Ophelia andou pelas escadas.
Eram quatro da manhã, as estrelas estavam perfeitas e o seu estado era de uma raiva incontrolável.
Descia, subia, atravessava corredores, perturbando a todos com seu andar apressado, seus resmungos. Queria agir, e ser verdadeiramente uma rainha. Tinha alguma coisa que a incomodava desde a luta com Elyon e Catherine, alguma coisa que insistia em ficar ali. Ela não sabia o quê, mas a coisa estava ali, no pé de cada escada, atrás de cada porta, no fim de cada corredor. A coisa que insistia, que perturbava, que atormentava Ophelia com aquela ansiedade, aquela excitação lhe subindo o peito. Ophelia queria gritar, mas não conseguia.
Todos dormiam.
Todos adormeciam.
Alicia dormia no outro canto no quarto onde Lala adormecia, assim Ophelia mandava.
Os Glombs ficavam quietos, pois o barulho deles incomodava Ophelia.
Ravèh adormecia em um quarto só dela, cedido por Ophelia, e os irmãos dormiam.
Nada.
Nada acontecia.
Pensou que quando fosse rainha, conseguiria vingar tudo o que sofrera na infância. Pensou que sua sede de poder seria saciada, seria feliz, no fim das contas. Mas não era isso que acontecia. A cada dia que passava, se sentia mais vazia e o vazio corroía a sua alma por dentro. Estava perdida, e queria alguma emoção. Aquela emoção que sentira ao massacrar Elyon e Catherine.
Sentou-se no trono, encarou a frente. Ali em frente, Bia lutou com Lala, e ela conheceu Umrae, Ly. E também a doce Amai, a decidida Rafitcha e a calma Kibii. Kibii... tivera-a nas mãos, e foi resgatada tão facilmente, de modo tão estúpido, que Ophelia teve que se questionar sobre a atenção real que dava para seus prisioneiros.
Era uma rainha.
Mas era a rainha dos demônios, e ao menos, eles gostavam de seu reinado. Tinham carta branca para tudo, não é? A lei deixou de existir, a ordem deixou de ser assegurada, e todo o Conselho simplesmente sumiu, dissolvido na confusão. Estava praticamente sozinha para governar reinos e reinos, e se Lala não resistisse, aí que estaria sozinha de verdade. Tinha Lala para lhe ajudar, tinha Lala para lhe aconselhar e para tirar o gosto da solidão. Ela era seu escudo, seu saco de pancadas e seu confessionário.
A única pessoa viva que conhecia o lado humano de Ophelia, e ela não podia deixar morrer simplesmente.
Não iria deixar.
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- Pronto?
- Yeah.
Dez dragões na frente, acorrentados no pescoço, e correntes presas a uma grande carruagem que tinha o tamanho da sala de estar de uma casa japonesa, daquelas de estudante. Por fora, toda pintada de furta-cor e completamente encantada para se mesclar ao céu. Por dentro, toda de madeira com janelas fechadas, feitas de cristal, e dois compartimentos separados por uma porta. No compartimento menor, se guardava as malas e todo o material necessário. No maior, as pessoas se deitavam sobre cobertas e não conseguiam dormir devido ao balanço que fazia enjoar. No interior, onze humanos e três dragões.
Dez dragões, sendo que cinco eram de escamas azuladas que brilhavam à luz das estrelas e cinco eram completamente negros, exceto pelos chifres que tinham cor de osso, e todos os dez dragões voavam em alta velocidade, carregando a carruagem.
- Chamada básica e ordens básicas - disse Bel, que se sentava junto à uma das janelas, recostada em uma enorme almofada forrada de cetim azul - vamos lá. - olhou para uma prancheta onde tinha alguns papéis - Crazy, Giovanna, Harumi, Luka e Pauline: cuidarão dos dragões azuis. Polly, Ratta, Ti-Yi, Toronto, vocês ficarão com os negros. Eu também ficarei com um dos negros.
- E eu? - Zidaly protestou veemente - ficarei com qual?
- Nenhum - Bel afirmou categoricamente - será a cuidadora.
Todos tiveram que disfarçar o riso, enquanto Zidaly não entendia:
- Como assim?
