que não falavam nada.
- Eu gostaria de uma dúzia de maçãs - pediu Thá, falando para o vendedor. O vendedor assentiu - bem, Lynda, você vai fugir como vão fazer várias pessoas? Ou vai ficar aqui?
- Eu não vou ser morta pela Ophelia - disse Lynda - nem se Ophelia acabasse com tudo aqui.
- Isso soa muito arrogante, Lynda - Thá riu.
Os olhos azuis de Lynda cintilaram.
- Sim - Lynda sorriu - mas permita-me perguntar... como vai o seu aprendiz?
- Bem - Thá respondeu - consegue algumas pequenas magias. Admito que é meio difícil educá-lo, mas garotos são mais difíceis de aprender do que garotas. Nunca entendi isso.
- Sim, é verdade - Lynda murmurou - garotas tem mais potencial para magias que garotos. Mas eu reparei que Vinicius tem muito talento para preparar poções mágicas. Deveria aperfeiçoar isso.
Thá sorriu. As poções de Vinicius eram perfeitas, tamanha era a habilidade do aprendiz.
- Bem, eu tenho que ir para a casa - disse Lynda. E para o vendedor, disse: - obrigada. Eis o pagamento.
- Eu vou com você - e Thá estendeu algumas moedas para o vendedor.
As duas moravam na mesma rua: uma casa em frente a outra. Lynda sorriu, e assentiu a cabeça, confirmando que esperaria a amiga. Pelo que Thá sabia, Lynda se mudara para Cherllaux há uns dois anos ou três, quando viera do norte para assistir a um julgamento cuja irmã mais nova era a ré. O julgamento foi uma verdadeira tragédia, em que tanto a irmã quanto o outro réu morreram de formas assustadoras, deixando um garoto de dez anos órfão. Lynda então não quisera voltar, e se fixara na pequena vila gélida, que fica entre a floresta e montanhas. A outra irmã, Kharën, agora morava sozinha e estava grávida da terceira criança.
Era uma história simples e incomum.
- Mestra! - gritou uma voz masculina - Mestra!
Thá se virou, deixando cair o capuz. Avistou Vinicius correndo apressadamente, seu rosto vermelho, sua expressão de medo.
- O que houve, Vinicius? - Thá indagou rispidamente.
- E-eu... - Vinicius tentou respirar sem sucesso. Embolou nas frases - Opheliaestáporperto.
- Ophe-o-quê? - Thá fechou a cara. Repreendeu o aprendiz: - fale direito, garoto!
- Ophelia está no meio dessa floresta, na cachoeira - foram as palavras que Vinicius conseguiu dizer.
Lynda franziu as sobrancelhas, intrigada.
- Eu não senti isso - disse - então Ophelia está suprimindo a sua energia?
- Eu não senti - Vinicius disse - eu a vi. Estava indo pescar alguns peixes e... bem, eu a vi do outro lado, tomando banho.
- Você viu a Ophelia? - Thá se supreendeu - e ela nem soube que estava ali?
- Ela levantou o r-rosto... - Vinicius tremia de medo - e me viu. Mas ela fez uma cara de asco, e me ignorou .___.
- Seu tolo - Thá disse, suspirando - vá pra casa e tome um chá. Céus, seu suor está frio.
Vinicius a olhou apatetado.
- Já foi?
Vinicius saiu correndo para a casa onde ele e Thá viviam.
- Vou indo também, Thá - disse Lynda - o que seu aprendiz diz é preocupante. A Ophelia está em algum lugar por aqui, e já que está suprimindo a energia, pressume-se que ela tem algum plano...
- Sim - Thá concordou.
Chegaram ao final da rua. As duas se despediram com uma reverência formal.
Thá suspirou, após fechar a porta atrás de si.
Não conseguia sentir a energia de Ophelia. Normalmente um monstro como a Musa Adormecida se faria sentir até mesmo de muito longe: Thá não havia sentido a bagunça que fizera quando entrara na capital? E a capital nem era tão perto assim, era uns dois dias de viagem considerando uma noite de descanso, a viagem no ritmo de um cavalo. Mas se o seu aprendiz estava certo, Ophelia estava perto demais, ali na cachoeira, no rio em que as pessoas da vila pescam, tomando banho distraída. E ela não sentira. Nem ela, nem mesmo Lynda que tinha maior precisão que ela.
Definitivamente Ophelia estava se escondendo.

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- Eu lhe darei uma carona - Raven disse.
Maria sorriu.
Rafitcha, Tatiih, Bia, Raveneh e Johnny estavam prontos para a viagem de alguns dias. Normalmente duraria muito tempo, mas os cavalos alados eram rápidos, então a viagem só duraria dois dias.
Raven levaria o grupo até o reino e depois voltaria para buscar a todos.
- Mande notícias - pediu Maria.
Ly e Doceh assentiram. Umrae chamou Tatiih e lhe entregou sete potes de vidro, cada um com um líquido de cor diferente.
Tatiih se intrigou:
- O que é isso?
- Veneno - respondeu Umrae - guarde-os. Entregue-os para Johnny, Bia ou Rafitcha quando for a hora. Por favor, não se esqueça: branco é sonífero leve, rosa é sonífero forte. O vermelho faz a pessoa cair doente e com febre, o azul causa alucinações e vícios. O verde queima por dentro, mas só mata se tomar muito de uma vez. O laranja tem gosto de laranja e faz os órgãos gelarem, e você sente muito frio a ponto de desejar a morte. E o negro... bem, o negro fica da cor do ar quando se mistura com outro líquido e é o único que mata com um gole somente. Tome muito cuidado com o veneno negro, está bem?
- S-sim... Mas porquê... eu? - Tatiih estava tremendo com a caixa de madeira, os sete potes de vidro dentro. Tremia com a hipótese de confundir o veneno...
- Vá, estão te esperando! - Umrae sorriu.
Tatiih fez uma mera despedida e correu para a carruagem, onde o restante do grupo esperava. A maioria das pessoas daram presentes para ajudar a Raveneh e os outros na viagem: Fer dera dois punhais de prata, Kibii cedeu um conjunto de flechas venenosas, a menina dos feijões dera uma ampola com algo transparente dentro (a finalidade não foi muito bem explicada), Ly ensinou a Johnny um pouco sobre defender alguém, Doceh produzira um conjunto de chocolates que corroíam qualquer um que os comessem.
- Adeus - Maria despediu-se.
- Adeus.
Em um rompante, os quatros cavalos alados se levantaram e começaram a voar, entre as nuvens. Era uma viagem mais exaustiva que a que fizeram para o show, que podiam ter feito a pé (mas como era um grupo e estavam com preguiça de subir as escadas rolantes/achar a praça, preferiram ir nos cavalos). Raveneh