Bel teve que explicar:
- A cuidadora é simplesmente o trabalho sujo. Lavar a sujeira que eles fazem, lavar os nossos uniformes - ao passo que Zidaly fazia uma careta de horror, Bel continuou sadicamente - sabe, você terá que usar uma roupa muito bonitinha, toda amarela, e manter tudo limpo, e tem que cuidar muito bem, senão eles ficarão furiosos com você e te matarão.
- Comendo viva - acrescentou Ti-Yi, risonho.
Zidaly recuou, abraçando os próprios joelhos. Parecia sinceramente apavorada.
- Eu não te conheço - Crazy comentou - você nunca deu ataque de frescura em missão, ainda mais quando você suborna para ser convocada.
- S-Subornar? - Zidaly quase que choramingava.
- Com o corpo - Bel alfinetou - eu aceitei que entrasse, mas infelizmente, você se esqueceu de decidir sobre que tarefa receberia, confiando na minha boa vontade. Infelizmente pra você, minha querida, eu estou com um desejo mortal de fazer criar o inferno na terra, sobre você.
Zidaly parou de tremer e choramingar, ficando fria como gelo.
- Não vai conseguir. Será dedurada quando eu voltar.
- Quem disse que vai voltar? Em uma guerra, costuma morrer gente, sabia? - Bel sorriu diabolicamente, ao que Zidaly mordeu o lábio inferior de raiva, seus dedos tremendo de tanto ódio. Polly ficou em alerta como costumava fazer quando a situação se tornava tensa, e Harumi ficou pronta para usar magia de defesa, coisa em que era muito boa.
Zidaly se levantou de supetão, postura ereta, procurando a espada no punho e reparou, com decepção, que não a possuia.
- Desculpe - Ratta disse cinicamente - mas todas as armas foram guardadas lá atrás. Ordens da Comandante.
Bel também se levantou, os punhos na posição.
- Quer lutar, criança? - sorriu - venha.
- De corpo? Que vulgar - Zidaly bateu o pé esquerdo no chão, direcionando alguma espécie de magia entre os ladrilhos de madeira e correndo até Bel com rapidez, fios de energia que se entrelaçavam em volta de Bel, fios azuis e mágicos que formaram uma espécie de gaiola. Mas Bel não se apavorou nem se intimidou.
Só deu um passo.
E os fios sumiram.
Zidaly bem que tentou, usando todas as magias de ataque nível um para iniciantes bakas aprendidos, mas Bel se defendeu de todas com tanta delicadeza e facilidade que Zidaly teve que admitir que a vitória era da Comandante. Desabou no chão depois da vigésima oitava magia lançada e defendida, e ofegou. Aquilo não lhe cansara quase nada, mas mesmo assim, não queria usar magia mais forte ou causaria uma forte interferência na magia que protegia a carruagem. Podia até matar Bel cantando e dançando, mas nunquinha que iria colocar o seu amado queridissímo Crazy em risco. Nunca.
- 1x0 para mim? - riu Bel bem baixinho.
Zidaly a encarou com um olhar de nojo, quando Gerogie disse friamente:
- Francamente, vocês me enjoam.
Pararam e ficaram quietos a viagem toda. Os três dragões dormiam tranquilamente, os humanos permaneciam com enjôo. É, fazer o quê.
E a noite chegaria, logo, ao fim.
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- Me ajuda?
Raveneh permaneceu com os olhos fechados, se revirou na cama.
- Não.
Respirava ofegante, mesmo dormindo, sentindo mágoa na garganta.
Droga. Droga.
- Raveneh.
- Raveneh, por favor, me ajuda
Johnny se levantou sobressaltado pelos gemidos de Raveneh, gemidos dolorosos de quem estava sofrendo demais.
- Espero a sua morte há catorze anos.
- Raveneh!
Johnny sacudiu a esposa que acordou, lágrimas nos cantos dos olhos. Se sentou, ofegante, as lágrimas correndo pelas bochechas, parecendo aturdida.
- Johnny...
- Sonhou com o quê?
Raveneh fixou o olhar no teto, não querendo responder. A resposta era vaga demais, a esperança estava sumindo.
- May está bem? - Raveneh perguntou, sua voz sempre tão adocicada, ao que Johnny respondeu com ternura:
- Sim, querida.
Johnny abraçou Raveneh com todo o carinho que podia reunir dentro de si, e embalou Raveneh com cochichos calmos e cantigas. Raveneh parecia uma criança dourada entre seus braços.