suspirou, agradecida por tanta gente a acompanhar, além do seu marido. Sentia que não estava sozinha. Perguntou-se o que Jorge acharia daquele grupo todo.

Ele era um dos baba-ovo da irmã Catherine.
Provavelmente era filho da mãe com um amante vagabundo qualquer, tamanho seu contraste com os outros irmãos: enquanto os outros irmãos tinham cabelos escuros do pai e os olhos cor-de-mel da mãe, Jorge era ruivo e com olhos verdes, repleto de sardas. Enquanto os irmãos eram fortes, Jorge era magricela. Desde que o pai morrera, todos trabalhavam para o governo. Mas somente Jorge estava no cargo mais alto, na área de advocacia. O resto costumavam trabalhar para os figurões do governo como seguranças ou assassinos profissionais.
Mas ainda assim era o preferido da sua mãe e da Catherine. A mãe o paparicava mais do que os outros filhos, e era o único com quem a Catherine não se irritava.

Era o único irmão que Catherine contava suas confidências.
Reparou que quando viera dar a notícia, seus cabelos estavam escuros. Provavelmente tingira para ficar mais parecido com um filho da sua mãe... Mas as sardas continuavam, sua magreza continuara. E os olhos verdes e penetrantes continuavam, sempre sinceros.
Apesar de Jorge ser o mais paparicado e preferido, era o único que não humilhava a Raveneh. Raveneh e uma barata era a mesma coisa para ele: nada. Jorge nunca ligara para Raveneh, nunca se dirigia a ela. Talvez se sentisse culpado de tantas humilhações e preferia se manter omisso. Raveneh não lembrava se alguma vez Jorge falara com ela quando moravam sob o mesmo teto.
- Eu queria poder lutar - suspirou Raveneh, ao que Johnny retrucou:
- Não pode fazer isso, pelo menos até o nosso bebê nascer. É muito esforço.
- Sim... - Raveneh estava aprendendo a lutar com espadas há dois anos, e já estava conseguindo desenvolver boas técnicas. Mas a maternidade interrompera esse aprendizado, e Raveneh não gostava disso.
Porém o bebê estava ali dentro, se mexendo. Quem seria?
- Que nome você daria para o nosso bebê? - indagou Raveneh.
- Será uma menina - sorriu Tatiih observando a barriga. Raveneh ergueu o rosto, surpresa.
- Como você sabe? - indagou.
Tatiih sorriu.
- Eu não sei dizer como - respondeu - mas as mulheres que viviam comigo na cidade sabiam dizer. Meu irmão, Giovanni, sempre errava quando tentava.
Giovanni?
- Você tinha um irmão? - indagou Rafitcha curiosa.
-Sim... ele era filho natural dos meus pais, mas eu fui adotada. Desde pequena - confidenciou Tatiih.
Eu já escutei esse nome... quando?
- E onde ele está agora? - indagou Bia.
Eu sei... eu sei, mas não consigo me lembrar!
Tatiih se entristeceu.
- Estava trabalhando em Heppaceneoh quando foi invadida pelos nortistas. Não tive mais informações desde então.
Estou lembrando.. Estou lembrando!

- Avisem... que... eu... morri... pra... minha... irmã...
- Onde ela mora? Qual o nome dela? E...
- Campinas... Ela vive nas Campinas... Irmã adotiva... O nome dela é...
- Campinas?

Foi anos atrás...

- Você acha que ele sucumbiu aos nortistas? - indagou Rafitcha.
- Talvez - Tatiih sorriu - talvez.
Tatiih fechou os olhos, embalada nas lembranças do irmão, enquanto Raveneh mordia o lábio inferior por nunca ter contado a verdade. Precisaria contar, já que

lembrava. Mas... quando?



E no próximo capítulo...

Siih saiu apressada, ignorando as reverências que faziam quando passavam por ela. Precisava arranjar o problema da Ophelia, antes que todos os outros. O país estava estarrecido com a notícia de que a Musa havia acordado: tentara abafar a notícia, mas não deu jeito: nenhum jornal quis ser subornado para ocultar o fato de que a Musa havia acordado. Lefi passara as horas tentando subornar os jornais com ofertas altíssimas, mas nem uma oferta de 80 milhões seduziu algum diretor. A idéia de que a tiragem dos jornais se superaria era melhor.
E ao mesmo tempo tinha que continuar reinando e governando como sempre fizera: não podia admitir a idéia que uma Musazinha qualquer causasse prejuízos ao país inteiro.
Como era complicado ser rainha.

Um comentário:

Clau disse...
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