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- Porque tem duas belezinhas tão sozinhas? - riu o barman que servia as bebidas com uma desenvoltura íncrivel. Seu sorriso era de um homem galante, metido à conquistador, alto e imponente, peito de fora e calças verde-exército.
Elyon o encarou com desprezo:
- Quero só a mimatta de malte - resmungou - não quero você.
- Você deveria reconsiderar, garota - o barman disse, enquanto servia dois copos repletos de mimatta fumegante - eu nunca decepciono as donzelas.
- pffff - riu Catherine sem achar graça - poderíamos matar cem desses em um golpe, mas ainda assim eles se acham...
- Obrigada, garotão - ironizou Elyon entregando duas moedas de bronze - acho que isso servirá.
- Não. Tem que ser um galleom por cada copo - o barman resmungou - por causa desses demônios - abaixou o tom de voz, quase que sussurrando - eu tenho mais dificuldades de manter esse bar... o preço aumentou, desculpe, senhoritas. Mas tem outro jeito de pagar...
Elyon jogou mais duas moedas de bronze, dando um olhar furioso:
- E mais duas, completa-se dois gm'. Pagaremos em moedas, não se preocupe.
Catherine pegou seu copo, bebendo um gole.
- Hey, - disse Catherine enquanto bebia aquela bebida tão amarga - veja só esses monstros. Completamente...
Elyon concordou com um aceno de cabeça.
A cena era triste.
Num canto, demônios jogavam baralho, bebendo mimattas que equivaliam à vários galões imperiais e discutiam sobre coisas obscenas, enquanto outros bebiam solitários. Ainda havia os humanos que dançavam ao som de humanos, e Elyon não conseguia sentir a energia deles, o que fazia pensar que eram realmente humanos em meio aos monstros.
- A qualquer minuto, eles podem explodir esse lugar - murmurou Catherine - esse bar só existe porque o barman conseguiu impor respeito...
- Sim - Elyon concordou, sentindo os efeitos do álcool - e ele também é um grande tarado. Se ele me atacar, vai perder muito mais do que o documento dele - rosnou maldosamente.
Catherine riu.
- Te odeio - gritou uma mulher, com três seios no tronco e quatro braços enormes - te odeio.
Outro demônio se levantou, fazendo cair várias cartas de baralho no chão. Media cerca de um metro e oitenta, e em seu rosto deformado, só havia um único olho grande, redondo de íris negra, e possuía vários dentes, pontiagudos e tortos.
- Também te odeio, Meicci - rosnou ele, erguendo as mãos em direção ao demônio feminino, que fez gritar, atraindo a atenção até dos mais desligados e bêbados.
Os quatro braços da tal Meicci bem que tentaram defendê-la, se movendo e rasgando o tronco do maior, mas nada adiantou. Seu pescoço foi apertado como em um estrangulamento, sua cútis facial se tornou arroxeada, seus olhos saíram das órbitas e desabou no chão, quando ele a largou. Todos o encararam, amedrontados e temerosos.
- Quem vai querer quebrar as regras do vinte-e-um comigo? - ele vociferou.
A voz ecoou no aposento.
E se sentou, solitário, jogando vinte-e-um sozinho, fingindo que tinha alguém ao lado.
Ninguém se movimentou para pegar o cadáver do demônio que ousara quebrar as regras do vinte-e-um com alguém que não tinha mais o bom senso de discernir entre o normal e o extravagante.
Oh céus, preciso melhorar isso logo. Mas estou me preparando, psicologicamente. Afinal não pensem que vai ser fácil digitar capítulos em que vidas serão desfeitas, sim, vidas. Ou vocês acham que o título do blog lá em cima vai permanecer verdade? E quando me refiro a 'todas', não me refiro somente às três principais. Por enquanto. Obrigada, boa noite. E comentem, eu gosto muito dos comentários que vocês fazem *-*
3 comentários:
Cuidado com esses genocídios de elenco. Tem pessoas que fazem falta. :(
Ophelia chata lawful-evil...
Aguardo ansiosa, como de costume.
Eu realmente tenho MUITO medo da Luna. *o*''
Mara, Lunoskaa!
Feliz Páscoa, Lunoska. :D
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